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02/02/2024

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Crítica do filme: 'A Câmara'


O estacionar a câmera num lugar onde histórias nascem a todo instante. Exibido no recorte Olhos Livres durante a Mostra de Cinema de Tiradentes 2024, o documentário brasiliense A Câmara, dirigido pela dupla Cristiane Bernardes e Tiago de Aragão, nos apresenta os bastidores do poder em Brasília através de ações e reações de algumas deputadas federais em um período perto de nova eleições. Curiosidades da direita e da esquerda são colocadas à mesa onde a interpretação do fazer política vira algo bem próximo aos nossos olhos.

Os assuntos de interesse da população, como pautas sobre educação e direitos humanos, se misturam com algumas necessidades de se posicionar para as próximas eleições, ainda dentro do governo do ex-presidente Bolsonaro. Com a câmera ligada em várias situações, inclusive num quase inimaginável cantinho de oração da bancada evangélica e embates calorosos, vamos vendo um real cenário das polarizações e uma busca constante por consenso.

Esses bastidores do poder nos mostram também algumas verdadeiras atuações e as ‘conversas’ com seus votantes através de mensagens, muito dentro do posicionamento nas redes sociais, vídeos de uns para os outros da mesma bancada, variáveis que nos levam a associar a um verdadeiro palco onde os eleitos se tornam estrelas, personagens reais dentro apenas de suas próprias narrativas.

Buscando ser um profundo recorte sobre a política brasileira através de um foco totalmente observador estático, o documentário busca se sustentar na busca pelo imprevisível, porém o olhar através do aleatório muitas vezes pode ser algo que não transmite além da superfície.


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29/01/2024

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Crítica do filme: 'Lista de Desejos para Superagüi'


Tudo mundo merece, no mínimo, o respeito. Documentário paranaense exibido na Mostra de Cinema de Tiradentes 2024, Lista de Desejos para Superagüi consegue contar uma importante história através de imagens belíssimas que passam todo o campo abstrato das emoções através de seu amplo alcance contemplativo. As denúncias de uma região abandonada, os dramas dos moradores, a realidade diferente de muitos de nós, com uma extensa pesquisa, além de todo o processo de filmagens que começou em 2018, esse documentário traça um raio-x de um lugar que respira a esperança pela volta de como era antes. Um dos melhores filmes exibidos na Mostra de Cinema de Tiradentes 2024 saindo o troféu da Mostra Aurora.

Autoral, ambientado numa Ilha do Paraná, também uma reserva federal, um lugar de pescadores artesanais, o projeto encontra seu norte através de um pescador na casa dos 70 anos chamado Martelo, um experiente homem do mar, que vem com recorrentes problemas de visão. Em busca de soluções, vai em busca de sua aposentadoria, mas pelo seu caminho as dificuldades do cotidiano se acumulam gerando uma série de reflexões que esbarram também nos dramas de outros moradores.

As imagens conversam com os temas propostos, o que é fundamental para um total entendimento. Tudo é captado em imagens repletas de beleza mas que se contrastam com as desilusões de um lugar muitas vezes esquecido. Sem fugir das características de um filme-denúncia, principalmente nos desenrolares sobre esse espaço carente de infraestrutura que se vê em dificuldade quando as pescas são proibidas nos momentos de reprodução dos peixes, Lista de Desejos para Superagui também esbarra seu olhar nas questões ambientais pela voz de quem tem muito a ensinar.

Criar uma história através de imagens nunca é algo fácil. Através dessa jornada repleta de variáveis de uma mítica ilha no litoral Sul do Brasil, o cineasta Pedro Giongo apresenta os fatos em contrastes, da solidão à união, dos desejos às desilusões. Será que há tempo para o sonhar? Imperdível documentário!

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27/01/2024

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Crítica do filme: 'Seu Cavalcanti'


O cinema como um complemento da realidade. Diante de uma certa necessidade de eternizar momentos através do cinema, o documentário Seu Cavalcanti, exibido na Mostra de Cinema de Tiradentes em 2024, é um projeto leve, descontraído, que flerta com a necessidade de eterna liberdade personificada na figura de um senhor de mais de 90 anos. Dirigido por Leonardo Lacca, produzido por Emilie Lesclaux e Kleber Mendonça Filho, o filme se consolida como uma carta de amor através de imagens e movimentos tendo a força da saudade misturada a uma inventiva imaginação.

