04/09/2016

Crítica do filme: 'O Silêncio do Céu'

O que é felicidade meu amor?  O novo trabalho do cineasta paulistano Marco Dutra (do interessante Quando Eu Era Vivo) é uma jornada esfíngica de um homem em busca de respostas em relação a uma situação que mudará para sempre sua vida. O roteiro beira à perfeição, consegue prender a atenção do público a cada segundo, a direção primorosa de Dutra traduz com eficiência um ritmo sinistro aos passos dos protagonistas, os atores principais dão um verdadeiro espetáculo ao público, principalmente Carolina Dieckmann que executa o seu melhor trabalho no cinema. Toda a produção parece uma orquestra entrosada, onde ritmos e harmonia andam detalhadamente simétricos, conseguindo apresentar ao público um dos melhores filmes do ano.

Baseada no livro Era el Cielo, de Sergio Bizzio, que também assina o roteiro, O Silêncio do Céu acompanha a trajetória de Mario (Leonardo Sbaraglia), um escritor/roteirista que acaba de voltar para sua esposa após alguns meses de separação. Mario é um homem repleto de medos e sempre brincou sobre essa questão com sua mulher Diana (Carolina Dieckmann). Certo dia, quando Diana chegava em casa é abordada por dois homens que a violentam. A questão é que Mario também estava chegando em casa e acaba presenciando a cena e não faz nada. Consumido pela dor e pela fraqueza de não ter feito nada para ajudar sua mulher, quase que seguindo os pensamentos do filósofo e escritor inglês Francis Bacon, que dizia: ‘A vingança é uma espécie de justiça selvagem’, Mario parte em busca de respostas para suas lacunas impostas por pensamentos dolorosos e por umas pitadas generosas de culpa, e acaba encontrando pelo caminho a coragem de executar uma vingança desenfreada e completamente inconseqüente.

Há muitos pontos a se destacar. O protagonista Mario é um grande enigma cheio de dimensões emocionais. Dominado sua vida toda pelo medo de muitas coisas, conseguiu encontrar um porto seguro ao lado de Diana, de quem percebe que não consegue esconder suas angústias de nenhuma forma. Tudo isso muda radicalmente quando acontece a situação já comentada com sua esposa e ele precisa além de enfrentar o medo, resolver o problema de uma forma que isso não influencie mais na sua rotina. O clímax do filme é um período longo e borbulhado de emoções em seu contorno. A atuação de Leonardo Sbaraglia merece elogio pois consegue passar toda a angústia e aflição de seu personagem ao espectador.

Já Diana é uma mulher que largou o Brasil para viver no Uruguai com seu marido, trabalha em um ateliê e após o estupro que sofreu vive de incertezas sobre se conta ou não conta o que houve e de uma certa falta de confiança com as pessoas, até mesmo com seu marido.  Ela é a chave de todo o mistério que se chega após descobertas de Mario sobre os criminosos de quem planeja se vingar. Em diálogos memoráveis (um deles guiados pela declamação da música Corcovado , de Tom Jobim), a dupla de protagonista navega pelo tom sentimental angustiante, com muitos olhares e diversas lacunas a serem preenchidas de um para o outro. Esse clima de suspense que acaba chegando no segundo ato em diante transforma esse filme em um dos melhores projetos nacionais dos últimos anos. Vale também o destaque para Carolina Dieckmann que consegue dar uma força em cena para sua personagem que é impressionante, principalmente quando usa do olhar para dizer alguma coisa. Bela atuação da Carol.


O Silêncio do Céu, essa co-produção Brasil/Uruguai (o filme é falado em espanhol em quase todo seu tempo) chega aos cinemas no dia 22 de setembro e promete agradar crítica e público com atuações acima da média, um roteiro quase que perfeito e uma genialidade de Dutra por trás das câmeras. Bravo!
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03/09/2016

Crítica do filme: 'Pets - A Vida Secreta dos Bichos'



Quando defendemos os nossos amigos, justificamos a nossa amizade. Dirigido pela dupla de cineastas Yarrow Cheney e Chris Renaud, Pets - A Vida Secreta dos Bichos conta de maneira divertida o cotidiano de um grupo de animais, em sua maioria caninos e felinos, e todas as situações que os adoráveis bichinhos se metem. O projeto é assinado pela produtora de animação Illumination, responsável pela lucrativa franquia Meu Malvado Favorito, que mais uma vez conseguem um show de simpatia e compor uma trama envolvente e agradável. 

