O descobrir e o redescobrir. Trazendo a história de uma
forte amizade impactada por uma terrível notícia, o longa-metragem francês O Melhor Está por Vir sai correndo dos
ares melancólicos óbvios tendo como maior mérito transformar um assunto
delicado em uma jornada leve e descontraída. Convencional do início ao fim –
fato que pode incomodar o olhar cinéfilo mais atento e exigente - se torna um
passatempo divertido pelas conexões emotivas que consegue transmitir.
Na trama conhecemos Arthur (Fabrice Luchini), um professor e pesquisador que é taxado como
chato pela maioria das pessoas que conhece, menos pelo melhor amigo Cesar (Patrick Bruel). Quando Arthur fica
sabendo que Cesar está com uma doença terminal, esconde a informação e resolve
realizar todos os desejos do amigo.
Como transformar um assunto pesado em uma narrativa leve?
Com forte uso de clichês e derrapando na obviedade, a receita de bolo escolhida
por aqui foi tentar divertir ao máximo e impulsionar a carga dramática quando
necessário. Contando com carismáticos personagens – e uma harmonia em cena dos
ótimos Luchini e Bruel – os cineastas Alexandre
de La Patellière e Matthieu
Delaporte jogam na tela situações inusitadas e vão criando um clima onde a
amizade vira protagonista.
Longe de qualquer pretensão de escavar camadas mais
profundas sobre uma doença sem cura que acompanha a humanidade, o olhar aqui é
no que tempo que resta, seguindo muito na linha de outros filmes, como Antes de Partir de Rob Reiner. Pode ser que você se emocione ao final dessa jornada ou
seja capturado pelas reflexões que o filme aborda, o redescobrir a vida através
de uma amizade sempre gera algum tipo de empatia no público.
O inusitado de uma descoberta. Dirigido pelo craque Stephen Frears, O Rei Perdido é um
cativante filme que se esconde atrás de uma busca que parece absurda para
florear um recorte intimista e honesto sobre as formas de reconquistar a
felicidade. Sem deixar de nos deixar atentos para um olhar sobre relacionamentos,
passando de forma inteligente pelas surpresas do inconsciente, o filme, baseado
em fatos reais, emociona pelos caminhos dos paralelos que conversam com uma narrativa
bem definida e que prende a atenção.
Na trama conhecemos Filipa (Sally Hawkins), uma mulher infeliz no trabalho, num recente término
de relacionamento com o ex-marido John (Steve
Coogan) que certo dia embarca em uma busca inusitada pelos restos mortais
do Rei Ricardo III. Indo atrás desse enorme desafio vai descobrindo a
solidariedade e novos conflitos que surgem quando pingos de sucesso começam a
aparecer nessa jornada.
A força da premissa é simplificada com narrativa estruturada
que abre-se em camadas que vão dos conflitos emocionais até as certezas de uma
generosidade encontrando o despertar de uma vida. Partindo de uma solidão que
nunca encontra a solitude, vemos o desabrochar das novas descobertas de um
caminho, da importância das relações, através de uma personagem principal
amargurada pelo término de uma união e o desequilíbrio no lado profissional. Tudo
isso representado por artistas maravilhosos em cena.
Trazendo outros olhares para a história de um Rei visto como
maquiavélico por Shakespeare, enxergamos duelos de contrapontos que jogam para
debate as imperfeições humanas e as verdades predefinidas por achismos e
conceitos que variam na forma de um entendimento. O uso da fantasia, o fato da
protagonista encontrar a figura central da trama, é um elo interessante que
fortalece o olhar para o inconsciente, uma voz interior que equilibra um
momento de solidão.
Baseado na obra The
King's Grave: The Search for Richard III, escrito por Philippa Langley e Michael
Jones, O Rei Perdido é um ótimo achado no vasto catálogo do segundo maior
streaming disponível no Brasil.
Darwin já falava: para sobreviver é preciso se adaptar.
Seguindo uma cronologia de fatos que se aproximam dessa verdade, o
longa-metragem espanhol Apocalipse Z - O
Princípio do Fim, baseado no livro de sucesso homônimo escrito por Manel Loureiro, segue a cartilha dos
bons filmes de luta pelo sobreviver. Superando desafios para se tornar o
clássico herói em sua jornada apocalíptica, o protagonista é o nosso guia em
uma narrativa – com seus clichês batidos - que busca sugar até a última gota de
angústia em meio ao caos dos dilemas e desespero onde o espírito de
sobrevivência é ativado.
Na trama conhecemos Manel (Francisco Ortiz), um advogado e empreendedor no ramo de energia
sustentável em luto desde a morte da namorada em um trágico acidente de carro.
Vivendo seus dias solitários ao lado do seu gatinho Lúculo, certo dia se vê
numa situação inusitada: uma epidemia desconhecida se espalha pelo mundo e ele
resolve se isolar. Mas com a falta de comida, não lhe resta outra escolha a não
ser tomar um rumo que o leva para uma viagem repleta de perigos em busca de
algum abrigo.
Um pouco mais de uma década atrás, o escritor espanhol Manel Loureiro por meio de um blog
começou a escrever a história, dividida em três fases, que hoje se tornou esse
projeto cinematográfico e antes uma publicação com milhares de cópias vendidas
em todo o mundo – inclusive no Brasil. Isso provavelmente acendeu a chama da
oportunidade para que logo virasse uma produção cinematográfica se mostrando um
acerto ao já sentirmos o sucesso com a chegada rápida do filme ao Top 1 da Prime
Video.
Caminhando pelo já batido cenário apocalíptico pandêmico,
pessoas se transformando em alguma espécie de Zumbis, com suas derrapadas nos
pontos vagos dos contextos amplos que propõe, tem como maior mérito a colocação
de uma questão existencial que é bem explorada também nas linhas do roteiro do
filme: nunca sabemos como lidaremos em situações extremas até que essas
cheguem.
