29/07/2020

Crítica do filme: 'Chasing Trane'


É algo realmente notável tocar em um nível tão especial. Tentando decifrar, de alguma forma, parte da genialidade de um dos maiores músicos saxofonistas da história desse imenso planeta em que vivemos, Chasing Trane, dirigido pelo cineasta John Scheinfeld, exibe várias curiosidades de um dos mitos das origens do jazz, John Coltrane. Filho único, nascido no sul dos Estados Unidos, tocava em casas de shows badaladas (algumas cheias de cafetões e vigaristas) trabalhando para sustentar sua esposa e a sua enteada, desde os tempos em que era integrante da espetacular banda de outro genial, Miles Davis (Miles Davis Quintet). O documentário, que tem narração de passagens na voz de Denzel Washington, é cronológico e aos poucos, com muitos detalhes, acompanhamos a construção desse mito do sax. Um projeto para sempre ser exibido a cada nova geração. Nunca podemos nos esquecer dos bons, jamais.

A dor que temos, a esperança que sofremos. Em suas canções, e principalmente após se descobrir um ótimo compositor, Coltrane aborda política, desigualdade social e outros temas em um som puxado para um pop jazz que ninguém fazia, sendo responsável pela divulgação cada vez mais forte do poderoso jazz norte-americano. Viciado em heroína logo no início de carreira, quase seguindo o destino de outra lenda do jazz Charlie Parker (Bird, do qual era fã), Coltrane consegue com muita força de espírito sair de alguma forma desse vício horroroso o que elevou sua vontade de viver e automaticamente sua criatividade musical.

Com depoimentos de biógrafos, filósofo, músicos como o baterista do The Doors que era seu fã, amigos próximos, parte de sua família, e até do ex-presidente Bill Clinton, vamos navegando na mente de um dos mais criativos artistas das últimas décadas. Imagens antigas da década de 40, 50 e 60 caminham junto à cronologia que que se adapta a todos os feitos e importantes marcos na carreira de Coltrane, como a composição de um de seus maiores sucessos Alabama que teve como inspiração o terrível atentado a uma igreja batista por supremacistas brancos que mataram quatro crianças.

Contra o contexto do preconceito os negros usavam a música como forma de alegria e equilíbrio emocional. Há um paralelo importante entre Martin Luther King e John Coltrane, o segundo encontra na música uma forma de lidar contra tudo de complicado que enxerga ao seu redor, e nós sentimos em nossos corações.





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Crítica do filme: ' Ligue Djá: O Lendário Walter Mercado'


Do triunfo ao quase desastre, sempre na esperança de voltar a falar com seu público. Muitas gerações recentes aqui no Brasil talvez nem nunca tenham ouvido falar no porto riquenho Walter Mercado. Sem zap, internet, quem comandava a festa da informação/comunicação eram as televisões e suas enormes audiências. Assim, anos atrás, na década de 90, um chamativo homem sempre com roupas extravagantes, capas, falando sobre astrologia dominou o interesse popular no Brasil e em toda a América Latina durante anos mandando mensagens positivas para milhares de devotos. Mas como que no auge da carreira e exposição na mídia, essa figura pública amada sumiu e nunca mais voltou à tv? Ligue Djá: O Lendário Walter Mercado, produzido pela Netflix, dirigido pela dupla de cineastas Cristina Costantini e Kareem Tabsch, mostra as verdades sobre tudo que aconteceu na formação, no auge do sucesso e no pós sumiço televisivo desse personagem sempre intrigante da televisão. Dois pontos muito interessantes: o encontro do atual gênio da Broadway Lin-Manuel Miranda com seu ídolo de infância é algo que emociona. Segundo, o projeto nos faz uma pergunta indiretamente: será que Walter Mercado faria sucesso nos dias atuais? A resposta está no filme!


Dividido em arcos muito bem compostos, esse ótimo documentário navega em pontos importantes da trajetória do astrólogo mais famoso do mundo na década de 90. A questão sobre a sexualidade dele, assunto que Walter não gostava de falar muito sobre, contorna o documentário sob ponto de vista de um ativista lgbt de Porto Rico que teve nele como alguém de referência para ser quem ele queria ser. Outra questão é a briga na justiça que Mercado teve com seu ex-empresário. Como a maioria dos artistas que se dedicam fortemente à sua arte sem pensar na estrutura que precisa administrar para que tudo aconteça, Walter acaba caindo em armadilha contratuais que praticamente extinguiram sua marca, seu nome que sempre lutou para deixar intacto no auge. Há um belo destaque também para as lembranças da carreira de ator de Walter, uma passagem muito bonita em um lindo teatro em Porto Rico ganha destaque no documentário.


