26/09/2014

Crítica do filme: 'Frank'



A solidão é o preço que temos de pagar por termos nascido neste período moderno, tão cheio de liberdade, de independência e do nosso próprio egoísmo. Uma das sensações do Festival de Sundance deste ano, onde recebeu diversos elogios de crítica e público, Frank, é um projeto corajoso que fala sobre as peculiaridades das pessoas e a eterna fábula contemporânea do achar o seu lugar no mundo. Dirigido pelo cineasta irlandês Lenny Abrahamson, esse drama conta com uma atuação inspirada do excelente ator Michael Fassbender  que interpreta cerca de 80% das cenas usando uma enorme cabeça feita de papel machê.

Na trama, conhecemos Jon Burroughs (Domhnall Gleeson), um jovem que está desiludido com a vida que leva. Sua rotina absurdamente chata no seu trabalho de escritório, sem um grande amor e com um sonho escondido de ser um grande músico de uma banda de sucesso. Tudo muda quando encontra um grupo de músicos da banda Soronprfbs que o convidam para gravar o novo cd deles na Irlanda. Assim, entre um tweet e outro, Jon embarca em uma viagem de descobertas em busca de encontrar definitivamente seu lugar no mundo.

O filme se aproxima do ótimo Quase Famosos de Cameron Crowe quando analisamos a partir das novas experiências de um amante do universo musical que por mais que respire música, nunca esteve de fato nos bastidores ou no palco de um grande evento. Essa mescla entre sonhos e desejos são incorporados no ótimo roteiro de Jon Ronson e Peter Straughan de forma inteligente, leve e divertida. A narrativa é lenta, induzida e também regida pelos objetivos conflituosos entre Jon e seus novos amigos. O protagonista tenta de todas as formas pertencer a esse novo mundo que acabara de conhecer e muitas vezes se precipita nesse desejo. 

Os personagens são ótimos, nada caricatos. E o interessante é que existe um grande conflito em cada um deles e o filme tem o mérito de explorar com eficácia isso ao longo dos 100 minutos de fita. Nos casos mais complexos, chegamos em Frank (Michael Fassbender), o líder da banda, um pós jovem músico brilhante que talvez para se esconder da realidade assustadora que enxerga vive dias e noites com uma enorme cabeça feita de papel machê. Toda essa peculiaridade em volta do líder da banda, tornam Frank um personagem enigmático, único, cheio de imperfeições explícitas muito bem modeladas pelo excelente Michael Fassbender.

O filme estreou no badalado Festival de Sundance deste ano e o mais legal nessa exibição foi que o público ganhou máscaras semelhantes à usada por Frank no filme o que tornou essa première ainda mais especial. Será que acontecerá isso no Brasil também? Seria o máximo! No mais, o que falar de um filme que fala sobre sonhos, música e conta com uma direção e atuações excelentes? Não percam, a arte do sonhar está dentro de todos nós! Viva Frank! Viva o cinema!
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Crítica do filme: 'Mapa para as Estrelas'



A decadência da fama, as fortunas ganhas, o status que cada vez mais se torna transparente e uma eterna ponte para realização pessoal de alguns artistas. Como se estivesse com uma poderosa marreta nas mãos, o cineasta canadense David Cronenberg derruba a porta da mesmice e realiza um projeto que foge de qualquer conceito de normalidade. Contando com um ótimo elenco, com destaques para os ótimos Julianne Moore e John Cusack, o famoso diretor realiza uma crítica afiada e cheia de verdades sobre a atual indústria cinematográfica hollywoodiana. 

Na trama, conhecemos diversos personagens que por conta de um destino extremamente fictício, em meio ao modelo de família hollywoodiana, se interligam de maneira extrema. Tem a atriz jogada para escanteio pela indústria cinematográfica, um psicólogo que fez fortuna com livros de auto ajuda, um jovem astro infantil que adora se meter em uma polêmica e uma jovem com sérios problemas que acaba de ser liberada de um sanatório. Tem de tudo nesse filme: Dramas familiares, obsessões de todos os tipos, surtos psicóticos. 

