13/07/2024

Crítica do filme: 'Goyo'


O caos do mundo lá fora. Abordando de forma madura e inteligente o universo das emoções, Goyo, recém lançado na Netflix, é um caminhar de personagens pelo aprender para entender. Escrito e dirigido pelo cineasta argentino Marcos Carnevale, imerso numa narrativa que contempla a arte e suas relações com as sensações, acompanhamos algumas fases do maior dos sentimentos sob dois pontos de vistas. Esse projeto busca abrir espaços de reflexões também para as formas como lidar com a rejeição através de dilemas que percorrem os caminhos dos ótimos personagens.

Na trama conhecemos Goyo (Nicolás Furtado), um homem inteligente que já tem um doutorado e trabalha como guia num museu de artes em Buenos Aires. Condicionado com Síndrome de Asperger, um estado do espectro autista, vive com sua irmã pianista Saula (Soledad Villamil), uma mulher superprotetora, em um belíssimo apartamento. Ele também é muito próximo de seu outro meio irmão Matute (Pablo Rago), um empreendedor de sucesso, dono de restaurante. Com a chegada de Eva (Nancy Dupláa), a nova segurança do Museu, uma mulher mais velha, com um relacionamento destrutivo com o marido frustrado, Goyo encontrará depois de muito tempo o amor mas também tudo que esse sentimento provoca.

Pés no chão, explorando dilemas, fugindo de qualquer melancolia rasa, explorando os altos e baixos pelo olhar de um protagonista com Síndrome de Asperger e uma outra personagem num momento de total instabilidade familiar, essa obra busca construir caminhos para conexões que surgem sem deixar de abrir um leque de considerações maduras. A narrativa opta por personificar o abstrato dos sentimentos em imagens e paralelos, um transporte das aflições, da dor, até mesmo do sentimento de prazer, um caminho cheio de interpretações onde o contexto se torna importante.  

O olhar para a maternidade ganha alguns focos mesmo que pelas entrelinhas. A estrutura familiar que cerca o protagonista, com os meio irmãos presentes durante toda sua vida fazendo o papel de um pai falecido num acidente e uma madrasta que nunca aprendeu a atender, escolhendo o caminho mais distante na relação com o filho. Aliás, essa última, Magda (interpretada pela fabulosa Cecilia Roth), e sua história com o Goyo acaba sendo a representante em cena que mais se aproxima da mesa de reflexões que o discurso propõe. De forma menos profunda, Eva e as questões que envolvem seus filhos e o marido descontrolado também estão inseridos nesse contexto.

O lidar com a rejeição, outro ponto importante por aqui, chega aos personagens de várias formas, é uma questão que está muito presente nas linhas do roteiro. Mas mesmo escancarado ou escondido em todas suas formas de expressá-lo, o amor, essa variável incontrolável, que nos leva do céu ao inferno, acaba sendo o combustível, algo que alimenta as ações, dos 106 minutos de projeção. Goyo, é uma daquelas obras cirúrgicas que apresenta verdades sobre o caos do mundo lá fora mas sem deixar de tocar nossos corações.



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12/07/2024

Crítica do filme: 'A Filha do Pescador'


O desenrolar de conflitos familiares tendo o mar como testemunha. Escrito e dirigido pelo cineasta colombiano Edgar De Luque Jácome, em seu primeiro trabalho como diretor de longas-metragens, A Filha do Pescador de forma bem objetiva, contorna a aceitação e o perdão dentro de um contexto familiar, numa relação conturbada entre pai e filha tendo uma paisagem deslumbrante como testemunha. O preconceito, o assédio, o machismo também são elementos que estão inseridos nas linhas do competente roteiro.

Na trama, conhecemos Samuel (Roamir Pineda) um experiente pescador que mora em uma ilha e vive seus dias dedicado 100% ao seu trabalho. Amargurado com o passar do tempo, sem se livrar das desilusões, aprendeu a viver com a solidão. Certo dia, seu filho que não via faz mais de uma década, volta pra casa, agora como uma mulher trans chamada Priscila (Nathalia Rincón), que fugiu da cidade onde morava por conta de uma situação. Quando Samuel se machuca após uma ida ao mar e precisa de alguém para cuidá-lo, esse pode ser o momento que precisam para se entenderem.

