11/03/2024

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Pausa para uma série: 'O Sinal'


O que pode estar lá fora? Desde os tempos inesquecíveis de episódios semanais de Arquivo X, nos primórdios das produções seriadas, nos deparamos com situações ligadas as incertezas do universo. A nova minissérie da Netflix, O Sinal, percorre o mesmo caminho, nos levando a questões sobre as verdades que estão lá fora de uma forma inteligente, costurando o que é real e o que a mente projeta.


Tendo como alicerce misteriosas situações que acontecem em uma estação espacial, ao longo de quatro episódios com cerca de uma hora de duração, essa produção alemã parte para suas reflexões existenciais a partir da certeza que a história da humanidade nada mais é que um ciclo vicioso, explorando as ações do ser humano quando existe a possibilidade de se achar a ruptura disso.


Na trama, conhecemos Paula (Peri Baumeister), uma brilhante cientista alemã enviada por uma empresa privada para o espaço com um único objetivo de realizar pesquisas sobre possíveis sinais vindos de fora da Terra. Ao mesmo tempo, seu marido, o professor de história Sven (Florian David Fitz) e sua jovem filha com deficiência auditiva esperam o retorno dela. Perto de completar sua missão, Paula se depara com uma descoberta e conflitos se desenrolam. Ao voltar ao nosso planeta acaba sendo responsabilizada por uma tragédia, modificando completamente a vida de sua família.


Questões geopolíticas, ambições, circo midiático, dramas familiares se entrelaçam nesse projeto que busca perguntas sobre a relação do ser humano com o próprio sentido de existência. É um caminhar bem filosófico que gera interpretações diversas. Há um curioso mistério que percorre os episódios, a princípio mal definido nos dois primeiros capítulos mas conforme vamos juntando as peças tudo começa a fazer um certo sentido. O choque entre o dilema de Paula na espaço e os dramas que sofre sua família na Terra é o combustível desse roteiro que objetiva encontrar um norte entre esses paralelos.  


O ponto mais interessante é quando entendemos sobre o que de fato é essa história. Aqui a humanidade é colocada em evidência, dentro do ciclo vicioso já mencionado, a partir das possibilidades de descobertas sobre o que há pelo universo. A ganância, a imposição militar, o reconhecimento, as loucuras que a mente é capaz de projetar, são alguns dos elementos que estão associados as ações vistas que traçam paralelos com a realidades de conflitos de diversos cotidianos. O eterno embate entre as ações individuais e coletivas, dentro de um sentido da essência do ser humano pondera o certo e o errado.  


Na sua incessante busca pelos conflitos emocionais de uma protagonista em crise nos dilemas que percebe na sua trajetória, algo necessário para entendermos a construção e desconstrução da personagem, a narrativa pode se tornar confusa em alguns momentos com um uso excessivo de flashbacks onde a variável tempo e seu vai e vem se tornam constantes. Mas o contexto acaba sendo uma peça chave, e mesmo caminhando pela previsibilidade, encontra um desfecho que não deixa de ser surpreendente, com um simbolismo importante para os nossos tempos.



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08/03/2024

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Crítica do filme: 'Sintonia de Amor' *Revisão*


O significado de milhões de pequenas coisas. Chegava aos cinemas três décadas atrás um filme apaixonante que navega do luto ao recomeço pelas linhas intensas e imprevisíveis do amor. Indicado para dois Oscars, Sintonia de Amor contorna a melancolia com a esperança trazendo carismáticos personagens que são levados para um encontro às cegas num tempo onde o Tinder nem pensava em existir. Dirigido pela cineasta Nora Ephron, esse é um dos três filmes estrelados pela dupla Tom Hanks e Meg Ryan. O mais rentável de todos eles.

Na trama, conhecemos Sam (Tom Hanks), um arquiteto de luto que se muda para Seattle com o filho em busca de um novo recomeço após a morte da esposa. Um ano e meio depois e sem avançar muito no luto ainda intenso, numa noite de natal seu filho resolve enviar uma mensagem para um programa de uma rádio pedindo ajuda para o pai arranjar uma nova esposa. A mensagem toca os corações de muitos, inclusive da jornalista Anne (Meg Ryan) que embarca em uma viagem para conhecer essa família de dois.

