22/01/2025

Crítica do filme: 'Vítimas do Dia'


Um recorte das dores de uma cidade marcada pela violência. Disponível com exclusividade no Globoplay, o drama Vítimas do Dia é mais uma obra audiovisual que traz a guerra imposta em muitos cantos da cidade do Rio de Janeiro, sob o ponto de vista de dois personagens, que representam de inúmeras formas o choque entre a expectativa da vida e a possibilidade da morte em uma cidade marcada pela violência. Esse retrato comovente que mostra através da tensão a realidade, atravessa também o amor, a compaixão e o afeto através de um ótimo elenco.

O motorista de aplicativo Elder (Amaury Lorenzo) estava em uma noite comum na sua rotina. Chegando em casa, no subúrbio do Rio de Janeiro, após trabalhar o dia todo, vai ao supermercado comprar um item desejado pela esposa Daiane (Jéssica Ellen), grávida. Chegando no lugar, é atingido por uma bala perdida. Em meio a um intenso tiroteio, precisa aguardar atendimento, sendo amparado por frequentadores e funcionários do estabelecimento. Em paralelo, Daiane sem saber notícias do marido, acaba entrando em trabalho de parto e tem dificuldades de sair de casa pois a violência também bate em sua porta.

Com direção de Bruno Safadi e roteiro de Dino Cantelli, Vítimas do Dia apresenta de forma emocionante uma noite como tantas outras já vividas por muitos moradores do Rio de Janeiro, uma amostra do reflexo do cotidiano do carioca. Pelos jornais e até mesmo por histórias nem contadas, sabemos o barril de pólvoras que marcam o cotidiano do carioca, uma cidade dominada por guerra urbanas imparáveis, onde a pessoa sai de casa e não sabe se volta. Tendo esse contexto bem amarrado, a narrativa apresenta através de um intenso drama diversos olhares sobre a situação.

Em cerca de 80 minutos de projeção - nesse que é o terceiro longa-metragem do Núcleo de Filmes dos Estúdios Globo - as dores da violência acabam encontrando refúgio no campo da humanidade. O afeto e o amor abrem espaço para ótimos personagens coadjuvantes darem sua contribuição e visão a essa história. A fé representada por uma nova gerente que descobriu uma gravidez, uma cliente do supermercado com marcas no passado, outra que fica de frente na ajuda para Elder, uma policial que se solidariza com o momento de Daiane, são alguns dos ótimos personagens que ajudam a contar essa história.

Drama urbano que percorre horas em uma noite, tendo apenas dois cenários, Vítimas do Dia consegue preencher as lacunas de seu discurso através do começo, meio e fim de situações ligadas entre a vida e a morte sem deixar de plantar reflexões por todos os lados através de críticas sociais certeiras.

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Crítica do filme: 'Sol de Inverno'


As relações humanas e as estações do ano andam de mãos dadas num filme que apresenta um retrato poético sobre o observar e suas conclusões. Selecionado para a mostra Um Certo Olhar no último Festival de Cannes, o delicado drama japonês Sol de Inverno atravessa um interessante recorte de três pessoas completamente diferentes tendo a referência como elemento que se chega até um despertar.

Numa das 14.125 ilhas geladas do Japão encontramos três personagens que através de um objetivo passam por reflexões sobre a própria vida. Um garoto chamado Takuya (Keitatsu Koshiyama) pratica Hockey mas se fascina pela patinação artística, ajudado pelo professor e ex-atleta Arakawa (Sousuke Ikematsu) começa a treinar junto de Sakura (Kiara Takanashi), uma garota prodígio desse esporte, para uma competição em duplas. Mas algo entre as alegrias, imaturidade e olhares curiosos podem ser obstáculos no forte vínculo criado.

Escrito e dirigido por Hiroshi Okuyama, esse é um filme que acontece no estático, num nada previsível vazio existencial que acaba indo de encontro aos personagens. Tentar traduzir o profundo das emoções - com margens para interpretações - é um dos pontos bem lapidados de um roteiro que possui um discurso que anda pelas estradas da melancolia sem se perder. A narrativa é ponderada, sua força acontece muitas vezes num olhar, num gesto, elementos que ganham intensidade no campo do refletir.