Na trama, conhecemos o adorável cachorrinho Max que vive uma vida maravilhosa ao lado de sua dona. Certo dia, ela volta para casa com um outro cachorro, o gigantesco Duke, com quem a princípio, Max, tem uma terrível relação. Após uma saída para passear no parque, os dois cachorrinhos acabam se perdendo e sendo perseguidos pela carrocinha. Agora, para voltar para casa, eles precisarão enfrentar as loucuras do mundo fora do conforto de cãs, e, para isso contarão com a ajuda de seus amigos animais vizinhos que não medirão forças para encontrá-los.

No roteiro, assinado por Brian Lynch, Cinco Paul e Ken Daurio, há diversas partes hilárias e muitas vezes o filme se torna um pocket musical (como na sequência hilária das salsichas dançantes). A descaracterização do imaginário, em relação a alguns animais é uma boa sacada. Um porquinho tatuado e com piercing, um coelhinho que é o grande vilão da trama, vários elementos dentro dessa proposta se colocam como um charme a mais para a história. A trilha sonora é maravilhosa, diversas músicas instrumentais maravilhosas que dão muita dinâmica as cenas de aventura que percorrem grande parte da animação. Tudo é muito bem construído, bem longe da melancolia e explorando com eficiência a aventura.

Pets - A Vida Secreta dos Bichos, como toda boa animação, traz diversas lições para a criançada, como o valor da amizade, o entendimento mais didático da palavra confiança, o respeitar ao próximo. Essa bela animação é um grande entretenimento não só pra criançada mas também para papais de todas as idades. Não percam!
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Crítica do filme: 'O Homem que viu o Infinito'

A matemática é a única ciência exata em que nunca se sabe do que se está a falar nem se aquilo que se diz é verdadeiro. Baseado no livro The Man Who Knew Infinity: A Life of the Genius Ramanujan, de Robert Kanigel, O Homem que viu o Infinito é apenas o segundo trabalho atrás das câmeras do desconhecido cineasta Matt Brown. Reunindo elementos muito interessantes para explorar a história de um gênio da matemática que usava de sua fé como plataforma para voar, o longa metragem promete agradar crítica e público, principalmente pelas atuações dos personagens principais, interpretados pelo bom ator Dev Patel e o experiente e sempre brilhante Jeremy Irons.

Na trama, conhecemos o humilde matemático indiano Srinivasa Ramanujan (Dev Patel) que mora em um lugar bem pobre em uma Índia fragilizada e carente por ajuda. Ramanujan é matemático e seu sonho é conseguir publicar alguma de suas teorias que ele acredita que podem dar uma luz à diversos conceitos que muitos diziam impossível. Assim, contando com a ajuda de pessoas que gostam dele, consegue que uma de suas cartas chegue até o grande Professor de Matemática Pura da Universidade de Cambridge, Godfrey Harold Hardy (Jeremy Irons) que logo o chama para Universidade (ouvindo os sábios conselhos do amigo e também brilhante matemático John Edensor Littlewood, interpretado pelo ótimo Toby Jones) e juntos começam a trabalhar em diversas teorias que vão de análise progressões de números primos até teorias que futuramente ajudariam a esclarecer os mistérios dos buracos negros.

Em uma época onde brilhavam mentes como a do filósofo e matemático Bertrand Russell (que por sinal, aparece no filme, interpretado por Jeremy Northam), surge o tímido, introspectivo e lotado de fé indiano que mudaria os rumos da matemática nas décadas futuras (e até hoje!). Ramanujan, muito bem detalhado no filme, dizia que suas fórmulas matemáticas vinham de sonhos e seus grandes embates com seu tutor Hardy eram sobre isso. Esse último queria que Ramanujan provasse sempre o caminho matemático que o levou a escrever suas teorias, quase que um ou dois passos atrás nas ações do genial matemático. Mas essa cobrança era para o bem dele, o desenvolvimento não só matemático mas social/vital do protagonista é notório e surge também por conta do excelente e emocionante trabalho de Dev Patel. Nessa relação de Gênio e Tutor havia um contraste muito grandes quanto a fé e emoções, discussões calorosas e diálogos muito interessantes deixam o espectador com a sensação de angústia e aflição em muitos momentos. O passar esses sentimentos através das interpretações é uma conexão fundamental para que o público lembre desse belo trabalho durante bom tempo.

