18/03/2024

Crítica do filme: 'Tempestade Infinita'


As montanhas sempre ouvem e nunca respondem de volta. Explorando duas forças emocionais conflitantes, o fugir e o ter esperança, Tempestade Infinita parte de uma história sobre luta pela sobrevivência onde o instinto maternal e a solitude são parte de uma engrenagem fundamental que contempla os desafios de superar perdas. Dirigido pela dupla Malgorzata Szumowska e Michal Englert, o projeto é baseado em fatos reais de uma dramática história ocorrida no ano de 2010. No elenco, a duas vezes indicada ao Oscar, Naomi Watts.

Na trama, conhecemos Pam (Naomi Watts) uma enfermeira na casa dos 50 anos com um enorme trauma no passado que vive seus dias sozinha em uma região fria e montanhosa. Ela faz parte da Equipe de Busca e Resgate do Vale de Pemigewasset, que cobre também o Monte Washington, em New Hampshire. Certo dia, mesmo sabendo das condições do tempo, com uma tempestade chegando, resolve ir até as montanhas. Durante o percurso, encontra um jovem perdido, e que parece desnorteado, fora de si. Lutando contra o tempo, Pam precisará usar todas suas habilidades para descer rapidamente a montanha e ajudar o jovem que encontrou.

Rodado em Kamnik, na Eslovênia, em uma co-produção que envolveu cinco países, Tempestade Infinita tem a perda implícita na trajetória de seus personagens mesmo que isso seja algo que demora a ser compreendido, fato que pode distanciar o espectador. O primeiro ponto é como sair de uma situação em condições contrárias, nesse parte, algumas perguntas podem ajudar: Quais os motivos para se sair daquela situação? Em quem você pensa quando embarca na esperança de volta pra casa? Qual o trauma sofrido pela protagonista? Para essa última pergunta, fundamental para entendermos algumas decisões, o uso de rápidos flashbacks completam algumas lacunas.

Basta uma pessoa para mudar os rumos de nossa vida. A narrativa adota a tempestade como um personagem importante, praticamente um elo entre os dois personagens que se encontram em um lugar inóspito onde o tempo muda rapidamente com a temperatura caindo abruptamente pelos menos 20 graus com a ausência do sol. Essa forte conexão, entre os dois personagens, só é completamente entendida no desfecho, deixando grande parte do filme estacionado em sequências repletas de cortes secos de um plano a outro guiadas pelo espirito de sobrevivência.

Outro ponto importante para reflexões é o instinto maternal, uma peça que aparece com mais clareza com a exaustão batendo e lembranças dolorosas transformando-se de peso à força. Nesse momento, entendemos o ritmo lento de uma narrativa que estimula alguns porquês do isolamento voluntário, a necessidade de uma solitude e as relações com as forças incontroláveis da natureza.

Disponível no catálogo da Prime Video, Tempestade Infinita é um filme que demora para acontecer mas que reserva boas reflexões quando desabrocha, saindo de um esmorecimento para uma profunda reflexão sobre os obstáculos que aparecem pela vida.


Continue lendo... Crítica do filme: 'Tempestade Infinita'

16/03/2024

,

Crítica do filme: 'O Livro da Discórdia'


O sexo e a punição. Exibido no Festival Varilux de Cinema Francês do ano passado a comédia O Livro da Discórdia apresenta reflexões sobre uma geração de imigrantes no choque entre as memórias do passado e o presente na visão de um escritor de meia idade, descendente de argelinos. Dirigido pela atriz e cineasta francesa Baya Kasmi, em seu segundo longa-metragem de ficção, o projeto abre também espaço para mercado editorial dos livros e seu circuito de interesses. Tudo funciona de forma equilibrada em um roteiro que preza pelo humor na medida certa.

Na trama, acompanhamos a trajetória de Youssef (Ramzy Bedia), um homem de 45 anos, que mora em Paris e busca seu primeiro grande sucesso como escritor. Quando seu novo livro, que relata experiências vividas na sua adolescência na cidade de Marselha, vira um fenômeno de vendas Youssef fica preocupado de falar com os pais sobre a obra que apresenta questões que vão longe do encontro de tudo que sua família acredita. 