Logo conhecemos Seu Cavalcanti, um ex-policial, já há mais de 20 anos aposentado, morador de recife, Pernambuco. Um figuraça, capaz de momentos marcantes. Assim, ao longo de um grande recorte de sua trajetória ao lado da família, vamos acompanhando suas aventuras ao melhor estilo crônicas de um cotidiano, através de imagens que seu neto sempre fazia. Com um roteiro intimista, que conta com a casualidade em confronto com o provocado, esse vovô gente boa, visto sob um olhar afetuoso de sua família pode vir a ser um dos personagens mais marcantes desse ano no cinema brasileiro.

Intimista, buscando identidade sob as pegadas do campo emocional em seus 78 minutos de projeção, possui na montagem um de seus destaques. Um dos trunfos é sempre circular sob o discurso, nunca perdendo sua referência. Uma declaração de amor, uma necessidade constante de eternizar momentos pelo cinema, o que gira ao seu redor do protagonista. Nesse liquidificador criativo, Lacca transforma a dor de uma eterna saudade em uma caixinha de surpresas para o espectador.

Sem nunca deixar de esbarrar na lembrança, um dos fortes elementos ligados ao processo criativo, o documentário experimenta os olhares através das situações que envolvem seu protagonista. Seja na formatura da neta, na tristeza de ter o fiat uno antigo roubado, ou participando de um filme, Seu Cavalcanti aos poucos se torna novamente, assim como na vida real, o protagonista de sua própria história. Criar situações e mesclar com a surpreendente captura de um momento real é um experimento que pode confundir mas nunca deixa de refletir.



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26/01/2024

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Crítica do filme: 'Not Dead'


Um dos sete filmes selecionados para concorrer ao troféu barroco dentro da competitiva Aurora da Mostra de Cinema de Tiradentes em 2024, o documentário baiano Not Dead reflete sobre a ideologia, e seus muitos olhares, de um movimento que teve seu início na década de 70 na Inglaterra e atingiu com grande força a trajetória de alguns jovens baianos que tinham um ponto de encontro, uma loja de artigos musicais e voltada ao universo punk chamada Not Dead. Ao mesmo tempo que se mistura com a concepção do próprio filme, inclusive incluindo a importante temática da acessabilidade, o trabalho do cineasta Isaac Donato encontra sua força nas novas maneiras de personagens reais ligados ao movimento punk baiano enxergarem a sociedade nos dias de hoje onde estão inseridas suas novas realidades.

Tudo começa em um edifício colonial construído em 1549 na Rua Chile, a primeira fundada no Brasil, perto da praça Castro Alves, no centro de Salvador, um lar de descobertas de parte do cenário jovem baiano de décadas atrás onde existia um lugar de encontros onde os pensamentos se alinhavam sobre os novos rumos do Punk, na linha do espírito de nunca deixar o som morrer. O discurso do projeto contorna alguns recortes para buscar ampliar os horizontes mais em cima da linha da ideologia, da indomável sensação que muitos personagens tinham de ir pra cima do que pode ser desconhecido e dentro da política do ‘faça você mesmo’.

O documentário resolve caminhar no depois sem se aproximar muito no antes, fato que atrasar o dinamismo. Assim conhecemos personagens, alguns bastante carismáticos, do cenário punk baiano que após anos nessa estrada também precisaram se virar com a parte do seu próprio sustento. Assim, aproveitaram oportunidades na marcenaria, como mototáxi, cervejeiro artesanal, mas sem nunca perderem o espírito da ideologia que acreditavam. As leituras sobre o movimento punk e a importẫncia social se chocam nessa superficial análise do antes e uma profunda do depois, na descrença de alguns pontos e um novo olhar para outros dentro dessa ideologia repleta de interpretações.

Um fator interessante por aqui é que o longa-metragem de pouco mais de 70 minutos traz para o espectador o assunto da audiodescrição dentro do audiovisual, personificada em um representante importante do movimento punk baiano que tem deficiência visual instigando novos olhares para dentro de uma mesma obra. Diretor do intrigante Açucena, Isaac Donato se consolida como um diretor com total domínio dos assuntos que aborda tendo muito a oferecer aos amantes da sétima arte.