Os laços familiares ganham pequena parcela no roteiro. Talvez o elo mais fraco na história, a superfície é o máximo que se alcança nessa parte. Por mais que mostre com eficácia, uma boa parte da cultura e os conflitos vindos de uma fé exigente, a sua relação distante, apresentada pelo filme, com a esposa e a mãe que moram em Madras (Índia), onde Ramanujan nasceu, deixam a outra parte da história muito mais interessante. No seu desfecho, bastante emocionante por sinal, esses laços familiares ganham um pouco mais de força mas não deixam de ser parte coadjuvante do filme.


Ramanujan publicou mais de 30 artigos e foi empossado na prestigiada Royal Society. Suas contribuições no mundo da matemática são gigantescas e muitas de suas teorias, encontradas após seu precoce falecimento, vão levar décadas para chegarmos a entendê-las (de tão complexas). Ele dizia que todo número tinha sua importância, o 1729, por exemplo, é um belo número: é o menor inteiro formado pela soma de dois outros inteiros elevados ao cubo! Esse grande ser humano merecia um filme como esse, com inúmeras qualidades e muito emoção. Ramanujan não só viu o infinito mas conseguiu um lugarzinho no coração de todos nós que pensamos sobre as leis do universo. Bravo! 
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28/08/2016

Crítica do filme: 'Últimos Dias no Deserto'

O lado bom da vida é descobrirmos, cada dia que passa, mais sobre ela. Dirigido pelo cineasta colombiano Rodrigo García, diretor do fabuloso Albert Nobbs, Últimos Dias no Deserto conta uma passagem na vida de Jesus Cristo, quando o mesmo passa por um grande desafio em relação a sua fé. Para o papel do protagonista, o experiente e sempre ótimo Ewan McGregor que mais uma vez consegue desempenhar com louvor um excelente e difícil personagem. Com uma fotografia belíssima, uma trilha sonora delicada que compõe todos os momentos do filme, da aflição ao conflito das emoções, o longa metragem exibido no Festival de Sundance do ano passado é um achado delicado, um drama com pitadas religiosas que fará cada espectador pensar melhor sobre sua própria vida e suas esperanças que crescem e morrem durante nossa trajetória na Terra.

Na trama, baseado no Velho Testamento, acompanhamos Jesus (Ewan McGregor) viajando totalmente sozinho pelo deserto alguns dias. Em jejum, caminhando muitas vezes sem saber a direção correta para Jerusalém, Jesus encontra uma família, um menino com sonhos a realizar e um pai com uma visão descrente sobre o mundo que vive. Ao mesmo tempo, a personificação do Diabo põe totalmente em cheque seu amor pelo pai e sua incrível fé.

A câmera de García é acolhedora, se apega aos mínimos detalhes para mostrar as origens das pequenas aflições do filho de Deus durante essa jornada.  Cheio de cortes e com cenas bem secas, um quebra cabeça sobre a figura santa de Jesus é montada de maneira sublime. Seu confronto com a personificação do diabo (interpretado pelo próprio McGregor), que ocorre durante boa parte da projeção, são memoráveis. Conseguimos sentir toda a aflição que esses diálogos provocam no protagonista.

O paralelo do filme com as nossas vidas vem em forma das escolhas que tomamos, principalmente nos diálogos e nas cenas com a família que encontra no deserto. Além de também de focar quase que superficialmente, mas de maneira poética, sobre enormes sentimentos que vivenciamos a todo instante. Em muitos momentos, ótimo Tye Sheridan divide essas cenas sobre escolhas com McGregor. Mesmo sendo meio paradão, o filme consegue ter dinâmica, fala sobre salvação, escolhas, morte, vida, medo, traição, fé e amor de maneira que toca os corações mais amargurados.


