04/06/2016

Crítica do filme: 'Um Belo Verão'



Tão bom morrer de amor e continuar vivendo. Dirigido pela cineasta francesa Catherine Corsini, do ótimo Partir (2009), Um Belo Verão, que faz parte da programação do Festival Varilux de Cinema Francês 2016, é um filme que fala sobre a luta das mulheres na década de 70 e um amor que nasce ingênuo e vira uma página importante na história das envolvidas. Um dos grandes destaques do longa-metragem é o belo roteiro assinado pela dupla Catherine Corsini e Laurette Polmanss que consegue com maestria dominar a atenção do público contando sempre com a ajuda de uma singela dose de empatia das ótimas personagens. 

Na trama, acompanhamos a trajetória da jovem Delphine (Izïa Higelin), filha única que vive no interior da França com seu pai e sua mãe. Certo dia, resolve abandonar sua família para descobrir o mundo em uma Paris no ano de 1971, lugar onde está passando por uma época de transformações intensas ligada à liberdade sexual e ao feminismo. Assim que chega na capital francesa, logo se aproxima de uma grupo de mulheres que lutam pelos direitos das mesmas, fazendo inúmeros protestos e invadindo conferências sobre temas polêmicos. Uma das líderes do grupo é Carole (Cécile De France), uma bela mulher que vive com seu namorado Manuel. Com o passar do tempo, Delphine e Carole vão se aproximando e acabam de apaixonando intensamente, provocando uma série de conflitos para ambas. 

Um Belo Verão se sustenta na força do amor. Fala com garra e inteligência sobre a força das mulheres em sua constante luta de igualdade de direitos. Entre esses dois universos, o do amor e o da luta feminina, giram as ótimas personagens interpretadas pela excelente atriz belga Cécile de France e pela jovem francesa Izïa Higelin. Delphine é uma jovem que sempre ajudou seu pai nos trabalhos na fazenda onde mora. Quando descobre Carole, uma mulher independente, pra frente, com muita atitude e delicadamente bela se entrega completamente a uma paixão cercada de preconceito e dúvidas em relação à liberdade desse amor. Carole descobre sua sexualidade com Delphine, se entrega e se apaixona como nunca antes fizera, vive a cada dia tentando mostrar ser merecedora do amor de Delphine. O conflito entre as duas acontece por conta da fragilidade nas atitudes de Delphine que tem muito medo do que os outros vão pensar se descobrirem sobre elas.

Se o final é triste ou não, não vou dizer. Mas acredito muito que esse belo trabalho deixa em nossa memória uma linda mensagem sobre como viver. A liberdade, a igualdade, pontos importantes na ideologia francesa ao longo das décadas, são fundamentais para que tenhamos o livre arbítrio de respirar as experiências de vida que achamos as mais felizes para nossa existência.
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02/06/2016

Crítica do filme: 'Agnus Dei'



Não é preciso que a bondade se mostre mas sim é preciso que se deixe ver. Com uma direção muito competente e segura da cineasta Anne Fontaine, um dos grandes destaques do Festival Varilux de Cinema 2016, Agnus Dei, é um filme que comove do início ao fim. Baseado em fatos reais ocorridos em uma Polônia cheia de problemas por conta da Guerra, o longa-metragem possui um roteiro envolvente e atuações acima da média que chega ao brilhantismo quando aborda o conflito da fé.  

Na trama, voltamos à Polônia no ano de 1945. A fria enfermeira Mathilde Beaulieu (Lou de Lâage) trabalha como assistente de medicina em um posto da Cruz Vermelha. Certo dia, uma misteriosa freira procura por ajuda de algum médico no posto, a única que se mexe para ajudar é Mathilde que acaba descobrindo que soldados soviéticos violentaram algumas mulheres no covento e que muitas dessas estão grávidas. Tentando ajudar a qualquer custo, a corajosa enfermeira enfrentará a todos para ajudar as freiras.

Protagonizado pela belíssima atriz Lou de Laâge, que encantou os cinéfilos com sua atuação no excelente Respire (2014), Agnus Dei, começa com um primeiro ato um pouco morno, demora um pouco para se encaixar. Nesse primeiro quadrante encontramos uma Polônia devastada pela guerra, com órfãos jogados pelas ruas e por uma estranha força militar soviética que assombra a região onde está o posto da Cruz Vermelha. O segundo ato, foca no conflito pessoal da enfermeira protagonista com as regras impostas pela irmã chefe, por conta do ocorrido, dentro do covento. Nos atos seguintes, o desenvolvimento das ações e conclusão dos fatos são feitos de maneira mais homogênea pois utilizam os conflitos da fé como interseção. 