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25/01/2024

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Crítica do filme: 'Maças no Escuro'


A oportunidade de ser quem você quiser. Buscando uma nova forma de olhar para a trajetória de um dramaturgo que flerta muitas vezes com o insucesso, o longa-metragem paulista Maçãs no Escuro, selecionado para a Mostra Aurora na Mostra de Cinema de Tiradentes 2024, utiliza curiosos pedaços imaginativos dentro de um recorte contemplativo, muitas vezes cômico, de um homem na fase final da vida ainda completamente absorvido pela sua arte. Dirigido, roteirizado e montado por Tiago A. Reis, acompanhamos muitos significados sem significados dentro de uma brincadeira com a linguagem e o que é real.


Assim, acompanhamos a história de Edson Aquino, uma figuraça, criador da trupe paulista de teatro Arruaça, com mais de três décadas de palcos, que acaba tendo sua vida contada por um grupo de jornalistas estrangeiros, que querem saber mais sobre sua carreira e feitos. Ao longo das quase duas horas de filme, vamos percorrendo o campo emocional através de diálogos distantes, cortes secos, que fazem parte de um roteiro que as vezes parece sem direção mas com um discurso que caminha com dinamismo dosado por uma narrativa que contempla experiências.


Imaginativo, Maças no Escuro se distancia dos conflitos deixando na superfície os desabafos, desilusões, tristezas, falta de esperança de personagens que parecem viver dos sonhos de uma vida onde no dia seguinte tudo vai se resolver. O protagonista e seus amigos de trupe se misturam em longos debates sobre os rumos do que fazem e as memórias de anos dedicados à arte. Isso tudo junto e misturado, em cena parece documentário, veste a camisa do experimental e todas as suas infinitas possibilidades trazendo novos olhares para essa história.


Mais estranho que a ficção. Muitas vezes não sabemos se o que estamos vendo é real ou mentirinha. E isso é muito legal! O filme assume seu lado experimental com eficácia, logo deixando o espectador à mercê de possibilidades na próxima cena, dentro de desfocadas e a tal da ampliação do campo de reflexão do espectador. Instigante, busca com seu carismático protagonista, um bem resolvido e humorado forrest gump da cena teatral, o equilíbrio de uma total declaração ao mundo das artes e suas possibilidades.


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23/01/2024

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Crítica do filme: 'Eu Também não Gozei'


Um dos sete filmes selecionados para a Mostra Aurora, dedicada à novos diretores, dentro da 27a Mostra de Cinema de Tiradentes, o documentário paulista Eu Também não Gozei foca suas reflexões na maternidade, ampliando olhares sobre a questão através de uma busca pela história do próprio filho recém nascido. O projeto, que demorou seis anos para ser feito, utiliza em sua narrativa um vai e vem na linha temporal, ação que encontra um dinamismo, além de um leque de situações que passa a protagonista em busca de sua própria forma de enxergar esse momento marcante da vida.


Os olhos são guiados para Letícia, uma jovem artista moradora da cidade de São Paulo que está grávida do primeiro filho. Sem saber quem é o pai da criança, passa por um intenso processo de mudanças em sua rotina, na espera de alguma resposta sobre essa questão. A partir da ausência desse desconhecido pai, começa a entender sua importância no papel de mãe mesmo envolta de uma solidão persistente. O antes e o depois nos mostram os pontos de equilíbrio alcançados nessa profunda e emocionante história sobre as mudanças que chegam através da pulsação de uma nova vida.


Dirigido por Ana Carolina Marinho, o documentário de pouco mais de 90 minutos parte da ausência, da negação, para construir sua vitrine de emoções onde o medo ligado à incerteza é uma variável presente a todo tempo. Com filmagens realizadas pela diretora e pela própria protagonista, percebemos que as dúvidas sobre o futuro ajudam a abrir os olhares para situações que envolvem a maternidade chegando inclusive a uma jornada de reflexões sobre a própria história da personagem principal.


Reunindo diversas situações que Letícia passa durante esse processo, um fato marcante é na hora do registro da criança e logo depois as questões jurídicas de uma inacreditável não aceitação de teste de paternidade. Esse último ponto chega para se refletir sobre as leis e um direito criado por homens para homens que se distancia de questões morais e que não reflete sobre o que passam as mulheres.


Para certas situações na vida, não existe preparo, nem ensaio. Eu também não Gozei utiliza o cinema e sua linguagem como um porta-voz de uma história que podem ser igual ou parecida de muitas outras mulheres.