Abrindo espaço para o enigmático mercado editorial e seus vícios em busca do sucesso, o filme usa do flashback para entendermos sentimentos do passado e os dilemas que se seguem no presente em uma França recheada de questões sobre imigrações, algo corriqueiro numa Europa dos nossos tempos. A forma como se apresenta os temas polêmicos ligados à religião e os costumes também geram ótimos debates, aqui acoplados na visão de uma família que flerta com o tradicional, por conta de suas raízes, mas que faz muito tempo vive num mundo atual onde as aparências se tornaram ferramentas de não enfrentamento de possíveis embates. 

Inteligente sem perder o humor. A causa e o efeito ganham sentido quando entendemos que as autocríticas chegam por meio de terceiros, pelos mais próximos do protagonista. Seu conflito, segue durante toda narrativa com a exposições de situações se tornando um elemento importante sem fugir do discurso do roteiro. O desenho de sua estrutura familiar é apresentado de forma bem humorada com Youssef preso na premissa de que a realidade sempre vai além da ficção.

 

Continue lendo... Crítica do filme: 'O Livro da Discórdia'
,

Crítica do filme: 'Lupicínio Rodrigues: Confissões de um Sofredor'


A genialidade declamando a sofrência. Trazendo para o centro do palco histórias marcantes da história de um dos mais brilhantes músicos do Brasil, o documentário Lupicínio Rodrigues: Confissões de um Sofredor nos mostra entrevistas realizadas com o letrista de histórias de amor no final da década de 60 até o início dos anos 70, além de depoimentos de amigos, parentes e consagrados nomes da música brasileira. Um equilibrado quebra-cabeça que mistura relatos de sua vida pessoal, suas inspirações e a trajetória de sucesso.

Primeiro longa-metragem da carreira do cineasta Alfredo Manevy, o projeto bate na tecla da rica contribuição musical de Lupi (apelido carinhoso por qual era chamado pelos amigos), suas lutas, seus amores, além de toda a história de uma época, na fase final da sua vida já em período da ditadura.

Gaúcho, da região de ilhota, um bairro conhecido pelas enchentes em Porto Alegre, Lupicínio Rodrigues começou fazendo música no quartel antes da maioridade. As dores de cotovelo que viveu foram para o papel somado a uma narrativa trágica que expõe as dores de amores como protagonista. Obras marcantes marcaram sua carreira de várias décadas com uma volta por cima quando perde espaço no mercado fonográfico com as famosas vozes da era do rádio ficando para trás e a chegada da Jovem Guarda.

O cantor que influenciou gerações, tendo canções imortalizadas em grandes vozes do Brasil, com suas inesquecíveis declamações da sofrência e do samba-canção tem seu nome marcado também no esporte brasileiro, com a composição de um dos hinos de clubes de futebol mais bonitos, o do Grêmio de Porto Alegre, feito no início da década de 50.

Um grande defensor pelos direitos autorias, sofreu com a falta de crédito em diversas músicas fora do Brasil. Inclusive, um fato curioso ligado ao Oscar não é esquecido pelo documentário. Na trilha sonora do filme Dançarina Loura, indicada ao Oscar em meados da década de 40, tem uma música de Lupicínio que até hoje o crédito a ele não foi dado pela academia.

Exibido em alguns festivais brasileiros, Lupicínio Rodrigues: Confissões de um Sofredor não deixa de ser um abre alas para quem nunca ouviu falar desse grande músico, um homem que viveu e cantou as dores de cotovelo com uma genialidade notável.

 

Continue lendo... Crítica do filme: 'Lupicínio Rodrigues: Confissões de um Sofredor'

15/03/2024

Crítica do filme: 'A Arte de Amar'


Quando o destino é um reencontro. O novo filme de ação misturado com um romance água com açúcar A Arte de Amar nada mais é do que uma sequência de situações previsíveis em um jogo, nada carismático, de gato e rato tendo lindas paisagens como cenário. Dirigido por Recai Karagöz, em seu segundo longa-metragem de ficção, e com roteiro de Pelin Karamehmetoglu, esse novo projeto lançado diretamente na Netflix busca na sensualidade de dois atraentes personagens apresentar uma história de amor bem longe da realidade.