Sobre as águas do oceano pacífico, as relações humanas encontram as várias formas de enxergar situações personificado pela força do sentido das estações do tempo. Assim, logo chegamos no preciso que essa trama nos traz, o elemento que é a interseção dos três personagens, a referência, como ponto que se chega até a paixão e incertezas. No centro de tudo, Arakawa é o vértice que representa os encontros e desencontros, ligando todos os personagens.

Sol de Inverno é uma obra sobre pessoas e suas percepções sobre os próprios sentimentos que se apresentam em conflitos circulando – entre dúvidas e imaturidade - as emoções de gestos carinhosos, as riquezas das amizades, com as dores de preconceitos.


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18/01/2025

Crítica do filme: 'O Assassino do Calendário'


O abismo e as reflexões. Lançado na Prime Video nesse início de 2025, o suspense alemão O Assassino do Calendário nos apresenta peças embaralhadas num suspense que tem como estrutura base fortes reflexões sobre a violência doméstica. Partindo da tensão criada por ações de um serial killer inescrupuloso que coloca em dilema suas vítimas, partimos para um forte drama tendo dois personagens que não se conhecem no epicentro dos acontecimentos durante horas de um dia cheio de variáveis. A direção é de Adolfo J. Kolmerer.

Amargurada por anos de sofrimento e sem saber o que fazer quando é ameaçada pelo conhecido Assassino do Calendário, Klara (Luise Heyer) está à beira de um precipício emocional e acaba entrando em contato com um telefone que ajuda vítimas a chegarem em casa. Do outro lado da linha, o traumatizado Jules (Sabin Tambrea) faz de tudo para ajudá-la durante toda noite que se segue. Só que aos poucos vamos entendendo melhor toda essa história que apresenta muitas surpresas.

Baseado no livro Der Heimweg, do escritor e jornalista alemão Sebastian Fitzek, o projeto busca nas surpresas apresentar os elos que se fecham numa história onde as subtramas acabam sendo uma parte importante do discurso. O roteiro baseado na obra de Fitzek tenta adaptar as sensações de angústia através de lacunas soltas que vão sendo preenchidas, passando por um forte clima de tensão. Tem momentos que a narrativa, em busca de criar caminhos para suas reviravoltas se perde ou mesmo fica óbvia mas mesmo assim consegue prender a atenção.

Se você pensa que esse filme é igual a outros onde rumamos para a descoberta do assassino e somente isso, não se engane. A violência doméstica ganha o holofote por aqui, se tornando o principal ponto de reflexão. Através das dores de uma protagonista indecisa sobre seu futuro, sem saber como se livrar de uma marido completamente doente, vamos sendo apresentados a uma história parecida com muitas que infelizmente acontecem na realidade. O forte discurso explorando esse assunto se torna um dos méritos do projeto. As revelações do Serial Killer, motivações, psicopatia, acabam sendo apenas um complemento. Algo que se mostra certeiro.   


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16/01/2025

Crítica do filme: 'Aqui'


Tem alguns artistas que lançam filmes, não leio nem sinopse e já vou correndo assistir seus próximo trabalho. Esse é o caso de Tom Hanks e Robert Zemeckis. Mas tem vezes que tudo pode dar completamente errado! Chegou aos cinemas brasileiros nesse início de 2025, um longa-metragem que se propõe atravessar décadas tendo o mesmo cenário e mostrando as emoções em conflitos de algumas famílias. A questão da obra Aqui é que se limita ao óbvio, sem ampliar os contextos – fato mortal para qualquer narrativa que se propõe no discurso atravessar gerações.

Ao longo de várias passagens de tempo, que vão desde a era glacial passando pelo século XVIII e chegando até o presente, acompanhamos uma casa que foi a residência de muitas famílias até chegar aos mãos dos pais de Richard (Tom Hanks): Al (Paul Bettany) e Rose (Kelly Reilly). No início um jovem sonhador e com o objetivo de viver com sua arte, Richard conhece Margaret (Robin Wright), ela engravida e sua vida muda de rumo, com altos e baixos até o tempo presente.