Primeira parte dessa trilogia – que deve ganhar seus
complementos em versões audiovisuais num futuro próximo - Apocalipse
Z - O Princípio do Fim pode ser visto por alguns ângulos mas com um ponto
incomum: a construção de um herói incomum precisando se adaptar a uma nova
rotina não se desgrudando da mira afiada de seu arpão. Em meio ao caos da
natureza incontrolável a razão humana se torna um divisor de águas, um
trampolim para a transformação do personagem.
A narrativa segue com seu clima de tensão bem instaurado,
com bons personagens carentes de melhor desenvolvimento – talvez nos próximos capítulos
- que rumam para um desfecho em aberto, com uma série de lacunas não
preenchidas. Mas uma constatação se torna crucial: prende a atenção! Apocalipse Z - O Princípio do Fim mesmo
com suas imprecisões não deixa de ser um bom entretenimento.
Um noite intensa e exigente. Baseado em um curta-metragem, o
projeto de um tiro só O Chef nos
leva do banal ao complexo em dramas que se acumulam num restaurante que tem uma
noite de altos e baixos. Dirigido por Filipe
Barantini, o projeto nos mostra o raio-x de uma descarga intensa de emoções
onde dilemas precisam serem resolvidos em frações de segundos, tendo como foco
um protagonista em total crise existencial. No papel principal, o ótimo Stephen Graham.
Na trama, filmada em plano sequência (sem cortes),
acompanhamos uma noite conturbada na vida do experiente Chef Andy (Stephen Graham). Precisando lidar com
problemas da sua equipe, e algumas questões inesperadas, como a visita de um ex-sócio
celebridade, além de momento de vícios no seu presente – fato esse que vai
destruindo a relação com a família – ao longo de uma noite, que parece não
acabar, o esgotamento se torna uma questão de tempo.
Rodado em um restaurante que existe no bairro londrino de Dalston,
O Chef é impulsionado por uma
adrenalina constante, um ritmo frenético, em torno dos embates que ocorrem em
vários pontos do local. Cada detalhe se torna um elemento importante nessa
avalanche de situações. Engraçado e trágico na mesma proporção, com inúmeros
diálogos complementares e interessantes, serve ao público uma dezenas de
questões sociais para reflexões.
Indicado para quatro prêmios BAFTA, o longa-metragem, entre
outros méritos, tem uma direção brilhante, consegue fazer com que o espectador
consiga sentir-se numa daquelas mesas elegantes do estabelecimento e assim
acompanhar uma série de ações e reações em torno de uma caótica pressão que é
uma cozinha de um restaurante premiado. Esse é um daqueles filmes que ficam nas
nossas lembranças.
Pesquisando um filme pra ver na Prime Video não poderia ter
sido mais certeiro! Escrito e dirigido por Jorge
Cuchi, Un Actor Malo joga uma
luz importante para denúncias de assédios num set de filmagens. Pelo olhar da
vítima e do agressor vamos compreendendo melhor essa história repleta de tensão
que transforma a gravação de um filme em um verdadeiro tribunal moral. Um dos
inúmeros méritos, são as atuações de Alfonso
Dosal, e principalmente Fiona Palomo,
que contemplam o público com atuações viscerais, hipnotizantes.
Na trama, durante um dia cheio de reviravoltas, conhecemos Daniel
(Alfonso Dosal) e Sandra (Fiona Palomo), dois artistas com bom
relacionamento fora das câmeras que estão rodando um filme. Numa das cenas,
Sandra acusa Daniel de má conduta, desencadeando uma série de situações. Ela
vai em busca de apoio jurídico para uma denúncia, enquanto a produção do filme
tenta contornar a situação. Ao longo dessa jornada, as consequências são mostradas
de várias formas, chegando até mesmo ao circo midiático que logo se mostra
presente.
O clima de tensão permanece constante, fato esse que leva a
narrativa para os caminhos da angústia e apreensão ao longo de toda a projeção.
O cenário claustrofóbico se complementa com os fortes sentimentos que passa a
protagonista dando mais força de impacto para a mensagem forte embutida em cada
cena de violência. Basicamente mostrando um dia e todo seus contratastes nas
emoções, somos jogados para um caldeirão de situações que refletem sobre pontos
importantes da sociedade.
Há reflexões em todos os cantos, fatos contundentes vão se
acumulando até um final impactante. Temos os pontos de vistas de advogados de
defesa e de acusação, o olhar das outras mulheres da equipe do filme que ajudam
a vítima nesse momento horripilante que passa, a produção do filme e sua preocupação
com o projeto que parece se distanciar da sensibilidade com a vítima, e as colocações
da mídia sensacionalista que se perde na apuração dos fatos levando uma
exposição ainda maior da vítima. O roteiro busca pelas ações e reações de seus
personagens, de forma dura, todos os olhares em torno de uma série de
acontecimentos violentos.
Desde sua premissa, imersa numa metalinguagem, seguindo para
um desenvolvimento de embates e dilemas essa é uma daquelas obras que
dificilmente esqueceremos, principalmente pelo seu desfecho emblemático que nos
leva a mais reflexões.
O vai e vem de revelações inesperadas. Apresentando muitas
surpresas pelo caminho, A Última Viagem,
filme irlandês escondidinho lá no catálogo da Prime Video, usa o clima fúnebre
e o flerte com a tragédia para contornar as linhas melancólicas de um roteiro
que apresenta reviravoltas importantes mudando o sentido da trama. Esse é um
filme sobre pais e filhos, relacionamentos, novas chances, recheado de
personagens carismáticos.
Na trama, conhecemos Daniel (Michiel Huisman), um advogado tributário em ascensão na carreira morando
na cidade de Nova Iorque, que está indo para a Irlanda após a morte de sua mãe.
Durante o voo um senhor de idade ao lado da sua poltrona morre e de uma forma
bem inusitada Daniel fica responsável por levar o corpo dele para ser enterrado
ao lado de um parente na Irlanda do Norte. Durante essa jornada, o protagonista
busca se reconectar com o irmão autista Louis (Samuel Bottomley) e acaba conhecendo melhor uma funcionária da
funerária, a carismática Mary (Niamh
Algar).
