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16/11/2024

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Crítica do filme: 'As Crianças Perdidas'


A sobrevivência em meio as leis da selva. Reunindo uma série de detalhes sobre um dos resgates mais emocionantes de toda a história da América do Sul, o excelente documentário As Crianças Perdidas nos leva até uma região conflituosa, onde grupos paramilitares, indígenas e militares entram em embates faz muitos anos e se tornam variáveis de uma busca por crianças que sofreram uma traumática tragédia no coração da Amazônia Colombiana.

No início do ano passado, quatro irmãos pequenos embarcaram em um avião em Araracuara para ir encontrar o pai/padrasto no município de San José del Guaviare. Um acidente terrível acontece, com o meio de transporte caindo numa região de difícil acesso. Logo o governo colombiano é avisado e começa uma intensa busca pela difícil selva. Mas será que alguém sobreviveu? Ao longo de desgastantes 40 dias, as respostas vem chegando conforme pistas aparecem e com a adição necessária ao grupo de busca de voluntários representantes indígenas que melhor conhecem a região.

A narrativa chama a atenção pela forte contextualização não só da vida das vítimas mas também sobre a violência em um país de belezas mas de enormes perigosos: uma nação em eterno conflito interno, assim pode ser definida a Colômbia. O governo numa luta de muitas décadas contra a FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), também vê embates entre seus militares e tribos indígenas, tudo isso é mostrado através dos relatos de heróis que fizeram parte da expedição.

Repleto de depoimentos de testemunhas dessa busca, familiares e conhecidos das vítimas, vamos de forma impactante conhecendo melhor um contundente recorte de uma região que logo vira um pano de fundo para um final que já se conhecia. A sabedoria indígena ganha destaque, um ponto onde o sobrenatural chama a atenção, algo que ao lado da estratégia dos militares vira uma soma importante para a equação de salvamento ter êxito. Esse entendimento entre as partes envolvidas em prol do salvamento pode ter aberto caminho para curar feridas do passado. Pelo menos uma porta se abriu.

As Crianças Perdidas completa um ciclo sobre uma situação abrindo camadas para tantas outras reflexões, um trabalho impecável que liga o passado ao presente mostrando a importância das conciliações através do caos de um desaparecimento.


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04/11/2024

Crítica do filme: 'Não se mexa'


O luto, a perda, o enfrentamento da culpa, as lambadas do destino são importantes vertentes para buscarmos entender os caminhos de Não se Mexa, filme que frequentou o Top 10 da Netflix nesse final de outubro, início de novembro. O clima de tensão se apresenta para um choque nas linhas da amargura dos personagens definindo de forma objetiva um duelo entre vítima e perseguidor. Mas será isso suficiente?

Na trama acompanhamos Iris (Kelsey Asbille) uma mulher entregue ao luto permanente após a perda do filho pequeno de maneira trágica e com fortes marcas no seu casamento. Certo dia resolve ir até o local onde ocorreu o acidente e acaba tendo seu destino cruzado com o de Richard (Finn Wittrock), que logo se apresenta como um alguém disposto a despejar sua sede de sangue. Lutando pela vida após ter sido injetada com uma substância paralisante, Iris correrá contra o tempo para sobreviver.

Esse é um clássico filme de luta pela sobrevivência com a psicopatia dominando o vilanismo. Do drama ao suspense, o filme dirigido pela dupla Brian Netto e Adam Schindler, dentro do recorte sinistro definido do 'nada a perder' busca soluções narrativas para circular o enfrentamento da culpa com algumas variáveis. Pena que a construção da mãe e a ruptura nesse laço após a perda caminham pelo superficial. Sem estender a corda para um passado construtivo, ficamos reféns do presente e das inconsequências que se tornam a base dos acontecimentos.

Mesmo com o foco na vítima, a narrativa abre espaço para as complexidades do assassino perturbado. As versões de si mesmo se tornam o escape para a construção desse vilão. Esse lado psicológico ambíguo, onde a mentira e frustrações reinam, busca uma modelagem também na perda, uma certeza quando chegamos ao entendimento de parte desse contexto.

Em resumo, buscando no que foi criado como base para seus dois personagens principais, Não se Mexa não foge do que se propõe, ser um filme que gera angústias e calafrios numa batalha pela vida.


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Crítica do filme: 'Corte no Tempo'


Um superficial filme Nerd. Se soubesse que algo ruim iria acontecer, você tentaria impedir? Navegando em torno dessa pergunta, o longa-metragem Corte no Tempo, lançado recentemente na Netflix, desvia-se de qualquer profundidade para apresentar sua premissa, passando apenas na superfície – entre outros assuntos - no choque cultural indicado pela distância das épocas. Querendo abraçar muitos temas, e se abraçando na teoria de que várias linhas temporais podem existir ao mesmo tempo, se consolida como um pot-pourri genérico de tudo que é proposto.

Na trama, ambientada na fictícia cidade de Sweetley, conhecemos Lucy (Madison Bailey), uma aluna brilhante mas uma jovem amargurada. Refém do luto contínuo da família pela perda da irmã Summer (Antonia Gentry) de forma trágica décadas atrás, vítima de um Serial Killer que aterrorizou a cidade, certo dia descobre uma dispositivo tecnológico que a leva para o dia em que assassinatos aconteceram. Confusa, e sem saber em quem confiar, resolve encontrar as respostas que ninguém nunca soube.

Como deixar mais interessante um tema tão batido? Viagem no tempo é sempre um assunto que gera interesse, ou no mínimo uma alta curiosidade. Em Corte no Tempo, os dilemas adolescentes e caos familiar se amontoam em meio a um ambiente Nerd. Com menções ao clássico De Volta para o Futuro e a assumida direção para um conceito de linhas temporais, tem o mérito da coragem de entrar de forma simplória em conceitos complexos como: antimatéria, entrelaçamento quântico, buraco da minhoca, resultância dos paradoxos espaço-tempo, efeito borboleta, logo naufragando ao se desviar do discurso.

Vestindo a camisa de um dos mais amados subgêneros do terror - o Slasher -  o filme, de forma genérica, busca afiar o 'fisiquês' num contexto que alcança de forma tumultuada o – a princípio - interessante debate sobre responsabilidade moral de mudar ou não acontecimentos e os choques culturais com diferença de duas décadas. Esse aulão de ‘Introdução a física’, com muitas locações na cidade de Winnipeg, no Canadá,  é mais um filme para a galeria dos esquecíveis desse ano.