Na trama, conhecemos a agente da divisão de roubos de arte da Interpol Alin (Esra Bilgiç), uma profissional competente que está no presente atrás de um habilidoso ladrão que percorre o mundo roubando obras de arte e nunca é pego. Certo dia, acaba percebendo que o criminoso na verdade é Güney (Birkan Sokullu), um empresário influente e seu ex-namorado que sumiu anos atrás. Bolando um plano ao lado do parceiro Ozan (Ushan Çakir), resolve se reaproximar do antigo amor para tentar um flagrante.

Quando você lê a sinopse logo pensa: já vi esse filme em algum lugar! Bem, longe de ser algum remake ou baseado em alguma outra produção, A Arte de Amar possui elementos na sua narrativa que nos fazem estar diante de uma receita de bolo vista em alguns blockbusters norte-americanos. Tem a heroína, o anti-herói charmoso, o vilão canastrão, colecionadores excêntricos, alta tecnologia, que rumam para seus conflitos com conclusões previsíveis dentro de um contexto recheado de situações que nos levam a uma história de amor mirabolante.

O dilema que enfrenta a protagonista sobre amar ou não um ladrão que rouba obras românticas poderia ser algo que trouxesse algum frescor para a história mas só é visto a superficialidade, a conclusão trivial. Esse é o ponto fundamental da construção da personagem, seu principal conflito, aqui meramente usado como trampolim para clichês se reunirem não completando percursos importantes entre o amor e a lei.

Seja nas belas paisagens de Praga ou em Istambul, essa produção turca tem uma direção que foca seus esforços nas cenas de ação como se qualquer explosão ou situação impossível de sobrevivência transformasse uma história em algo realmente impactante aos olhos do espectador.  


Continue lendo... Crítica do filme: 'A Arte de Amar'

Crítica do filme: 'Ervas Secas'


Quando se fecha os olhos, os problemas nunca tem fim. Um vilarejo turco, um professor desiludido e com o sonho de sair dali, um fato marcante em meio a uma neve incessante. Indicado à Palma de Ouro em Cannes no ano passado, o longa-metragem turco Ervas Secas escancara o conformismo para destrinchar as relações humanas movidas pela esperança, a raiva, as incertezas. Baseado no diário do professor Akin Aksu, esse, que é o nono longa-metragem do excelente cineasta Nuri Bilge Ceylan, um decifrador da natureza humana, caminha na objetivo de apresentar argumentos de que uma vida tem valor mesmo que não encontre mais sentido.

Na trama, acompanhamos um período na vida do professor de artes Samet (Deniz Celiloglu), um homem que chegou no último ano como professor em uma aldeia distante e já planeja novos voos em uma das maiores cidades da Turquia. As desilusões sobre o ensino, as desconfianças sempre foram uma marca de sua personalidade. Um dia, ele e mais outro professor, são acusados de contato inadequado com duas alunas, fato esse que muda para sempre seus planos. Quando tudo parecia bem confuso e perdido, se aproxima de Nuray (Merve Dizdar), professora de uma outra escola da região, uma mulher que o confronta sobre seu conformismo, sua acomodação dentro de um fugir ao invés de encarar, trazendo novos olhares e restos de esperança.

O sufoco dos próprios gritos. As desilusões sobre o papel do ensino na formação, as desconfianças, retratos políticos, os relacionamentos se somam a trajetória de um protagonista que culpa o lugar por todos os seus problemas. O intrigante labirinto das suas emoções se jogam na evidência ao não conseguir entender os porquês das acusações que podem influenciar para sempre seu futuro. Cansado da esperança, se joga na incerteza. Esse relato nada mais é que um paralelo com muitos destinos do lado de cá da tela, transformando essa obra é algo muito próximo quando enxergamos uma enxurrada de realidade em cada movimento.

O espectador precisa de paciência, são mais de três horas de duração. A narrativa caminha de forma lente e desabrochando uma poderosa trama onde tudo é minuciosamente envolvido por belas imagens e diálogos longos, profundos. Impressionante como tudo faz grande sentido quando pensamos no uso das imagens e seus movimentos. Somos testemunhas de uma enorme viagem rumo ao abstrato dos sentimentos sem perder o norte de apresentar os caminhos para novas perspectivas, novos olhares, para dentro e para o que está lá fora.


