O que seria de nós sonhadores sem o cinema? A sétima arte tem poderes mais potentes do que qualquer superman, nos teletransporta para emoções, situações, onde conseguimos lapidar nossa maneira de enxergar o mundo através da ótica exposta de pessoas diferentes. Por isso, para qualquer um que ama cinema, conversar sobre curiosidades, gostos e situações engraçadas/inusitadas são sempre uma delícia, conhecer amigos cinéfilos através da grande rede (principalmente) faz o mundo ter mais sentido e a constatação de que não estamos sozinhos quando pensamos nesse grande amor que temos pelo cinema.
Nosso entrevistado de hoje é cinéfilo, de Belo Horizonte
(Minas Gerais). Nicholas Correa tem
21 anos. É graduando em Cinema e Audiovisual pela PUC Minas, crítico para o
portal Plano Aberto, com uma
participação em um episódio do Podcast
Cinema em Transe.
1) Na sua cidade,
qual sua sala de cinema preferida em relação a programação? Detalhe o porquê da
escolha.
Dois lugares que me marcaram muito: o Cinema Usiminas Belas Artes e o Cine Humberto Mauro. O Belas Artes eu gosto particularmente pela
programação que contempla filmes com um apelo menos comercial, é um lugar que
eu posso assistir um filme do Hong
Sang-Soo por exemplo. O Cine Humberto Mauro é uma sala que possui um
trabalho de curadoria excelente, com mostras e festivais que marcaram a minha
trajetória, assim como a trajetória de muita gente. A minha relação afetiva com
esses dois espaços não é diferente da cinefilia belorizontina, tenho muito
apreço por eles.
2) Qual o primeiro
filme que você lembra de ter visto e pensado: cinema é um lugar diferente.
É difícil pensar em uma sessão específica, minha relação com
o cinema começou bem cedo e não foi nas salas, foi nos DVDs. Lembro que ver Titanic ainda criança foi algo bem
marcante. Mas se eu tiver que apontar uma das sessões que mais ficou na memória
nesse início de cinefilia foi uma exibição de O Circo do Chaplin em
que fui com minha família.
3) Qual seu diretor
favorito e seu filme favorito dele?
Eu não tenho um diretor favorito, tem alguns que me chamam
mais atenção por um determinado momento. Nesses tempos eu tenho pensado
bastante no James Benning, dele eu
gosto especialmente de Landscape Suicide.
4) Qual seu filme
nacional favorito e porquê?
Eu simplesmente amo o Sem
Essa, Aranha do Rogério Sganzerla.
A liberdade, a desfaçatez, o atrevimento, tudo nesse filme é muito inspirador.
5) O que é ser
cinéfilo para você?
Diria que é muita coisa. É ter paixão pelos filmes, claro,
mas também é ter disposição, curiosidade, inquietações e também saber que, como
tudo na vida, quanto mais você se aprofunda em uma questão, mais você se dá
conta de que ainda tem muito o que ver e aprender. Ser cinéfilo é apreciar uma
coisa inesgotável.
6) Você acredita que
a maior parte dos cinemas que você conhece possuem programação feitas por
pessoas que entendem de cinema?
De uma certa maneira, sim. Acredito que a maior parte das
salas, os multiplex de shopping, tem uma programação feita por pessoas que
conhecem o cinema mais por uma parte mercadológica do que qualquer outra coisa.
Essas pessoas não são ignorantes a respeito do cinema, mas não imagino que elas
vão tratar dos filmes de um ponto de vista estético, sociológico ou cultural,
elas vão seguir uma lógica de mercado antes de mais nada. Elas conhecem o
cinema tendo em mente o que “funciona” e o que “não funciona”. Mas claro,
existem curadores e programadores que se preocupam com questões que estão além
do mercado e é um trabalho que precisa ser cada vez mais valorizado.
7) Algum dia as salas
de cinema vão acabar?
Não. A sala de cinema pode perder espaço diante do streaming
ou de outras mídias, mas acabar totalmente acho muito improvável. Além do mais,
somos seres sociais, nós gostamos de aglomerar em vários tipos de arena, jogos
de futebol, shows de música, espetáculos de teatro, de dança, etc. Enfim, não
acho que vamos deixar de ir ao cinema.
8) Indique um filme
que você acha que muitos não viram mas é ótimo.
Por algum motivo insondável quase ninguém fala do The Last Wave do Peter Weir, filme fantástico.
9) Você acha que as
salas de cinema deveriam reabrir antes de termos uma vacina contra a covid-19?
Não, os cinemas deveriam esperar até a situação ser
controlada. Eu não tenho o mesmo conhecimento de um infectologista e eu sei que
as salas estão tomando alguns cuidados, controlando o ambiente e tal, mas acho
que ainda existe um risco, principalmente em se tratando de um espaço fechado.