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Crítica do filme: 'O Que Tiver que Ser'


Quais as lições que aprendemos em meio ao caos? Por dentro de emoções sobre as verdades doloridas de um presente incerto, o filme O Que Tiver que Ser, abraça o labirinto angustiante da melancolia mostrando versões de um sufocar que encontram as reconexões através do mais forte dos sentimentos. Escrito, dirigido e protagonizado pela artista sueca Josephine Bornebusch, essa produção europeia, lançada sem grande divulgação pela Netflix, é um grande achado que logo chegou ao Top 3 da plataforma. Um recorte maduro sobre relacionamentos.

Na trama conhecemos o casal Stella (Josephine Bornebusch) e Gustav (Pål Sverre Hagen) que estão em um relacionamento de anos, já em ruínas. Ela uma mulher amargurada pelo rumo do seu casamento com uma notícia que esconde da família, ele um psicólogo que deixou faz tempo de ser presente como pai e marido. Juntos embarcam em uma viagem para acompanhar a filha adolescente Anna (Sigrid Johnson) numa competição de pole dance. Durante esse tempo, aprenderão mais uns sobre os outros e dilemas aparecerão, principalmente por conta do segredo que Stella esconde de todos.

Comovente e destrinchando seu discurso de forma profunda, o roteiro estabiliza no seu recorte sobre esse relacionamento em crise abrindo um leque de camadas que chegam forte na emoção. A narrativa busca complementos nas imagens e movimentos para enfatizar os fortes e conflituosos sentimentos que surgem a cada nova descoberta. Percebemos um olhar profundo para o contraste entre o controle e o descontrole, elementos frequentes nessa gangorra de situações. Os diálogos, alguns bem intensos, provocam as reflexões através do desencontro e de conflitos por todos os lados.  

Quais as lições que aprendemos em meio ao caos? Essa é uma pergunta que chega com força, principalmente para quem consegue se aproximar bastante do que é visto. Relacionamentos não são fáceis, isso é uma questão que sempre gera boas considerações. Em O Que Tiver que Ser, as respostas chegam por meio de desconstruções, do baixar a guarda para o diálogo, no cair da ficha sobre prioridades da vida. Um dos méritos da produção é ampliar esse novo renascer para os relacionamentos através de todos os personagens que compõem essa família.


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31/10/2024

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Pausa para uma série: 'Assassino Zen'


As formas de lidar com o cotidiano. Sentimentos que nós seres humanos julgamos ser conflitantes, como: a raiva, o medo, a insegurança, se tornam elementos centrais dos oito excelentes episódios de Assassino Zen, produção alemã disponível na Netflix. Com uma narrativa dinâmica, usando - sem abusar - da quebra da quarta parede, esse projeto mostra a desconstrução de um protagonista, na corda bamba da moral e da ética, sendo parte de um contexto curioso onde lições em meio ao caos vem de encontro a muitas considerações existenciais.

Na trama, conhecemos o advogado Björn Diemel (Tom Schilling) que trabalha em um grande escritório de advocacia na função de liberar bandidos para um chefão local. Infeliz no trabalho, com dificuldades em reestruturar os laços afetivos da própria família, vive seu cotidiano com a corda no pescoço. Tudo isso muda quando resolve fazer um intensivão num curso de ‘atenção plena’ com um guru que lhe entrega saídas para momentos difíceis. Assim, colocando em prática tudo que aprendeu, se envolve em uma série de situações conflitantes a partir da morte de um famoso criminoso, cliente dele.

Fazer coisas boas para pessoas ruins. Esse, que é o gatilho do personagem principal não deixa de ser um reforço da premissa de um roteiro que transborda observações sobre as Inter-relações dentro do sentido da mutualidade. Longe de buscar explicações simplórias, nos joga numa corrente de comportamentos, de pensamentos, através de um escancarado paralelo nas derrapadas da psiquê humana, num choque de interpretações entre o consciente e o inconsciente. São brilhantes as conexões que surgem, sempre tendo como foco principal o estalo na vida de seu protagonista.

Aqui acontece o caso da narrativa sendo fielmente ao proposto pelo discurso. E com uma importante contribuição, a da criatividade. Com a maioria dos episódios – com cerca de 35 minutos de duração cada um – vemos o depois e voltamos ao antes, um flashback em forma de rebobinada que cria um ritmo intenso, além de reviravoltas realmente inesperadas. A cereja do bolo é a quebra da quarta parede de forma inteligente, lúcida, e que nos ajudam a entender melhor todas as camadas de um personagem fascinante. Uma aula de atuação de Tom Schilling.

Como lidar com o tempo? Como equilibrar a atenção entre trabalho e família? Um ponto como âncora nos momentos de pânico, o controle da raiva, as ilhas de tempo, a atenção ao que geralmente não se percebe. Passando por incertezas, e certezas com novos significados, dentro de uma nova forma de enxergar o que sempre esteve na frente, as consequências ganham contornos sombrios pelas ações duvidosas que se seguem. Diemel se veste de anti-herói e conquistará a muitos de nós, jogando reflexões para o lado de cá da tela também.

Assassino Zen com tantos méritos, se consolida como uma das melhores séries de 2024. Golaço da Netflix!


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29/10/2024

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Pausa para uma série: 'Territory'


O poder e os egos inflados em meio a uma paisagem deslumbrante. Pegando carona na fórmula de bolo certeira definida pela aclamada Yellowstone, a minissérie australiana Territory é um novelão, com alguns núcleos, que busca sua força nas intrigas, traições e desencontros que são vistos ao longo dos seis episódios.

Criado pela dupla Ben Davies e Timothy Lee, se constrói a partir de uma premissa simples: Uma dinastia indo pro precipício a largos passos e os problemas de comando para uma reviravolta. Mas a solidez no seu discurso vai de encontro a uma narrativa muitas vezes desinteressante e sonolenta, com um calcanhar de aquiles alarmante: a falta de força e carisma nos personagens. É difícil uma forte conexão.