Continue lendo... Crítica do filme: 'Ervas Secas'

14/03/2024

, ,

Crítica do filme: 'A Menina Silenciosa'


Dois mundos e seus conflitos. Indicado para mais de quarenta prêmios internacionais, inclusive chegando até os cinco selecionados ao Oscar de Melhor Filme Internacional em 2023, o longa-metragem irlandês A Menina Silenciosa navega sua trama nas chegadas e partidas de uma jovem que vive situações inéditas na sua curta trajetória de vida ao ser enviada para a casa de parentes de sua mãe. Baseado na obra Foster, da escritora Claire Keegan, o filme, dirigido por Colm Bairéad, é um retrato delicado do início da adolescência e o começo de novos conflitos que se jogam na frente, como o entendimento do luto, da perda e o real sentido de família.

Na trama, conhecemos Cáit (Catherine Clinch), uma menina quieta que vive dias tensos com sua família disfuncional e distante em uma humilde casa. Durante o verão do ano de 1981, ela é enviada para a casa de Eibhlín (Carrie Crowley) e Seán (Andrew Bennett), parentes de sua mãe, um casal que perdeu o filho em uma tragédia. Chegando lá acaba descobrindo um novo sentido de lar, de relação familiar, e assim precisa lidar com novos acontecimentos que abrem o seu leque de percepções sobre a vida.

A esperança que chega e vai embora. A narrativa detalhista segue os passos de sua jovem protagonista, entre descobertas e decepções, vê seu mundo se multiplicar em esperança, renovando as verdades da palavra amor. Entre imagens e movimentos, ambientados em uma zona rural irlandesa no início da década de 80, a cultura local acaba sendo o primeiro ponto conflitante que a confronta sobre a certeza do que é certo ou errado. Com o passar do tempo, e entendendo mesmo de forma superficial a dor dos parentes que a abrigam nesse verão se enxerga em dilemas sobre os dois mundos que é apresentada.

As chegadas e partidas estão implícitas, num iminente ponto futuro. Até quando vai ser possível viver aquelas novas experiências? Será que algum dia seus pais biológicos a tratarão com o amor e carinho? Como vai ser quando o verão acabar? Seguindo em perguntas ao vento, implícitas nas ações e emoções dos personagens, A Menina Silenciosa é um recorte sobre as durezas da vida e os lapsos de esperança que surgem quando se menos espera.


Continue lendo... Crítica do filme: 'A Menina Silenciosa'

Crítica do filme: 'A Noite do Traidor'


A guerra é o pior momento de se apaixonar. Escondidinho no catálogo da Prime Video está uma pérola europeia que apresenta com brilhantismo um indigesto encontro premeditado com o objetivo de descobrir que matou uma pessoa anos atrás. Dirigido pela cineasta francesa Josée Dayan, o filme lançado em 2008, A Noite do Traidor parece uma mistério de Agatha Christie, daqueles mesmo onde só descobrimos o culpado nos últimos minutos.

Na trama, conhecemos Marie (Nathalie Baye), uma mulher da alta sociedade francesa no pós guerra que resolve reunir alguns amigos de um grupo que fez parte da resistência francesa durante a ocupação nazista mas que não se viam faz mais de uma década. Após amistosas reapresentações, o clima esquenta, com o grupo descobrindo que seu líder, morto em uma possível emboscada durante os conflitos de outrora, foi traído por um deles. Assim, uma pergunta terá que ter respostas, qual deles foi o traidor?

É um exercício interessante pensar sobre a direção de arte e os enquadramentos, já que são muitos personagens em cena que se passam em dois cômodos complementares de uma casa. O preenchimento em tela, usando a criatividade do posicionamento parece transportar um ar teatral com impacto de quem está no comando da oratória. Assim, versões de fatos se confrontam. Com a mira em constante mudança, parece que estamos vendo um julgamento onde muitos personagens vão se revezando em um banco de réus imaginário.

A narrativa insiste em apresentar de forma contundente o confronto. Suspeitas antigas, rusgas do passado, um balé de desconfiança que levam a becos sem saídas. Passados políticos se misturam com hipocrisias até então colocadas como inquestionáveis, a tal da falta de auto crítica em qualquer debate nessa direção. Indo e voltando dentro de um contexto de guerra e os novos pensares no pós guerra colocam em choque antigos dilemas apresentando as fraquezas de muitos personagens em conflitos.

