07/08/2021

E aí, querido cinéfilo?! - Entrevista #501 - Olivia Batista


O que seria de nós sonhadores sem o cinema? A sétima arte tem poderes mais potentes do que qualquer superman, nos teletransporta para emoções, situações, onde conseguimos lapidar nossa maneira de enxergar o mundo através da ótica exposta de pessoas diferentes. Por isso, para qualquer um que ama cinema, conversar sobre curiosidades, gostos e situações engraçadas/inusitadas são sempre uma delícia, conhecer amigos cinéfilos através da grande rede (principalmente) faz o mundo ter mais sentido e a constatação de que não estamos sozinhos quando pensamos nesse grande amor que temos pelo cinema.

 

Nossa entrevistada de hoje é cinéfila, de Cachoeiro de Itapemirim (Espírito Santo). Olivia Batista tem 37 anos. Formada em Letras, pós-graduada em Filosofia, cresceu em uma cidade pequena e passou a infância e adolescência, literalmente, na frente da TV assistindo aos filmes. Fez seus trabalhos de conclusão de curso e pós-graduação sobre o uso do cinema na educação. Com o início da pandemia, criou, juntamente com três amigas, um clube do filme: 3x4 Filmes – 3 filmes por semana, 4 amigas juntas, e foi quando teve a oportunidade de começar a escrever uma coluna semanal sobre cinema. Sua intenção sempre foi escrever sobre os filmes de uma f o r m a d i s t a n t e d o m o d e l o d e c r í t i c a cinematográfica - tenta aproximar os filmes da sua história de vida, da relevância afetiva que eles têm para ela - são textos essencialmente subjetivos. Também procura escolher, para as colunas, filmes que possam se relacionar com algo que esteja sendo vivido ou debatido, naquele momento, pela sociedade - buscando, com isso, que o cinema possa ser um ponto de partida, uma ponte que permite pensar o ser humano e nossa realidade de uma maneira poético-filosófica amparada pela arte cinematográfica. Escreve sobre cinema para: @bemditojor e @diaadiaes.com.br .

 

1) Na sua cidade, qual sua sala de cinema preferida em relação a programação? Detalhe o porquê da escolha.

Moro em uma cidade que, nos últimos anos, cresceu em número de habitantes, mas que continua essencialmente interiorana. Só temos dois cinemas do mesmo grupo - são salas voltadas para o cinema comercial, que raramente trazem algo fora desse estilo. São cinemas do shopping, somente. Por isso, não tenho uma sala de cinema preferida.

 

2) Qual o primeiro filme que você lembra de ter visto e pensado: cinema é um lugar diferente.

Acho que foram dois momentos: a primeira vez que fui ao cinema é o primeiro deles. Eu fui com a escola, quando tinha 11 anos, assistir Pocahontas. Toda aquela cerimônia coletiva me marcou muito; a fila para comprar o ingresso, a expectativa para escolher um lugar (até hoje, ainda sinto o mesmo frio na barriga para escolher aonde sentar), o apagar das luzes, a música que tocou antes do filme quando a tela se acendia. E, anos depois, quando eu tinha 18 anos e participava de um grupo de teatro da minha cidade e a prefeitura emitiu uma carteirinha chamada “Amigos da Cultura”, para atores, atrizes, diretores, músicos, enfim, agentes culturais - e com essa carteirinha não pagávamos para ir ao cinema nem ao teatro. Eu me sentia extremamente importante de chegar ao cinema e mostrar minha carteira. E o primeiro filme que fui assistir com ela foi Homem-aranha, em 2002.

 

3) Qual seu diretor favorito e seu filme favorito dele?

Kleber Mendonça Filho - Aquarius.

 

4) Qual seu filme nacional favorito e porquê?

Aquarius. O filme é incrível por vários motivos, mas minha escolha é puramente emocional. Me identifico com Clara - personagem de Sônia Braga - e a forma como a história mostra um Brasil que não existe mais, pelo menos não na minha cidade e na minha realidade, e isso me emociona muito.

5) O que é ser cinéfilo para você?

É construir minha própria identidade através dos filmes que assisti. É me ver como pessoa, entender a sociedade ao meu redor e experimentar os afetos e as relações humanas com a presença constante e relevante dos filmes.

 

6) Você acredita que a maior parte dos cinemas que você conhece possuem programação feitas por pessoas que entendem de cinema?

Acredito que não. Na minha visão pessoal, são empresas, e as escolhas de quais filmes colocar em cartaz, horários, promoções são orientadas para a manutenção lucrativa de um negócio. Talvez eles entendam de como manter a “empresa cinema” em uma cidade pequena (falando da minha realidade) não acredito que exista essa preocupação voltada para uma curadoria de filmes, ou com o cinema enquanto arte.

 

7) Algum dia as salas de cinema vão acabar?