Dirigido pela cineasta Aoife
Crehan, essa mirabolante jornada a princípio parece ter muitas questões
soltas em subtramas que vão ganhando camadas emocionantes ao longo da projeção,
nos levando até pontos familiares que usam os dilemas de outrora para trazer
entendimento sobre atitudes do presente. Sem adotar flashbacks a narrativa
mergulha nos desabafos e memórias de um protagonista que amadureceu
forçadamente protegido pela família. Há um enorme spoiler que vira o roteiro de
ponta a cabeça (e pra não estragar, sem menções por aqui). Essa carta na manga,
que realmente surpreende, dá um novo sentido para tudo que acompanhamos.
A composição dos personagens é muito bem feita. Mesmo de
forma bem objetiva, ultrapassando um pouco a superfície, entendemos o que
precisamos para juntar as peças de um momento cheio de turbulências em diversas
áreas para todos eles. Esse fato aproxima o público. Há clichês? Há. Mas nada
que nos distancie, pelo contrário nos leva até reflexões profundas. Grata
surpresa!
O ódio que cega. Caminhando pelos capítulos na vida de um
protagonista em total desespero para acabar com uma de suas maiores dores, Beyond The Mountain costura a tensão
emocional e a tragédia em uma narrativa que coloca o espectador como testemunha
da inconsequência de um solitário protagonista. Escrito e dirigido por David R. Romay, Beyond The Mountain utiliza de forma inteligente o antagonismo do
abstrato, o ódio batendo de frente com o amor, a desilusão sendo surpreendida
por uma luz de felicidade. Elementos que rumam para o imprevisível.
Na trama, conhecemos Miguel (Benny Emanuel), um responsável jovem, abandonado pelo pai no
nascimento, que trabalha como datilógrafo em um escritório público na Cidade do
México. Sua vida é simples, vive com sua mãe – que sofre até o presente pelo
abandono do marido - em um humilde apartamento e tem o sonho de chamar Carmela
(Renée Sabina), uma cliente regular
do seu trabalho, para um encontro. Após uma tragédia, dominado por sentimentos
conflitantes nos quais se vê amplamente perdido, resolve ir atrás do pai para
dar um ponto final na história dele.
Em menos de 15 minutos somos convencidos que essa é uma
história que precisamos assistir. Com um discurso que parecia seguir uma longa
jornada para o perdão, percebemos aos poucos que o lidar com a perda proposto
acaba abrindo novas janelas de oportunidades. Esse longa-metragem mexicano é um
forte drama com suas camadas de suspense, muito também por seu ótimo
protagonista que mistura sentimentos em tela e os torna uma progressão rumo ao
trágico. A saudade logo vira raiva. Mesmo o amor aparecendo, a dor ainda é mais
forte.
Rodado em Chihuahua, no México, essa pérola escondida no
catálogo da Prime Video, se fortalece nessa tensão emocional. É frio, objetivo,
faz o espectador imaginar possibilidades de desfechos, sempre tendo as
consequências da imensurável sensação da perda sendo o maior dos seus alicerces.
Daqueles filmes que precisam serem descobertos. Dirigido por
Diego del Rio, o longa-metragem Todo o Silêncio explora com maestria a
angústia e as camadas que se juntam a partir desse sentimento, tendo como força
motora um recurso muito bem utilizado, o silêncio, fato esse que ganha inúmeras
possibilidades dentro do contemplar e refletir através das infinidades da
linguagem.
Na trama, conhecemos Miriam (Adriana Llabres), filha de pais surdos que trabalha como professora
de libras em uma escola. Ela vive uma vida feliz ao lado da namorada Lola (Ludwika Paleta) e investe tempo e
dedicação na carreira teatral. Às vésperas de interpretar uma personagem de uma
peça de Tchekhov, após uma consulta médica, descobre estar ficando totalmente
surda, fato esse que mudará para sempre sua trajetória e sonhos.
Nosso foco é a protagonista e seus dramas, próxima da surdez
desde a infância parece se camuflar entre dois mundos com o impacto da notícia
que mudará mais uma vez a forma de enxergar tudo ao seu redor. As artes e seus
complementos ganham forma poética, com uma ebulição de sentimentos chegando ao
mesmo tempo, em uma narrativa imersiva as dores e nos guiando lentamente para
uma desconstrução que flerta a todo instante com o renascer.
Entre amores e amizade, antes prestes a realizar sonhos,
somos testemunhas de uma rebobinada na vida, onde acompanhamos uma prisão da amargura
e desespero tomando conta de cada olhar para fora. Del Rio com bastante
delicadeza apresenta essa história com inúmeras pausas para nosso refletir, uma
mistura de belas imagens que personificam as raízes dos problemas chegando até
uma exposição da emoção muitas vezes difícil de encaixar na tela. Belíssimo
filme mexicano!
As novas maneiras de enxergar a vida. Vamos falar agora de
um longa-metragem italiano, que está escondido no catálogo da Prime Video, Emma e as Cores da Vida. Camuflado de
filme romântico, o intenso drama e suas muitas possibilidades de leituras logo
se tornam variáveis dentro de um contexto sobre responsabilidades, avançando no
olhar de um protagonista cheio de traumas não resolvidos no seu passado que
precisa lidar com a chegada do verdadeiro amor. Pode parecer um conto de fadas
mas há a tentativa de trazer as reflexões ao mundo real. A acessibilidade,
assunto muito importante, ganha espaço através de uma ótima personagem e sua
rotina.
Na trama, conhecemos Téo (Adriano Giannini), um publicitário, sedutor, mulherengo, que vive
sua vida amorosa sem compromissos com verdades e se relacionando com algumas
mulheres ao mesmo tempo e com a mentira fazendo parte de seu cotidiano. Quando
conhece a osteopata Emma (Valéria Golino),
uma mulher cega que logo o atrai, Téo passará por reflexões sobre a própria
vida e questões do seu passado que sempre foram lacunas sem respostas.