Ícone da moda? Figura pop? Rei dos memes foi por jovens que nunca o viram na tv? Cascateiro? Ingênuo? Walter Mercado pode ser definido por você leitor da forma como o enxergar mas uma coisa não tem como nenhum de nós negar: marcou a história da televisão mundial.

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28/07/2020

Crítica do filme: 'Verão em Berlim' (Sommer vorm Balkon)


As entrelinhas da monotonia de um cotidiano sempre em crise. Utilizando a tática do ‘ritmo labirintesco’, o que de fato se aproxima da realidade, Sommer vorm Balkon, no original, lançado faz 15 anos na Alemanha e dirigido pelo competente cineasta Andreas Dresen explora as ações e consequências de uma classe média perdida em uma europa em constante transformações. Os contrapontos entre as idas e vindas dentro das situações da vida das duas amigas protagonistas coloca o que vemos sempre em pontas opostas, mostrando dor e sofrimento com pitadas de esperança. O roteiro assinado pelo alemão Wolfgang Kohlhaase se pergunta a todo instante, implicitamente falando: afinal, o que é felicidade?

Na trama conhecemos Katrin (Inka Friedrich) e Nick (Nadja Uhl), duas inseparáveis amigas que estão perto dos 40 anos e ainda não conseguem encontrar rumos em alguns campos de suas respectivas vidas. Quando a segunda, uma leitora assídua de Stendhal, começa um relacionamento com um caminhoneiro que leva tapetes pelas estradas da Alemanha, a primeira, que enfrenta forte preconceito por sua idade nas entrevistas de trabalho que vai, entra em certo desespero mas aos poucos começa a entender melhor toda a situação. Composto por pequenos recortes do cotidiano dessas duas ótimas personagens, o filme navega pelos conflitos europeus bastante atuais.

A classe média e seus problemas. Só por tocar nesse tema, o projeto seria um grande palco para análise de antepassados economistas e sociólogos. As reflexões do medo mas nunca deixar de tentar, transforma jornadas em ações longe de uma perfeição nos vários campos da vida: no amor, nas relações interpessoais, nas profissões. Há uma melancolia no ar que é facilmente detectada pelos olhos mais atentos, como se as personagens abrissem portas e sempre do outro lado tem a mesma coisa. Mas por conta disso a fita é honesta e bastante próxima da realidade, afinal, aqui desse lado da telona o dia a dia de muitos se reflete a enormes decepções e fragmentos de felicidade que se tornam poeiras em pouco tempo.

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27/07/2020

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Pausa para uma série: #10 - Rick and Morty – 1ª Temporada


Para entender o mundo complexo que vivemos nada melhor que um pouco de loucura. Com estreia aguardada no longínquo ano de 2013 (quase 2014), Rick And Morty, criado pela dupla Dan Harmon e Justin Roiland, essa genial série de aventura é um fenômeno que grita pelas entrelinhas e também choca em alguns momentos, mostrando uma série de aventuras interdimensionais de uma família, com núcleo centralizado em um avô louco (Rick, uma espécie de Dr. Emmett Brown em formato de desenho) e seu neto Morty. Usando a técnica de animação para falar muito sobre o mundo atual, os embates entre gerações, as genialidades perdidas e outras surpreendentemente questões, Rick And Morty é um fenômeno pop, com intensos 22 minutos por episódio.


Criada a partir de uma paródia animada em curta-metragem do clássico filme De Volta Para o Futuro produzida para o festival de cinema Channel 101, Rick and Morty nos mostra as aventuras de um cientista/físico louco e que gosta de uma bebida, Rick, avô do tímido e curioso Marty. Ambos vivem com o restante da família: Jerry (o pai de Morty), Summer (a irmã) e Beth (a mãe de Morty e filha de Rick). A dupla viaja por interdimensões, vão para outros planetas, sempre em uma nova aventura provocada por algum problema existencial do cotidiano deles. Simplesmente genial.