Na trama, acompanhamos os Lawsons, uma família que domina Marianne, a maior propriedade rural (estância) de gado do mundo, situada no norte da Austrália. Assim, conhecemos o chefe da família Colin (Robert Taylor), o filho mais velho Graham (Michael Dorman) e sua esposa Emily (Anna Torv), além da filha deles Susie (Philippa Northeast) e o filho distante de Graham, Marshall (Sam Corlett). Quando o filho que tomava conta dos negócios morre de forma surpreendente, a família passará por enormes atritos para manter o controle e legado de toda região.

Os núcleos compõe as peças em ebulição. É quase um tabuleiro de War com jogadas movidas também pela oportunidade e sorte. Aqui, o contexto é amplamente revisitado, deixando a narrativa numa redundância perceptível, alguns personagens parecem que não saem do lugar. Há os ladrões de gado, os poderosos de olho em Marianne, os nativos e suas reivindicações ligados fortemente ao lado cultural da região, as questões políticas e os jogos de influência.

Decisões tomadas na emoção moldam características em subtramas afastadas e que são forçadamente colocadas em confronto. Por meio de reviravoltas e algumas surpresas que são apresentadas em momentos chave, rumamos até o sexto - e último episódio - com uma série de incertezas e pontas soltas.

É muito difícil não vir logo uma comparação com Yellowstone. Família poderosa em eterno conflito interno, um chefe de clã impiedoso, empresários cheios da grana querendo uma parte das terras, questões com os nativos da região. Mas indo a fundo, algumas questões se afastam na maneira como chegamos até essas histórias.

Com um elenco encabeçado pela atriz Anna Torv – protagonista de uma das séries mais lembradas dos anos 2000, Fringe Territory peca na construção de seus personagens. Isso é uma flecha danosa em qualquer alicerce que se baseia nas relações conflituosas que se seguem.

Com suas paisagens deslumbrantes, rodado no Território do Norte e na Austrália do Sul, incluindo o Parque Nacional Kakadu, considerado Patrimônio Mundial da UNESCO, Territory usa da dinastia do gado para mostrar a ganância e o ego inflado. Se você conseguir se distanciar de Yellowstone, pode ser que ache mais méritos. Mas em resumo, é uma minissérie visualmente chamativa mas com carência no desenvolvimento de seus inúmeros personagens.  


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25/10/2024

Crítica do filme: 'Assalto Brutal'


Muito além de um crime. Baseado - em partes - numa história real, em Assalto Brutal, vemos embates a partir de um irmão próximo do abismo emocional após a ruptura de laços, um caótico evento num banco que está sendo privatizado e os fantasmas do passado de um brilhante policial que se tornam ferramentas para lidar com um caso repleto de violência. Rapidamente chegando ao Top 10 da Netflix Brasil, o projeto possui camadas muito bem amarradas pelo cineasta Michal Gazda, com um roteiro assinado por Bartosz Staszczyszyn.

Na trama, ambientada na época onde os VHS dominavam as prateleiras das milhares de locadoras pelo mundo, um misterioso assalto a banco, com vítimas, deixa Varsóvia em estado de alerta. Com uma proposta para voltar à ativa na forças da lei caso consiga desamarrar a investigação do crime, o policial Tadeusz Gadacz (Olavo Lubaszenko) fará de tudo para chegar as verdades.

A narrativa opta por explorar as consequências com as peças já encontrando rápidas definições. Sabemos quem é o responsável mas o motivo se torna um atrativo pronto pra ser alcançado pelo clímax. Por esse caminho, há uma visão fria dos relacionamentos caracterizada por cores carregadas, transmitindo sentimentos que vão dá raiva ao remorso, conversando com o passado nebuloso de mais de um personagem. O roteiro é preciso ao destacar o lado psicológico dos conturbados personagens e ganham destaques a fotografia e direção de arte.

Seguindo o rastro de violência deixado pela inconsequência através de uma premeditação assustadora de um personagem chave, essa história – também – sobre traumas mal resolvidos, se cerca com todas as peças no entorno do principal suspeito, logo chegando em desdobramentos surpreendentes. Com o passar dos dias marcando mini capítulos dentro de todo o recorte proposto, a narrativa e seu ritmo cadenciado chega com consistência nas respostas para o motivo e o como ocorreu o crime, encontrando assim algumas surpresas pelo caminho.

A partir dessa visão fria sobre a realidade e os alcances das inconsequências, chegamos em críticas sociais importantes que envolvem a política de segurança pública em uma Polônia de tempos atrás, as consequências de traumas mal resolvidos do passado, até mesmo o papel da mídia em casos de grande repercussão. Assalto Brutal cumpre seu papel de apresentar as causas e efeitos, se consolidando como um bom filme policial. 


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21/10/2024

Crítica do filme: 'Lá Fora'


Destrinchando o desespero através de uma história que envolve uma distopia repleta de zumbis que correm e um desenrolar sombrio de um casamento por um fio, Lá Fora, lançamento filipino da Netflix que logo alcançou o Top 10, é uma obra tensa, violenta, que alcança seu primor no suspense psicológico. Seguindo a frase: 'não há beleza no caos', nos aproximamos de uma história dura, um soco no estômago que explora o estado de sobrevivência. O projeto é escrito e dirigido pelo cineasta Carlos Ledesma.

Na trama conhecemos o casal Francis (Sid Lucero) e Iris (Beauty Gonzalez), que junto dos dois filhos, encontram abrigo na casa da família do primeiro após o mundo ser dominado por zumbis. Um fato importante é que essas duas almas estão com o casamento por um fio e situações de um passado recente começam a aflorar nesse presente de caos e incertezas. A partir de inconsequências a história toma um rumo imprevisível.

Com suas mais de duas horas de projeção, o filme se prolonga mas não chega a ser repetitivo, encontra algumas formas de concluir subtramas familiares que fazem parte do alicerce dos conflitos dos personagens. Com uma narrativa detalhista, onde a obsessão, os traumas, a opressão, os deslizes da psiquê, são características jogadas pelo caminho, logo nos deparamos com a verdadeira prisão que começa a se revelar. Esse último ponto, se aproxima de temas atuais como a violência doméstica.