Há um paralelo importante do choque familiar com o mar e a força da natureza. Ambientado num lugar isolado mas com suas belezas, percebemos as dores de um passado já distante que ganham novos sentidos com um reencontro, mesmo que em meio a tempestades que logo podem virar dias bonitos. Mas até quando o perdão pode superar as inconsequências? A desconstrução de Samuel é a base para uma narrativa que ruma para a aceitação ao mesmo tempo que encontra a amargura envolvida por uma solidão. O vai e vem do mar e o olhar para a natureza são como uma mensagem indireta, uma parábola, para os desequilíbrios das relações.

Nessa co-produção Brasil, República Dominicana, Colômbia e Porto Rico, em menos de 80 minutos de projeção, com o passar dos conflitos que se seguem vamos vendo uma tentativa de reconexão surgindo, mais uma chance numa relação que insistiu em se perder com o tempo. O preconceito enraizado num machismo interminável nos leva até a dor de uma personagem sofrida, frequentemente assediada, que busca um oásis pro seu sofrimento exatamente num lugar onde as pedras chegam na frente de qualquer conforto.   

A Filha do Pescador dispara suas considerações a partir da melancolia de personagens no sentido de um sentimento que não se desprende da perda. A construção narrativa eficiente e com respiros para entendermos os conflitos dos protagonistas fortalecem o discurso, dentro de um contexto de aflições nos levando até um mar de reflexões.   


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05/07/2024

Crítica do filme: 'Divertimento'


Uma caminhada exigente tendo a força do amor pela música. Contando com muita emoção e detalhes a história da brilhante maestrina Zahia Ziouani, Divertimento tem uma narrativa contemplativa, na linha do admirar e pensar, opta pelo desafio de conectar os sentidos aos confrontos de uma grande protagonista em forma audiovisual, transportando imagens e movimentos com paralelos entre os altos e baixos emocionais. Dirigido pela cineasta francesa Marie-Castille Mention-Schaar, o projeto não deixa de tocar em temas como o machismo e o preconceito, além de outras críticas sociais importantes.

Na trama, ambientada em meados dos anos 90, conhecemos Zahia (Oulaya Amamra) e Fettouma (Lina El Arabi), irmãs gêmeas que desde criança possuem um enorme amor pela música clássica. Vindas de um subúrbio francês, tem a chance de estudar em um conservatório prestigiado em Paris. A primeira com o sonho em ser uma maestrina, a segunda em seguir carreira como violoncelista. Ao longo do tempo, enfrentam vários tipos de preconceitos e impedimentos, até que um dia resolvem formar a própria orquestra. Assim surgiu a Divertimento.

Contornando, em uma espécie de novos olhares para um gênero da música clássica predominante no século XVIII que conta com alguns poucos instrumentos, o divertimento, esse longa-metragem liga a teoria à prática através de uma história de superação, uma busca por respeito. De mãos dadas e em harmonia, o roteiro e a narrativa transformam os palcos da vida, e seus paralelos com a disciplina, numa deslumbrante alegoria das emoções. Muitas vezes, ao longo das quase duas horas de projeção, nos sentimos num grande concerto, com atos poderosos, onde menções à Schubert, Beethoven, se mostram como convidados.

A não definição do que é música (uma verdade universal), esse campo abstrato e cultural, abre margens para inúmeras interpretações que se juntam à ficção. A maneira de sentir, de executar as notas rumo à perfeição, entram nos dilemas mundanos. A rigidez, a prática ganham forma e paralelos com a trajetória de vida que acompanhamos. Nesse ponto, um destaque é o ping pong entre mentor e a aprendiz, aqui com a impactante emoção de Oulaya Amamra (intérprete da protagonista) e Niels Arestrup (intérprete do experiente maestro Sérgio Celibidache) se mostra eficiência nos ótimos diálogos.