Ação ao invés de palavras, senão isso, silêncio. Essa fita corajosa que se protege de qualquer crítica usando a simplicidade e falando carinhosamente sobre a fé, é um trabalho impactante, marcante. Últimos Dias no Deserto é um livro aberto sobre a reflexão que precisamos ter sobre nossas vidas principalmente quando estamos em dúvidas de nossa capacidade de acreditar em dias melhores.
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Crítica do filme: 'Funcionário do Mês'

Um dia sem rir é um dia desperdiçado. Com o selo de uma das maiores bilheterias da história do cinema italiano, o novo trabalho do diretor italiano Gennaro Nunziante, Funcionário do Mês, é o que podemos dizer de comédia simples mas que navega por temas polêmicos e possui na força de suas cenas um ponto de interação interessante com o público. Protagonizado pelo comediante Checco Zalone, um grande show de situações sem noção é criado e por mais que em alguns momentos o filme se perca totalmente consegue fazer rir com eficiência.

Na trama, conhecemos Checco (Checco Zalone), um homem de meia idade que desde que nasceu sonha em ser funcionário público. Conseguindo realizar seu sonho logo que chega na fase adulta, vive uma vida pacata e sem emoções em uma cidadezinha italiana. Quando uma reforma administrativa acontece na Itália, toda a vida manda de Checco é colocada em cheque e ele passa a ter que lutar pela manutenção de seu emprego se metendo em diversas e hilárias situações.

O grande mérito dessa comédia é desde seu primeiro minuto levantar a bandeira de que esse é um filme para rir, sem comprometimento nenhum com regras cinematográficas ou mesmo com as técnicas cênicas do cultuado cinema italiano. Esse espírito é que o roteiro carrega, prende a atenção do espectador com diálogos forçados e uma atuação totalmente caricata de seu protagonista. Obviamente o filme não agradou a classe crítica, o excesso de assuntos polêmicos (e bastante atual) camuflado de cenas toscas não convenceu a maioria. Funcionário do Mês é para ser analisado como uma tentativa de elucidar problemas sérios de uma Europa em constante crise de identidade.


Uma das partes que mais chama a atenção é a questão da burocracia, completamente escrachada por Checco e sua equipe. Entre carimbos e a vida mansa que um funcionário público pode levar (aos olhos do imaginário leigo sobre essas questões),  o roteiro utiliza o fator do riso para mostrar – a quem quiser ver – que o mundo nunca vai ser um lugar monótono e que todos nós devemos estar sempre alerta. Funcionário do Mês ainda está em cartaz em alguns cinemas mas não teve a carreira que merecia em nosso circuito. 
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Crítica do filme: 'Lazer Team'

Devemos aceitar a decepção finita, mas nunca perder a esperança infinita. Dirigido pelo desconhecido cineasta Matt Hullum, chega mais um filme sobre super heróis aos cinemas norte-americanos, apostando em um gênero que vem fazendo sucesso em diversas janelas de exibição, o sci-fi, Lazer Team acaba falhando em sua proposta e se torna apenas mais do mesmo quando pensamos em outras terríveis produções que se assemelham a essa fita. A ideia era muito boa mas o roteiro está mais perdido que o Ryan Lochte dando explicações sobre o que aconteceu em uma noite no RJ durante a última olimpíada.

Na trama, conhecemos um grupo de pessoas, alguns com problemas de interação no passado, que acabam descobrindo um objeto voador que caiu em um lugar isolado e assim passam a serem devotos de um poder que era destinado a outra pessoa. Com a descoberta desse fato por autoridades norte americanas, de controle desse tipo de assunto, o grupo precisará provar que são realmente merecedores de tais poderes.  

O longa metragem em questão beira ao trash mas acaba não assumindo essa caricatura, erro Sine qua non. Tenta ser um filme sério em alguns momentos mas se perde em sua jornada. Os artistas que compõe a produção não possuem nenhum tipo de carisma, fica a mercê de diálogos bobos e situações constrangedoras para tentar interagir com as pobres almas que param para assistir a esse show de chatice (como que vos escreve). A sinopse chama a atenção, no nosso imaginário cinéfilo sempre tem filmes do gênero que foram emblemáticos em nossa trajetória, talvez por isso um pré interesse é bastante forte em assistir a esse filme. Quando chega em seu final, um misto de perdi 102 minutos de outras possibilidades (ou outros filmes) é bem forte.