De suspense em poucos passos encontra o terror através também dos gatilhos emocionais. Tentando elucidar os pesadelos nas memórias, o roteiro logo se mostra em paralelos a um presente real e opressor. O carro quebrado, o mundo destruído, tornam-se espelhos de um relacionamento na iminência do fim. Percebemos a todo instante um cuidado para a imagens (referências) conversarem com os conflitos emocionais dos personagens. Aqui chegamos na quebra do psicológico, por meio do descontrole, o trauma não trabalhado.

Somando-se ao exposto no parágrafo anterior, em um lugar onde parece que todos os dias são noites, percebemos o declínio do consciente, amargurado pelo choque de desequilíbrios. Indo até camadas profundas, percebemos a proximidade - quase necessidade - de uma aproximação do que acontece na realidade.  Tudo é bem conduzido pela direção primorosa de Ledesma. Esse é um dos mais interessantes filmes lançados nesse segundo semestre de 2024 na Netflix.

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21/09/2024

Crítica do filme: 'As Três Filhas'


A solidão ligada na ausência. Num pequeno apartamento numa grande cidade norte-americana conhecemos uma história que se joga com força na melancolia e num preparo para o iminente luto tendo como protagonistas três personagens em um clima constante de atenção. Escrito e dirigido pelo cineasta nova iorquino Azazel Jacobs, As Três Filhas se lança à melancolia, passando por desavenças e desabafos para criar um retrato profundo e por vezes emocionante de integrantes de uma família que tem muito a dizer uns para os outros o que transforma o que vemos numa grande sessão de terapia. É preciso paciência do público, rumando para o desfecho, o filme desabrocha deixando muitas lições.

Na trama, conhecemos três irmãs, Katie (Carrie Coon), Christina (Elizabeth Olsen) e Rachel (Natasha Lyonne), que se reúnem para estar nos momentos finais do pai, com câncer em estágio avançado, no lugar onde foram criadas. Completamente diferentes na maneira de pensar a vida e visões nesse momento complicado, entre implicâncias e sermões entram numa estrada para entenderem melhor uma a outra.

A narrativa opta pelo acompanhamento próximo dos embates, construídos a partir de um roteiro com expressões de sentimentos afundados em insatisfações e outros adormecidos que encontra a melancolia ligada num momento de ebulições emocionais. Assim, aos poucos vamos entendendo alguns porquês, sempre girando em torno da figura paterna. Com o despertar do passado surgindo, mágoas reveladas, tudo que as cerca parece ganhar novos sentidos.

Muitas vezes parece que o filme não sai do lugar comum que são os confrontos estabelecidos. Essa amargura dos personagens é sentida nas escolhas que viram reflexões, a construção disso é lenta, é preciso paciência. Esses dilemas, como: reanimar ou não o próprio pai, se tornam reflexões sociais e o projeto vai ganhando formas e movimentos interessantes. Soma-se positivamente a isso, um desfecho que surpreende, nas linhas interpretativas, mas que apresentando desfechos convincentes e com várias mensagens. Vale também o destaque para as três atrizes, atuações maravilhosas de todas elas.


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15/09/2024

Crítica do filme: 'Rebel Ridge'


Um dos melhores filmes de ação lançados na Netflix em 2024. Envolvendo o público com uma profunda trama que gira em torno da corrupção policial, Rebel Ridge não é só tiro, porrada e bomba. Escrito e dirigido pelo excelente cineasta Jeremy Saulnier, que já tinha nos brindado com o ótimo Sala Verde, o longa-metragem com intensos conflitos possui um ritmo dinâmico, insinuante, não foge do discurso e ainda recarrega camadas ao longo das mais de duas horas de projeção. No papel principal, o ótimo ator britânico Aaron Pierre que substituiu John Boyega quando o mesmo deixou o projeto no meio das filmagens.

Na trama, conhecemos Terry (Aaron Pierre), um ex-fuzileiro naval que chega até uma cidadezinha do interior dos Estados Unidos com o objetivo de pagar a fiança de um primo que está sendo transferido para uma penitenciária. Quando chega no lugar, tem o dinheiro da fiança roubado por policiais corruptos. Tendo que improvisar com novas soluções para seu objetivo após uma tragédia, sem nada a perder, acaba travando um explosivo duelo com a gangue da maior autoridade do local, o chefe de polícia Sandy Burnne (Don Johnson).

Muito bem conduzido por Saulnier e com uma trilha sonora que já apresenta um clássico do Iron Maiden na abertura, Rebel Ridge reúne uma série de pontos positivos. Aos mais atentos há até algumas semelhanças com Rambo! Nesse interessantíssimo filme de ação, repleto de críticas sobre os malabarismos maquiavélicos de alguns que chegam ao poder, sem esquecer de um olhar reflexivo sobre as segundas chances, caminhamos pela terceira Lei de Newton  - toda a ação, tem uma reação – adaptada aqui para as possibilidades do desequilíbrio emocional.

Há uma análise interessante que podemos fazer sobre o personagem principal, nossos olhos durante todo o desenrolar da narrativa. Como a maioria das personificações do herói e suas jornadas, o protagonista beira ao indestrutível, encontra o convencional mas apresenta suas fraquezas e bate de frente com as inconsequências o que engrandece sua trajetória. Nesse ponto, brilha Aaron Pierre com uma baita atuação!

Rebel Ridge e sua essência explosiva, como qualquer obra do gênero ação, se consolida como um filme que consegue fugir da bolha de mesmices de outras obras que podem soar parecidas. Carrega consigo o trunfo de atingir camadas importantes ligadas à emoção e construção dos personagens que vão muito além da superfície. Grande acerto da Netflix!

 

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03/09/2024

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Pausa para uma série: 'Bastidores do Pop: O Esquema das Boy Bands'


Backstreet Boys, N’Sync
... Você já ouviu falar dessas bandas né? Quem viveu intensamente os anos 90 deve se lembrar do boom que foi na indústria fonográfica a chegada das boy bands nas paradas de sucesso. Entretanto, o que pouca gente sabia era o que acontecia atrás das cortinas. Através dos malabarismos duvidosos de um polêmico empresário que conseguiu uma rápida subida na sua posição, muitas verdades foram expostas aos poucos e aqui explicadas com alguns detalhes numa nova série no maior dos streamings.