Baseado em uma história em quadrinhos intitulada Here, criada pelo designer gráfico americano Richard McGuire, esse filme – que teve o uso de Inteligência Artificial na maquiagem digital dos protagonistas – opta por explorar camadas dramáticas na linha da obviedade deixando em segundo plano o inusitado espaço pouco explorado. É muita informação, há desencontros e pouco desenvolvimento, algo que vai gerando o desinteresse.

A narrativa, para ir de acordo com a proposta da história, opta pelo estático de um só campo a explorar, uma casa. Até aí tudo bem, a questão como é traduzido isso aos olhos cinematográficos. Por meio desse ponto (se limitando a um cômodo apenas), que tem uns elementos indecifráveis que mais parecem que estamos assistindo a um vídeo de playlist no Youtube – com direito aquelas janelinhas e tudo - perde-se força por ir atrás do irrelevante.

O filme, dirigido por Robert Zemeckis (que eu continuo adorando) marca o reencontro de Tom Hanks e Robin Wright, que protagonizaram lindas cenas em Forrest Gump – O Contador de Histórias. Pena que o sono chega forte. Uma abordagem superficial que diz pouco exibindo muito. Pouco para tanto que tinha em mãos. Uma pena.


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15/01/2025

Crítica do filme: 'Meu Bolo Favorito'


Da simplicidade chegam as melhores histórias, sendo assim, é possível achar muitas formas de abordar os sentimentos mais profundos ligados ao amor e o desejo no cinema. O caminho encontrado pelo longa-metragem iraniano Meu Bolo Favorito é uma imersão ao despertar de sentimentos esquecidos trazendo a melhor idade como protagonista e logo chegando até um delicado recorte, sem se esquecer de todo o entorno político de um país marcado pela opressão.

Escrito e dirigido pela dupla de cineastas Maryam Moghadam e Behtash Sanaeeha, vencedor de prêmios no Festival de Berlim do ano passado, o projeto lançado nos cinemas nesse início de 2025 opta por falar de amor e solidão na mesma equação, uma estrada que nunca cai na melancolia encontrando sua força numa sutileza louvável. Muitos detalhes em cena se tornam um paralelo marcante com realidades que existem por aí.

A vida da ex-enfermeira e viúva Mahin (Lili Farhadpour), uma mulher que se prendeu em uma solidão faz décadas, caiu na mesmice. Vendo as amigas que adora cada vez menos a cada ano, vive sozinha numa casa tendo contato com as filhas somente pelo celular. Certo dia, algo desperta nela e tomando coragem para se livrar do cantinho solitário que passa o cotidiano, acaba tendo um encontro pra lá de casual com o também solitário, e taxista, Faramarz (Esmaeel Mehrabi), com quem passa uma noite inesquecível, cheia de surpresas.

Sem esquecer do contexto do sistema opressivo do Irã, que não deixa de passar por questões políticas, a narrativa leve e descontraída, costura seu desenvolvimento com pinceladas certeiras em forma de críticas sociais. Misturando comédia, romance e drama vamos sendo conquistados pelos cativantes personagens que embarcam em uma aventura rumo a autodescoberta. Em uma noite como clímax, lições são tiradas aos montes tendo essa reconexão mais viva que nunca.  

Rodado todo na capital do Irã, Teerã, esse projeto da dupla que já havia lançado o interessante longa-metragem O Perdão, é mais um forte grito contra um governo que instaura ‘Polícia da Moralidade’ e outros tantos absurdos. Tendo o cinema como elo para reflexões, encontramos um brinde à vida, dentro de um recorte intimista que diz muito sobre o bico que podemos dar em qualquer lapso de solidão.  


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14/01/2025

Crítica do filme: 'O Príncipe das Mares'


O trauma e o recomeço. Batendo na tecla de que a arte do recomeçar pode ser algo que venha algumas vezes ao longo de uma vida, no início dos anos 1990, um profundo drama chegou aos cinemas unindo as facetas do amor com as ultrapassagens por caminhos espinhosos de um passado em eterno conflito. O Príncipe das Mares é antes de mais nada uma jornada encantadora com lições por todos os lados.

