Quando em momentos de conflito não existe nem um alma
estranha para aconselhar. Escrito e dirigido por Caio Sóh, Canastra Suja é um drama, um retrato nu e cru de uma família
recheada de problemas, onde muitos se blindam na dependência alcoólica do pai, Batista,
interpretado pelo ótimo Marco Ricca. Impressiona a capacidade do roteiro em
prender o espectador. Talvez pelos ‘plot twist’ existentes, talvez pela
curiosidade do olhar do público em saber qual o final de cada personagem. É um
filme sobre família, seus problemas, seu cotidiano. Cada personagem é uma peça
nesse tabuleiro. A eminência da tragédia é algo que percorre todos os intensos
120 minutos de projeção.
Batista (Marco Ricca) e Maria (Adriana Esteves) são casados
e são pais de três filhos: Emília (Bianca Bin), Ritinha (Cacá Ottoni) e Pedro
(Pedro Nercessian). Eles levam uma vida de aparências, regados de problemas do
cotidiano, muito por conta do fato de Batista ser um alcoólatra. Sem confiança
de ninguém de sua família, o pai desconta toda sua raiva e frustrações da vida
bebendo e no relacionamento repleto de dificuldades com o filho. Alguns
acontecimentos surpreendentes vão contornar essa história.
As reviravoltas do roteiro são importantes para o ritmo da
trama, vamos aos poucos vendo faces ocultas dos personagens que causam surpresa
e mudam nossa ótica sobre eles. Cartas de baralho definem arcos. Extremamente
complexos individualmente, completamente desalinhados como família, Canastra Suja apresenta um leque de
portas se abrindo ao mesmo tempo que muitas outras se fecham. O olhar para o
futuro com alegria vai virando um pequeno feixe de luz na porta mais distância
que conseguimos enxergar.
As subtramas são muito bem elaboradas, exploram as características
de cada personagem. Os dramas tomam camadas densas e profundas. Muitos
personagens parecem estar no limite. Pedro usa os problemas do pai como
justificativa para sua falta de rumo na vida, colocando-o sempre em evidência. Emília é um epicentro importante da família. Parece que todas as
variáveis passam por ela, possui um papel de equilíbrio, pelo cuidado que tem
pela irmã Ritinha. Namora Tatu (David Junior), mas também gosta do seu chefe
dentista. A partir do segundo arco,conhecemos um pouco mais a fundo a dama do
baralho, que parece esconder segredos, sonhos e objetivos, Maria, a mãe. Quando
a família volta do trabalho, seu papel permanece como outra vertente de
equilíbrio, principalmente na relação conturbada entre o filho e o marido. A
batalha entre pai e filho percorre todos os arcos. Um coloca no outro a culpa
pelos seus problemas. Batista é um pai rígido mas não consegue se livrar de
seus fantasmas com a bebida, o que coloca em xeque todo o respeito que os
outros poderiam ter por ele.
A bela apresentação inicial, ao melhor estilo teatral, onde
a câmera passa pelos personagens já indicava um certo tipo de ciclo que
veríamos, talvez com uma redenção, talvez com esclarecimentos sobre os futuros
dos personagens. Canastra Suja é um
trabalho sólido, surpreendente e, desde já, podemos afirmar ser um dos grandes
trabalhos do cinema nacional nesse ano. Imperdível.