27/10/2025

Crítica do filme: 'Delírio'


Selecionado para a Mostra de SP, Delírio é um filme pra lá de insólito – no sentido de estranhamento - que congela algumas tentativas de criar tensão, sem elementos convincentes de construção de uma narrativa que parece não sair do lugar. Jogando todas suas fichas nos detalhes e no silêncio – que não soa ensurdecedor-, e com poucos personagens, o longa-metragem vai sugerindo conflitos de forma lenta, deixando o público abraçado – ou não – pela paciência.

A partir do olhar sobre três gerações de mulheres da mesma família - com relações deterioradas ao longo do tempo e marcas do passado acompanhando suas trajetórias -, somos testemunhas de uma curiosa adição do sobrenatural em meio a conflitos mundanos. As sensações e os medos buscam ganhar forma e movimento, numa imersão com muitas pontas soltas. Ao sugerir mais do que explicar, o trabalho escrito e dirigido por Alexandra Latishev Salazar vira uma missão para pessoas com grande paciência.

A médica Elisa (Liliana Biamonte) precisa passar um tempo com a mãe já debilitada, Dinia (Anabelle Ulloa), e leva consigo Masha (Helena Calderón), sua filha. Após algumas noites com sensações estranhas e barulhos esquisitos pela casa, Elisa percebe que algo está estranho naquele lugar, tomando algumas atitudes para entender o que acontece e proteger a filha.

A princípio parece que há uma história interessante - o roteiro tem questões importantes para reflexões, como a falha parental, mais ligada ao afeto. Mas é impressionante como, ao tentar contá-la, tudo fica muito confuso, em uma simplicidade que até confunde. Um exemplo é quando observamos mais de perto os conflitos entre as gerações, principalmente entre Elisa e Dinia: percebemos uma mágoa profunda, algo nada detalhado expressando-se através de um discurso indireto, quase disfarçado.

Mas o ponto que mais pega é a relação da filha mais nova com um provável fantasma - uma figura representativa no âmbito familiar, marcada pela violência. Uma situação que, bem desenvolvida, poderia elevar a obra de patamar, abrindo inclusive camadas importantes que não são encontradas pela narrativa.

Em resumo, Delírio, ao abraçar a sensação, esquece-se de apresentar questões de forma mais clara e convincente, conduzindo o público para uma jornada na qual olhar o relógio é a única certeza.