O novo trabalho da família Barreto, grandes produtores do
nosso cinema, Flores Raras, chega aos cinemas brasileiros na próxima
sexta-feira (16). O filme, apesar de se passar na década de 60, aborda questões
muito atuais da sociedade de maneira global, como o homossexualismo. Para falar
sobre o projeto, Bruno Barreto, Lucy Barreto e Miranda Otto se reuniram no
Hotel Pestanna no bairro de Copacabana.
A trajetória do filme começou há 17 anos atrás. A ideia de
fazer o longa Flores Raras surgiu quando a produtora mineira Lucy Barreto
recebeu o livro Flores Raras e Banalíssimas – do qual o roteiro foi baseado –
na noite de natal de 1995. No dia seguinte, após ter lido a publicação por
completo durante toda a madrugada, Dona Lucy Barreto ligou para a amiga que lhe
deu o presente – a autora do livro Carmen Oliveira - e disse que queria fazer
esse filme.
Ao longo desses anos, a corajosa produtora continuou
desenvolvendo o projeto com diversos roteiros como opções. Propôs o filme ao
diretor Bruno Barreto inicialmente e a princípio, o mesmo, não via filme nessa
história. Conversou sobre o projeto com o diretor argentino – radicalizado no
Brasil - Hector Babenco (Carandiru) que disse algo
semelhante. Assim, Lucy Barreto começou a desenvolver sozinha toda a
idealização deste filme. Até que um dia, Bruno Barreto voltou a procurá-la e
disse que estava interessado em tornar essa história em filme.
“Eu conheci Bishop e
Lota em 1959. Na ocasião, meu marido Luis Carlos Barreto foi, a pedido da
Revista O Cruzeiro, fazer uma matéria com as duas na samambaia. Era um almoço
de domingo onde estava a intelectualidade brasileira, citando alguns nomes
presentes: Vinícius de Moraes, Manoel Bandeira, Carlos leão. Fiquei muito
impressionada com as duas, com a cumplicidade que elas tinham. Elas se
divertiam com os olhares de uma para outra”, comentou emocionada a grande
produtora.
Sobre a escolha do elenco, uma certeza era dominante: Glória
Pires (É Proibido Fumar) seria Lota de Macedo Soares, não poderia ser
outra opção. Um fato que chamou a atenção dos jornalistas foi a declaração de
Dona Lucy Barreto a esse fato: “Liguei
para a Glorinha (Pires) e disse: ‘Você é a Lota de Macedo de Soares, estou te
mandando o livro, leia e me diga o que acha.’ Dois dias depois ela me ligou e
disse que queria o papel”, comentou a veterana em produções nacionais.
A arquiteta Lota Macedo de Moraes teve criação elitista, foi
criada na Europa, falava sete línguas. Por isso que a língua é muito importante
nesse filme, para passar a veracidade das ações. Flores Raras é falado 95%
em português e apenas 5% em português. Os roteiristas escolhidos foram a jovem Carolina
Kotscho (2 Filhos De Francisco) e o experiente britânico Matthew Chapman
(A
Tentação).
A dificuldade da pronúncia da língua portuguesa foi um dos
assuntos abordados na coletiva. A artista australiana Miranda Otto (Guerra
dos Mundos), que interpreta a poetisa e ganhadora do prêmio Pulitzer
Elisabeth Bishop, falou: “Eu tinha uma
desculpa. Elisabeth Bishop não falava o português tão bom, a preparadora do
elenco que me ensinou algumas palavras em português. Eu já falei outras línguas
em outros filmes antes. Eu gosto desse desafio.”
A falta de reconhecimento sobre a construção do Parque do
Flamengo pela grande idealizadora e uma das protagonistas do filme foi um dos
motivos para a realização desta obra. Sobre isso, Dona Lucy Barreto abre o
coração: “Eu sempre morei no flamengo.
Então acompanhei a construção do parque. O resgate da Lota é muito importante
para mim, ela não é reconhecida por essa obra maravilhosa. A única coisa que
nós temos é uma plaquinha que fica na rua Tucumán na passagem subterrânea entre
a praia do flamengo e o parque.”
Como fazer um personagem, até certo ponto antipático em algo
mais suave que passe empatia? A atriz australiana, que rouba cena em muitos
momentos do filme, teve uma grande responsabilidade para contar essa história
de amor. A ideia dos envolvidos no projeto era de que o filme não poderia ser
somente da Lota. “O grande desafio no
roteiro, na filmagem, no trabalho com a Miranda. A grande qualidade da Miranda
foi não cair na armadilha hollywoodiana de querer fazer o seu personagem
simpático. Muitos atores norte-americanos caem nesta armadilha (mesmo que a
artista em questão seja australiana)”, relatou o diretor.
Sobre o período de filmagens no Brasil, Miranda Otto
confessou que adorou gravar no Rio de Janeiro, sentiu dificuldade nos set de
filmagens e se apaixonou pela nossa culinária: “Foi uma sorte enorme vir ao Brasil filmar. Me ofereceram esse papel
fantástico e ir trabalhar todo dia era muito bom. Adorava a hora do almoço, feijoada e a goiabada agora são minhas comidas
favoritas. A comida brasileira é
fenomenal. Algumas coisas nas filmagens são bem diferentes das produções lá
fora, demorei um pouquinho para me adaptar como as coisas acontecem por aqui.”
Em uma das cenas mais marcantes do filme, quando Lota e
Bishop compram uma criança – uma espécie de adoção de outras épocas – foi tema
de uma inteligente colocação durante a coletiva. “A realidade não tem a mínima importância, mesmo se fosse real o meu
compromisso não é com a realidade é com a verossimilhança. Eu sou um ficcionista
não sou um documentarista. Essa situação era uma coisa que ocorria. No nordeste
ainda ocorre, até cinco anos atrás vinham estrangeiros à procura de adoção
nessa região. Nós pesquisamos para buscar a realidade na ficção”, comentou
Bruno Barreto.
Com pretensões de indicações ao próximo Oscar
(principalmente para as duas atrizes) e com temas polêmicas que vão gerar
debates interessantes, Flores Raras – que já se chamara
Você Nunca Disse Eu Te Amo – promete emocionar o público, ansioso para
conferir essa produção que estreia em 150 salas de cinema de todo o Brasil.