Tendo como elemento central Lou Pearlman, considerado por muitos o guru das boybands, Bastidores do Pop: O Esquema das Boy Bands, minissérie documental de três episódios disponível na Netflix, nos leva até os bastidores de um ramo do Pop music, do anonimato ao estrelato, expondo questões por trás do sucesso que ganha aos poucos o alcance mundial e tendo como passagem as descobertas de fenômenos como Backstreet Boys e N’Sync e outras bandas com relevância dentro do mesmo segmento.

De uma empresa de dirigíveis até as descobertas que mudariam a cultura pop de uma geração, vamos entendendo um pouco a mente de um empresário que se escondia no glamour, fazendo os outros de fantoche, uma reta sem paradas rumo ao egoísmo e egocentrismo. Utilizando uma técnica de dublagem para seu protagonista, através de contextos da obra onde a minissérie se baseia em grande parte, ‘Bands, Brands and Billions: My Top Ten Rules for Success in Any Business’, o projeto nos leva das descobertas até investigações colocando em dúvida a ética por trás de um rentável negócio.

Mesmo carecendo de detalhes sobre algumas questões, ao longo dos três episódios que compõe a obra, o foco parece ser jogar um monte de pulguinhas atrás da orelha sobre determinadas situações, além de mostrar ao público verdades da indústria fonográfica dos anos 90. Por meio de depoimentos de alguns dos astros das bandas descobertas, amigos, jornalistas e envolvidos nas investigações Bastidores do Pop: O Esquema das Boy Bands busca traçar um raio-x de um homem e suas polêmicas raspando nos contextos de uma época marcante na cultura pop mundial.


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Pausa para uma série: 'Depois do Acidente'


Quando a dor vira obsessão. Vou te contar agora de um seriado que chegou ao Top 1 da Netflix rapidamente e nos mostra as consequências de um acidente inusitado, com um pula pula, fato esse que escancara as verdades de muitos envolvidos. Dividido em 10 episódios, Depois do Acidente, seriado mexicano disponível na Netflix possui um discurso que segue para seus desenrolares entre o ódio e a culpa jogando num tabuleiro de traições, ganância, poder e inconsequências personagens com o emocional em desequilíbrio onde o certo e o errado se tornam pontos com várias interpretações.

Na trama, conhecemos algumas famílias de classe alta que se reúnem para o aniversário do filho de um deles. A principal delas, é formado por Dani (Ana Claudia Talancón) e Emiliano (Sebastián Martínez), uma policial e um empresário/advogado prestes a ficar milionário por conta de um investimento valoroso. Durante o evento, um terrível acidente com um pula pula mal instalado acaba deixando mortos e feridos. Após o ocorrido, o personagens embarcam em busca dos culpados o que desencadeia uma série de consequências com outras subtramas que correm em paralelo.

Escrita pelo jornalista venezuelano Leonardo Padrón, autor de algumas novelas de sucesso, Depois do Acidente joga na tela hipocrisias sociais ao mesmo tempo que caminha pelo luto e as camadas da imoralidade. Sem muitos ganchos entre um capítulo e outro, parte da agonia de seus muitos personagens apresentando uma trama ampla com muitas variáveis que algumas vezes se embola. É aquela questão de querer apresentar muitos fatos e suas profundidades mas alguns ficam apenas na superfície, o que acaba esbarra em personagens engolidos por outros.

Entre bons e medianos episódios, nessa primeira temporada vemos, com um ar novelesco, subtramas dominando o contexto principal, fato esse que se torna uma ponte importante para conhecermos melhor alguns intrigantes personagens e seu caráter duvidoso. De um lado a turma do ódio, guiados totalmente e muitas vezes de forma inconsequente por esse sentimento que não e desgruda. Do outro, a turma da culpa, representados na maior parte do tempo pelo personagem principal Emiliano (Sebastián Martínez). Não deixa de ser uma fórmula de bolo que acaba dando certo.

Depois do Acidente é um drama com pitadas de suspense mas sem muitos mistérios, aposta suas fichas no jogo de interesses entre os envolvidos para prender a atenção do público. Aponta seus holofotes um monte de situações enroladas que vão desde os deslizes da imprensa atrás do sensacionalismo, a maldade personificada por um clássico vilão, até as derrapadas do caráter e da honra aliada a uma ganância viciosa.  


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30/08/2024

Crítica do filme: 'Príncipes Perigosos'


Os longas-metragens mexicanos vem ganhando a atenção dos cinéfilos a partir da chegada dos streamings com toda força nos nossos lares, títulos que nem imaginávamos chegar por aqui agora estão constantemente disponíveis. Esse é o caso do forte e pretencioso Príncipes Perigosos, novo filme disponível na Netflix. Longe de ser um filme fácil, há algumas camadas, seu discurso se mantém numa busca constante por destrinchar um cenário distante de muitos que gira em torno de uma certa investigação sobre a psiquê humana aliada a um confuso conflito de classes. O projeto dirigido por Humberto Hinojosa Ozcariz nada de braçada, junto a uma narrativa nada atrativa, para imposições de pontos de vistas deixando distante as reflexões que aparecem sem destaque. 

A trama gira em torno de quatro jovens que tem a riqueza sempre rondando suas vidas. Envoltos em uma bolha onde tudo é possível e constantemente mimados, quando não tem absolutamente nada pra fazer se jogam em ações perigosas e violentas onde o dinheiro acaba sendo uma variável importante (por incrível que pareça!). Assim, entre sequestros armados, brincadeiras sem noção, traições, e passando por cima de quem aparece, a tal da consequência aparece através de outros olhares atingidos. 

O chocar ganhar força, se torna uma peça de impulso superlativa. Violento, sangrento, com cenas que beiram ao impactante, o roteiro busca soluções para não ficar refém de fragmentos de histórias que envolvem jovens em uma bolha privilegiada. Mas aí que mora o calcanhar de aquiles mais evidente, quando pensamos num contexto mais amplo, entre esquemas bem distantes de dilemas. A trama se perde num jogo desleal ditado por quem tem mais poder de manipulação e acesso a recursos, se tornando inclusive redundante em muitos momentos. 

