25/12/2014

Crítica do filme: 'Violette'



Viver é a coisa mais rara do mundo. A maioria das pessoas apenas existe. Em seu quinto longa-metragem, o cineasta francês Martin Provost resolve contar uma história real, forte e cheia de detalhes que impactaram o modo de pensar francês durante todo o século passado. Com um grande desfile de astros da literatura e filosofia, um roteiro primoroso e a dupla Emmanuelle Devos e Sandrine Kiberlain inspiradas, Violette se transforma ao longo dos 139 minutos de fita um retrato contundente sobre uma figura ímpar em uma sociedade careta que recebe um tapa em cada linha de seus polêmicos textos.

Na história, roteirizada pelo próprio diretor, conhecemos mais profundamente a vida da escritora Violette Leduc, uma mulher guerreira que encontrou a salvação através da escrita. Sua amizade e sua paixão por Simone de Beauvoir também é meticulosamente bem mostrada. Se sentindo em um deserto que monologa, desafiando o convencional da época, quebrando tabus, sendo admirada por ilustres escritores do século XX, a protagonista é muito poderosa. Emmanuelle Devos embute uma energia vigorosa que é fundamental para que tenhamos empatia por Violette. Uma grande atuação dessa excelente atriz, talvez, pouco conhecida aqui no Brasil. 

Ao longo da ótima trama, vemos um despertar da sexualidade, uma liberdade profunda em expressar e sentir suas emoções. As asfixias da vida geram uma força em Violette para que a mesma escreva sobre sua ardente e sofrida vida. Na verdade, Violette se punia a cada passo sem êxito, a cada chance desperdiçada, chegava ao limite da razão e emoção facilmente, fruto de sua vida sofrida e os traumas do passado que sempre voltavam como fantasmas sem solução. Sua amizade com Beauvoir ajuda a encontrar o caminho e a ganhar um pouco de razão em busca de seu destino.

O roteiro concentra-se no período pós segunda guerra até o lançamento de seu famoso livro, A Bastarda, em meados da década de 60. Assim, contornamos uma sociedade francesa que se remodela após uma das grandes tragédias mundiais. O sofrimento de Violette é um pouco o reflexo de uma sociedade que precisa lutar por sua existência, nesse ponto Violette absorve uma obsessão pela escrita, sonhando que o escrever lhe trará tudo que a vida lhe tirou.

Depressiva, pobre, despretensiosa de grande beleza, Violette é um personagem fascinante que nas telonas do cinema transbordará emoções a cada instante. Não percam esta bela fita francesa.
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24/12/2014

Crítica do filme: 'Para Sempre Alice'



E se todas as lembranças de nossas vidas simplesmente sumissem ou nunca mais conseguíssemos lembrá-las mais? Para falar sobre o terrível Mal de Alzheimer nas telonas, os diretores Richard Glatzer e Wash Westmoreland criam uma história forte, convincente e comovente que envolve problemas existenciais de uma impactante mulher. Para Sempre Alice é muito mais que um drama tocante, é uma lição de vida onde o público presencia uma das grandes atrizes em atividade no auge do seu talento.

Na trama, conhecemos Alice (Julianne Moore), uma conceituada professora e autora de livros que se encontra em uma fase conturbada de sua vida ao ser diagnosticada com Mal de Alzheimer aos 50 anos. Tentando não enlouquecer e espantando a tristeza, encontra um desafogo para suas dores na tentativa de reaproximação com sua filha mais nova, com quem sempre teve muitos problemas e discussões. 

O roteiro, que é baseado na obra de Lisa Genova, aborda a vida da protagonista no trabalho e na família, antes e depois de ser diagnosticada com a doença. No campo familiar, as relações passam a ser mais melancólicas, frias e distantes. Vemos uma protagonista que se desmonta no campo emocional com tanta verdade que somente uma atriz do nível de Julianne Moore para conseguir tal feito. Não tenham dúvidas, é uma das grandes interpretações femininas do ano, Moore tem boas chances de ganhar o próximo Oscar por essa atuação. 