Dirigido por Silvio
Soldini, o projeto apresenta a desconstrução de um machista, e seus novos
olhares. Aqui pode haver um problema nas linhas interpretativas e o espectador
segue por alguma das duas estradas, ou embarcamos nas reais mudanças através de
um passado sutilmente apresentado ou ficamos presos nos achismos de uma
fantasia. Intenso, profundo, reflexivo, a obra contorna as ações e
consequências o que afasta qualquer tipo de pretensão.
A acessibilidade ganha os holofotes através de Emma e todo o
contorno de sua deficiência visual. Suas batalhas do dia a dia entram em choque
através de uma outra personagem, Nadia (Laura
Adriani) uma jovem que não aceita sua condição, além das incertezas de um
relacionamento com o complicado Téo. Há poesia para demonstrar os conflitos
emocionais mas sem esquecer as verdades mundanas. Um dos méritos de Emma e as Cores da Vida é seguir na
linha ‘pés no chão’ para tratar sobre o assunto.
Dando sentido à um flerte com a melancolia, a narrativa se
desenvolve de forma dinâmica. Valéria
Golino, em grande atuação, é um dos pontos altos do longa-metragem que
reproduz crises existenciais, algumas ligadas à falta de compromisso, que se
coloca à disposição como oportunidade de mudanças.
Sangrento, pulsante, imprevisível. Vamos falar agora sobre o
novo filme protagonizado por Liam Neeson
que entrou recentemente na prime video, Na
Terra de Santos e Pecadores. Exibido no Festival de Veneza ano passado,
nesse projeto somos apresentados a um choque entre a frieza e as desilusões
pelo olhar de um protagonista, um clássico anti-herói, em total crise
existencial que se vê envolvido em um último conflito ligando seu passado à
vida que quer abandonar. O longa-metragem é dirigido pelo norte-americano Robert Lorenz, em seu terceiro projeto
atrás das câmeras após uma carreira de sucesso como produtor de alguns filmes
de Clint Eastwood, como: Sobre Meninos e Lobos e Menina de Ouro.
Na trama, ambientada em meados da década de 70, conhecemos o
assassino de aluguel Finbar (Liam Neeson),
um homem já amargurado pelo seu passado que após a morte da esposa vem aos
poucos começando a repensar suas escolhas e os rumos para o futuro. Morando
numa vila de poucos habitantes, longe dos agitados dias de tensão política na
outra parte da Irlanda, ele enfim resolve se aposentar. Mas a chegada ao local
de um grupo associado ao IRA, liderado por Doireann (Kerry Condon) faz Finbar repensar algumas questões.
O ar fúnebre se mistura as reflexões sobre ideologia, dentro
do contexto de uma guerra política que causou caos a terceira maior ilha da
Europa. A narrativa é empolgante, com o ritmo dosado, explicando de forma
trivial paralelos interesses, como um contorno do discurso que bate de frente
com o clássico Crime e Castigo de Dostoiévski. Numa linda paisagem, o
contraste com o violência é uma marca e assim vamos aos poucos entendendo as
crises existenciais que se amontoam, toda essa parte é muito bem conduzida pelo
olhar detalhista de Lorenz que consegue extrair não só os dilemas mas preenche
as lacunas de muitos porquês.
Esse é um filme onde os personagens se mostram muito
presentes em cada espaço. E nesse campo aberto rumo ao imprevisível, já
inserido na iminência de uma guerra civil, de um lado um assassino experiente
em crise existencial, já não sabendo mais lidar com o ganha pão que escolheu,
do outro um grupo de jovens imersos nos limites emocionais de sua incursão à
revolução que escolheram, um modo de vida instável sempre à espera das
consequências dos atos que se seguem. Heróis e vilões ganham interpretações
diversas. Ajudam a contar essa história três excelentes artistas irlandeses
indicados ao Oscar: Liam Neeson, Kerry Condon e Ciarán Hinds.
Algo que o cinema faz como muitas artes, não deixar cair no
esquecimento, se junta à força de um discurso. Esse projeto, mesmo sendo uma
total ficção, é mais um capítulo na vasta história que liga o famoso grupo
paramilitar IRA, que passou por diversas modificações ideológicas desde seu
início lá em 1919, à conflitos por toda a Irlanda.
O plano perfeito não existe. Chegou recentemente ao catálogo
da Prime Video um intrigante longa-metragem que nos mostra ao longo de uma
noite, reviravoltas e surpresas em meio a um banho de sangue, numa busca da
descoberta de quem é a pessoa mais esperta daquele lugar. Escrito e dirigido
pelo roteirista vencedor do Oscar Graham
Moore, e ambientado numa época de forte predomínio das máfias nos Estados
Unidos, seguimos os passos de um intrigante personagem e sua aparente fuga da
violência mas que esconde segredos conforme vamos entendendo melhor essa
história.
Na trama, conhecemos o britânico Leonard (Mark Rylance), um experiente alfaiate
que após uma tragédia se mudou para Chicago em meados da década de 1950. Nesse
novo lugar, acabou se envolvendo, mesmo que de forma indireta, com a máfia,
inclusive um dos chefões da região é o seu principal cliente. Quando em uma
noite, uma série de acasos acontecem, o alfaiate precisará de muita habilidade
para se livrar de uma peculiar situação.
Dilemas, suspense, num cenário com atuações excelentes. O
brilhantismo do roteiro caminhando nas ações e consequências se torna um
parceiro perfeito de uma narrativa com ar sombrio, que respinga violência, onde
o inesperado é ansiosamente aguardado na próxima cena. Tendo esse plano de
fundo instaurado, personagens se revezam na entrega de peças de um mosaico
ligado a crimes, traições, ego, onde emoções entram em conflitos culminando numa
série de ações inconsequentes.
A delicadeza de uma profissão, hoje quase esquecida pelo
desenvolvimento da tecnologia, ganha uma luz intensa na composição de um
protagonista marcante. Seu intérprete, o ganhador do Oscar Mark Rylance está
fabuloso em um papel que poderia lhe render outros prêmios. Leonard e seu campo
de percepção apurado vai se revelando aos poucos o ponto de interseção de
subtramas, sempre muito bem conduzido por uma direção detalhista que busca
encontrar a pulga atrás da orelha do lado de cá da telona.