O filme é mal editado, dirigido, roteiro pífio e atuações abaixo da média. Tenta ser uma dramédia em alguns momentos e falha pela incompetência. Praticamente tudo dá errado no filme. Não entendemos os personagens, tudo é muito jogado e sem coesão. Rola em alguns sites que o filme foi baseado em fatos reais, talvez, no caso desse, com uma adição considerável de licença poética, (não é possível).  As filmagens duraram cerca de 40 dias ininterruptos e a produção teve financiamento por meio do adotado modelo de crowdfunding, conseguindo a incrível quantia de perto de 3 Milhões de dólares. Palavras à parte, esse filme é candidato ao temido e, por que não dizer glamuroso, Framboesa de Ouro. 
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Crítica do filme: 'Already Tomorrow in Hong Kong'

Selecionado para diversos festivais durante todo o ano de 2015, estreou nos Estados Unidos em fevereiro de 2016, uma curiosa trama, que um pouco se assemelha à clássica trilogia de Richard Linklater Antes do Amanhecer/Antes do Pôr-do-Sol/Antes da Meia-Noite. Already Tomorrow in Hong Kong é uma micro mais contagiante história de amor intangível. Ao longo dos curtíssimos 78 minutos de projeção, somos testemunhas de profundos diálogos que vão de uma criativa crítica ao mundo da tecnologia até as razões pelas quais amamos alguém. Jamie Chung e Bryan Greenberg, os protagonistas, dão um espetáculo de harmonia e fazem toda a magia do cinema acontecer a partir do poder que as palavras possuem na hora que você conhece alguém.

Na trama, conhecemos Josh (Bryan Greenberg), um jovem banqueiro norte-americano que mora faz uma década em Hong Kong. Certo dia, quando está do lado de fora de onde acontece a festa de sua atual namorada, acaba conhecendo a bela Ryby (Jamie Chung), com quem acaba passando as horas seguintes passeando pelas ruas de Hong Kong. Em certo momento, quando Ruby descobre que Josh tem namorada, eles se despedem. Um ano mais tarde, por uma brincadeira do destino talvez, eles voltam a se encontrar por acaso e agora precisam se entender, saber realmente se vão ser marcantes na vida de cada um.

Todo bom diretor sabe, assim como os jurados de Master Chef Brasil, que o menos é mais. A diretora e também roteirista deste singelo e profundo trabalho Emily Ting, em sua primeira direção de um longa metragem, adota essa tática de confiar 100% no roteiro e na interação dos seus personagens principais. Com diálogos inteligentes e objetivos, além de compreendemos melhor as personalidades dos protagonistas, conseguimos ficar com aquele sentimento de surpresa na espera do que realmente pode acontecer quando esss dois mundos bem diferentes se chocam. Há semelhanças com a trilogia de Linklater, mas Already Tomorrow in Hong Kong consegue ter sua própria essência, mexe com nossos corações e foca num princípio sempre sugestivo, o da escolha que precisamos fazer em momentos chaves de nossas vidas.


A única coisa de ruim que possa ter nesse texto sobre esse lindo trabalho é a quase certeza de que esse filme não chegará ao circuito brasileiro. Talvez pela falta de observação cinéfilas das distribuidoras, talvez pela falta de coragem que ainda faltam em alguns de apostar em filmes que mexem com nossos corações e não tem artistas famosos contando a história. De certo, é que se você caro leitor tiver a chance de assistir a essa película, não perca essa chance. 
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27/08/2016

Crítica do filme: 'Aquarius'

Selecionado para o famoso e prestigiado Festival de Cannes deste ano, finalmente chega o dia da estreia nacional do aguardado Aquarius, 01 de setembro. Dirigido pelo prestigiado Kleber Mendonça Filho (um dos grandes diretores de sua geração e da atualidade), o longa-metragem de 142 minutos vem causando uma grande onda de expectativa após as poucas exibições que foram feitas até agora. Não é pra menos, Kleber consegue redefinir todo um padrão/coragem quando pensamos em direção cinematográfica, ao longo dos minutos, de cena em cena, fica claro o talento e as referências cinéfilas deste grande artista atrás das câmeras. O roteiro, assinado pelo próprio diretor, explora uma recife e seus problemas, fatos e situações que nunca deixarão de ser uma angústia para a sociedade brasileira como um todo. Para brindar os cinéfilos, talvez a grande e talentosa cereja deste bolo cheio de camadas iluminadas seja a atuação magistral da gigante Sonia Braga, de longe o fato que nos faz não tirar os olhos da tela em um momento sequer.