Les Innocentes, no original, não é um filme fácil. Ao longo dos quase 120 minutos de projeção, vamos navegando nas histórias tristes que as grandes guerras produziram durante todos os anos de conflito. Tem que ter um coração forte, é um poderoso drama com muitos momentos emocionantes.  
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Crítica do filme: 'Marguerite'



Os gritos de uma angústia sonhadora. Selecionado para o Festival Varilux de Cinema Francês 2016, o drama Marguerite é uma longa-metragem deleitável, que possui interpretações fantásticas. Década de 20, França, em uma época onde Chaplin andava por Paris, dividido em capítulos, atos, Marguerite possui um roteiro muito bem estruturado e uma direção detalhista muito perto da perfeição. Essa é uma vantagem em ter um diretor autoral na condução de uma obra tão complexa. Méritos do cineasta Xavier Giannoli que com certeza, com este trabalho, vai ganhar um espaço na memória dos cinéfilos.

Inocente, sonhadora, indomável. Marguerite, interpretada pela fabulosa Catherine Frot, é uma mulher deveras interessante, louca por ópera, milionária, vive em quase total reclusão em um casarão longe do agito do centro da capital francesa. Sua vida consiste em sonhar, projetar e realizar pequenas apresentações em um limitado círculo de amigos da alta sociedade francesa. A questão é que a personagem principal, que exala uma dose exorbitante de carisma em cada sequencia, canta completamente desafinada e suas performances são camufladas pelo orgulhoso círculo de amigos.

Analisando um lado importante da personagem principal, o psicológico, o ato de se apresentar a tira da loucura e de seus intensos pensamentos tristes, a arte se torna uma blindagem a qualquer tipo de sentimento ruim. Marguerite é incompreendida em sua essência durante todo o tempo, somente seu simpático mordomo Madelbos a ajuda em suas deliciosas e surpreendentes apresentações. Porém, com sua bondade e porque não dizer simplicidade, acaba conquistando a quase todos que a conhecem. 

A transformação do marido também é feita de maneira bela e inesperada. Antes, um envergonhado, traidor e infeliz parceiro vai aos poucos se tornando um porto seguro às ações da protagonista, vira quase um protetor dos sonhos de sua esposa. O personagem se vê em uma guerra entre a vergonha e o sonho. E assim, chegamos a grande pergunta que o filme está envolvido: Quem de nós possui um coração puro o suficiente para julgá-la?
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14/05/2016

Crítica do filme: 'Rua Cloverfield, 10'

Nossas vidas são definidas por momentos. Principalmente aqueles que nos pegam de surpresa. Debutando em um longa-metragem, o cineasta Dan Trachtenberg resolve aceitar um projeto que tem sua essência no pânico psicológico e nas arrepiantes linhas fortes do roteiro. Rua Cloverfield, 10 tinha tudo para ser bem comum mas conforme os minutos vão passando (e nem vamos percebendo), a trama começa a ganhar uma consistência impressionante deixando os olhos do público vidrados em cada detalhe deste criativo quebra-cabeça com resoluções para lá de surpreendentes. O filme deve agradar não só quem curte filmes de mistério, mas filmes de terror e ação também.

Na trama, conhecemos rapidamente a bela Michelle (Mary Elizabeth Winstead) que dirige meio que sem destino por uma via expressa norte-americana, até que uma caminhonete bate na traseira do carro dela causando um acidente. Horas depois a protagonista está presa em um quarto e logo é surpreendida por Howard (John Goodman) um ex-militar que avisa Michelle que o mundo está dominado por forças extraterrestres e que é para ela nunca sair dali. Completamente perturbada com tantas situações e informações chocantes, Michelle terá que ter muita confiança para tomar as decisões corretas.

O roteiro, também assinado pelo indicado ao Oscar Damien Chazelle (Whiplash), é alma do filme. O primeiro ato é bastante sombrio e muitas vezes parece que estamos entrando em uma das experiências de Jigsaw (Jogos Mortais), os personagens estão frios mas delicadamente deixam algumas pontas soltas para a resolução no ato seguinte. Já no segundo ato, algumas surpresas são apresentadas e o roteiro opta em apresentar argumentos para os dois caminhos que a trama deve seguir e fica girando em torno da questão: ‘Howard está mentindo?’, com brilhantismo e muita força em cena os atores crescem muito o clima de tensão da história. O último ato, que chamo de terceiro, preenche todas as respostas que a protagonista tinha e vai surpreender demais o público.

