Há beleza num mundo caótico? Uma igreja que se casa com uma
era ficará viúva na próxima era. Dirigido pelo cineasta brasileiro Fernando Meirelles, Dois Papas é um contratempo do pensar,
dois dos maiores artistas de suas gerações, o tango vs pretzel, tudo isso
envolto em suposições de dias de diálogos entre duas mentes completamente
diferentes mas que amam o mesmo Deus. Indicado em algumas categorias no próximo
Globo de Ouro, e, provavelmente com algumas futuras indicações ao Oscar 2020,
essa produção Netflix é um leve filme, onde nos diálogos a magia acontece.
Na trama, em passagens rápidas e intensas em certos anos,
acompanhamos o encontro entre Jorge Bergoglio (Jonathan Pryce) e Joseph Ratzinger (Anthony Hopkins), o atual e o ex-papa. A fundo em seus modos de
pensar, vamos descobrindo curiosidades - algumas com boas pitadas de licença
poética e imaginária - uma que evoluiu outra que ainda não consegue de
desprender da defesa de tradições ultrapassadas. Discutindo o tempo todo sobre
tabus e temas contemporâneos, pequenos flashbacks resgatam épocas passadas da
vida do popular atual papa.
Nada é estático na natureza, nem no universo, nem mesmo
Deus. Um muro foi construindo, a partir de ideias e velhos mandamentos,
tentando proteger ‘valores’ da igreja, enquanto o problema, como todos sabem,
era dentro dos muros. Se foi ou não verdade tudo que presenciamos em Dois Papas acaba não importando muito.
O que interessa é que a partir das características do pensar de cada uma dessas
personalidades, e, como isso flui com uma naturalidade em um ritmo delicioso
dentro da trama, escrita por Anthony
McCarten. Os pecados, os perdões, e tudo aquilo que poderíamos imaginar, em
uma cenário, sobre o que acontece no lado de dentro do famoso Vaticano é
colocado aos nossos olhos iluminados pelo encontro de duas lendas dos palcos e
da telona. Impressionante a sintonia. Um deleite aos tão apaixonados cinéfilos
de todo o planeta.
Exibido em alguns sortudos cinemas pelo Brasil (antes do seu
lançamento na Netflix, que ocorreu na última semana), o filme deve agradar a
maioria do público pelo seu tom leve e até certo ponto descontraído nesse
subextrato imaginário baseado em fatos reais. A cereja do bolo é a sublime
trilha sonora, com direito a Bella Ciao.