Remake de um clássico do final dos anos 50, A Noite do Traidor é uma obra audiovisual exigente no seu discurso e na sua forma fato que leva o espectador a uma jornada que incita a reflexão.

Continue lendo... Crítica do filme: 'A Noite do Traidor'

13/03/2024

, ,

Crítica do filme: 'Eu, Capitão'


Contando a saga de dois jovens que vai do sonho de uma vida melhor passando por um enorme pesadelo sem fim na busca do objetivo, o longa-metragem Eu, Capitão, indicado ao Oscar de Melhor Filme Internacional nesse ano, é um profundo recorte cheio de temas atuais que nos faz refletir a todo instante. Dirigido pelo cineasta italiano Matteo Garrone o filme embarca em uma narrativa que relata muito dos conflitos dos nossos tempos se tornando uma história impactante sob o ponto de vista de refugiados e suas superações.

Na trama, conhecemos os primos Seydou (Seydou Sarr) e Moussa (Moustapha Fall), dois jovens senegaleses que resolvem fazer uma viagem de Dakar até a Itália em busca de seus sonhos. Só que essa jornada não será como ele imaginam, sofrem com os horrores da ganância humana, conflitos geopolíticos, esgotando as curtas margens de esperança mas também encontrando pelo caminho novas formas de entender o mundo.

Vencedor de alguns prêmios no Festival de Veneza, o filme coloca em seu principal holofote os valores da moral e a humanidade tendo como referência o olhar imaturo e até ingênuo de dois jovens que acabam descobrindo os horrores que os seres humanos são capazes durante a caminhada. Os dilemas se tornam constantes, continuar ou não continuar? É possível confiar com o pesadelo batendo na janela dos sonhos a toda hora?

A questão dos refugiados é amplamente debatida. Um refúgio num lugar seguro, uma premissa básica de quem sofre na sua terra natal, vai entrando em contraponto à políticas governamentais, pessoas maldosas que buscam se aproveitar da esperança alheia, esgotando a esperança e a transformando em lapsos entrando quase sempre em uma situação de sobrevivência. A história mostrada no filme se aproxima demais com a de milhares de outras pessoas que buscam outros países para chamarem de lar, por isso a importância do ponto de vista deles que aqui é brilhantemente retratado.

Eu, Capitão é um dos filmes mais impactantes da lista dos indicados ao Oscar desse ano. Um filme pra ver e refletir, uma brilhante narrativa que vai demorar a sair de nossas memórias.



Continue lendo... Crítica do filme: 'Eu, Capitão'
,

Pausa para uma série: 'Ara San Juan: O Submarino que Desapareceu'


Uma tragédia e muitas descobertas. Chegou recentemente no catálogo da Netflix, um seriado documental argentino que traça um pente fino no catastrófico sumiço de um submarino com 44 tripulantes à bordo ocorrido em outubro de 2017. Um desastre que abre um mar de absurdos que vão desde um governo insensível, completamente perdido ao lidar com uma situação, até inúmeras teorias mirabolantes do que de fato possa ter acontecido.

Nos oito episódios com cerca de 25 minutos, Ara San Juan: O Submarino que Desapareceu navega pelos desabafos de parentes, falta de sensibilidade de oficiais da marinha argentina, espionagem ilegais, entrevistas com especialistas e jornalistas que cobriram o caso desde o início, até críticas que chegaram ao alto escalão do governo, afetando a popularidade do presidente em exercício argentino na época: Mauricio Macri.

Com o objetivo de realizar exercícios navais no percurso entre Mar del Plata e Ushuaia, logo após ir à mar aberto no controle de pescais ilegais, além de coletar informações sobre possíveis navios do Reino Unido e suas posições perto das Maldivas, o Ara San Juan partiu para numa viagem sem volta no que culminaria em um misterioso recorte sobre o que de fato pode ter acontecido. Uma das maiores buscas da história naval mundial ligadas a um submarino, inclusive contando com a ajuda internacional de alguns países, esse recorte tenso da história militar argentina mostra as fraquezas e incertezas de governantes de um país colocados contra a parede pelo seu povo.