A construção de grande parte dos personagens é interessante. Dissimulados, excêntricos, desesperados, alucinados, tem de tudo um pouco. O elo de interseção de todas essas figuras cênicas é o intrigante mundo das celebridades. Esse projeto, às vezes, dá a impressão de ser um thriller sobrenatural psicótico, tamanha as cenas esquisitas que somos testemunhas.  Os diálogos também merecem uma pequena referência: São sarcásticos e impressionam pela transparência de cada verdade mencionada e jogada no colo do espectador.

Julianne Moore interpreta de forma fantástica sua complexa personagem Havana Segrand. Cheia de problemas de auto estima e inseguranças diversas, uma das protagonistas é uma das maiores criações de Moore nos últimos anos. Merecidamente, essa excelente atriz já levou neste ano o prêmio de melhor atriz no Festival de Cannes e já se coloca com grandes possibilidades de concorrer a uma vaga no próximo Oscar. O ponto negativo vem para Mia Wasikowska com sua Agatha Weiss e para Robert Pattinson e seu Jerome Fontana, ambos totalmente perdidos em algumas cenas. Parece que não conseguiram encontrar seus personagens dentro desse mapa para as estrelas.

Com muitas citações a artistas conhecidos do grande público e algumas situações que de fato aconteceram na realidade, Cronenberg utiliza a troca de perspectivas, entendemos os fatos relatados através dos olhos de vários personagens, o que resulta em um filme um tanto quanto complexo. É como se olhássemos pelo buraquinho da fechadura e enxergássemos um mundo nebulosamente fora de qualquer realidade conhecida onde todos buscam a sua própria liberdade.
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23/09/2014

Crítica do filme: 'O Sal da Terra'



Cada um molda sua forma de ver o mundo de acordo com tudo que já viveu. O documentário que abre o Festival do RJ 2014, é uma junção entre cinema e fotografia, algo único para todos os amantes de qualquer arte. O Sal da Terra, título maravilhoso diga-se de passagem, conta a história de um brasileiro com um olhar único sobre o mundo que estudou e vive. Dirigido por Juliano Salgado (filho do protagonista) e pelo genial cineasta Wim Wenders, o documentário promete ganhar milhares de fãs mundo à fora e definitivamente trazer a luz o nome do espetacular ser humano que é Sebastião Salgado.  

Nesse impactante documentário, somos teletransportados para as lentes de um dos maiores fotógrafos do planeta, o brasileiro Sebastião Salgado. Ao longo dos últimos anos, Salgado viajou o mundo registrando dramas, emoções e apresentando para quem quisesse ver muitos problemas ao redor da Terra. Por meio de fotos instigantes, somos testemunhas de um registro único de um ser humano pra lá de especial. Sua história, começou em uma cidade do interior do Brasil chamada Aimorés, único irmão entre sete irmãs, Tião, como carinhosamente é mencionado vários vezes no filme pelo seu pai, mostra ao público como a fotografia é explicada como um alguém que escreve em luz.

Cada foto, uma história diferente. Os relatos calorosos cheios de carinho e emoção dão um significado para cada imagem que passa como se fosse um lindo carrossel na telona do cinema. O espectador se sente em um magnífico tour em uma galeria mágica com retratos, paisagens e exposições que atingem em cheio nossas emoções. O tom em preto e branco, oriundo de muitos cliques do famoso, e ex-economista, personagem principal dão um toque de perplexidade a tudo que conferimos na telona.

O Sal da Terra tudo mais é que a história do mundo por um brasileiro que conheceu o mundo. Cada depoimento tem um clima de emoção que transporta para as cadeiras dos sortudos que puderem conferir esse trabalho no cinema. Emocionante também é a narração e depoimento do grande cineasta Wim Wenders, que muitas vezes se rende em falas emocionadas ao grande protagonista desse seu novo filme. Na conclusão, podemos cravar com toda nossa emoção que viver é descobrir pessoas, afinal: as pessoas são o sal da terra! Bravo!
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21/09/2014

Crítica do filme: 'O Batismo'



A amizade desenvolve a felicidade e reduz o sofrimento, duplicando a nossa alegria e dividindo a nossa dor. Falando sobre o sofrimento mundo das escolhas e do passado que volta e meia retorna assombrando, o filme polonês O Batismo é uma aula de como deixar o público incomodado e com os olhos perplexos a todo instante. Dirigido por Marcin Wrona, esse filme conta com excelentes atuações, principalmente do espetacular ator Wojciech Zielinski que dá vida à Michal, personagem principal dessa forte história.