As páginas de uma tragédia. O pivô de um crime que chocou a
Argentina, culminando na pessoa mais jovem a ser condenada à prisão perpétua no
país hermano. Você já ouviu falar de Nahir Galarza? Buscando seu dinamismo
através de um vai e vem na linha temporal onde peças de um quebra-cabeça
emocional vão aparecendo aos poucos, o novo filme da Prime Video Nahir – Entre a Paixão e as Grades busca
traçar o perfil psicológico e uma cronologia de fatos que ganharam as páginas
da imprensa mundial sobre um fato que até hoje tem algumas interrogações.
Na trama, conhecemos a introspectiva Nahir (Valentina Zenere), uma jovem iniciando
a fase adulta que está em um relacionamento repleto de idas e voltas com o
jovem Fernando (Simon Hemp). Numa
madrugada, após uma discussão, ao pegar sua moto voltando pra casa é
assassinado. No dia seguinte Nahir assume o crime. Mas será essa toda a verdade
do caso?
A narrativa se joga no antes e o depois do crime e algumas
versões que se chegam no arco conclusivo. A crueldade que choca está embutida no
contraste das cores em cena, principalmente no figurino da protagonista, que
expõe a composição de uma personagem enigmática, que caminha na falta de
compaixão, a falta da culpa, um alguém definido com o desejo de ser o centro
das atenções. Valentina Zenere está
muito bem no difícil papel, buscando algo enigmático no olhar.
A visão dos pais que tem suas vidas completamente afetadas
pelo ocorrido também ganham seus contornos, principalmente quando o foco se
vira nos desenrolares no tribunal, numa audiência que ganhou a atenção de
muitos por conta de todo o circo midiático. Aqui nesse ponto, uma importante reviravolta
acontece rumando para as estradas de versões de um mesmo crime.
A cidade de Gualeguaychú, província de Entre Rios, ficou pra
sempre marcada na história policial argentina por essa história. O filme, de
forma objetiva, traz aos holofotes detalhes desse caso aterrorizante que
escancara os deslizes emocionais e deixa margens para algumas interpretações.
Tava procurando uma série que me deixasse empolgado e que se
tornaria uma brilhante jornada de reflexões. Encontrei! Ambientada no universo
de um jogo famoso criado nos anos 90, chegou na Prime Video um seriado
empolgante que busca reflexões quando a tragédia flerta com a oportunidade. Nos
longos e excelentes oito episódios dessa primeira temporada, em Fallout, somos guiados por carismáticos
personagens que embarcam em uma trajetória de absurdos que os levam ao encontro
de verdades não ditas e suas as interpretações da moral, dos valores ligados a
um princípio darwiniano. Nesse enorme tabuleiro de mentiras, a narrativa brilha
ao mostrar as inversões de perspectivas que nos ajudam a entender melhor esse
universo fascinante que merece toda nossa atenção.
Na trama, bem à frente no futuro, conhecemos a Terra
dizimada por ações nucleares. Para proteger alguns, os Estados Unidos junto à
um grupo de empresas, principalmente uma, a Vault- Tec , resolvem criar refúgios
subterrâneos. Assim, 200 anos depois do caos começar, conhecemos a jovem Lucy (Ella Purnell) que após o lugar onde
nasceu e foi criada ser atacado, e ainda com o sequestro de seu pai, resolve ir
atrás dele e desbravar a superfície, um lugar onde nunca antes havia ido. A
cada caminhada, uma nova descoberta, e assim seu destino se cruza com Maximus (Aaron Moten), um sobrevivente de um dos
ataques nucleares mais impactantes e o enigmático necrótico Cooper (Walton Goggins), esse último com um passado
com vivas memórias do início do fim.
O que é preciso fazer para sobreviver? Os protagonistas se
misturam na própria angústia, cada um no seu objetivo, em modos diferente de
viver, de se adaptar. Saindo de um universo de regras tendo a meritocracia como
pilar, com um mundo lá fora com outras, seguimos na maior parte do tempo os olhares
de Lucy e sua busca incessante que geram perguntas do tipo: Como melhorar um
mundo perdido? Essa ótima personagem passa por uma desconstrução absurda com o medo
que logo vira coragem passando pelas dificuldades do confiar.
Não podemos esquecer da jornada de Maximus e Cooper. O
primeiro, um jovem traumatizado com seu passado devastador, que é adotado por
um grupo militar e almeja dias mais tranquilos num universo onde o poder é
tomado, não dado. O segundo, um homem com ações moralmente questionáveis, detentor
de muitas memórias dos tempos onde o mundo vivia como os dias de hoje,
sobreviventes na superfície dos males da radioatividade, que viu a construção
de um império do mal e luta para tentar se encontrar novamente com sua família.
O tempo e a manipulação de tudo. A variável ‘Tempo’ aparece
como elemento principal, um catalisador de ações e inconsequências em meio a
uma terceirização da sobrevivência. Animais radioativos, clérigos em busca de
poder, necróticos que vagam como nômades se juntam à ambição e ao princípio de
querer ser Deus, esse último ponto personificado na linha de comando da empresa
Vault-Tec. Aliás, as poucas descobertas sobre as criações dessa empresa, e as
maiores explicações sobre o potencial de ganhos com o fim do mundo, é o ótimo
gancho para uma possível (e provável) segunda temporada.
Fallout já tem
toda sua primeira temporada disponível na Prime Video e já posso dizer, é a melhor
série do ano até aqui! Brilhante!
Quando o caos é tudo que existe. Dirigido pelo excelente
cineasta James Wan, conhecidos pelos
filmes de terror do seu currículo, em 2008 chegou aos cinemas um filme de ação
brutal com alta doses dramáticas que coloca em evidência uma imersão às
consequências de uma vingança. Protagonizado por Kevin Bacon, Death Sentence é
sobre o estopim de uma guerra, a destruição de uma família, e as tentativas em
vão do equilíbrio de uma equação que não deveria existir.