O que mais surpreendente no filme, além do terceiro ato que é simplesmente sensacional, é a forma como os atores compõem seus personagens sempre deixando uma margem para dúvida no espectador. John Goodman está impecável na pele do intrigante Howard, completamente sério e misterioso, bem distante do Goodman de papéis que sempre vemos em muitas comédias. A protagonista Mary Elizabeth Winstead também consegue passar toda a angústia que sua personagem sofre, tanto fisicamente quanto psicologicamente. A dupla é uma das grandes responsáveis pelo excelente desenvolvimento da trama.


Rua Cloverfield, 10 passou um pouco desapercebido pelo circuito mas não deixem de acreditar, é um belo filme que vai surpreender demais você. 
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04/05/2016

Crítica do filme: 'Vampiro 40 Graus'

Quando existe risco na coincidência, o bicho pega. Vampiro 40 Graus corta o Rio de Janeiro para contar uma saga brutal sobre vampiros e suas inquietações vivendo em um planeta consumido pelo poder e fúria. Dirigido por Marcelo Santiago, o longa-metragem é baseado em uma série chamado Vampiro Carioca exibida pelo Canal Brasil por três temporadas, e também inspirada no livro As Aventuras do Vampiro Carioca da psicanalista e escritora Lucia Chataignier.

O filme brinca e fala sério sobre as angústias de nossa existência, não deixando de ser uma grande homenagem a filmes do gênero, fantásticos, que usam e abusam da originalidade, além da evidente força das sequências que chamam a atenção desde o início. O uso do ser Vampiro é fundamental para que a trama possa se criar e se recriar trazendo todos seus questionamentos embutidos no universo eternizado por John Carpenter e outros.

Canino chip, Máscaras enigmáticas, uso de uma estética original com forte presença de traços de quadrinhos ao melhor estilo Sin City,  substâncias que estimulam o organismo, personagens misteriosamente brutais, um ar sexy que vão do prazer ao poder em segundos. O longa-metragem, que terá estreia nacional no dia 02 de junho, possui sua própria identidade, escondida nas curiosas linhas de um roteiro aterrorizante mas que servem de paralelos com o universo real, de nossa própria existência.


Vampiro 40 Graus é um filme corajoso que segue fiel em sua narrativa visceral. Há uma sensualidade usada como quebra de paradigmas, é o poder do livre-arbítrio que o cinema ano pós ano consegue, não só lá fora mas aqui no Brasil também.
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Crítica do filme: 'De Amor e Trevas'

Apenas em torno de uma mulher que ama se pode formar uma família. Escrito, dirigido e protagonizado pela atriz israelense Natalie Portman, De Amor e Trevas é um filme forte que explica bastante sobre uma região conflituosa de nosso planeta. O trio principal em cena dá um show de elegância e força de atuação, prende a atenção do espectador a todo instante. Excelente estreia de Natalie Portman na direção de um longa-metragem.

Na trama, conhecemos um jovem menino que vive com sua família durante a guerra em Jerusalém. Aos olhos do pequeno Amos vamos conhecendo as profundezas de sua trajetória marcada pelo abalo emocional de sua mãe Fania Oz (Natalie Portman) e as dúvidas e incertezas que pairam sobre seu pai Arieh Oz (Gilad Kahana). Após uma tragédia que abala sua família, Amos resolve seguir seu caminho sozinho e se torna uma pessoa de expressão na vida política do lugar onde vive.

Há um pouco de Mallick, metáforas belíssimas sobre as tão imensuráveis emoções. A trilha sonora desliza sobre os impactantes arcos do roteiro escrito pela própria Natalie Portman, baseado em memórias de Amos Oz.  Pelo contexto familiar , vamos conhecendo mais sobre a história mundial, por conta do contexto forte externo que impacta na vida desses que sofreram com horrores de guerras entre homens.


O roteiro é excelente. Em seu primeiro ato, a história nos apresenta seus personagens, o cotidiano e referências que fazem uma inteligente ponte com as sequências da trama. O segundo ato mescla as diversas tentativas de serem uma família em meio a uma guerra sem fim, já começa a colocar o filme em um plano profundo de descobertas, ações e consequências. O terceiro ato é o mais profundo pois aborda as consequências psicológicas da mãe que causa um grande rompimento familiar.  Ao final do longa-metragem, muitos vão se emocionar, principalmente quem conseguir criar paralelos e se aproximar desta bela história.
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