Indicado para sete Oscars, o longa-metragem estrelado e dirigido por Barbra Streisand nos leva até a história de Tom (Nick Nolte) um treinador de futebol americano desempregado que vive com a esposa e as três filhas numa casa de frente pro mar. Quando sua irmã tenta se suicidar, ele embarca para Nova York e lá acaba conhecendo a psiquiatra dela, Susan Lowenstein (Barbra Streisand), com quem descobre mais sobre si mesmo e vive um intenso amor.

Baseado na obra homônima do escritor norte-americano Pat Conroy esse é um daqueles filmes onde o trauma de toda uma vida se torna um alicerce para uma enxurrada de emoções. De peito aberto para se reinventar, o protagonista interpretado por Nolte é um homem comum em conflito. Parece algo fácil para se transformar em um filme mas não é não! O desenvolvimento desse personagem caminha a todo instante com o discurso do reinventar, transformando as mais de duas horas de projeção em um enorme embate dentro do mundo das emoções.

O papel de Barbra, chega como um ponto de encontro perfeito, um casamento entre opostos que se atraem mas que por circunstâncias da vida por não ter se encontrado no tempo certo. Quer algo mais realista que isso?! Por meio das dores e segredos, uma porta se abre através do amor, um peça que faltava para toda uma engrenagem voltar a funcionar.

As lições por aqui são inúmeras. A narrativa contemplativa de O Príncipe das Mares girando em torno desse protagonista absorvido por seus traumas – de mãos dadas com a melancolia – abre ao público inúmeras formas de se encontrar com essa história. Pra quem curte psicologia, esse filme deve ser um prato cheio.


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Pausa para uma série: 'Jerry Springer: Brigas, Câmera, Ação'


Tudo – e realmente tudo – pela audiência. Chegou na Netflix nesse início de 2025, uma minissérie de dois episódios que mostra os bastidores e depoimentos da equipe de um dos mais polêmicos shows televisivos da história da televisão mundial. Tendo como foco as quase inacreditáveis pautas de The Jerry Springer Show - programa camuflado de um talk show – vamos percorrendo as ações de produtores, suas relações de trabalho e com os convidados. Antes de mais nada, esse é um projeto assustador quando pensamos em nós como sociedade.

O sensacionalismo é algo que chama a atenção de muitas pessoas, hoje, por exemplo, vemos alguns tipos de exploração migradas para as redes sociais onde a liberdade virou uma faca de dois gumes. Mesmo com as lutas e até alguns merecidos cancelamentos que ajudam a tentar equilibrar os valores morais, a humanidade sempre esteve próxima do interesse pelo chocar. Esse projeto mesmo beirando ao superficial, traz luz para essas reflexões.

Ex-ancora e comentarista de televisão, Jerry Springer também foi prefeito de Cincinatti. Então, jamais foi um nome totalmente desconhecido. Ele chega em Chicago com o objetivo de lançar um programa de tv e consegue um espaço numa famosa emissora. Junto a uma equipe que encarna o espírito do sensacionalismo e do banal, na guerra pela audiência, ao longo de 28 temporadas consegue o ibope que queria, mesmo sendo alvo de críticas por todos os lados.

Jerry Springer: Brigas, Câmera, Ação chega para decifrar os caminhos até esse sucesso que teve como força motora as maiores baixarias já vistas no universo televisivo. Teve brigas com vias de fato, um homem casado com um cavalo, embates feitos para criar o caos e até um episódio de assassinato que se tornou emblemático e marcou o ponto que iniciou a ladeira abaixo do programa.

Nos dois episódios que praticamente se definem como um ‘começo, meio e fim’, vamos acompanhando depoimentos chocantes que, entre outros pontos, encontram a relação da violência de muitos tipos com a vitória na audiência. Reflexo da sociedade? Limites na busca pela fama? Muitas perguntas giram em torno dessa minissérie mas sempre tendo poucas respostas. Até hoje, parte da sociedade, de uma maneira geral, insiste em não refletir sobre o que consome. E assim caminha a humanidade...