Na trama, conhecemos Nick (Kevin Bacon) um homem bem sucedido, com uma família feliz. Tudo
muda quando, após parar em uma loja de conveniência, seu filho é assassinado de
forma brutal. Completamente desnorteado com o ocorrido, logo seu luto vira
vingança e assim, sem medir as consequências de seus atos dá início a uma
jornada sem volta.
A justiça existe? Causando reflexões nas linhas do ‘o que
você faria?’, Death Sentence, de
forma sangrenta e sombria, apresenta uma enorme desconstrução de um personagem completamente
enfurecido, que se desprendeu dos valores morais para ir atrás da justiça que
acredita. Essa confusão no ultrapassar limites entre o que é justiça e o que se
encaixa como vingança é o campo mais amplo nesse projeto rodado em apenas dois
meses.
O drama familiar ganha contornos profundos na narrativa
quando pensamos na relação do pai com seus filhos. O preferido, ganha todos os
olhares com o mais jovem ficando de lado. Essa relação conturbada entre pai e
seu filho mais novo acaba ganhando muitos olhares. A habilidade de Wan em
traçar conflitos emocionais ligados à família ficam em segundo plano mas vão
além da superfície.
Inspirado na obra homônima, escrita pelo autor norte-americano
Brian Garfield em meados da década
de 70, Death Sentence é uma
caminhada rumo as certezas do precipício, da não tentativa de se desprender do ‘Olho
por olho, dente por dente’. Quando o caos é tudo que existe, a sentença já está
assinada.
Os novos passos de uma família. Caminhando pelo estado da
solidão forçada, nos laços em dificuldades para uma nova união, Uma História em Montana é uma bomba
relógio de emoções onde as barreiras do medo buscam encontrar o perdão. Dirigido
pela dupla Scott McGehee e David Siegel, a narrativa possui um
ritmo constante, se fortalece pela força dos diálogos, no desabrochar de almas
amarguradas com um passado preso em decepções. Haley Lu Richardson e Owen
Teague estão absolutamente fabulosos emcena, transbordando emoções para seus complexos personagens.
Na trama, conhecemos Cal (Owen Teague), um jovem estudando para ser engenheiro civil volta às pressas para o rancho da família no
Estado de Montana para ajudar no momento crítico em que se encontra seu pai, à
beira da passagem. Buscando resolver os problemas burocráticos, afetado pelas
dívidas de seu progenitor, acaba reencontrando seu irmã Erin (Haley Lu Richardson), após sete anos.
Os irmãos, que se mantiveram distantes durante todo esse tempo, precisarão
encontrar novas formas de entender um ao outro, além de resolver um impactante
trauma do passado.
O que acontece com o amar nessa família? Um pai de passado
duvidoso, à beira da morte, vira o epicentro para atualizações do hiato entre
os irmãos, que se mostram constantes, virando peças numa nova forma de enxergar
os caminhos iminentes. Como resolver o que ninguém quer falar? Será que a
situação próxima do abismo da vida fará novos pensares chegarem como forma de
resoluções? A extensa minutagem, cerca de duas horas de projeção, nos apresenta
perguntas que são respondidas entre situações que se chocam, do presente ao
passado, através de memórias vivas daquele lugar.
A fuga é o caminho mais fácil para não pensar em um conflito.
Buscando distância do enfrentar, a jornada dos personagens é algo próximo de
uma redenção para que seus próprios caminhos se tornem menos dolorosos. A
região da gelada Montana ajuda a criar o clima de reclusão das emoções, a
fotografia busca nos detalhes e imagens passar a aflição, sentimento que vai de
encontro à dor e a culpa. Uma História
em Montana é cirúrgico ao relatar as fraquezas humanas, uma necessidade de
um equilíbrio muitas vezes perdido pelo tempo.
O contraponto da genialidade e a maldição. Baseado na obra
homônima do escritor e jornalista espanhol Juan
Gómez-Jurado, o primeiro de uma trilogia, chegou recentemente no catálogo
da Prime Video um seriado empolgante, que parte da jornada de heróis brilhantes
e imperfeitos até o encontro com um caso macabro que vai se moldando através de
pistas sobre um psicopata enigmático. Rainha
Vermelha tem todos os seus conflitos chegando através dos laços entre pais
e filhos, esse sentimento forte, vívido, conflitante, muitas vezes dependente,
que se torna a base dos sete episódios, com duração perto de uma hora.
Na trama, conhecemos Antônia Scott (Vicky Luengo), uma jovem considerada uma das pessoas mais
inteligentes do mundo (com um altíssimo QI) que faz parte de uma organização
que só entra em operação em casos complexos onde a polícia não consegue
resolver. No passado, um trauma abala todas suas estruturas emocionais ficando
longe de qualquer agitação. Mas tudo isso muda com uma série de acontecimentos
horripilantes que percorrem as ruas da cidade mais famosa da Espanha. Assim,
seu destino se interliga com o de Jon (Hovik
Keuchkeriano), um carismático policial que se junta ao time com a função de
escudeiro da nomeada Rainha Vermelha. Juntos, precisarão resolver esse sinistro
caso que envolve violência e o sequestro de uma milionária.
Antônia Scott é um personagem fascinante mas só vamos
descobrir isso lá pelo meio da temporada. Então, paciência! A série esquenta
mesmo a partir do terceiro episódio. É importante toda a costura do contexto
que é feita nos primeiros episódios, de peças da organização fantasma que corre
em paralelo às forças policiais até os arcos do antagonistas, passando pelo
brilhante e carismático policial Jon, Rainha
Vermelha posiciona peças que serão importantes nesse desfecho e até mesmo
nas sequências dos outros livros que muito provavelmente virarão novas temporadas
(a segunda inclusive já está garantida).
O mundo é um enorme texto a ser decifrado. Superdotada e
refém de um experimento, Scott é uma jovem com uma mente brilhante que sempre
se viu distante de uma sociedade que prega valores por meio de muitas hipocrisias.
