O que seria de nós sonhadores sem o cinema? A sétima arte tem poderes mais potentes do que qualquer superman, nos teletransporta para emoções, situações, onde conseguimos lapidar nossa maneira de enxergar o mundo através da ótica exposta de pessoas diferentes. Por isso, para qualquer um que ama cinema, conversar sobre curiosidades, gostos e situações engraçadas/inusitadas são sempre uma delícia, conhecer amigos cinéfilos através da grande rede (principalmente) faz o mundo ter mais sentido e a constatação de que não estamos sozinhos quando pensamos nesse grande amor que temos pelo cinema.
Nossa entrevistada de hoje é cinéfila, do Rio de Janeiro. Roberta Mathias é Antropóloga,
Fotógrafa e Mestre em Filosofia - Estética/Cinema. Doutoranda no Departamento
de Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) com
coorientação pela Universidad Nacional de San Martin (Buenos Aires). Doutoranda
em Cinema pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Além disso, é
Pesquisadora de Cinema e Artes latino-americanas.
1) Na sua cidade,
qual sua sala de cinema preferida em relação a programação? Detalhe o porquê da
escolha.
Escolheria uma recém-fechada: Cine Joia, em Copacabana. Sala
na qual vi meus primeiros filmes projetados.
Uma sala que passou por diversas transformações ao longo dos anos e foi
resgatada em meados dos anos 2000 por entusiastas.Conseguiu sobreviver até a pandemia
com programação diversa contando com mostras de cinemas, shows,saraus...
Entendeu a sala como espaço de encontro e possibilidade de trocas. Que ao Cine
Joia ainda restem 5 vidas. Ainda cito como menção honrosa o lindo trabalho da
Ponto Cine de resgate e formação de audiência para o cinema nacional.
2) Qual o primeiro
filme que você lembra de ter visto e pensado: cinema é um lugar diferente.
Nosthalgia, Andrei Tarkovsky. Meu pai era cinéfilo
(a polêmica aqui pode ser: não me considero como tal). Ele tinha um amigo de
quem pegava entre duas ou três fitas por semana após sua aposentadoria. Estava
passando por acaso em seu escritório e parei na frente da Tv com a sequência da
piscina. Tinha entre 6 e 7 anos e pensei exatamente isso: Isso é completamente
diferente de tudo o que vi. A situação foi repetida em meu primeiro ano de
cinema, já em uma faculdade quando o professor de som resolveu passar o filme.
3) Qual seu diretor
favorito e seu filme favorito dele?
Pergunta muito difícil e que muda quase diariamente. HOJE e
para as suas sequências de perguntas(rs), eu diria: Cinema Paradiso, Bem-vindo à
Casa de Bonecas e O Pântano
porque tiveram papéis importantes em minha formação audiovisual. Mas não sei,
por exemplo, se diria que os três diretores seriam meus favoritos. Certamente,
a Lucrecia Martel integra uma
possível lista porque abriu meus olhos definitivamente para o cinema
latino-americano (pelo qual tenho particular interesse) ...
4) Qual seu filme
nacional favorito e porquê?
Outra pergunta dificílima (e agora você percebe que não
consigo responder diretamente a perguntas sobre cinema). Acho que adotarei a
mesma tática da resposta acima, HOJE Macunaíma
: por tudo o que representa para a cultura nacional; Edifício Master :porque o Coutinho me apresentou a uma outra forma
de cinema documental que pode ter influenciado minha mudança de trajetória
profissional e Sinfonia da Necrópole
da Rojas e Temporada do Novaes: por
anunciarem um novo cinema nacional que muito me interessa.
5) O que é ser
cinéfilo para você?
Como disse anteriormente, não me considero cinéfila. Talvez
precise de um desprendimento que não tenho. Um poder transitar por entre
linguagens e temáticas que não possuo. Acredito que meu pai o fosse, pois se
interessava por cinema em geral e todos seus formatos. Quase como um
colecionador. Por mais amplos que sejam meus interesses e minha paixão pelo
cinema, acho que existe um espectro pelo qual decido caminhar.
6) Você acredita que
a maior parte dos cinemas que você conhece possuem programação feitas por pessoas
que entendem de cinema?
Acredito que no “entender de cinema” existe uma gama vasta
de possibilidades. A sala precisa dialogar com o espectador. Acredito que,
quando ela o faz, cumpre seu papel. Por isso, o programador pode exercer um
papel de mediador, procurando entender o que a sala permite para aquele espaço
específico (bairro, cidade, país na qual a sala está localizada) e o que seria
de interesse do público. É claro que algumas salas se transformam em entidades
e começam a atrair a um público específico a partir de sua própria programação,
o que também pode ser bonito de se ver.