A corrupção e a impunidade, pares complementares da falta de caráter ,são alguns dos elementos na montagem de peças emocionais que se juntam a própria condição social que os protagonistas estão imersos. A trama fica em segundo plano, o foco são os personagens que se desenvolvem rumo as instabilidades emocionais. Mas será isso o suficiente pra prender a nossa atenção? Com ações de uns e consequências para outros, que se perde pela obviedade, a narrativa se desenvolve em campos sombrios buscando mostrar uma andança desgovernada pela corda bamba entre a ganância e a não resposta pelos próprios atos.



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13/07/2024

Crítica do filme: 'Goyo'


O caos do mundo lá fora. Abordando de forma madura e inteligente o universo das emoções, Goyo, recém lançado na Netflix, é um caminhar de personagens pelo aprender para entender. Escrito e dirigido pelo cineasta argentino Marcos Carnevale, imerso numa narrativa que contempla a arte e suas relações com as sensações, acompanhamos algumas fases do maior dos sentimentos sob dois pontos de vistas. Esse projeto busca abrir espaços de reflexões também para as formas como lidar com a rejeição através de dilemas que percorrem os caminhos dos ótimos personagens.

Na trama conhecemos Goyo (Nicolás Furtado), um homem inteligente que já tem um doutorado e trabalha como guia num museu de artes em Buenos Aires. Condicionado com Síndrome de Asperger, um estado do espectro autista, vive com sua irmã pianista Saula (Soledad Villamil), uma mulher superprotetora, em um belíssimo apartamento. Ele também é muito próximo de seu outro meio irmão Matute (Pablo Rago), um empreendedor de sucesso, dono de restaurante. Com a chegada de Eva (Nancy Dupláa), a nova segurança do Museu, uma mulher mais velha, com um relacionamento destrutivo com o marido frustrado, Goyo encontrará depois de muito tempo o amor mas também tudo que esse sentimento provoca.

Pés no chão, explorando dilemas, fugindo de qualquer melancolia rasa, explorando os altos e baixos pelo olhar de um protagonista com Síndrome de Asperger e uma outra personagem num momento de total instabilidade familiar, essa obra busca construir caminhos para conexões que surgem sem deixar de abrir um leque de considerações maduras. A narrativa opta por personificar o abstrato dos sentimentos em imagens e paralelos, um transporte das aflições, da dor, até mesmo do sentimento de prazer, um caminho cheio de interpretações onde o contexto se torna importante.  

O olhar para a maternidade ganha alguns focos mesmo que pelas entrelinhas. A estrutura familiar que cerca o protagonista, com os meio irmãos presentes durante toda sua vida fazendo o papel de um pai falecido num acidente e uma madrasta que nunca aprendeu a atender, escolhendo o caminho mais distante na relação com o filho. Aliás, essa última, Magda (interpretada pela fabulosa Cecilia Roth), e sua história com o Goyo acaba sendo a representante em cena que mais se aproxima da mesa de reflexões que o discurso propõe. De forma menos profunda, Eva e as questões que envolvem seus filhos e o marido descontrolado também estão inseridos nesse contexto.

O lidar com a rejeição, outro ponto importante por aqui, chega aos personagens de várias formas, é uma questão que está muito presente nas linhas do roteiro. Mas mesmo escancarado ou escondido em todas suas formas de expressá-lo, o amor, essa variável incontrolável, que nos leva do céu ao inferno, acaba sendo o combustível, algo que alimenta as ações, dos 106 minutos de projeção. Goyo, é uma daquelas obras cirúrgicas que apresenta verdades sobre o caos do mundo lá fora mas sem deixar de tocar nossos corações.



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28/06/2024

Crítica do filme: 'Última Chamada para Istambul'


A vida como ela é. E não é que a Netflix nos surpreendeu com um filme nada badalado mas que pode conquistar corações?! Apostando numa narrativa que busca na leveza refletir sobre assuntos importantes sem deixar de avançar na profundidade, se afastando de qualquer razão convencional, Última Chamada para Istambul tem um discurso que logo acerta seu alvo. Com o auxílio das surpresas e as várias visões de uma história, abrindo camadas inesperadas que chegam na intensidade de assuntos que giram em torno de um relacionamento desgastado pelo tempo, o projeto aposta no arriscado mundo dos sentimentos e suas desilusões.

Na trama, conhecemos Mehmet (Kivanç Tatlitug) e Serin (Beren Saat), duas pessoas bem diferentes que se encontram no aeroporto de Nova Iorque e resolvem passar as próximas horas juntos após um imprevisto com a mala de um deles. Ambos casados, resolvem viver como se não houvesse amanhã. Só que uma verdade logo aparece, nos levando para novos olhares para essa mesma história.

O gostos, os desejos, se tornam elementos prontos para embates que se sustentam nos paralelos com a realidades de muitos casais. E não pensem que é fácil em se chegar a algo assim. Conforme vamos acompanhando as leis da atração entrarem em cena, é muito fácil se identificar com as dúvidas e aflições dos personagens. Kivanç Tatlitug e Beren Saat, em total harmonia, passam para o espectador um mix de emoções que vamos entendendo melhor quando as verdades são reveladas. Somos testemunhas de dois carismáticos personagens que nos fisgam exatamente pelo túnel da inconsequência em que estão sempre flertando.

A cereja do bolo chega por um plot twist convincente, algo que a narrativa amarra de forma brilhante, é um verdadeiro impacto a guinada que o roteiro se propõe. Passando pela melancolia, a culpa, o desistir, as frustrações se tornam novas variáveis em uma espécie de jogo de amor que encontra seu rumo através de um olhar para o passado. Tendo uma Nova Iorque dos tempos atuais como cenário, quase como um personagem estático, esse lugar de sonhos e aventuras se mostra como um achado para quem quer a autodescoberta, algo que se soma às reflexões propostas.

Dirigido por Gonenc Uyanik e escrito por Nuran Evren Sit, Última Chamada para Istambul está escondidinho no catálogo da Netflix e merece ser encontrado!