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22/01/2024

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Crítica do filme: 'YVY Pyte – Coração da Terra'


A sabedoria guarani através de imagens e movimentos. Com uma emocionante narrativa que flerta com a poesia, o documentário mineiro YVY Pyte – Coração da Terra nos leva para uma jornada de redescobertas de um personagem central em pleno voo livre e sem fronteiras para seu lugar de origem. Percorrendo 11 territórios indígenas do Brasil e do Paraguai, nesse road movie indígena, vemos um alguém com muito a descobrir que acaba se tornando um simbólico porta-voz da resistência guarani. Em sua busca, entre outras questões, chega-se a importantes reflexões sobre elementos da natureza e suas mensagens culturais.


Romper as barreiras que os anos e a ação do homem branco impôs de forma covarde é um dos objetivos dessa pequena pérola. Através da sua própria história, conhecemos um personagem com raízes indígenas que se vê em um presente estacionado nas fronteiras que dividem. E nada melhor que o cinema, um dos maiores pilares de qualquer noção de sonho coletivo, através da imagem, logo chegando na imersão, culminando em uma história que precisa ser contada pois todos nós podemos também aprender.


Há uma reflexão interessante sobre os indígenas e os homens brancos quando pensamos nas formas de pensar o individual e o coletivo. Essa talvez seja a questão que mais chama a atenção pois logo que pensamos sobre, traçamos paralelos sociais, algo próximo da realidade de muitos que fazem o exercício de olhar pelas suas próprias janelas.


O projeto, não é nada redundante no seu discurso mas é preciso prestar a atenção e embarcar nessa viagem junto com o personagem. Funcionaria melhor como uma minissérie documental? Sim, mas o vasto material é tão cheio de ensinamentos que os detalhes se tornam importantes por aqui, talvez por isso a narrativa não consiga encontrar um equilíbrio para o dinamismo. Para alguns, pode ser tornar cansativo mas pra quem dá uma chance, o filme pode ser uma obra que pode marcar suas memórias.


Há muita riqueza no material, que ainda conta com uma fotografia deslumbrante. Através de um caminho cheio de estradas e lugares que ficaram quase isolados acoplados na necessidade de uma pausa no tempo, longe dos avanços e mais próximos das suas próprias origens e ensinamentos, YVY Pyte – Coração da Terra se torna um ensinamento para todos que quiserem abrir os olhos.


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Crítica do filme: 'Terror Mandelão'


Quem não é visto, não é lembrado. Logo nos primeiros dias de exibições da 27a Mostra de Tiradentes de Cinema foi exibido um documentário paulista que busca ampliar as reflexões sobre um gênero musical pulsante e também polêmico, o funk. Sempre com o andamento rítmico marcante de plano de fundo, o primeiro filme da dupla de diretores Felipe Lorozza e GG Albuquerque, Terror Mandelão, com seus curtos 75 minutos, se desenvolve a partir do olhar de alguns personagens que acabam sendo uma voz representante dos jovens da periferia que lutam para viver dos seus sonhos dentro do concorrido mercado fonográfico.


Se fossemos dividir o filme em duas partes, podemos dizer que a narrativa costura seu pontapé inicial através de um resumo geral sobre Dj K, um jovem que luta para conseguir um espaço no cenário do funk paulista, dentro do subgênero dos bailes intitulado por bruxaria, e que começa a colher os frutos de mais de uma década nesse caminho. As influências, a busca pelo seu próprio olhar dentro do Funk, as incertezas, os dilemas e principalmente o processo criativo são vistos dentro de uma espécie de resumão. Esse último ponto, o processo criativo, acaba deixando essa primeira parte do documentário algo como uma vídeo aula sobre um subgênero do Funk que possuem letras fortemente ligados ao sexo.


A segunda parte é bem mais dinâmica pois os holofotes se jogam na ascensão, depois dos altos e baixos na carreira. A primeira viagem internacional, os convites para começarem a trilhar o cenário europeu, a real validação de que podem enfim viver da música depois de muita luta. Sempre ao lado de seu simbólico boné de crochê o Dj K é a grande alma dessa narrativa que tem o mérito de a partir de seu personagem principal chegar até as introduções sobre uma visão macro que mistura sonhos, dedicação e também pitadas de sorte.


O filme também chega, mesmo que seja de forma superficial, até as polêmicas que contornam as letras com forte teor sexual. A visão dos personagens é bem objetiva sobre o tema, não se veem presos dentro de qualquer linha de absurdo. Há muitas reflexões, debates construtivos, que podem surgir a partir disso. Terror Mandelão mostra que o cinema pode ser uma ferramenta importante para a sociedade refletir sobre muitas vozes que tem sonhos mas que nunca sabem se vão chegar até eles.



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