Na trama, conhecemos a jornalista Clara (Sônia Braga), uma mulher na fase final de sua vida que vive sozinha em um antigo e bem localizado apartamento de frente para a praia chamado Aquarius. Financeiramente de bem com a vida, possui um relacionamento agradável com seus filhos, (talvez um pouco mais complicado com Ana Paula (Maeve Jinkings)), e vem passando por um verdadeiro inferno astral já que uma construtora planeja destruir o edifício onde morou quase a vida toda para construir um daqueles enormes arranha céus. Entre memórias e diversas situações que vamos sendo testemunhas ao longo da fita, vamos entendendo melhor sua personalidade, suas escolhas e uma garra peculiarmente simples e objetiva para defender suas memórias.

Um dos grandes méritos do roteiro é o preenchimento de lacunas sobre a personalidade de Clara, com os protagonistas. Entre idas e vindas, segredos, longas conversas e diversas situações, tudo em torno de Clara vai formando para o público um rascunho da protagonista. Por ser tão longo, 142 minutos, Aquarius pode sofrer críticas quanto ao prolongamento de algumas cenas, uma necessidade (completamente aceitável) de mostrar uma realidade nua e crua de uma pessoa comum que podemos encontrar em qualquer esquina. Nas cenas mais fortes, percebe-se um escopo de realmente mostrar o que acontece em nossa realidade como ser humano, o sexo, as lembranças picantes e etc.

O filme faz uma viagem, principalmente em seu início (o primeiro ato quase como um todo), por dentro do que são as memórias em nossa vida. Não só pelos pensamentos da protagonista, mas aproveitando as brechas da trama para sermos levados à memórias de outros personagens. Essa primeira parte, fica um pouco confusa, os elos (ligações) com a trama e seus porquês ficam um pouco soltos talvez distanciando um pouco o espectador por tanta informação ao mesmo tempo. Do segundo ato em diante o filme se estabiliza e se torna brilhante em alguns momentos. Principalmente, quando pensamos em Sonia Braga e tudo o que ela faz para que sua personagem fique inesquecível em nosso imaginário cinéfilo. Cenas fortes, cenas lindas, uma investigação dos sentimentos em alguns momentos, Sonia dá simplesmente um show na arte de atuar.


Com um orçamento beirando os 2 milhões e meio de reais, Aquarius tem o poder de tocar em assuntos polêmicos, explorá-los e deixar que o público tire suas próprias situações. O cinema brasileiro precisava de um filme como esse: corajoso.  Não só a imprensa nacional, mas a internacional, já detalhou e dissecou todos os méritos desta produção que fará um sucesso estrondoso de bilheteria a partir da próxima quinta-feira (01 de setembro). Polêmicas políticas à parte, que inundaram os noticiários ligados à cultura e ao cinema aqui no Brasil nas últimas semanas, vá ao cinema e tire você mesmo as suas conclusões. Esse é um filme que merece ser visto. 
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19/08/2016

Crítica do filme: 'Nós Duas Descendo a Escada'

Me ajude a lembrar quantas declarações de amor eu falei. Como nosso amor começou? E chega diretamente de Porto Alegre uma das gratas surpresas do universo cinematográfico brasileiro deste ano. Nós duas descendo a Escada, dirigido pelo cineasta Fabiano de Souza,  é um leve e bonito conto moderno que fala sobre o amor entre duas mulheres de maneira cativante. A trilha sonora do filme é belíssima, às vezes um pouco demasiada demais para algumas sequencias, porém com força o suficiente para se destacar sem incomodar na maior parte do tempo.