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Pausa para uma série: 'Terra Indomável'


Trazendo para reflexões assuntos que até hoje estão em alta nas pautas políticas, como: migração e a colonização, o novo seriado da Netflix Terra Indomável nos transporta até o já conhecido e conturbado velho oeste americano, mais precisamente no ano de 1857, onde nativos, exército americano, milícia mórmon entram em choque para alcançar a liberdade, o poder, pelo que acreditam ou simplesmente pela sobrevivência.

Contado de forma visceral, com cenas de tirar o fôlego e uma narrativa cirúrgica, essa minissérie de seis episódios apresenta recortes profundos sobre as formas de pensar diferente de nômades das indefinições de um país em conflito. As tradições vão de encontro a uma cultura de sobrevivência, com num trajeto de muitos perigos e violência por todos os lados, somos guiados por uma mãe e seu passado misterioso em busca de um refúgio.

Ambientado na região de Utah no século XIX, sob diversos pontos de vistas, conhecemos Sara (Betty Gilpin), uma mãe desesperada para chegar até o oeste com o filho Devin (Preston Mota). Seu caminho acaba se cruzando com o de Isaac Reed (Taylor Kitsch) que a ajuda numa jornada de muita dor, sangue e batalhas pela sobrevivência. Paralelo a isso, uma disputa por poder deixa toda a região selvagem e imprevisível.

Retratar o velho oeste norte-americano sempre foi um enorme desafio para as centenas de produções que assim fizeram. Emboscadas, traições, violência, a distância da lei, sempre tomaram conta dos roteiros. Em Terra Indomável, longe de ser um guia definitivo sobre essa era cheia de questões da história norte-americana, vemos a jornada da heroína muito bem construída e arcos dramáticos junto de conflitos e desenvolvimento bem executados. Uma equação que realmente prende a atenção do público.

Criado pelo roteirista norte-americano Mark L. Smith, o seriado que vem conquistando a atenção do público na mais famosa plataforma de streaming, usa o desejo e objetivo dos personagens para criar um retrato impactante de uma natureza bela e selvagem. Com subtramas muito bem embaralhadas vemos constantes distantes, como a escassez de recursos e a esperança, andarem lado a lado em disputas que não conhecem a paz.


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Crítica do filme: 'Além do Tempo'


Como viver após uma tragédia? Olha, tem alguns filmes que realmente conseguem passar toda a força das emoções por mais duras e inalcançáveis que elas sejam. O drama holandês Além do Tempo - completamente perdido lá no catálogo da Prime Video – nos apresenta uma história em duas linhas temporais sobre o caos emocional da perda, no entendimento do luto, na visão de pessoas que se amam que tiveram esse amor marcados por uma tragédia.

No início dos anos 80, tudo ia bem na vida dos jovens apaixonados Johanna (Sallie Harmsen) e Lucas (Reinout Scholten van Aschat) que estão à bordo de um cativante navio viajando por lugares lindos junto de seu filho, Kai. Certa hora, em pleno alto-mar, eles percebem que a criança sumiu e aos poucos o desespero daquela situação viraria uma página triste na história deles. Décadas mais tarde, eles se reencontram e muito do não dito vem à tona.

Filmado em Portugal, Malta, Republica Dominicana e na Holanda, Além do Tempo pode ser dividido em duas partes complementares que a narrativa envolve numa espécie de vai e vem como se fossem peças de um profundo marcante quebra-cabeça emocional. Na primeira, vemos a consolidação da tragédia e os primeiros passos após. Na segunda, unindo a arte com as lembranças transforma esse projeto em algo bem especial.

O luto e a dor são variáveis constantes por aqui. Vemos num mar de tristeza o desenrolar de uma deteriorização de uma forte paixão. A tragédia se une nesses pontos, mostrando de forma visceral os curtos caminhos rumo a um ‘seguir em frente’ e as difíceis decisões que podem conter nessa estrada sem volta na fuga pela dor. Com uma pequena reviravolta em seu desfecho rumamos para reflexões sobre os altos e baixos.