Isso não a deixou longe de ter uma família, criar laços. Andando em uma corda
bamba com sua observação apurada parece conseguir esconder em um lugar sombrio
seus embates absurdos com o exigente e influente pai e todo um passado ainda
ser contado. O seriado começa exatamente no seu despertar, através de um forte
trauma.
De um outro extremo, conhecemos Jon, um policial gay,
marcado por um passado repleto de situações que o deixaram de lado na força
policial. Sua forte relação com a mãe é o caminho para entendermos sua capacidade
impressionante de agregar valores positivos numa relação e seus princípios
ligados à uma análise sentimental. Um homem de uma inteligência emocional
apurada que muitas vezes estaciona nas dores de causas perdidas. Hovik Keuchkeriano, está fabuloso no
papel. Você pode lembrar dele como ‘Bogotá’ do mega sucesso mundial La Casa de Papel.
A razão e a emoção moldam as personalidades distintas desses
dois protagonistas formando um encaixe perfeito dentro de uma fórmula de ação e
suspense onde a trama nunca é deixada de lado e sempre guiado por eles. A
maneira como a história é contada (narrativa) deixa o ritmo dinâmico ampliando
o campo de visão do espectador, muitas vezes através de um raio-x do
subconsciente da protagonista e as reações espontâneas do outro.
Um ótimo vilão, e as surpresas quando nos deparamos com a
sua história, se juntam a essa trama repleta de mistérios, reviravoltas, segredos
inconfessáveis, relacionamentos abusivos, psicopatia e suas esferas. Rodado
todo na cidade de Madri, Rainha Vermelha
é o pontapé inicial de um arco maior. Há muito para se desenvolver. A segunda temporada
já está garantida e será a adaptação de Loba
Negra, segundo livro da brilhante trilogia de Juan Gómez-Jurado. Para quem se interessar, essa primeira temporada
está disponível no catálogo da Prime Video.
O olhar imaturo e as releituras das relações. Buscando um
olhar minucioso numa relação conturbada entre filha e pai dentro de um doloroso
confronto com o passado, A Filha do Rei
do Pântano busca uma constante tensão através de uma forte conexão com o
medo e as dificuldades de confiar. Dirigido pelo cineasta norte-americano Neil Burger, do ótimo O Ilusionista, um jogo de caça e
caçador é estabelecido através dos conflitos emocionais, algo que domina o tempo
de tela, se perdendo em sua narrativa que carece de ritmo.
Na trama, conhecemos Helena (Daisy Ridley), que no passado viveu isolada ao lado do pai Jacob (Ben Mendelsohn) e da mãe Beth (Caren Pistorius) sendo criada de forma
selvagem pelos ensinamentos do primeiro. Certo dia, durante a infância, após
fugir com sua mãe, é revelada a ela que o pai as mantiveram em cativeiro
durante anos. O tempo passa e Helena vive nos tempos atuais, casada, já com uma
filha, mas como se não encontrasse um lugar para viver em meio aos seus intensos
traumas que voltam com frequência. Quando seu pai consegue fugir da prisão, o
pesadelo aparece de novo na sua frente.
O que se vê no reflexo dos olhos? A narrativa se desenrola a
partir do forte elo estabelecido entre pai e filha, com a segunda sendo colocada
em um caminho de desconstrução quando cai na sua frente as verdades desse pai.
A composição da protagonista é bem feita, atormentada pelos traumas parece em
total desequilíbrio como se uma página do livro de sua vida estivesse sempre
aberta. Essa questão da relação encosta no melodrama e aqui a direção se perde,
buscando movimentos para personificar os traumas. Aliado a isso, o ritmo é
inconstante, deixando o caminho até o clímax uma viagem sonolenta pelo desequilíbrio
emocional.
Com o lema: ‘Sempre proteja a família’, e suas diversas
interpretações que vão mudando conforme conhecemos mais dos personagens, A Filha do Rei do Pântano não alcança todo
seu potencial, deixando que uma interessante construção da protagonista
afundasse em uma narrativa que não alcança o fôlego para sustentar a releitura
de uma relação.
Imagina você acordar em uma nave espacial após um longo sono
profundo e não conseguir se lembrar como e os motivos de ter ido parar ali? Seguindo
as pistas desse primeiro mistério, o longa-metragem Pandorum, lançado 15 anos atrás, mistura drama existencial com
ficção científica em uma intensa luta pela sobrevivência que reserva boas
surpresas para o espectador. Escrito por Travis
Milloy e Christian Alvart (esse também
o diretor), o projeto, filmado em uma usina abandonada na cidade de Berlim, na
Alemanha, solidifica seu caminhar nos disparos de gatilhos emocionais em uma
narrativa envolvente com um desfecho marcante.
Na trama, ambientada perto do ano 3.000, conhecemos o Cabo
Bower (Ben Foster), um homem que
acorda numa nave chamada Elysium, com grandes avarias, sem lembrar direito como
foi parar ali. Ao seu lado, o sargento Payton (Dennis Quaid) também é acordado. A dupla então começa a busca
entender o atual cenário da nave espacial em que estão, e entre alguns lapsos
de memórias, precisam descobrir uma nova maneira de reestabelecer o controle da
nave que está ocupada por seres nada amistosos. Assim, o cabo Bower parte para
as partes mais distantes da nave, já que uma solução pode ser a de chegar ao
reator principal da nave, e assim descobre muitas surpresas pelo caminho.
Sem leis, um lugar onde a moralidade não existe. Explorando
o conceito de colonização interplanetária, Pandorum
parte do suspense para navegar seus conflitos numa luta pela sobrevivência num
período onde nosso planeta está à beira do caos. Dentro desse cenário, 60.000
pessoas são recrutadas das formas mais diversas para uma viagem de muito anos,
com direito a hipersono prolongado, compondo uma nave de colonização até um
planeta chamado Tanis (esse com condições parecidas com a da Terra), encontrado
bem longe daqui. A questão é que algo dá muito errado, fruto de uma ação à uma reação
emocional na qual chamam de Pandorum.