E o que acontece quando encontramos nós mesmos? Filosofando de maneira divertida e muito inteligente, essa e outras questões existenciais volta e meia ganham destaque nos onze episódios de sua primeira temporada (atualmente já existem quatro temporadas na Netflix) que saúda com louvor os órfãos de mais aventuras de Mcfly e Emmett Brown. A ficção científica aplicada à trama cai como uma luva para os cinéfilos que adoram as loucuras geniais de Nolan e cia. Cada episódio é uma fonte de criatividade misturada com conceitos complexos em formas debochadas de como podemos enxergar quem realmente somos.

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Crítica do filme: 'Marieke, Marieke'


Segredos e a rotina de não saber o que vai acontecer com o seu futuro. Fita alemã/belga de dez anos atrás, que nunca chegou a ser exibida no Brasil, Marieke, Marieke é uma pequena jornada rumo ao recorte no passado de mãe e filha, onde segredos do passado acabaram de alguma forma moldando as personalidades delas depois do trauma vivido. Primeiro longa-metragem da cineasta Sophie Schoukens, que também escreve o roteiro, o projeto conta com uma ótima atuação de sua protagonista, interpretada pela artista belga Hande Kodja.

Na trama, conhecemos a intrigante personagem principal, Marieke (Hande Kodja), por muitas vezes parece perdida em suas próprias atitudes, sempre munida de uma pequena máquina fotográfica tirando fotos de corpos com quem se encontra, se relaciona com homens mais velhos e trabalha em uma fábrica de doces artesanais na cidade onde vive. Possui um relacionamento conturbado com sua mãe Jeanne (Barbara Sarafian), o que só gera mais conflito quando chega um enigmático personagem chamado Jacoby (Jan Decleir) que diz ser o editor do livro que seu pai escreveu anos atrás e promete contar a Marieke algumas verdades de seu passado.

Espírito livre e completamente em desalinho sobre rumos e focos do que fazer com sua rotina monótona e quase sem esperança em um mundo que para ela se coloca como cheio de obstáculos, perdido, todas as respostas e perguntas da história giram em torno da protagonista, praticamente não há outra ótica. A sociologia por trás de toda a complicada personagem é colocada de maneira sutil, passando de um feminismo que acompanha o seu tempo e ao mesmo tempo toda a imaturidade de uma jovem que tenta entender a vida de maneira as trancos e barrancos, sendo pouco compreensível aos olhos de quem a tem por perto.

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20/07/2020

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Crítica do filme: 'Greyhound'


Como faz falta uma sala de cinema! Com um orçamento de cerca de 50 milhões de dólares, com roteiro escrito pelo próprio Tom Hanks baseado no livro The Good Shepherd, de C.S. Forester, Greyhound, nova estrela no catálogo da Apple Tv é um filme de guerra sem muitas pausas para absorvermos os inúmeros termos náuticos de combate em meio a um oceano atlântico que lembra o bom e velho batalha naval que jogávamos na infância. No papel principal, também Hanks com pitadas de um pouco mais do mesmo visto em outros filmes. Pena que esse filme não conseguiu chegar aos cinemas, pelo menos ainda não, pois as cenas muito bem conduzidas e o som principal deixariam o espectador com uma interação mais profunda com tudo que acontece na tela aos longos dos menos de 100 minutos de projeção.

Na trama, dirigida pelo cineasta Aaron Schneider, conhecemos o capitão da marinha norte-americana Ernest Krause (Tom Hanks) que tem uma missão muito complicada, na fase inicial da Segunda Guerra Mundial, liderar diversas embarcações de mais de três dúzias de navios norte-americanos e britânicos a cruzar o enorme Oceano Atlântico e protege-los dos ataques perigosos dos enormes submarinos nazistas. Ao longo de todo o filme, vamos vendo toda a angústia e pressão na cabine de comando.

Um dos méritos do filme é conseguir criar o clima de tensão, principalmente pelo comandante interpretado por Hanks, a cabine onde acontecem as maiores situações de perigo e decisões que influenciam todo o comboio é vista de perto pelo espectador graças à boa condução da direção dessas cenas por Schneider. A experiência com certeza foi pensada para ser exibida na tela enorme dos cinemas pelo mundo, muitas cenas com ótimas técnicas são vistas e passam tamanha realidade. Recheado de termos técnicos de combate em alto mar, o filme não deixa marca no coração cinéfilo mas não deixa de ser um competente trabalho.