Lutando contra o machismo, a falta de reconhecimento das mulheres em um mundo dominado pelos homens, as irmãs Ziouani marcaram seu lugar no concorrido universo da música clássica. Essa inspiradora história pode abrir margens para muitos sonhares. É muito bonito quando uma obra cinematográfica consegue chegar nesse ponto, o de inspirar!


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03/07/2024

Crítica do filme: 'Jornada para o Inferno'


A natureza e todos os seus aspectos. Baseado na obra Butcher's Crossing, escrito pelo professor e autor norte-americano John Williams, Jornada para o Inferno nos apresenta a caminhada de um jovem e sua necessidade de encontrar conexões entre o homem e a natureza, esbarrando de forma abrupta no medo que se mistura ao desbravar. Através de uma narrativa imersiva ao contexto do velho oeste americano e os modos de sobrevivência daqueles tempos, o longa-metragem propõe reflexões profundas e filosóficas. Dirigido pelo cineasta Gabe Polsky, e tendo como um dos seus protagonistas o vencedor do Oscar Nicolas Cage, o projeto estreou no prestigiado Festival Internacional de Cinema de Toronto em 2022.

Na trama, conhecemos Will (Fred Hechinger), um jovem estudante que larga a prestigiada Universidade de Harvard para descobrir o mundo longe da bolha que vivia. Chegando na cidade de Kansas, em meados de 1870, logo conhece um experiente caçador de búfalos chamado Miller (Nicolas Cage). Ambos embarcam em uma perigosa caça, em uma região ao norte, numa imensidão de terras não habitadas, um lugar temido por muitos. Ao longo de dias intensos, ao lado de Miller e outros dois personagens, o protagonista vai de encontro a descobertas que o farão entender melhor sobre a vida e a natureza.

A nevasca, a insanidade, a fé, as crenças, a necessidade do ganhar dinheiro para se sustentar, se somam a uma aterrorizante sensação de estarem perdidos, algo que se torna uma constante. Os desdobramentos de interpretações da moral logo mostra suas facetas em meio a uma natureza selvagem de paisagens belas e perigos iminentes. O conflito se abre como uma oportunidade para se refletir. É muito simplista definir esse como apenas um filme sobre sobrevivência, há mais olhares. A filosofia e as questões da existência logo ganham paralelos com os valores sociais principalmente as definições sobre liberdade.

O que é preciso ver para se entender a vida? Essa é uma pergunta que podemos nos fazer ao ampliar o olhar crítico para tudo que nos é mostrado. Através dos olhares de seus protagonistas, a condução de Gabe Polsky vira ferramenta fundamental para o enorme alcance de definições que muitas interações entre os personagens nos dizem. Há espaço para alcançarmos contextos amplos daquele país naquele momento e as novas maneiras de viverem e pensarem os avanços da sociedade até ali. O desfecho diz muito pelas entrelinhas. Junta-se a isso, a enormidade de interpretações para as ações do homem no encontro com a natureza.

Rodado em menos de três semanas em algumas locações no Estado de Montana, numa região conhecida como Montanhas Rochosas, Jornada para o Inferno joga a definição de faroeste a outros patamares, amplia seus horizontes de reflexões sobre um período marcante no século XIX norte-americano.


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Crítica do filme: 'Greice'


Um curioso quebra-cabeça emocional. Buscando ampliar suas reflexões através de contextos que envolvem um passado sem deixar de tocar em pontos que ligam a atualidade entre dois países, o longa-metragem Greice é um projeto que deixa suas marcas através de uma narrativa divertida e segura que nos leva até uma carismática protagonista, amiga das circunstâncias. Escrito e dirigido por Leonardo Mouramateus, o roteiro abre caminhos para camadas dramáticas que se ligam à uma personalidade, através das ações da ótima protagonista.

Na trama, conhecemos Greice (Amandyra), uma brasileira na casa dos 20 anos, que tempos atrás embarcou para Portugal. Dividindo sua rotina trabalhando em um quiosque, sendo da produção de uma artista e avançando no curso de esculturas no curso de Belas Artes da Universidade de Lisboa, certo dia conhece um jovem português. Durante uma festa, Greice vê seu nome envolvido em uma situação que acontece, fato esse que coloca sua permanência no país em risco e ela resolve voltar para o Brasil, mais precisamente para sua cidade natal, para achar soluções. Em um hotel em Fortaleza, fugindo de uma possível descoberta da família, reencontra amigos, conhece novos e assim analisa o que fazer com sua vida.