Essa base teórica do filme é algo que percorre todo o discurso sendo visto em
cada detalhe da excelente narrativa proposta.
Programado para ser uma trilogia, pode ser que isso não
aconteça (infelizmente) já que o desempenho em bilheteria na época de seu lançamento
fora longe do esperado, o longa-metragem diz muita sobre a humanidade e as
diversas reações em situações extremas. Há muito a se refletir por aqui. Longe
de casa, vemos os pulos pelos obstáculos dentro de uma jornada do herói aos
olhos de um protagonista carismático que precisa encontrar soluções, mesmo completamente
perdido, sem entender direito o real sentido de tudo que vive.
Empolgante até seu último minuto, com direito a reviravoltas
constantes, Pandorum é um daqueles
filmes que poucos conhecem mas deveriam ir atrás. Pra quem se interessar, o
filme está disponível no catálogo da Prime Video.
A iminência do desequilíbrio. Escrito e dirigido pelo
cineasta mexicano David Zonana, em
seu segundo longa-metragem na carreira, Heroico
é um projeto que escancara as linhas tênues entre a disciplina e a punição na
visão de um jovem soldado, no limite do descontentamento, que sofre com o
treinamento e os atos sádicos e desumanos de um dos superiores. Exibido nos
Festivais de Berlim, Sundance e San Sebastian do ano passado, o filme busca um retrato
de um pesadelo, onde a violência é um elemento para uma série de tragédias.
Na trama, conhecemos Luis Nunez (Santiago Sandoval), um jovem que acabou de entrar em uma escola
militar no México em busca de uma estabilidade e também do seguro médico
militar para ajudar a mãe que luta contra uma avançada diabetes. Logo nos
primeiros dias, se depara com abusos e situações constrangedoras de seu oficial
direto Eugenio Sierra (Fernando Cuautle)
e embarca em uma jornada sem volta com conflitos que se seguem.
Como lidar com os absurdos que presencia? Contendo cenas
fortes em sua narrativa, utilizando o recurso do chocar para refletir, Heroico navega na desconstrução de um
protagonista que se vê perdido, completamente afetado pelos abalos emocionais
que sofre. A direção busca nos detalhes a crítica social contundente, algo que
se aproxima a uma lupa constante dos precipícios dos limites morais.
O universo militar ganha contornos na visão do recrutas,
suas expectativas e quanto a essa rotina. Muitos estão ali por necessidade,
pelos benefícios que essa vida pode entregar. O choque com a realidade que se
apresenta é um banho de água fria, com a hipocrisia de oficiais rolando solta. As
mãos sujas de sangue, acaba sendo apenas mais um capítulo dessa história que vira
peça chave na iminência do desequilíbrio.
Heroico é um
filme que causa impacto. Abre nosso refletir para valores morais e instituições
que deveriam ser uma saída para quem quer uma mas acabam sendo um reflexo constante
da sociedade.
As montanhas sempre ouvem e nunca respondem de volta. Explorando
duas forças emocionais conflitantes, o fugir e o ter esperança, Tempestade Infinita parte de uma
história sobre luta pela sobrevivência onde o instinto maternal e a solitude
são parte de uma engrenagem fundamental que contempla os desafios de superar
perdas. Dirigido pela dupla Malgorzata
Szumowska e Michal Englert, o
projeto é baseado em fatos reais de uma dramática história ocorrida no ano de
2010. No elenco, a duas vezes indicada ao Oscar, Naomi Watts.
Na trama, conhecemos Pam (Naomi Watts) uma enfermeira na casa dos 50 anos com um enorme
trauma no passado que vive seus dias sozinha em uma região fria e montanhosa.
Ela faz parte da Equipe de Busca e Resgate do Vale de Pemigewasset, que cobre
também o Monte Washington, em New Hampshire. Certo dia, mesmo sabendo das
condições do tempo, com uma tempestade chegando, resolve ir até as montanhas. Durante
o percurso, encontra um jovem perdido, e que parece desnorteado, fora de si. Lutando
contra o tempo, Pam precisará usar todas suas habilidades para descer rapidamente
a montanha e ajudar o jovem que encontrou.
Rodado em Kamnik, na Eslovênia, em uma co-produção que
envolveu cinco países, Tempestade
Infinita tem a perda implícita na trajetória de seus personagens mesmo que
isso seja algo que demora a ser compreendido, fato que pode distanciar o
espectador. O primeiro ponto é como sair de uma situação em condições
contrárias, nesse parte, algumas perguntas podem ajudar: Quais os motivos para
se sair daquela situação? Em quem você pensa quando embarca na esperança de
volta pra casa? Qual o trauma sofrido pela protagonista? Para essa última
pergunta, fundamental para entendermos algumas decisões, o uso de rápidos
flashbacks completam algumas lacunas.
Basta uma pessoa para mudar os rumos de nossa vida. A narrativa
adota a tempestade como um personagem importante, praticamente um elo entre os
dois personagens que se encontram em um lugar inóspito onde o tempo muda
rapidamente com a temperatura caindo abruptamente pelos menos 20 graus com a
ausência do sol. Essa forte conexão, entre os dois personagens, só é completamente
entendida no desfecho, deixando grande parte do filme estacionado em sequências
repletas de cortes secos de um plano a outro guiadas pelo espirito de
sobrevivência.
Outro ponto importante para reflexões é o instinto maternal,
uma peça que aparece com mais clareza com a exaustão batendo e lembranças
dolorosas transformando-se de peso à força. Nesse momento, entendemos o ritmo
lento de uma narrativa que estimula alguns porquês do isolamento voluntário, a necessidade
de uma solitude e as relações com as forças incontroláveis da natureza.
Disponível no catálogo da Prime Video, Tempestade Infinita é um filme que demora para acontecer mas que
reserva boas reflexões quando desabrocha, saindo de um esmorecimento para uma
profunda reflexão sobre os obstáculos que aparecem pela vida.