Um dos sequestros mais absurdos e com desenrolares inacreditáveis da história da Europa. Gravações feitas no mês de agosto do ano de 1988 se transformaram em um documentário que nos impacta do início ao fim. Os Reféns de Gladbeck, lançado recentemente na Netflix tem a proposta de apresentar os fatos de um sequestro onde, por mais de 50 horas, sem interrupção, telespectadores da Alemanha Ocidental acompanharam os desenrolares da ação criminosa que virou um grande circo midiático. Totalmente feito com gravações originais, mostrados em ordem cronológica, vamos acompanhando uma série de absurdos que se sucedem, desde um passivo comando das forças policiais até a interferência massiva de jornalistas ao longo de todos os fatos.
O drama dos primeiros reféns começou logo pela manhã, perto
das 8 horas quando dois criminosos conhecidos da polícia, muito por já terem
longa ficha criminal, invadiram um banco na cidade de Gladbeck e fizeram um
gerente e uma funcionária de reféns. Negociando com a polícia para em
troca soltarem os dois inocentes dessa história, conseguem um carro e dinheiro,
assim rumam para o norte do país, mais precisamente a cidade que se formou às
margens do rio Weser, Bremen, onde uma série de bizarras situações acontecem. A
polícia parecia estar bastante perdida, sem saber lidar com a situação. Os
horrores da situação em si eram camufladas por ações absurdamente amistosas de
dezenas de jornalistas que cobriam os desenrolares desses dias caóticos com uma
proximidade aos fatos e aos criminosos poucas vezes vista.
Talvez o maior ponto de reflexão de tudo que assistimos ao
longo das pouco mais de uma hora e meia de projeção seja o papel da imprensa,
esse colocado em reflexão a todo instante. Inusitadas situações acontecem
enquanto pessoas eram feitas de reféns, como por exemplo um dos sequestradores,
totalmente sem medo, começa a dar entrevistas para os jornalistas em clima
amistoso, uma situação absurda que, no mínimo, afronta ostensivamente as
convenções e conveniências morais e sociais quando pensamos em tudo que estava acontecendo
naquele momento ali. E os absurdos não param por aí, há inclusive tentativas independentes
de mediação por partes de alguns jornalistas, o maior exemplo disso é um editor-chefe
de um jornal de Colônia que entrou no carro dos bandidos buscando soluções para
a situação (ou apenas mais material para seu jornal) quando não era esse seu
papel.
Muitas mudanças em relação a cobertura jornalística (conduta
da mídia) na Alemanha foram determinadas após tudo que acontece nessa história.
Em uma delas, o Conselho de Imprensa Alemão, após o ocorrido, proibiu qualquer
entrevista com sequestradores durante situações com reféns. Até hoje os acontecimentos
de agosto de 1988 são lembrados e intensos debates são travados não só em
relação ao papel da imprensa mas também sobre os erros e os desencontros das forças
policiais e também em relação à justiça e a sentenças dadas aos envolvidos.