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01/06/2024

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Pausa para uma série: 'Eric'


É possível mudar o mundo antes de si mesmo? Chegou na Netflix uma interessante minissérie de apenas seis episódios que caminha pela esperança desencontrada abrindo um leque de profundas reflexões a partir de uma busca de um refúgio para intensas aflições. Eric, apresenta pelo olhar indefeso do mundo, um casamento em ruínas, a política, a corrupção, a polícia, o preconceito, os abandonos de relações entre pais e filhos. Criado pela dramaturga britânica Abi Morgan, e com todos os episódios dirigidos pela cineasta Lucy Forbes, tem como maior trunfo as lições que transmite através da personificação dos sentimentos centralizados na figura de um boneco criado por um desenho que atrás de seu ar monstrengo nos leva até medos, inseguranças.

Na trama, ambientada numa Nova Iorque em meados da década de 80, conhecemos o jovem Edgar (Ivan Morris Howe), um garoto que sofre com o ponto em que se chegou o casamento dos pais, a professora Cassie (Gaby Hoffmann) e o criador de um programa de bonecos bem famoso, Vincent (Benedict Cumberbatch). Um dia, Edgar some. Acionando logo a polícia, o caso cai na responsabilidade de Michael (McKinley Belcher III), um policial gay que sofre com diversos preconceitos e que fará de tudo para resolver o mistério desse sumiço.

Não é porque você não enxerga que não existe. O roteiro, longe de ser rasteiro, navega por histórias que se cruzam através de uma decisão. As subtramas são todas muito bem desenvolvidas e ganham seus convincentes desfechos. Um casamento em ruínas, com vícios e traições é exposto, as relações entre influentes da cidade e a polícia também. Os segredos, o descaso, a fuga da culpa vão expondo os lados de um poder que não se vê mas sabemos que existe. Um homem da lei e seu silêncio sobre a vida pessoal com uma iminente perda é uma subtrama profunda que parece andar em paralelo à investigação do sumiço do jovem. Em algum ponto nos perguntamos: onde está a esperança para algumas dores do mundo? Enxergamos críticas sociais contundentes por todos os lados.

O protagonista parece ser mesmo Vincent e sua jornada pelas dores emocionais, nunca tratadas, até mesmo prolongadas, que no fim do seu túnel nunca enxerga a luz de reconexões. Totalmente desequilibrado, com muitos vícios, e os traumas na relação com o pai, levaram esse ator bonequeiro a um reflexo do que viveu na relação fria com o próprio filho. Mas como o espectador entende tudo isso? Aí que vem a grande sacada, um boneco que aparenta o deixar com medo mas que na verdade é um espelho das emoções que misturam a loucura, a culpa, o medo.

Nesse forte drama, entre desconfianças para todos os lados, as indefesas do mundo são quase um personagem. É também sobre pais e filhos, sobre as consequências das relações tóxicas mas também sobre reconexões. Assim, seguimos nos perguntamos até o minuto final: É possível mudar o mundo antes de si mesmo?


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30/05/2024

Crítica do filme: 'Biônicos'


Por si, pelos outros, até o fim. O novo longa-metragem brasileiro produzido pela Netflix, Biônicos, nos leva até uma distopia, mais precisamente ambientada no ano de 2035 onde próteses biônicas revolucionam os esportes. Tendo o poderoso trunfo dessa premissa instigante, que bate na tecla de muitas questões, inclusive de que a auto mutilação é o novo doping, o ótimo cineasta Afonso Poyart nos leva até uma narrativa que embarca no arriscar, onde se cruzam uma rivalidade entre irmãs e um curioso olhar para a tecnologia que influencia os esportes de alto rendimento.

Na trama, conhecemos Maria (Jéssica Cores), uma atleta do salto em distância, filha de uma famosa esportista, que vê suas chances de sucesso no esporte serem afetadas drasticamente com a chegada de próteses tecnológicas que transformam a vida de outro atletas. Ao mesmo tempo, sua irmã Gabi (Gabz), amputada desde a infância por conta de um tumor, chega ao estrelato da mesma modalidade se tornando uma referência dessa nova realidade do esporte que pratica. Sua vida começa a dar novos passos quando conhece o misterioso Heitor (Bruno Gagliasso) o líder de um grupo revolucionário de apoio a atletas comuns que tem um plano mirabolante. Assim, nos dilemas entre o certo e o errado, Maria embarca em uma jornada que mudará seu destino e o de muitos ao seu redor.

Uma distopia futurística. Poucas vezes você viu no cinema brasileiro. Esse é o maior dos méritos dessa nova produção da Netflix. Estiloso visualmente, tendo a cidade de São Paulo com ares futurísticos, Biônicos estaciona sua criatividade narrativa no drama comum sobre relacionamentos entre irmãos. Com uma protagonista também narradora, passamos pelo  preço para se chegar ao sucesso, o arriscar, o relacionamento familiar conturbado, esses pontos ganham boas reflexões.

Pena que o roteiro tem alguns deslizes, se torna didático demais batendo de frente no desenvolvimento dos personagens, além de cair na previsibilidade dos clichês, mas nada que atrapalhe muito o contundente discurso. A jornada da heroína é cumprida passando pelas ações e consequências, e ao mostrar esse segundo ponto a produção ganha contornos que se aproximam da realidade, algo que podemos traçar paralelos com o mundo atual.

Poyart é um ótimo diretor e isso fica óbvio ao assistirmos ao filme. O cineasta santista, que já dirigiu Anthony Hopkins em Presságios de um Crime, além do espetacular longa-metragem Dois Coelhos, une conceitos como inovações para desenvolvimento do córtex motor, chip de última geração em uma prótese, referências criativas adaptadas para um futuro incerto, transformando sua narrativa em algo único e ganhando muito no conceito visual. É louvável a ideia de realizar uma produção de ficção científica em nosso país, nosso cinema estava precisando desses novos olhares.


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Crítica do filme: 'Long Shot'


A perspectiva do ‘E Se?’. Não é costume de boa parte do público parar e assistir a um projeto audiovisual que não seja um longa-metragem. Se você é um desses, acho que depois de conferir esse filme, seu pensamento pode mudar. Em agosto de 2003 um pai de família, em um relacionamento saudável com sua companheira, é abruptamente cercado por agentes da polícia de Los Angeles e logo acusado de um crime que não cometeu. Somado a esse caótico absurdo, uma variável quase inacreditável se torna a única esperança de Juan Catalan, um homem inocente: a filmagem de um seriado de sucesso da HBO. Long Shot, média-metragem premiado em alguns festivais, é uma viagem para o campo das reflexões sociais e o papel do destino na trajetória de uma vida.  