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Crítica do filme: 'Extreme Job'


Meio comédia pastelão, meio filme de ação com cenas milimetricamente bem coreografadas, Extreme Job tem vários elementos que podem conquistar o espectador que resolve escolher um filme para se divertir, sem mensagens metafóricas nas entrelinhas, sem muitos temas para se pensar. Partindo do princípio de um empreendimento inusitado que alcança sucesso, um grupo de detetives bem loucos da cabeça precisam combater o crime organizado de maneira bastante peculiar.  Dirigido pelo cineasta sul coreano Byeong-heon Lee e escrito pelo roteirista conterrâneo Se-Young Bae, a comédia/ação que levou apenas quatro dias para ser vista por um público de 2 milhões de pessoas na Coreia do Sul (o que ocasionou em um novo recorde do cinema sul coreano, pelo curto tempo pela marca alcançada).

Na trama, conhecemos uma unidade de detetives da polícia de uma cidade da Coreia do Sul, comandada por um comandante atrapalhado, que está tramando como prender um alto figurão do crime organizado local. Para tal ação, eles conseguem imaginar o inusitado, quando descobrem que na frente do lugar onde esse chefão frequenta constantemente, existe um restaurante que vende frangos fritos que está à venda. Assim, resolvem comprar o estabelecimento, o que não esperavam é que a receita de molho pro frango que inventam acaba caindo no gosto dos frequentadores e o restaurante vira um gigante sucesso.  

Com orçamento de quase seis milhões de dólares e lançado em janeiro do ano passado na Coreia do Sul e sem nenhuma previsão de desembarcar no Brasil, Geukhanjikeob, no original é bastante honesto com o espectador, desde seu início repleto de ações desencontradas e cenas que miram a comédia como protagonista em relação à ação, até o seu clímax inusitado mas exatamente o que fará muita gente procurar por esse filme, o projeto possui arcos organizados e brindam o espectador com boas gargalhadas. A composição dos personagens é superficial pois o foco é todo nas loucuras dos desenrolares de seu elemento principal que é o fato peculiar que caminha pela trama. Extreme Job prova que, se alguém ainda tinha dúvidas, não só de ‘filmes de arte’ vive o excelente cinema sul coreano contemporâneo.

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19/07/2020

Crítica do filme: 'Os Mortos Não Morrem'


As loucuras de um roteiro descontrolado. Três anos depois de realizar uma de suas obras-primas no cinema, o fantástico Paterson, o cineasta norte-americano Jim Jarmusch volta as telonas escrevendo e dirigindo um filme sem pé nem cabeça que tenta falar metaforicamente sobre zumbis mas acaba sendo uma sequência de cenas bizarras sem qualquer equilíbrio com uma história interessante. Reunindo um elenco conhecido, como: Bill Murray, Adam Driver, Chloë Sevigny, Steve Buscemi, Danny Glover, Caleb Landry Jones e Tilda Swinton, Os Mortos não Morrem passa longe de ser brilhante como outras obras do famoso diretor. Uma grande decepção.

Na trama, conhecemos uma pacata cidadezinha no interior dos Estados Unidos que começa a apresentar situações estranhas beirando o bizarro e assim, os policiais Cliff (Bill Murray) e Ronald (Adam Driver) começam a se preparar para o inusitado: uma invasão zumbi. Tentando bolar algum tipo de plano para se protegerem e aos outros, a dupla de policiais conta com a ajuda de policial Mindy (Chloë Sevigny) e da curiosa personagem Zelda (Tilda Swinton). Ao longo do estranhíssimo roteiro vamos vendo situações para lá de loucas com os personagens.

Sinceramente não dá pra entender o que Jarmusch quis dizer com esse filme. Completamente alucinante e pirado do início ao fim não se encontra sentido em nenhuma linha do roteiro. É como se ligassem a câmera e os atores tentassem interpretar personagens que não sabem nada sobre e nem entendem o sentido daquela história. Buscando sempre o inusitado, o famoso diretor acaba se perdendo na sua própria excentricidade, levando os cinéfilos a perderem quase duas horas de seu precioso tempo.