Greice pode ser dividido em dois momentos. Numa primeira fase em Portugal, conhecemos um pouco da rotina de sua personagem principal, imigrante irregular, adepta do ‘deixa a vida me levar’ que sempre arranja um jeitinho de moldar tudo e todos para suas necessidades. Quando uma variável incontrolável aparece em seu caminho, chegamos na segunda fase, já no Brasil, onde a força do roteiro mostra seu valor através de autodescobertas. Esse arranjo se mostra eficiente em uma narrativa cativante que usa muito bem o espaço e o tempo a seu favor. A direção também é segura, com um foco nos paralelos para reflexões sem deixar de apresentar os detalhes de cada ponto que se soma na imprevisibilidade da trama.

Com um direcionamento total pelos olhos de Greice, somos levados para uma imersão rumo as incertezas da bolha de mentirinhas compulsivas instauradas no seu fantástico mundo. Isso torna imprevisível qualquer situação, uma carta na manga que a narrativa explora muito bem. Subtramas e seus leques de assuntos importantes para debates vão se somando mas tendo apenas um ponto intercessor. Ao se aproximar das próprias verdades, aquelas que ela insiste em se esconder, a protagonista flerta com a necessidade de desconstrução e aí vem um outro ponto positivo, a inconsequência, mostrada através de fatos onde há a necessidade de se passar pelo choque da realidade.

Exibido no Festival Internacional de Cinema de Roterdã e vencedor dos Prêmios de Melhor longa-metragem e Melhor Atuação (Amandyra) no Festival Olhar de Cinema nesse ano, Greice é um trabalho consistente, interessante, honesto, que aproxima-se da realidade com ótimas atuações e personagens. Não duvide que esse filme vai figurar em listas dos melhores filmes brasileiros lançados em 2024.


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28/06/2024

Crítica do filme: 'Última Chamada para Istambul'


A vida como ela é. E não é que a Netflix nos surpreendeu com um filme nada badalado mas que pode conquistar corações?! Apostando numa narrativa que busca na leveza refletir sobre assuntos importantes sem deixar de avançar na profundidade, se afastando de qualquer razão convencional, Última Chamada para Istambul tem um discurso que logo acerta seu alvo. Com o auxílio das surpresas e as várias visões de uma história, abrindo camadas inesperadas que chegam na intensidade de assuntos que giram em torno de um relacionamento desgastado pelo tempo, o projeto aposta no arriscado mundo dos sentimentos e suas desilusões.

Na trama, conhecemos Mehmet (Kivanç Tatlitug) e Serin (Beren Saat), duas pessoas bem diferentes que se encontram no aeroporto de Nova Iorque e resolvem passar as próximas horas juntos após um imprevisto com a mala de um deles. Ambos casados, resolvem viver como se não houvesse amanhã. Só que uma verdade logo aparece, nos levando para novos olhares para essa mesma história.

O gostos, os desejos, se tornam elementos prontos para embates que se sustentam nos paralelos com a realidades de muitos casais. E não pensem que é fácil em se chegar a algo assim. Conforme vamos acompanhando as leis da atração entrarem em cena, é muito fácil se identificar com as dúvidas e aflições dos personagens. Kivanç Tatlitug e Beren Saat, em total harmonia, passam para o espectador um mix de emoções que vamos entendendo melhor quando as verdades são reveladas. Somos testemunhas de dois carismáticos personagens que nos fisgam exatamente pelo túnel da inconsequência em que estão sempre flertando.

A cereja do bolo chega por um plot twist convincente, algo que a narrativa amarra de forma brilhante, é um verdadeiro impacto a guinada que o roteiro se propõe. Passando pela melancolia, a culpa, o desistir, as frustrações se tornam novas variáveis em uma espécie de jogo de amor que encontra seu rumo através de um olhar para o passado. Tendo uma Nova Iorque dos tempos atuais como cenário, quase como um personagem estático, esse lugar de sonhos e aventuras se mostra como um achado para quem quer a autodescoberta, algo que se soma às reflexões propostas.