Em 2003, a polícia de Los Angeles investiga o violento assassinato de uma jovem na porta de casa. Por meio de um retrato falado, chega ao nome de um suspeito. Assim começa essa história dirigida por Jacob La Mendola que mais parece um roteiro feito por Hollywood. Você vai entender o porquê. Por meio de uma prisão injusta baseada em interrogatórios com mentiras deslavadas e muitos achismos das forças policiais, a única chance de Juan Catalan chega através de um obstinado advogado de defesa, um jogo do Los Angeles Dodgers e da produção do sétimo episódio da quarta temporada de um dos grandes sucessos da HBO, Curb Your Enthusiasm, série estrelada por Larry David. A narrativa tendo esses elementos para contar, transforma esse projeto em algo onde não conseguimos desgrudar nossos olhos dos acontecimentos que se seguem.

Percorrendo por partes importantes da investigação policial, principalmente como conseguiram chegar até um nome como principal suspeito, o projeto nos leva para os contextos de uma operação que coloca em xeque os métodos de interrogatórios, os modos de operação, na busca por resolução de fatos. Um problemática que abre margens para reflexões sobre preconceitos e as absurdas falhas que podem levar pessoas inocentes até mesmo à pena de morte. Contra uma promotora dura, implacável, que nunca tinha perdido um caso na carreira, um jovem advogado persistente em provar a inocência de seu cliente se torna um grande herói de uma história da vida real que tinha tudo pra dar errado.

O drama que se segue encosta na agonia sentida por Juan e sua família. E se, ele não tivesse ido a um jogo do time do coração? E se, seu advogado não acreditasse nele e não se dedicasse ao caso? E se, as filmagens de uma famosa produção audiovisual em um estádio para dezenas de milhares de pessoas não tivessem ocorridas exatamente no lugar onde estava marcado seu lugar? Pegue 40 minutos do seu precioso tempo e vá correndo assistir. Não vai se arrepender.


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29/05/2024

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Pausa para uma série: 'Ashley Madison: Sexo, Mentiras e Escândalo'


Umas das minisséries documentais mais chocantes e com reviravoltas acaba de estrear na Netflix. Vamos falar agora sobre Ashley Madison: Sexo, Mentiras e Escândalo. Um pioneirismo na internet, no início dos anos 2000, no boom dos namoros Online, um site para casos extraconjugais é lançado gerando enormes polêmicas. A pessoa se cadastrava e era prometido sigilo e descrição. Certo dia, um ataque hacker aos servidores do site leva até o maior caso de divulgação de dados da história, modificando vidas para sempre.

Com depoimentos de ex-funcionários e usuários que tiveram suas vidas completamente afetadas pelas consequências dessa situação, essa série documental de três episódios disponível na Netflix joga ao espectador questões sobre a moral e os lados escondidos de relacionamentos. Percorrendo histórias de alguns lugares entre os EUA e o Canadá vamos entendendo os dramas a quatro paredes, que passam pela vergonha e constrangimento.

Batendo na tecla da pergunta: Qual o preço de se viver numa mentira? Vamos entendendo as motivações de todos os lados. O prazer, os segredos, entre outros, se tornam elementos de uma narrativa que busca nas surpresas seu dinamismo. A mente humana e suas complicadas certezas ampliam o contexto de reflexão chegando até as críticas sociais, essas na linha tênue da moral aqui personificado na figura de uma empresa que ganha com a traição dos outros.

Nesse ponto da minissérie, quando se traça um raio-x da empresa Ashley Madison e também de sua figura mais marcante, um CEO arrojado que teve e-mails polêmicos divulgados, chegamos até os deslizes do bom senso. Seria tudo um golpe de marketing? Essa pergunta logo se desfaz quando entendemos a investigação por trás dos vazamentos. E em relação a isso, até hoje algumas dúvidas no ar.

Ashley Madison – Sexo, Mentiras e Escândalo é um exercício sobre o pensar a sociedade e o consumismo, além de mostrar na cara dura as hipocrisias de pessoas que juram sempre se comportar.

 

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28/05/2024

Crítica do filme: 'Bayoneta'


Quando o trauma paralisa. Sendo duro e cru na maneira como demonstra um estado de arranhados conflitos emocionais que se somam com o tempo, aos olhos de um protagonista, que nada de braçadas na solidão, já no ponto de um despertar, essa co-produção México/Finlândia, Bayoneta caminha pelo recomeçar. Dirigido pelo cineasta queniano Kyzza Terrazas, através de uma composição quase sensorial de um personagem perdido em um impactante trauma, esse projeto nos apresenta os dramas de uma vida e o desabar de uma carreira. Destaque para a excelente atuação do ator Luis Gerardo Méndez.

Na trama, conhecemos o boxeador e medalhista olímpico mexicano Miguel 'Bayoneta' (Luis Gerardo Méndez) que após um trágico final de sua última luta, quando era visto como uma estrela em ascensão no esporte que escolheu, resolve se mudar para a Finlândia se distanciando de amigos e família. Nesse lugar, busca se reestabelecer emocionalmente quando uma nova oportunidade chega até ele.

Se distanciando de outros filmes sobre esportes, nesse projeto, rodado na cidade de Turku, na Finlândia, nos encontramos com o drama de um homem que após anos de dedicação para ser o melhor no que faz entra em choque com as desilusões, fato esse que o deixa em estado de total confusão, como se deixasse nas mãos do destino alguma indicação de novos caminhos. O lado psicológico do personagem é muito bem explorado, com seus altos e baixos constantes e a aflição de não conseguir se desprender do grande trauma de sua vida. O roteiro busca o dinamismo nessas mudanças abruptas do personagem, não conseguindo alcançar um clímax mas sendo linear no seu discurso.

Na busca de encontrar novos sentidos para sua ligação com seu ofício, num país completamente diferente do seu, embarca em busca do congelamento das próprias emoções mas a vida não percorre pelos passos simplistas, como demonstra muitas vezes a realidade. Nesse ponto a narrativa ganha destaque, aliada a uma direção competente, transforma a emoção em imagens e movimentos que impactam como se fosse um espelho do complicado abstrato dos sentimentos.


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