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17/07/2020

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Pausa para uma peça de teatro filmada (Pro-Shot): #1 – Hamilton


E se ganharmos nossa independência? Ampliando a criatividade de levar ao público de todo o mundo uma das peças de teatro da Broadway mais badaladas dos últimos anos, a Disney, no seu streaming Disney+ lançou o Pro-shot (em curta explicação, seriam gravações de números teatrais compondo um filme) do badalado musical Hamilton. Ao longo de quase três horas de duração, vamos por meio de textos cantados em forma de rap conhecendo a história de Alexander Hamilton, um dos criadores dos Estados Unidos e que inclusive dá rosto à cédula de dez dólares. No papel principal, o grande criador do espetáculo (baseado na obra do historiador Ron Chernow), o Hors concours das mentes criativas atuais quando pensamos em musicais, Lin-Manuel Miranda. Pulsante, inovador e beirando ao extraordinário, Hamilton, do primeiro ao último minuto, mostra ao que veio. Não desperdiçou sua chance, chance.

Nessa história cheia de situações políticas e decisões que colocaram um novo rumo, desde a independência norte americana até os primeiros governantes dessa hoje potência mundial, acompanhamos a trajetória pouco comentada de Alexander Hamilton (Lin-Manuel Miranda), um órfão que veio de navio de uma das ilhas do caribe para se tornar em pouco tempo figurinha carimbada nas rodadas políticas de independência e depois dos bastidores das escolhas dos primeiros que assumiram o poder. Repleto de escolhas, de uma traição dolorida, duelos de armas, inveja, amizades, lealdades somos testemunhas de uma grande história de um dos pais fundadores dos Estados Unidos.

Musical raiz, daqueles onde todas as linhas do roteiro são cantadas pelos artistas em cena, Hamilton estreou anos atrás no off-broadway, com as rápidas críticas positivas de crítica e público passou a ser apresentado na galeria principal das ruas da broadway se tornando um fenômeno artístico poucas vezes visto nos últimos anos. Sua mistura de história antiga, com raps, misturas equilibradas de palavras em contextos antes complexos de explicações por todo o blá blá blá político, além de um elenco inspirador e extremamente competente transformam essa saga de Hamilton em uma experiência única.

Em uma época de pandemia inesperada, um pro-shot simbólico, de um dos maiores sucessos da história da Broadway, pode ser o caminho para muitas outras ótimas peças de teatro, musicais ou não, conseguirem chegar até o público através das plataformas de streamings.

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16/07/2020

Pausa para uma série: #9 - Doze Jurados


Um ninho de estratagema em busca da moral da história. Dos showrunners Sanne Nuyens e Bert Van Dael está disponível no vasto catálogo da Netflix brasileira o intrigante seriado belga Doze Jurados (De Twaalf no original). Diferente de alguns outros dramas que envolvem júris, acusações e assassinatos misteriosos, nesse projeto vemos o foco máximo na vida detalhada da maior parte dos jurados que compõe um júri popular de um caso com grande repercussão nacional. O que impressiona é a qualidade do roteiro mesmo colocando seu assunto principal em plano de fundo na maioria dos episódios, consegue prender a atenção mesmo assim. Ao longo dos apurados doze episódios, vemos problemas de todo tipo nesse júri: relacionamento psicologicamente abusado de marido para esposa, um solitário senhor que não consegue entender as novas realidades que o cercam após o falecimento da esposa, um dono de construtora envolvido em um caso fatal de um trabalhador do seu staff ilegal, um pai rigoroso que não entende sua filha adolescente, entre outros. É uma série que muitos podem achar arrastada pela sua riqueza de detalhes e talvez até lenta demais em alguns momentos mas a curiosidade pelos desfechos serão de muita importância para você se convencer a seguir em frente e a maratonar. 