Dirigido por Gonenc Uyanik e escrito por Nuran Evren Sit, Última Chamada para Istambul está escondidinho no catálogo da Netflix e merece ser encontrado!


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23/06/2024

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CINEOP 2024 - O pioneirismo conhecido na temática preservação dando as mãos à animação

De 19 a 24 de junho o mundo dos amantes do cinema brasileiro se voltou para a histórica cidade de Ouro Preto, em Minas Gerais, onde a realização do CINEOP 2024 aguardou o público com programações totalmente gratuitas. Completando quase duas décadas de um brilhantismo em sua realização, atividades e curadoria, a Mostra de cinema de Ouro Preto reuniu em 2024 um leque com mais de 150 filmes, entre curtas, médias e longas-metragens, além e debates e oficinas, unindo todos que amam a sétima arte.


Além da temática de preservação, já com o pioneirismo conhecido, nesse ano o evento trouxe para seu epicentro um recorte profundo, atual e histórico, do cinema de animação no Brasil. Esse inclusive foi um dos focos do Guia do Cinéfilo, que fez a cobertura desse ano pela primeira vez. Ao longo dos dias de evento, organizados pela excelente equipe da Universo Produções, estivemos presentes em muitas sessões de curtas-metragens de animação além de alguns longas-metragens documentários, foram  ótimas as mesas de debates com realizadores e coletivas de imprensa.



Abaixo uma pequena entrevista com Nara Normande, animadora e cineasta brasileira que falou da importância desse evento o foco na animação:

 


Sobre os curtas-metragens, abaixo um pouco do que achamos de alguns desses trabalhos exibidos no CINEOP:

 

Pororoca de Fernanda Roque e Francis Frank



Curta mineiro aborda dilemas e paralelos com o maior dos sentimentos através do encontro de um peixe boi e uma baleia. Com várias frases de efeitos, como: Amor com fronteira não é amor. Traz em sua construção visual deslumbrante uma visão positiva sobre Conflitos e seguem reflexões sobre as possibilidades dos personagens num encontro do rio e do mar, da água doce e salgada.

 

Curacanga



Baseado num mito popular, o curta baiano Curacanga Nos leva até o vale do corrente onde encontramos um amor que logo se une a uma tragédia, uma condição. A ausência de cores fortes mostra o frio e o gelado dos sentimentos conflitantes. A estética conversa com o discurso sempre com um tom fúnebre.

 

Lulina e a Lua



Curta paulista de Alois do Léo e Vinícius Vasconcelos nos joga de forma rica e poética para os primeiros passos da imaginação que logo ganha asas através de um fato revelado no final do filme. Os mistos de sentimentos, com o foco no enfrentar os medos, se transformando em uma brilhante narrativa que encontra sentidos também no lúdico.

 

Dona Beatriz Ñsîmba Vita



Curta mineiro, exibido também no festival de Sundance nesse ano, nos leva para uma história impactante, visualmente impactante que nos leva para reflexões sociais através de uma personagens e sua reprodução de clones. Um filme que fica na memória por muito tempo.


Dona Biu de Gabriela Taulois

Esse curta do Rio de janeiro aborda as memórias, a cura, a fé, sob o ponto de vista de uma narradora que transborda emoção e espontaneidade. Esse detalhe, da narradora ser tão presente é um trunfo mesmo que a narrativa não alcance grandes profundidades.

 

A sua imagem na minha caixa de Correio de Silvino Mendonça

Criativo, emotivo, com um ar nostálgico cinéfilo, esse curta-metragem do distrito federal é uma verdadeira pérola. Dividido em três partes complementares, e dirigido por Silvino Mendonça, partimos de curiosas trocas de cartas entre leitores de uma famosa revista sobre cinema pra quem já curtia essa arte antes da internet chegar com força. Passando pelos movimentos de Fã clubes, estaciona de forma construtiva no olhar para uma certa solidão e necessidade de compartilhar o mesmo gosto. A narrativa bem bolada, amplia a linguagem, investe no decifrar personalidades e estados de espíritos a partir do fascínio pela sétima arte. Um filme que vai abrir um leque de possibilidades para reflexões.