Penso que não. Mas, da forma como eu vejo, a experiência de ir ao cinema vem se transformando: o cinema de rua, com filas nas calçadas, pipoqueiro na porta vendendo a um preço acessível, isso não existe mais. Existiam cinemas na minha cidade, nos anos 90, que ficavam exatamente nos pontos de ônibus - e os horários de início e fim das sessões traziam uma movimentação linda para aquelas ruas. Muita gente que nem tinha planejado entrar e ver um filme acabava mudando de ideia. Era uma experiência coletiva, interpessoal. Hoje, os cinemas estão longe dos olhos e do cotidiano de muita gente, escondidos dentro de shoppings e, na minha cidade, esses shoppings são em regiões que são complicadas de chegar usando transporte público - para alguém saber quais filmes estão em cartaz é preciso acessar a internet - e, além disso tudo, as entradas são muito caras. Então, respondendo diretamente à pergunta, não acredito que as salas de cinema irão acabar, mas acho que vão se tornar, a cada dia mais, uma “experiência” de luxo, inacessível à uma grande parcela da população. Com salas investindo em conforto, tecnologia - porém, esvaziando cada vez mais a qualidade e a relevância artística dos filmes escolhidos para entrarem em cartaz.

 

8) Indique um filme que você acha que muitos não viram mas é ótimo.

Fahrenheit 451 - 1966, dirigido por François Truffaut.

 

9) Você acha que as salas de cinema deveriam reabrir antes de termos uma vacina contra a covid-19?

Não. Inclusive, conversei sobre isso com uma amiga, durante o debate que se desenrolou sobre a abertura das igrejas, mesmo com números altos de casos e mortes por COVID, acredito que em abril desse ano. O que eu disse, à época, é o que eu ainda penso: o argumento usado era de que a experiência da fé (indo às igrejas) seria importante para as pessoas religiosas passarem por esse momento difícil de pandemia. Ora, eu não sou religiosa, mas a experiência do cinema também seria importante pra mim, durante esse período. Assim como shows, para quem precisa da música, eventos esportivos, para quem precisa de vibrar e acompanhar esportes. Então, pra mim, a segurança da vida vem antes de todas essas nossas necessidades. E a atitude segura seria manter todos os “templos” fechados.

 

10) Como você enxerga a qualidade do cinema brasileiro atualmente?

Eu gosto do que tem sido feito, porque o cinema brasileiro resiste, apesar de “tudo isso aí, talkey?” Porém, ainda acho que existe uma visibilidade e um espaço excessivo que é dado aos filmes que parecem novelas.

 

11) Diga o artista brasileiro que você não perde um filme.

João Miguel - ator e Karim Aïnouz - diretor.

 

12) Defina cinema com uma frase:

Cinema é sobre as pessoas nos filmes, é sobre as pessoas com quem assistimos aos filmes e é dessa forma que será - mais completamente - sobre nós mesmos.

 

13) Conte uma história inusitada que você presenciou numa sala de cinema.

Foram muitas! Mas acredito que uma que é especial foi quando fui assistir Kill Bill Vol.1 com um amigo. Nós estávamos pilhados de expectativas pra esse filme, o primeiro Tarantino que assistiríamos no cinema. Fomos à estreia e o filme começou a ser exibido de cabeça pra baixo. A gente se achava muito “cult”! Na época, eu tinha 19 anos. E começamos a falar que o cara (o Tarantino) era genial mesmo, que aquilo era vanguarda demais. Até que o filme parou e depois recomeçou com a imagem “de cabeça pra cima”, ou seja, tinha sido só um erro do projecionista. E a gente ficou com tanta vergonha o resto da sessão que o rosto até queimava. Hoje, virou uma piada contar sobre esse dia e, depois dessa bola fora, a gente ficou bem mais humilde pra apreciar e comentar sobre os filmes que amamos.

 

14) Defina 'Cinderela Baiana' em poucas palavras...

Fiquei sabendo da existência desse filme com essa pergunta ...

 

15) Muitos diretores de cinema não são cinéfilos. Você acha que para dirigir um filme um cineasta precisa ser cinéfilo?

Penso que não. Muitos deles podem encarar a atividade como uma profissão e não uma paixão. Não sei, talvez viver a indústria do cinema por dentro pode gerar sentimentos diferentes em pessoas diferentes.

 

16) Qual o pior filme que você viu na vida?

A forma da água.

 

17) Qual seu documentário preferido?

Estou me guardando para quando o carnaval chegar - 2019 e A marcha dos pinguins - 2005.

 

18) Você já bateu palmas para um filme ao final de uma sessão?

Sim. Foi em 25 de dezembro de 2003 - ao final de O Senhor dos Anéis - O retorno do rei. Foi uma sessão mágica, assisti com meu namorado e muitos amigos. Chegamos ao cinema horas antes, para conseguir ingressos para a estreia. A plateia inteira de fãs e ninguém saiu da sala, depois de mais de três horas de filme. Muita gente chorou, inclusive eu, e as palmas eram tanto para a finalização da trilogia, quanto para aquele momento que vivemos em conjunto.

 

19) Qual o melhor filme com Nicolas Cage que você viu?

Eu evito de assistir filmes com Nicolas Cage. Isso responde à pergunta?

 

20) Qual site de cinema você mais lê pela internet?

Cinema em Cena.

 

21) Qual streaming disponível no Brasil você mais assiste filmes?

Netflix em família. MUBI para cinema cinema mesmo.