Na trama, acompanhamos, em alguns idas e vindas no roteiro que usa flashbacks como ajuda a determinadas questões mal explicadas, a composição de um júri de doze jurados mais dois suplentes que foram escolhidos via sorteio para integrarem o elenco dos cidadãos que definirão o destino de Frie Palmers (Maaike Cafmeyer), um funcionária de uma escola que é acusada de matar seu filho pequeno e a melhor amiga de adolescência. Ao longo dos episódios, vamos descobrindo aos poucos os segredos desse caso e também muito sobre a vida conturbada de alguns dos que integram esse júri.
Com episódios que giram em torno de 45 minutos, todos falados (no áudio original) em flamengo, vamos conhecendo as cartas desse tabuleiro com bastante espaços para especulações e onde a tendência acaba sendo que a decisão sai, em meio a muitas dúvidas, sob o aspecto particular de vida de cada um dos jurados, como eles pensam vivem ou vieram definirá o destino da acusada. O caminho buscado a todo tempo pelo roteiro em contornar a trama principal com as ótimas subtramas dos jurados é uma boa escolha mesmo que trave um pouco o seriado em alguns episódios medianos. O ritmo se acelera nos últimos três episódios eletrizantes, onde descobrimos as verdades e as punições para as consequências.

Para quem curte uma trama jurídica, recheada de pontos sem nós onde o espectador é guiado através de ótimos personagens rumo às explicações e seus porquês, Doze Jurados pode ser uma ótima diversão.

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14/07/2020

Pausa para uma série: #8 - Little Fires Everywhere (1a Temporada)


Os obstáculos da vida que são usados para construção do que acreditamos ser o certo para nossa vida. Produzida pelo streaming Hulu mas agora já disponível no Amazon Prime, a primeira temporada de Little Fires Everywhere é intensa, impactante, com atuações que chamam a atenção além de um sólido roteiro que esconde seus segredos muito bem ao longo dos pujantes oito episódios. Falando sobre o papel da mãe de diversas maneiras, preconceitos, primeiro amor, aborto, as escolhas profissionais e os dramas que devemos enfrentar, nos lados opostos dessa engenhosa trama, duas atrizes fantásticas brindam os amantes das series com atuações inesquecíveis: Reese Whiterspoon e Kerry Washington. Little Fires Everywhere é um dos seriados que você não pode deixar de assistir. Um retrato apodíctico sobre nossa sociedade.

Na trama, que estreou na segunda metade de março desse ano nos Estados Unidos e logo depois desembarcou no Brasil, acompanhamos a chegada de Mia (Kerry Washington) e Pearl (Lexi Underwood), mãe e filha, que chegam a cidade de Shaker Heights em Ohio em um carro antigo e com a vida toda delas na mala. Após buscarem um lugar para morar na cidade, acabam conhecendo a jornalista e mãe de quatro filhos Elena (Reese Witherspoon), uma mulher de uma família prestigiada na região que acaba alugando para Mia e Pearl uma casa que é de sua família. Aos poucos a relação entre Mia e Elena passa de uma quase amizade para um total jogo misterioso onde os segredos que ambas escondem dos seus próximos acabam levando ambas a um conflito profundo e com muitas consequências.   

Seguir ou não as ‘regras da vida’? É difícil imaginar o desenho completo do roteiro desse seriado se não o assistir. As subtramas são excelentes e no final percebemos como as conexões acabam se encaixando como uma luva, levando o espectador a fugir dos rótulos de vilão ou mocinho pois os erros de todos são vistos com bastante clareza tendo como background as hipocrisias da sociedade do lado de cá da telona, os preconceitos e situações que vivemos ou já ouvimos falar. Há complexidade em tudo quando imaginamos os enormes conflitos dos personagens, principalmente as duas mães mas também os filhos que fazem parte dos mais dolorosos conflitos e dilemas. Little Fires Everywhere é imperdível.

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Pausa para uma série: #7 - The Umbrella Academy (1ª Temporada)


Nenhuma família precisa se entender por completo para lutarem pelo que é o certo. Pouco comentada e passando quase desapercebida no catálogo da Netflix, The Umbrella Academy se baseia em uma fórmula interessante de misturas equilibradas de gêneros narrativos, vai do drama à ação em segundos com muita competência. Tudo isso aliado a um visual com tons pesados que refletem com ênfase sobre as características bastante complicadas de cada um dos intrigantes personagens: uma família de super heróis desajustada e pouco unida que precisa estar junta para combater o fim dos tempos. Excelente em sua narrativa (que já ganhou uma segunda temporada) The Umbrella Academy é baseada na história em quadrinhos homônima escrita pelo músico e vocalista da conhecida banda My Chemical Romance, Gerard Way, com ilustrações feitas pelo brasileiro Gabriel Bá.  