A protagonista é levada a um recomeço distante, Se encontra aprendendo a arte do reaprender todos os dias. Toda a vida acumulando memórias, como conheceu seu marido, quando segurou pela primeira vez seus filhos, tudo isso sendo retirado de maneira cruel. Esse trabalho não deixa de levantar uma bandeira importante sobre a doença que sofre a personagem principal. Assim como o filme de estreia da Sarah Polley como diretora (Longe Dela), esse belo projeto mostra a dura realidade de quem possui Alzheimer.

Com Alec Baldwin (que também tem uma ótima atuação, preenchendo a telona de emoção) , Kristen Stewart e Kate Bosworth no elenco, Para Sempre Alice estreia ano que vem nos cinemas brasileiros e mais uma vez ganhamos a oportunidade de conferir mais um espetáculo em cena de Julianne Moore. Ela vale o ingresso!
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Crítica do filme: 'Um Santo Vizinho'



Quando a casa do vizinho está pegando fogo, a minha casa está em perigo. Escrita e dirigida por Theodore Melfi, em seu primeiro longa-metragem na carreira, Um Santo Vizinho é uma comédia dramática que tinha tudo para ser uma cópia de Um Grande Garoto ou outro filmes que mostram a relação de amizade entre adultos e crianças. Porém, por conta de seu protagonista, basicamente um anti-herói, interpretado pelo genial Bill Murray, o filme se transforma em uma grande jornada sobre a arte de recomeçar.

Na trama, conhecemos o peculiar ranzinza Vincent (Murray), um homem que leva uma vida sem sentido. Vincent é um homem ex-herói de guerra norte-americano que vive sozinho com seu gato persa passando o dia bebendo e apostando em corridas de cavalo. Dançando bêbado em frente à jukebox, discutindo arduamente com o gerente do banco, maltratando a muitas pessoas gratuitamente, Vincent parece não ter mais solução. Certo dia, novos vizinhos chegam para morar ao lado dele e assim conhece o jovem Oliver com quem logo faz uma grande amizade.

O filme basicamente é de um personagem apenas, roubando a cena a cada instante. Sim, estamos falando de Vincent! Seus óculos vermelhos, beirando ao ridículo, escondem um homem triste. O lado sensível do protagonista se prolifera quando ele visita semanalmente sua esposa que mora em um asilo para pacientes de Alzheimer. Vestido de médico, muitas vezes, consegue proporcionar mais segundos inesquecíveis ao lado da única mulher que amou. Seu jeitão rabugento não muda muito ao longo da história mas alguma doçura também é captada quando começa a dividir seu tempo com o jovem Oliver, uma criança inteligente que usa GPS para chegar na escola.

O roteiro também abre poucas oportunidades para que os coadjuvantes consigam nos contar melhor essa história. Melissa McCarthy atuando de maneira mais séria e não de forma debochada, cresce como atriz. Mostrou muitas qualidades para o drama nesse bom filme. Já a personagem de Naomi Watts, que a princípio fica um pouco deslocada na trama, vai e vem nas linhas do roteiros sendo peça importante para o desfecho da história.

Bill Murray deve ser um cara maneiro, disso, nós cinéfilos não temos dúvidas, um avô que muita gente já sonhou. Talvez por isso Um Santo Vizinho é um filme que muitos devem gostar. Nada excepcional mas conta com uma história criativa, um elenco entrosado e um Bill Murray inspirado.  
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23/12/2014

Crítica do filme: 'The Salvation'



 “A vingança é uma espécie de justiça selvagem”. Essa frase emblemática do filósofo britânico Francis Bacon, encaixa como uma luva quando pensamos na definição para o novo filme do competente diretor dinamarquês Kristian Levring, o faroeste The Salvation. Protagonizado pelo camaleão Mads Mikkelsen, o filme possui um roteiro bem simples, assinado pelo excelente Anders Thomas Jensen (que também assinou  roteiro do espetacular Brothers (2004)), mas que permite o brilho de todos os personagens nas sequências. 