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13/01/2025

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Pausa para uma série: 'Força Policial'


As verdades da rua. Com oito excelentes episódios em sua primeira temporada, a nova série da Prime Video - Força Policial - apresenta através de dois personagens, do lado da lei, repleto de problemas nos respectivos presentes uma sólida trama onde as surpresas e ações impensadas se encontram nos limites da ebulição emocional.  Enfrentando dilemas e a corda bamba da ética e da moral, a narrativa se joga para dentro das ruas violentas de uma cidade que não parece dormir.

Introspectiva e com um passado recente cheio de amarguras e conflitos com outros policiais, a experiente oficial do corpo de polícia de Long Beach, Harmon (Troian Bellisario), recebe a missão de treinar mais um recruta, Diaz (Brendan Larracuente), um rapaz destemido que sofre com o irmão preso e precisa aprender muito mais do que imagina. Ao longo do tempo que formam dupla, esses dois policiais enfrentarão casos violentos pelas ruas da cidade.

Muito bem dirigido - com episódios conduzidos por Brenna Malloy e Eriq La Salle - o projeto consegue chegar numa poderosa imersão explorando as consequências principalmente quando os limites são ultrapassados. As câmeras no uniforme ajudam a dar um clima intenso sobre as verdades da rua, a trama abre um leque de variáveis que vão desde os julgamentos de ações até a parte política que mesmo não ganhando personificação está por todos os lados.

Assinado por Tim Walsh e Elliot Wolf, com produção do famoso showrunner Dick Wolf - criador da franquia Lei e Ordem - a série consegue reunir todos os elementos apresentados apontando para um clímax convincente que liga todos os capítulos. Criminosos cruéis, problemas familiares, violência extrema, esses e outros pontos são envoltos na responsabilidade e papel social da polícia que se vê em constante interrogações sob o foco na maneira de agir.

Há uma questão que percorre de forma nada silenciosa tudo que assistimos: Como fazer a diferença em um universo tão violento? A estrutura para isso ser apresentado - nos episódios de duração com cerca de 30 minutos - é estabelecer uma relação mestre x aprendiz mas que se encontram em muitos pontos deixando o discurso afiado. Com a classificação 18 anos, Força Policial já pode ser considerada uma das ótimas novidades na Prime Video nesse início de 2025.


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12/01/2025

Crítica do filme: 'O Truque do Amor'


A Netflix vem ao longo dos anos trazendo a possibilidade de encontrarmos rapidamente filmes de todos os lugares do mundo. Esse é o caso do longa-metragem italiano O Truque do Amor que dentro da sua proposta ingênua e nada criativa busca se agarrar em um discurso de reconstrução de um pai solteiro, sem grana, que comete absurdos e nunca encontra a consequência. Com personagens caricatos envoltos em situações para lá de peculiares, o projeto dirigido por Umberto Riccioni Carteni é um daqueles pesadelos para quem busca um filme bom pra assistir.

Tudo na vida do jovem pai solteiro Vito (Antonio Folletto) parece desmoronar. Vive com o irmão Antonello (Vincenzo Nemolato) em um prédio antigo onde os moradores estão indo embora, e para piorar, sem dinheiro e com um emprego nada estável de meio período, está prestes a perder a guarda do seu filho. Quando seu destino encontra com o da rica empresária Marina (Laura Adriani), Vito e o irmão bolam um plano para conseguir uma grana mas ele não esperava se apaixonar.

Com todas as locações realizadas na linda cidade de Nápoles – um lugar belíssimo diga-se de passagem - O Truque do Amor e seu esqueleto repleto de ingenuidade trabalha sua narrativa para tudo ganhar um ar engraçado – algo que se desgasta em poucos minutos de projeção - deixando o desenvolvimento das relações em total segundo plano. As suas mensagens ou mesmo pontos de reflexão surgem de uma série de situações impossíveis que atravessam o desinteresse.