 


Com sessões especiais no Cine Praça, um lugar com uma tela à céu aberto e com mais de 500 lugares, também no confortável Cine Teatro do Centro de Arte e Convenções, o CINEOP marcou mais um capítulo de sua grande história. Não perca nossa cobertura completa pelo Instaram do Guia, e principalmente pelos stories onde deixamos uma aba especial com alguns resumos de todos os dias do CINEOP 2024.



Ouro Preto, amamos! Até ano que vem se Deus quiser!

  

 

 

 

 

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17/06/2024

Crítica do filme: 'Na Terra de Santos e Pecadores'


Sangrento, pulsante, imprevisível. Vamos falar agora sobre o novo filme protagonizado por Liam Neeson que entrou recentemente na prime video, Na Terra de Santos e Pecadores. Exibido no Festival de Veneza ano passado, nesse projeto somos apresentados a um choque entre a frieza e as desilusões pelo olhar de um protagonista, um clássico anti-herói, em total crise existencial que se vê envolvido em um último conflito ligando seu passado à vida que quer abandonar. O longa-metragem é dirigido pelo norte-americano Robert Lorenz, em seu terceiro projeto atrás das câmeras após uma carreira de sucesso como produtor de alguns filmes de Clint Eastwood, como: Sobre Meninos e Lobos e Menina de Ouro.

Na trama, ambientada em meados da década de 70, conhecemos o assassino de aluguel Finbar (Liam Neeson), um homem já amargurado pelo seu passado que após a morte da esposa vem aos poucos começando a repensar suas escolhas e os rumos para o futuro. Morando numa vila de poucos habitantes, longe dos agitados dias de tensão política na outra parte da Irlanda, ele enfim resolve se aposentar. Mas a chegada ao local de um grupo associado ao IRA, liderado por Doireann (Kerry Condon) faz Finbar repensar algumas questões.

O ar fúnebre se mistura as reflexões sobre ideologia, dentro do contexto de uma guerra política que causou caos a terceira maior ilha da Europa. A narrativa é empolgante, com o ritmo dosado, explicando de forma trivial paralelos interesses, como um contorno do discurso que bate de frente com o clássico Crime e Castigo de Dostoiévski. Numa linda paisagem, o contraste com o violência é uma marca e assim vamos aos poucos entendendo as crises existenciais que se amontoam, toda essa parte é muito bem conduzida pelo olhar detalhista de Lorenz que consegue extrair não só os dilemas mas preenche as lacunas de muitos porquês.

Esse é um filme onde os personagens se mostram muito presentes em cada espaço. E nesse campo aberto rumo ao imprevisível, já inserido na iminência de uma guerra civil, de um lado um assassino experiente em crise existencial, já não sabendo mais lidar com o ganha pão que escolheu, do outro um grupo de jovens imersos nos limites emocionais de sua incursão à revolução que escolheram, um modo de vida instável sempre à espera das consequências dos atos que se seguem. Heróis e vilões ganham interpretações diversas. Ajudam a contar essa história três excelentes artistas irlandeses indicados ao Oscar: Liam Neeson, Kerry Condon e Ciarán Hinds.

Algo que o cinema faz como muitas artes, não deixar cair no esquecimento, se junta à força de um discurso. Esse projeto, mesmo sendo uma total ficção, é mais um capítulo na vasta história que liga o famoso grupo paramilitar IRA, que passou por diversas modificações ideológicas desde seu início lá em 1919, à conflitos por toda a Irlanda.  