Na trama, conhecemos Adri (Miriã Possani), uma jovem cheia de sonhos que após um encontro inusitado, acaba conhecendo Mona (Carina Dias) uma carismática mulher por quem se apaixona perdidamente.  Assim, suas semanas nunca mais serão as mesmas, os dias mais intensos, sempre em busca de fugir da tal da solidão longe de seu grande amor. Basicamente, as idas e vindas de um amor entre duas jovens, completamente diferentes, que encontram no amor a poesia das metáforas do cotidiano.

Referências à sétima arte, ao mundo das artes, à literatura, o roteiro navega em águas categóricas para criar suas interações. Em alguns momentos parece que estamos vendo declamações de poemas e poesias, uma espécie de licença poética impactante em meio ao imaginário da trama. A personalidade, bem distanciada,  das duas protagonistas é a grande sacada para a fluidez da história que é contada de maneira cronológica e não deixa de ser objetiva.

A bicicleta como carruagem, um manual para despedidas, cartazes de filmes, um drink bate igual a três quando se está sozinho. Quem não quer um final feliz pra sua história? O longa também fala sobre a única palavra que tem tradução somente no português, a saudade. E nesse sentimento que só nós temos a tradução é onde o filme navega por águas melancólicas com subidas e descidas, que podem tocar alguns, outros não, mas que sempre conta com a força cênica e talentosa das duas atrizes que dão luz à esse belo conto de amor.




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05/08/2016

Crítica do filme: 'Born to be Blue'



Seja qual for o seu sonho, comece. Ousadia tem genialidade, poder e magia. Dirigido pelo desconhecido cineasta canadense Robert Budreau, Born to be Blue mostra de maneira forte, segura e honesta parte a trajetória do mundialmente conhecido trompetista norte americano Chet Baker. Usando várias sacadas interessantes, do roteiro à condução do argumento, Budreau consegue extrair a alma da trama que é brindada com uma atuação beirando a perfeição do experiente ator Ethan Hawke. Born to be Blue exala emoção com uma calorosa, harmônica e estonteante sonora de trompete.

Na trama, conhecemos a lendária história do genial músico de Jazz Chet Baker (Ethan Hawke), que durante todo seu auge se meteu em diversas confusões, além de seu intenso e preocupante vício em vários tipos de drogas. O roteiro foca mais forte na parte da tentativa de reestruturação de sua carreira após uma grave lesão, oriunda de uma agressão motivada por dívidas antigas. Seu encontro com uma atriz chamada Jane (Carmen Ejogo), que conheceu em um set de filmagens, praticamente redefine os anos seguintes de sua trajetória.

O James Dean do Jazz, o príncipe do cool. Nas idas e vindas do roteiro, conhecemos melhor a personalidade deste gênio do jazz. Sua rixa com o igualmente gigante da música Miles Davis, seus vícios constantes por drogas, seu jeito pacato mas que causava um grande impacto não só por suas canções românticas mas também por suas ações inconsequentes. Trilhando uma estrada cheia de músicas e agulhas, o jovem músico parece que nunca conseguiu fugir do caminho do sucesso, precisou ir até o fundo do poço, voltar e marcar de vez seu nome da história da música mundial. 

O preto e branco das filmagens, o colorido da realidade, o filme faz um jogo de cena interessante para mostrar rapidamente diversos momentos do passado do artista que durante todo tempo teve uma vida conturba pelos vícios. Seu relacionamento distante com os pais, mesmo pouco abordado no final, explicam um pouco da personalidade forte e inconsequente de Chet. As interpretações são um arraso. Carmen Ejogo traz emoção à sensualidade de sua personagem, praticamente um termômetro das emoções do protagonista, figura chave e complementar para entendermos melhor Baker. Já do protagonista, falar o que? Uma interpretação estrondosa beirando ao espetacular de Ethan Hawke, chega ao nível de emoção igual às sonoras canções pulsante de seu personagem. 

Sem previsão de estreia no Brasil, Born to be Blue é uma grande homenagem a essa figura inesquecível da história do jazz, o criador do swing da costa oeste norte americana, que tinha em suas músicas uma forma honesta de tocar, um jeito único, singular, que adoça o ouvido mais difícil de agradar.
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