7) Algum dia as salas
de cinema vão acabar?
O cinema é uma técnica em transformação. Vou usar o exemplo
da fotografia. Comecei a fotografar profissionalmente antes de me envolver com
cinema- apesar da paixão pelo cinema ter vindo antes. Quando comecei, peguei a
rebarba da fotografia analógica e início da fotografia digital no país. Fiz
minha formação no SESC ainda com um laboratório super ativo e com a fotografia
analógica como parte de metade do curso. Logo depois, isso desapareceu, mas
voltou como vintage ou linguagem artística. Então, não acredito que as salas
irão acabar. Acho que elas irão se modificar e dar espaços para outros formatos
de exibição como já vem acontecendo. Mas, é complicado fazer um exercício de
futurologia. As coisas, os conceitos e os sentimentos estão em constante
modificação.
8) Indique um filme
que você acha que muitos não viram, mas é ótimo.
Acredito que esse conteúdo será lido por iniciados, não é?
rs Eu gosto muito do deixar-se ser contradição que é o Raúl Perrone. Um dos meus diretores em atividade favoritos e sempre
citado. Então, para quem me conhece não será exatamente uma surpresa...
9) Você acha que as
salas de cinema deveriam reabrir antes de termos uma vacina contra a covid-19?
Não. Bem direta. rs Mas posso desenvolver um pouco... Antes
de tudo temos uma responsabilidade social e não podemos nos distanciar dela. O
Brasil é um país que vive uma crise em quase todos os possíveis sentidos da
palavra. Não precisamos de uma crise sanitária. O que não significa que eu seja
contra o consumo e a divulgação dos cinemas ante da vacina. Sou extremamente
entusiasta do conteúdo distribuído por meios virtuais. É outra coisa? É. Mas é
o mais seguro e responsável nesse momento.
10) Como você enxerga
a qualidade do cinema brasileiro atualmente?
Acho que o cinema brasileiro vem criando novas identidades
desde meados dos anos 2000 e isso é motivo de comemoração para qualquer amante
de cinema. Como disse em outra pergunta, gosto muito do cinema feito pela Juliana Rojas, pelo André Novais, pela Plano3 Filmes e um “novo, novo” cinema
recifense que vem nascendo... Me parece um cinema que olha mais para dentro de
nossas feridas, não como um olhar de denúncia – porque já sabemos os erros que
cometemos na tentativa de construção de uma identidade nacional-, mas como um
olhar de urgência. Essa me parece a postura a ser tomada diante de algumas
questões. Emergência é a palavra e, se o cinema puder ajudar nisso, um tanto
melhor. Sem perder a sensibilidade, melhor ainda. E, sinto um tanto disso nas
referências citadas. Mas tem muita gente boa que não entrou...
11) Diga o artista
brasileiro que você não perde um filme.
Não sei mesmo...
12) Defina cinema com
uma frase:
Possibilidades.
13) Conte uma
história inusitada que você presenciou numa sala de cinema:
Depende do gênero favorito. Já vi gente abrir garrafa de
espumante e sacar da bolsa salada de frutas, geléia de damasco e torradinhas
(estavam ao meu lado e fiz questão de olhar o sabor), mas a que conto sempre é
a experiência de ver Dançando no Escuro
na pré-estreia do Festival do Rio em
um Odeon novinho. O filme acabou:
metade da plateia em prantos e a outra metade permaneceu estatelada nas
cadeiras.
14) Defina 'Cinderela
Baiana' em poucas palavras...
Beleza, graça e ironia brasileiras. Típico caso: Quando
transformam o filme em algo melhor que ele mesmo. Não, à toa, somos campeões em
memes.
15) Muitos diretores
de cinema não são cinéfilos. Você acha que para dirigir um filme um cineasta
precisa ser cinéfilo?
Não. Rs.
16) Qual o pior filme
que você viu na vida?
Não me lembro. Memória seletiva. Rs Sério. Se não gosto,
deleto porque o HD já está cheio demais.
17) Qual seu
documentário preferido?
Edifício Master
para ser coerente com a resposta anterior (mas é possível que eu já citasse um
outro Coutinho aqui se essa entrevista fosse presencial).
18) Você já bateu
palmas para um filme ao final de uma sessão?
Não.
19) Qual o melhor
filme com Nicolas Cage que você viu?
Coração Selvagem
e Adaptação dividem o posto.
20) Qual site de
cinema você mais lê pela internet?
Sem querer fazer
"oba-oba" para os colegas, a Revista Rebeca. É conteúdo acadêmico,
mas é para falar a verdade, né? rs