Na trama, acompanhamos a história de uma família de crianças com dons adotadas pelo milionário Sir Reginald Hargreeve. Das 7 crianças, uma parece não ter dons a princípio e sempre fica deslocada, Vanya (Ellen Page). Após uma infância muito conturbada lutando contra vilões e perdendo um pouco do lado construtivo das relações familiares, anos se passam e cada irmão foi para um lado e o que acaba os unindo novamente é uma situação com o pai deles aliada ao inusitado retorno do ‘número 5’ (Aidan Gallagher, em atuação destacada) que ficou preso em um loop temporal anos atrás e que consegue voltar para os dias atuais dizendo que todos eles precisam estar juntos pois um apocalipse está chegando. Assim, para impedir que o mundo termine, e enfrentando vilões para lá de loucos, Luther (Tom Hopper), Diego (David Castañeda), Alisson (Emmy Raver-Lampman), Klaus (Robert Sheehan), Ben (Justin H. Min) e os outros dois mencionados acima precisarão estar mais unidos do que nunca.

Original mas sem deixar de ser excêntrica, o seriado arrisca-se ao tentar traduzir sentimentos em imagens e ações, quando parte para o terreno denso, acaba deixando alguns episódios arrastados mas que sempre são salvos por alguma tirada sensacional de algum dos ótimos personagens. E para que todos os super heróis se sobressaiam em tela, óbvio que vilões intrigantes precisam aparecer e esse é exatamente o caso Cha Cha (Mary J. Blige) e Hazel (Cameron Britton) que possui subtramas que adicionam demais a narrativa.

Repleta de mistérios que provavelmente foram deixados sem respostas no aguardo de próximas temporadas, The Umbrella Academy é uma ótima diversão que vai surpreender a muitos. No aguardo da segunda temporada.

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Crítica do filme: 'A Jornada'


A saudade é o que nos fazem viajar para fora do planeta e faz nosso tempo parar. Escrito e dirigido pela cineasta francesa Alice Winocour, A Jornada é um tocante recorte sobre a relação mães x filhos e todo o entorno, muito bem detalhado no projeto, das dinâmicas e complexas divisões entre os compromissos de trabalho e a saudade/atenção aos filhos. Destaque para a ótima atuação de Eva Green, no papel principal, nos emocionamos em muitos momentos com sua personagem, a forte, brilhante, corajosa e batalhadora astronauta Sarah Loreau.

Na trama, conhecemos a astronauta francesa Sarah Loreau (Eva Green) que consegue a chance que tanto queria: fará parte da equipe que viajará para a estação espacial (ao lado de um norte americano e um russo) para um dos últimos projetos antes da ida à Marte. Para tal, precisará ficar 1 ano no espaço e longe de sua filha única. O longa mostra assim os últimos dias de Sarah e os primeiros movimentos de saudade que ambas precisarão enfrentar por conta do compromisso profissional (e dos seus sonhos) da astronauta francesa.

Profundo e sensível, Proxima (no original) é uma extensa jornada na ótica da maternidade. Os desafios e obstáculos vividos por mulheres em busca do topo profissional, sem deixarem de serem dedicadas mães, contornam os backgrounds das situações que acompanhamos ao longo dos ótimos 107 minutos de projeção. A força feminina está em cada linha do ótimo roteiro e não deixa de ser bastante motivador para jovens mulheres que assistam a esse belo trabalho que conta com a já mencionada e destacada atuação de uma das melhores atrizes francesas de sua geração, Eva Green. Belo filme, vale a pena conferirem.

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08/07/2020

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Pausa para uma série: #6 - Dark (1ª,2ª e 3ª Temporadas)


Sem Spoilers.

O tempo sendo associado ao ato de amar em tempos em que o esquecimento é o grande vilão da nossa realidade. Criado pelo cineasta suíço Baran bo Odar e pela cineasta alemã Jantje Friese, Dark chegou ao catálogo do poderoso streaming Netflix sem muito ‘oba oba’, bastou os espectadores irem aos poucos terminando a temporada para o burburinho positivo começar. Muito bem amarrada, com começo meio e fim estrategicamente bem desenvolvidos, com uma produção de arte belíssima, fotografia ótima, trilha impecável e uma montagem de elenco espetacular a produção alemã se tornou um fenômeno cult em pouco tempo, culminando no desfecho da última temporada dentro do período pandêmico que o mundo vive em 2020. Muito bem ranqueado em diversas listas dos principais sensores de cinema/séries do mundo, Dark é uma série difícil de esquecermos.