Na trama, voltamos ao ano de 1870 em uma América indefinida, naqueles tempos onde os vilões bigodudos dominavam as estradas de areia que andavam os cavalos. Assim, conhecemos o dinamarquês Jon (Mikkelsen) que chegara há algum tempo na América junto a seu irmão e ambos conseguiram crescer em seus empreendimentos, permitindo a vinda da esposa de Jon e de único filho para a terra das oportunidades. Porém, assim que sua família chega, são assassinados brutalmente por um parente de um bandido local. Jon então parte em busca de vingança a qualquer preço.

Há drama, há suspense, há ação, bem exploradas dentro do contexto. A parte do romance dentro da trama que deixa um pouco a desejar. Madelaine, personagem de Eva Green, era o caminho certo para fazer fluir nesse sentido, porém, a leitura feita por Eva de sua personagem transforma Madelaine em uma mulher dura, que se expressa por ações e não por emoções ao longo dos curtos 92 minutos de fita. Isso não é ruim, não estou dizendo isso, só meio que não preenche todas as lacunas que a história permitia. 

As cenas de bang bang são excelentes. A condução de Levring é inteligente, deixando o espectador, principalmente aos cinéfilos que curtem os filmes do gênero, grudado na poltrona. O ótimo Jeffrey Dean Morgan, eterno sósia de Javier Bardem, veste muito bem a Carapuça de vilão, parece se divertir em cena. Sem dúvidas, um dos grandes destaques da o filme.

The Salvation se aproxima muito da qualidade dos ótimos faroestes feitos nos últimos anos em Hollywood: Os Indomáveis (3:10 To Yuma) e Appaloosa - Uma Cidade Sem Lei. O êxito desses trabalhos é fundamental para que esse gênero, imortalizado por John Wayne e companhia, nunca seja esquecido do imaginário cinéfilo.
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22/12/2014

Crítica do filme: 'As Duas Faces de Janeiro'



Malandro se soubesse quanto é bom ser honesto, seria honesto só por Malandragem. Após um curta-metragem no longínquo ano de 1989, o cineasta iraniano Hossein Amini, que adaptou o roteiro elogiado de Drive (do Refn), deve ter lido muito Georges Simenon e Agatha Christie para criar e dirigir a confusa, e nada atraente, trama de As Duas Faces de Janeiro. O filme é ambientado em uma Grécia na década de 60 mas para irritação dos cinéfilos, não consegue criar elementos para aproveitar todo o charme do lugar, fora os personagens fracos e com péssimas atuações de Viggo Mortensen e Kirsten Dunst. Um dos piores filmes do ano, não tenham dúvidas.

Na trama, somos apresentados rapidamente ao vigarista Chester MacFarland (Mortensen), um homem cheio de segredos que deixou para trás um passado de roubos em pessoas importantes e resolveu fugir para uma “trip” com sua linda esposa Colette MacFarland (Kirsten Dunst). Após uma noite agradável em Athenas, um homem confronta Chester para retomar o dinheiro roubado, nisso, após uma briga, o protagonista acaba matando ele. Para tentar ajudar o personagem principal e sua esposa a fugir do país, um guia turístico, também outro malandro, chamado Rydal (Oscar Isaac) aparece em cena não estabelecendo limites para conseguir outras coisas em troca.

As Duas Faces de Janeiro é o tipo de filme que te cansa logo nas primeiras cenas. Um charme debochado, totalmente clichê, é visto nas primeiras sequências embutido em cada personagem que é apresentado. A trama, é lenta, com poucas razões para os desenvolvimentos das ações, tudo é muito gratuito. A única tentativa de agradar ao público fica a cargo do suspeito personagem interpretado por Oscar Isaac, mas mesmo esse não tem o desenvolvimento nem influência suficiente para agradar ao público no desfecho. É nítido que Mortensen, Dunst e Isaac não conseguem entrosamento em nenhuma sequência, parecem textos lidos e não interpretados. 

Com tanto filme bom em cartaz no circuito brasileiro, ainda mais agora que vão chegar os filmes que possuem indicações aos grandes prêmios do cinema mundial, As Duas Faces de Janeiro se torna um prato indigesto, uma apática história blasé que gera mais sonolência que o rivotril.

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