Do drama familiar – aqui revestido com o cômico absurdo – comprometido com uma fórmula de bolo batida até as trapalhadas forçadas para se chegar a um romance, o roteiro nos leva para uma caminhada rumo a um ilusório universo. E falando em roteiro, dentro de uma estrutura básica, se atrapalha com o desenvolvimento dos personagens chegando sem força nos pontos de viradas que se propõe.


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11/01/2025

Crítica do filme: 'Ad Vitam'


A balisa da moral aos olhos da justiça. O gênero policial e seus respingos na ação acabam encontrando uma fórmula bem executada no lançamento francês da Netflix, Ad Vitam. Com um bom desenvolvimento narrativo e dissecando os principais conflitos de um protagonista prestes a ser pai, embarcamos numa história repleta de variáveis que se sustenta na responsabilidade do dever.

Na trama conhecemos Franck (Guillaume Canet) e Leo (Stéphane Caillard), um casal à espera do primeiro filho. Eles fizeram parte de um grupo de elite do lado da lei (grupo de intervenção da guarda nacional) que um certo dia vêem seus destinos mudar numa operação mal sucedida que causou a morte de um amigo. Quando informações secretas do ocorrido colocam em xeque todo o contexto, Franck passa a ser perseguido para entregar a única prova do que realmente aconteceu.

A parte dramática, com camadas que vão se moldando em dois recortes de tempos, não deixam de serem um preponderante combustível para as ações dos personagens. Sob alguns olhares - principalmente do casal - a culpa, a escolha por ter filhos, um incidente político internacional se juntam como alguns dos pontos inseridos na trama que ainda tem ótimas cenas de ação mesmo escorregando em alguns clichês do gênero cinematográfico que se insere.

Havia muitas formas de contar essa história e pode ter certeza que a forma que escolheram foi uma das melhores. Os méritos começam na narrativa que usando um detalhado flashback ganha os espectadores com uma história - acima de tudo - sobre lealdade e responsabilidade, uma captação do espírito que se constrói quando entendemos a história dos personagens e sua ligação com o dever.

O resultado é um projeto satisfatório, com ótimas atuações, que não faz rodeios e vai instigando o espectador a ir direito para as lições de seu discurso. E o título também é certeiro, Ad Vitam significa: 'Para toda a vida', algo que preenche todas os conflitos na jornada do herói.


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10/01/2025

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Pausa para uma Série: 'A Grande Descoberta'


As mãos dadas da ciência com quem protege a sociedade. Trazendo os detalhes - de forma cirúrgica - de uma das mais famosas e extensas investigações de assassinato da história da Suécia, a minissérie true crime da Netflix, A Grande Descoberta, nos mostra de maneira incisiva e sem rodeios como a ciência e uma operação policial andaram lado a lado através da genealogia genética.

Ao longo de quatro episódios percorremos um amplo contexto sobre o ocorrido, desde o luto e dor das famílias atingidas pela tragédia, passando pelo pesadelo emocional e peso da responsabilidade do encarregado chefe das investigações, as linhas das leis de proteção de dados até a ciência que estuda a origem e a evolução de uma família. Tudo isso é exprimido em capítulos que se projetam cada um com uma base trazendo um ponto fundamental que como um todo interligam de forma certeira todas as questões.  

Na trama conhecemos John (Peter Eggers) um policial, ex-atleta olímpico, que é detetive na pequena cidade de Linköping, no sul da Suécia. Ele está prestes a ser pai pela primeira vez e ao mesmo tempo acaba sendo o encarregado principal de uma investigação sobre um duplo homicídio que chocou sua cidade. Conforme o tempo vai passando, a polícia vai se distanciando da solução e John acaba sendo consumido pelo caso. Mais de uma década e meia depois, John conhece Per (Mattias Nordkvist), um genealogista que pode ajudar a enfim solucionar o ocorrido.

Baseado no livro Genombrottet : så löste släktforskaren dubbelmordet i Linköping , escrito pela dupla Anna Bodin e Peter Sjölund, o projeto com curtos episódios – ótimo pra maratonar - consegue resumir um caso real que chocou a Suécia através de uma narrativa muita bem organizada em suas ideias que trabalha em direção ao passado sem esquecer de mostrar as consequências no presente. Através dessa imersão, e tendo o desenvolvimento da investigação como plano de fundo chegamos em camadas profundas do emocional ligadas à responsabilidades, o confronto com a dor e ao luto ininterrupto.