Como já vi as três temporadas e qualquer descuido é um grande spoiler, podemos apenas contar que a série mostra a rotina, conflitos e descobertas sobre habitantes de quatro famílias de Winden, na Alemanha. Quando um grupo de jovens descobre uma situação suspeitas vinda dentro de uma caverna na floresta da região, um deles some, dando início a uma saga que explora os sentimentos de perda ao limite, passando também pelo inusitado caso do tempo, fator importante e que vamos descobrimento melhor sobre ao longo dos intensos 26 episódios divididos em três temporadas absolutamente arrepiantes.  

Como um tabuleiro bem jogado de rpg, vamos descobrindo as grandes variações de peças nesse jogo de controle por algumas variáveis que descobrimos aos poucos. Não há totalmente heróis, não há totalmente vilões, cada peça se move conforme pensa e acredita que pode manter ou descontruir a variável tempo de alguma forma. Com muitas lições físicas e paradoxos complicados de explicar, a série caminha dentro de uma, até certo ponto, lógica original definindo desde seu princípio as explicações que se baseiam. Longe de ser interativa, mas com um necessidade gigante de complemento a algumas explicações, de tão complicada, organogramas viram ferramentas para o público entender melhor quem é quem nesse embaralhado trajeto até as descobertas finais dos porquês. Um seriado genial, que prende o espectador até o último minuto. Bravo!

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Pausa para uma série: #5 - The Sinner (1ª Temporada)


Nas profundezas da mente humana sempre há espaço para surpresas para os que enxergam de fora. Em 2017, chegava ao público a 1ª temporada de The Sinner. Disponível, hoje já na sua 3ª temporada na Netflix, a trama de suspense guiada pelos olhos do complicado detetive Harry Ambrose (Bill Pullman em atuação destacada) mostrava um fato impactante já no seu piloto e as surpresas do desenrolar dos porquês transformaram esse seriado, baseado na obra homônima da escritora Petra Hammesfahr, em um dos mais brilhantes do gênero suspense.

Dirigido em sua primeira temporada quase toda pelo cineasta Antonio Campos, nessa primeira jornada de Ambrose aos misteriosos assassinatos que o rondam, acompanhamos a história de Cora (Jessica Biel, que inclusive foi indicado por esse papel ao prêmio Globo de Ouro de Melhor Atriz em Série Dramática) uma mulher feliz no casamento que após uma ida à praia com seu marido e seu filho, acaba por impulsão esfaqueando um homem na frente de todos. Presa, ela a princípio se coloca como culpada, mas o detetive Harry Ambrose (Bill Pullman) desconfia que há algo a mais nesse assassinato a sangue frio.

As costuras entre os pontos de ligação do suspense são excelentes, como uma ampola consegue ir do drama ao mistério de maneira muito profunda, cheia de detalhes e com surpresas. Mesmo que o roteiro de vez em quando prega uma peça ou outra, alguns detalhes não esclarecidos sobre ligações durante a trama, a série como um todo, ao longo dos seus oito episódios prende a atenção do público. O detetive interpretado por Pullman é excêntrico, masoquista que vive um casamento conturbado e possui um desejo intenso por sua amante. Mesmo com todos esses problemas para lidar, Ambrose é obstinado em saber as verdades sobre o caso, mesmo que muitas vezes sendo desacreditado por outros profissionais do seu departamento.

Cora é um retrato do desespero de alguém que faz algo e não sabe o porquê. Muito bem interpretada por Jessica Biel, a personagem se desconstrói e renasce ao longo dos episódios. Há uma interação as vezes na superfície entre Cora e seu marido, algo que poderia ter sido mais profundo e esclarecedor. O papel dos sogros dela também ficam como plano de fundo, sumindo após detalhes sobre a rotina cansativa de morar em frente a eles, mostrado no episódio piloto. Já que o universo a ser explorado é o da protagonista, faltaram algumas arestas para serem melhor detalhadas. Mesmo assim, nada que atrapalhe o andamento da história.

Com ótimas atuações e um roteiro bom para ótimo, The Sinner é um dos seriados mais interessantes que estão disponíveis pelos inúmeros streamings por aí.

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