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11/06/2024

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Crítica do filme: 'Geografia Afetiva'


Poético, tocante, através de memórias recriadas por lembranças. Falaremos agora do ótimo documentário Geografia Afetiva. Exibido no último dia de exibições do CINEPE 2024, o longa-metragem paulista encontra sentido nas descrições dos sentimentos, nos encontros e desencontros de uma família com conexões entre Brasil, Canadá e El Salvador. Contando parte da sua própria história, a cineasta Mari Moraga leva ao público de forma cativante e honesta os desabafos dos tempos de guerra, o sofrimento da distância, a satisfação dos reencontros. Marcas que acompanham toda uma vida.

O primeiro recorte, logo na abertura, é a base do discurso, algo que a narrativa preenche com poesia, imagens e movimentos que fazem total sentido, uma busca por respostas após a dor de uma perda. Aos poucos, passando por dilemas, dramas e escolhas, algumas lacunas são preenchidas, algo que a realizadora divide com o espectador de forma honesta e delicada, abrindo a porta da sua família para que todos possam refletir sobre muitas questões. Em certo momento entendemos que nem todas as respostas seriam ditas mas o que viesse já era o suficiente.

Junta-se à narrativa um olhar curioso que mostra o elo da geografia com as descobertas, algo feito de forma elegante, sucinta, também trazendo um interessante paralelo com a natureza. A aparente superficialidade em alguns temas na verdade se mostra um convite à pesquisa, o início de um refletir, um exercício que o espectador pode se aprofundar futuramente. Através de uma espécie de road movie, onde cada ponto no mapa afetivo é detalhado através de relatos objetivos dos entrevistados, entendemos contextos mais amplos, políticos, sociais, econômicos, de décadas atrás e os reflexos hoje.

A planta da emoção chega como um registro. Vou explicar: uma folha de cartolina com detalhes de lugares onde familiares fixaram raízes no início de trajetória. Uma mapa que mostra uma história. Nesse ponto, marcas de um passado difícil que logo flertam com o adeus se tornam o combustível de um dia caminharem de volta. Logo, estamos de frente para o passado e o presente, um choque que traz suas questões, um momento esperado por décadas no coração de cada integrante dessa família.

Geografia Afetiva encontra a beleza no reencontro, na necessidade de um registro definitivo de uma história familiar que começa num lugar e avança para outros. Um ciclo que nada mais é do que a jornada de uma vida, com altos e baixos, mas com a vontade de voltar mais uma vez e relembrar.

 

 

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08/06/2024

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Crítica do filme: 'Memórias de um Esclerosado'


Um retrato honesto, corajoso e emocionante. Filme de abertura da mostra competitiva de longas-metragens do CINEPE 2024, o documentário gaúcho Memórias de um Esclerosado nos leva para uma intensa viagem de um homem em busca de registrar suas memórias após ser diagnosticado com esclerose múltipla. Em uma belíssima construção narrativa, colocando na tela um poderoso pulsar de alguns pontos marcantes de toda uma trajetória até uma notícia avassaladora, encontramos uma estrada que percorre o real sentido dos sonhos que aqui ganham força em imagens e movimentos.

Na trama, conhecemos o cartunista Rafael Côrreas, que 14 anos atrás, recebeu o diagnóstico de esclerose múltipla. Com o avanço da doença, resolve ir atrás de um registro sobre momentos importantes de sua vida, até mesmo personificações importantes do abstrato mundo das emoções, que traçam paralelos com o mix de sentimentos que entra em ebulição de forma dilacerante em uma enorme inquietante e produtiva conversa com o espectador.

Passando pelo karma de um acontecimento quando criança, em um antes e depois imersivo, a narrativa busca fugir do lugar comum e tratar o epicentro do discurso de mãos dadas com os medos que chegam. Esse exercício de linguagem interessante, se soma a uma metalinguagem cirúrgica, algo que traz o refletir para perto a todo instante. O desfecho inesquecível, dentro do campo da infinidade de possibilidades criativas que a sétima arte abraça, vira poesia nas mãos competentes da cineasta Thaís Fernandes.  

Estima-se que no Brasil mais de 40.000 pessoas foram diagnosticada por essa doença neurológica. É papel do cinema ser um caminho para mostrar essa realidade que sempre nos trazem reflexões sobre tudo que envolve um tema tão delicado, com ligação aos importantes debates sobre acessibilidade.


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