Na trama, conhecemos o empresário Michal (Wojciech Zielinski), um homem de gostos requintados que vive com sua linda mulher, Magda (Natalia Rybicka) e seu bebê recém nascido em um bairro de classe alta. Ele vive feliz com sua família, até que mafiosos começam a relembrá-lo de seu passado no crime. Perto do batizado de seu filho, um grande amigo de infância, Janek (Tomasz Schuchardt), chega do exército. Como as atitudes de Michal deixam margens às especulações, Janek vai em busca de informações para saber o que está acontecendo e assim é envolvido em uma história de dor e angústia onde precisará tomar uma decisão que mexerá com a vida de todos. 

São singelos 86 minutos eletrizantes de muitos dramas, escolhas e onde a arte do viver é posta em cheque a cada momento. As fortes sequências deixam o público incomodado mas com certeza faz parte da história e nada é tão gratuito assim. O espectador que conseguir se conectar à trama principal da amizade e das escolhas que todos os personagens precisam tomar, chegará a conclusão que está diante de um dos melhores filmes do ano. Não tenham dúvidas.

Lançado no ano de 2010 mundo à fora, O Batismo foi recrutado para a galeria de ótimos lançamentos da distribuidora Lume Filmes, pena que só chegou ao Brasil 4 anos depois. Com uma abertura bem pequena, e no circuito de arte Brasil à fora, o filme deve ficar pouco tempo em cartaz mas se você tiver a chance de conferir, não perca! É impactante!
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20/09/2014

Crítica do filme 'Uma Nova Chance para Amar'



Esquecer é uma necessidade. A vida é uma lousa, em que o destino, para escrever um novo caso, precisa apagar o caso escrito. Falando sobre a arte do esquecer, o diretor Arie Posin (que também assina o roteiro deste filme) cria um universo difícil de acontecer na realidade em seu novo drama Uma Nova Chance para Amar. A sorte, ou competência, foi ter chamado dois dos melhores atores da eterna Hollywood blockbusterizada que conseguem segurar todas as lacunas perdidas desse drama que pode agradar a grande parte do público. Annette Bening e Ed Harris, com uma grande harmonia em cena, realmente, fazem histórias estranhas se tornarem impactantes aos olhos do espectador.

Na trama, conhecemos a designer de interiores Nikki (Annette Bening), uma mulher que sofre durante anos pela morte prematura de seu marido em um afogamento numa praia do méxico. Anos se passam e a vida de Nikki não consegue evoluir, tudo ao seu redor a lembram de todo amor que sentia pelo marido. Certo dia, resolve ir até um museu e lá, surpreendentemente, conhece Tom (Ed Harris) que possui uma semelhança absurda com o seu ex. Sem saber como lidar com essa situação inusitada, resolve embarcar em um romance, que mais parece um triângulo amoroso, que vai mudar sua maneira de ver sua vida.

A história deste filme beira ao absurdo mas isso não é necessariamente uma coisa ruim. O espectador fica a todo instante esperando conclusões mais claras sobre como duas pessoas podem ser tão parecidas e não terem nenhum tipo de vínculo familiar. O certo é focar em como a protagonista pensa sobre tudo isso. Nikki é uma das melhores construções de personagens feita por Annette Bening nos últimos anos, muito por conta desse universo complexo criado. Ed Harris, um baita ator, consegue também passar toda a angústia que esse novo amor gera aos envolvidos. O público que conseguir se distanciar dos absurdos contidos na trama acaba se identificando com os personagens e esquece da ‘licença poética’ que o roteiro executa.

Com um lançamento modesto aqui no Brasil, o filme foi lançado perto do início de diversos festivais famosos o que vai deixar sua vida útil no circuito bem limitada. É o famoso caso de filmes que as distribuidoras precisam colocar no circuito rapidamente senão atrapalha outros lançamentos da mesma. Provavelmente leitor, você quando ler esse texto, o filme já deve estar nas locadoras. Mesmo assim, com todos esses pontos analisados, Uma Nova Chance para Amar vale muito ser conferido pelas grandes atuações de Benning e Harris. Afinal, quem não quer dar sempre uma nova chance para o amor entrar, por mais inusitada a forma como isso pode acontecer?
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