Se alguém ainda tem dúvidas sobre a importância dos streamings em trazer histórias interessantes e que geram reflexões em toda a sociedade, que nunca chegariam por aqui senão fosse através dessas plataformas virtuais, A Grande Descoberta chega para validar mais uma vez esse ponto.


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09/01/2025

Crítica do filme: 'Herege'


A religião, o terror e as necessidades de sobrevivência. Com um vilão interpretado com maestria por Hugh Grant e buscando criar algo ‘fora da caixa’ mas sem deixar de se fortalecer com as altas cargas de tensão que todo bom longa-metragem de suspense precisa ter, no final do ano passado, chegou aos cinemas um filme que busca no seus diálogos profundos colocar em confronto a fé e os questionamentos sobre inúmeros aspectos da vida. Herege é um filme sobre o obscuro do psicológico cheio de caminhos para reflexões.

Na trama conhecemos Irmã Paxton (Chloe East) e a Irmã Barnes (Sophie Thatcher) duas jovens missionárias mórmons que vão até a casa de um homem para tentar convertê-lo à religião delas. A questão é que logo elas percebem estarem de frente com Mr. Reed (Hugh Grant), um pesquisador pra lá de maluco que as envolve em uma espécie de jogo macabro.

A fé e a tensão se tornam elementos importantes dentro de um contexto que busca nos pontos de vistas agregar paralelos. Sobre o primeiro ponto, uma enxurrada de críticas podem surgir mas o uso de uma direção nessa questão é para elucidar e fortalecer os contrapontos. Sobre o segundo, tudo é muito bem conduzido, com um estabelecido labirinto assustador vamos entendendo camadas dos personagens dentro de um desenvolvimento narrativo que prende a atenção.

Escrito e dirigido pela dupla Scott Beck e Bryan Woods, Herege busca seu próprio caminho em um gênero repleto de repetições. Isso é um mérito. Mesmo com o pecado de tentar dar definições conclusivas elaboradas para seus personagens - o filme termina quando parecia ir ladeira abaixo no seu conjunto de ideias - não deixa de ser um suspense inteligente e deveras intrigante.


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08/01/2025

Crítica do filme: 'A Hora do Silêncio'


Buscando chegar na tensão por meio de uma perseguição em um prédio quase desativado, A Hora do Silêncio, que chegou ao catálogo da Prime Video no finalzinho de 2024, atravessa o mundo das sensações através da perda de um sentido estabelecendo desde o início o velho e batido jogo entre heróis e bandidos. Dirigido pelo cineasta norte-americano Brad Anderson o projeto não é mais do mesmo mas também não alcança todo seu possível potencial.

Na trama acompanhamos Frank (Joel Kinnaman) um obstinado policial que após um acidente num dia de trabalho acaba perdendo a audição. O tempo passa e ele acaba se envolvendo num caso onde uma testemunha surda, Ava (Sandra Mae Frank), corre perigo. Depois de uma série de desencontros, ficam presos num prédio onde precisam encontrar uma solução de fuga lutando pela sobrevivência.

Um fator interessante é que o protagonista entra em desconstrução a partir do momento que percebe a aceitação da sua nova condição caindo das mãos, mesmo em um recorte não muito profundo. É válido as reflexões sobre o tema, mas novamente de forma trivial. As dores do sobreviver encaixam nas dúvidas do protagonista que precisa encontrar novas maneiras de enxergar e viver seu cotidiano estabelecendo uma camada de alguma forma sólida.

A narrativa não surpreende mas também não foge do que propõe: um 'polícia e ladrão' com os deslizes da moral como cereja do bolo. Acelerado para se estabelecer no gênero cinematográfico que mais veste a camisa, A Hora do Silêncio tem um discurso que encontra a narrativa durante todo o tempo e mesmo não causando impacto apresenta um recorte do gênero policial perto do satisfatório.


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