10) Como você enxerga
a qualidade do cinema brasileiro atualmente?
Não gosto de fazer generalizações e é difícil bater o
martelo sobre o momento atual, mas uma coisa dá para ter certeza, o cinema
brasileiro é muito rico. Só nessa última década o que teve de filmes excelentes
vindo tanto de cineastas veteranos quanto de uma geração relativamente mais
recente é impressionante. Para citar alguns dos filmes que eu mais gostei: Luz nos Trópicos (Paula Gaitán), Já Visto,
Jamais Visto (Andrea Tonacci), Beduíno (Júlio Bressane), Vaga Carne (Grace
Passô, Ricardo Alves Jr), Sinfonia da Necrópole (Juliana Rojas, Marco Dutra),
República (Grace Passô), No Coração do
Mundo (Gabriel Martins, Maurilio Martins), Sertânia (Geraldo Sarno).
11) Diga o artista
brasileiro que você não perde um filme.
Gosto muito da Grace
Passô. Ela não só está em vários filmes que eu gosto nesses últimos anos do
cinema brasileiro como também dirigiu alguns.
12) Defina cinema com
uma frase:
A rigor seria: “Um conjunto de imagens que tem uma duração
própria”. Mas eu falo essa frase sob o risco de me arrepender depois. Essa é a
pergunta mais difícil, porque o cinema, como toda a arte, é um conceito fluido,
dinâmico e que não deve nada a coisa nenhuma. A gente pode se surpreender com
ele.
13) Conte uma
história inusitada que você presenciou numa sala de cinema:
Minha vida na sala de cinema infelizmente não é muito
movimentada, mas me lembro de uma sessão de Era Uma Vez em Tóquio em que um sujeito muito bêbado entrou na sala
durante os créditos iniciais. Ele fez um ou dois comentários com a voz toda
troncha, até que alguém no fundo pediu para ele se aquietar e esse sujeito deu
uma resposta engraçadinha. Não me lembro mais dessa resposta, mas ela rendeu
umas risadas minhas e do restante da sala.
14) Defina 'Cinderela
Baiana' em poucas palavras...
Venho aqui diante do povo brasileiro pedir perdão, não
assisti Cinderela Baiana.
15) Muitos diretores
de cinema não são cinéfilos. Você acha que para dirigir um filme um cineasta
precisa ser cinéfilo?
Não, ele só precisa ser sincero no que faz.
16) Qual o pior filme
que você viu na vida?
Antigamente eu costumava odiar certos filmes, mas hoje em
dia eu tento enxergar filmes ruins de uma maneira mais fria mesmo, sem
ressentimentos. Mas se eu tenho que apontar um que foi inesquecível, esse filme
é O Cozinheiro, o Ladrão, sua Mulher e o
Amante.
17) Qual seu
documentário preferido?
Uma História do Vento
do Joris Ivens e da Marceline Loridan. É um documentário
que mescla elementos ficcionais também. Definir os limites do documentário e da
ficção é uma dessas coisas que, quanto mais você tenta, mais você se frustra.
Alguns dos melhores documentários exploram essa tensão.
18) Você já bateu
palmas para um filme ao final de uma sessão?
Eu normalmente bato palmas quando algum dos realizadores
está presente na sessão, mas fora isso não costumo bater palmas.
19) Qual o melhor
filme com Nicolas Cage que você viu?
Do meu querido Nicolas
Cage eu gosto muito do Face Off.
20) Qual site de
cinema você mais lê pela internet?
Não vou saber te dizer qual site eu mais leio. Além dos
textos dos meus colegas no Plano Aberto
eu gosto muito de revistas e portais como Contrabando,
Multiplot!, Cinética, À Pala de Walsh. Também acompanho o blog Vestido sem Costura que faz um trabalho
fantástico com a tradução de vários textos de críticos mundo afora incluindo
alguns clássicos como os textos de Serge
Daney. Um site que também leio bastante, mas que já está inativo há um bom
tempo, é o da revista Contracampo.
Como também é o caso de muita gente que eu conheço, essa revista foi
fundamental na minha formação cinéfila.
21) Qual streaming
disponível no Brasil você mais assiste filmes?
Eu também não vou saber te dizer qual streaming eu mais
consumo. Assisto filmes não só pela Mubi
e pela Netflix como também pelo Youtube, espaços como UbuWeb, Lux Moving Image, Light Cone e
sites de cinematecas. Só que recentemente com a pandemia eu tenho focado mais
em acompanhar festivais e mostras online, nesses eventos é possível encontrar
filmes que são pouco vistos e pouco debatidos. As mostras e festivais também
impõem limites de tempo para acessar os filmes, então eu dou prioridade para
eles.