O seriado é bem detalhista ao jogar na tela versões, situações, além de conseguir ampliar o contexto que chega com força na política de um país em eternas crises financeiras. Do lado da família, dor e muito sofrimento, algo que se prolonga com as inacreditáveis descobertas que são feitas ao longo desse espinhoso caminho rumo às verdades.  

Teorias vão se criando, desde possíveis erros humanos na manutenção de alguma operação técnica dentro do submarino, até mesmo fogo inimigo, no caso aqui do Reino Unido já que a embarcação poderia estar perto da região das Maldivas, uma área de eterna tensão militar que teve uma guerra de alguns meses no início da década de 80. Conflito esse que ainda deixa marcas nos corações dos argentinos.

Ara San Juan: O Submarino que Desapareceu é muito mais do que um recorte sobre uma tragédia, é a exposição de uma série de absurdos com pessoas que deveriam proteger e confortar dando um bico na moral.


Continue lendo... Pausa para uma série: 'Ara San Juan: O Submarino que Desapareceu'

11/03/2024

,

Pausa para uma série: 'O Sinal'


O que pode estar lá fora? Desde os tempos inesquecíveis de episódios semanais de Arquivo X, nos primórdios das produções seriadas, nos deparamos com situações ligadas as incertezas do universo. A nova minissérie da Netflix, O Sinal, percorre o mesmo caminho, nos levando a questões sobre as verdades que estão lá fora de uma forma inteligente, costurando o que é real e o que a mente projeta.


Tendo como alicerce misteriosas situações que acontecem em uma estação espacial, ao longo de quatro episódios com cerca de uma hora de duração, essa produção alemã parte para suas reflexões existenciais a partir da certeza que a história da humanidade nada mais é que um ciclo vicioso, explorando as ações do ser humano quando existe a possibilidade de se achar a ruptura disso.


Na trama, conhecemos Paula (Peri Baumeister), uma brilhante cientista alemã enviada por uma empresa privada para o espaço com um único objetivo de realizar pesquisas sobre possíveis sinais vindos de fora da Terra. Ao mesmo tempo, seu marido, o professor de história Sven (Florian David Fitz) e sua jovem filha com deficiência auditiva esperam o retorno dela. Perto de completar sua missão, Paula se depara com uma descoberta e conflitos se desenrolam. Ao voltar ao nosso planeta acaba sendo responsabilizada por uma tragédia, modificando completamente a vida de sua família.


Questões geopolíticas, ambições, circo midiático, dramas familiares se entrelaçam nesse projeto que busca perguntas sobre a relação do ser humano com o próprio sentido de existência. É um caminhar bem filosófico que gera interpretações diversas. Há um curioso mistério que percorre os episódios, a princípio mal definido nos dois primeiros capítulos mas conforme vamos juntando as peças tudo começa a fazer um certo sentido. O choque entre o dilema de Paula na espaço e os dramas que sofre sua família na Terra é o combustível desse roteiro que objetiva encontrar um norte entre esses paralelos.  


O ponto mais interessante é quando entendemos sobre o que de fato é essa história. Aqui a humanidade é colocada em evidência, dentro do ciclo vicioso já mencionado, a partir das possibilidades de descobertas sobre o que há pelo universo. A ganância, a imposição militar, o reconhecimento, as loucuras que a mente é capaz de projetar, são alguns dos elementos que estão associados as ações vistas que traçam paralelos com a realidades de conflitos de diversos cotidianos. O eterno embate entre as ações individuais e coletivas, dentro de um sentido da essência do ser humano pondera o certo e o errado.  


Na sua incessante busca pelos conflitos emocionais de uma protagonista em crise nos dilemas que percebe na sua trajetória, algo necessário para entendermos a construção e desconstrução da personagem, a narrativa pode se tornar confusa em alguns momentos com um uso excessivo de flashbacks onde a variável tempo e seu vai e vem se tornam constantes. Mas o contexto acaba sendo uma peça chave, e mesmo caminhando pela previsibilidade, encontra um desfecho que não deixa de ser surpreendente, com um simbolismo importante para os nossos tempos.



Continue lendo... Pausa para uma série: 'O Sinal'