Inspirado no clássico da década de 50, Tarde Demais para Esquecer, a narrativa segue em paralelo as vidas de Sam e Anne tendo como interseção a possibilidade do amar. Assim, vemos um possível encontro entre um homem abalado pelo trauma que perdeu um pouco da esperança de amar intensamente e de uma mulher sonhadora que percebe aos poucos que o seu presente não é da forma como queria. A construção dos personagens, seus dramas e conflitos, são vistas de formas separadas.

O sentido de família aqui é muito bem explorado pelo roteiro. Do luto ao recomeço, há um enorme espaço onde o desenvolvimento dos personagens acontecer através dos olhares para os conflitos, não só dos protagonistas mas dos coadjuvantes que os cercam, que se seguem mesmo tendo o exagero, as licenças poéticas em muitas linhas. Aqui o impossível é aproximado ao inusitado, ou ao ar de sabedoria do destino, fato esse que aproxima os corações sonhadores do lado de cá da telona.

Um ingrediente é fundamental por aqui! A trilha sonora é marcante, com lindas versões de clássicos da música. Nat King Cole, Louis Armstrong, Céline Dion, Joe Cocker são algumas das vozes que ouvimos em canções fabulosas, como: As Time Goes By, When I Fall In Love, A Kiss To Build A Dream On.

Duas curiosidades sobre o filme. A primeira é que Tom Hanks e Meg Ryan só tiveram cerca de dois minutos de tempo de tela juntos em cena. A segunda, é que durante a sua folga, Tom Hanks começava a gravar a dublagem do primeiro Toy Story.

Sintonia de Amor é um sucesso dos anos 90, um filme para todos os românticos continuarem suas caminhadas na esperança de que o grande amor da vida existe e pode te encontrar em qualquer lugar.



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Crítica do filme: 'Closer - Perto Demais' * Revisão *


‘Olá estranho!’. Os cinco minutos iniciais hipnotizantes, com uma bela canção que sempre nos fará lembrar desse filme, já previa que estaríamos de frente com uma obra que marcaria nossos corações. Closer – Perto Demais, lançado duas década atrás, nos leva para as profundezas do desejo, das desilusões, a partir de quatro personagens que tem suas vidas conectadas por ações e inconsequências. Baseado em uma peça teatral homônima do autor britânico Patrick Marber, o filme ganhou duas indicações ao Oscar.

Na trama, conhecemos quatro personagens em alguns momentos de suas vidas. Um encontro pelas ruas de uma grande cidade, entre o jornalista que escreve obituários Dan (Jude Law) e uma jovem vinda de outro país, Alice (Natalie Portman), acende uma paixão. O tempo passa, e Dan escreveu um livro sobre Alice e acaba conhecendo e se apaixonando pela fotógrafa Anna (Julia Roberts) com quem mais à frente entrará em um relacionamento com Larry (Clive Owen). Essas quatro vidas vão passar por uma série de situações dolorosas a partir de suas próprias escolhas ligadas ao desejo e o que acham que é amor.

Por que o amor não basta? Invadindo o campo das emoções conflitantes quando pensando em um relacionamento, a narrativa nos joga para uma imersão nos extremos das desilusões. Sugando até a última gota do egoísmo, o envolvente projeto nos joga no caos dos desequilíbrios, onde o certo e o errado são ultrapassados a todo instante transformando a saga desses quatro personagens em um enorme ponto de reflexões sobre a vida a dois. São muitos olhares para vários temas ligados às emoções.

Com mais de 500 perguntas sendo feitas entre os personagens (o que não é um achismo, e sim um fato!), muitas delas deixadas sem respostas concretas, o que de fato se junta ao campo de reflexão quando pensamos sobre, Closer passa de forma marcante pelo compromisso, o amor, o desespero, a infidelidade, os inícios, os términos, os recomeços e até mesmo o machismo descarado. O roteiro é brilhante, a narrativa usa a variável tempo com maestria, idas e vindas são vistas e histórias que se complementam levando aos epicentros dos conflitos.

O elenco é fabuloso. Jude Law, Natalie Portman, Clive Owen e Julia Roberts brindam os cinéfilos com atuações viscerais, marcantes. A referência que eles tinham são as montagens da peça. A primeira, a formação original, foi exibida no Royal National Theatre, em Londres, tendo inclusive um dos presentes no filme, Clive Owen, interpretando Dan. Em 1999 na Broadway, a peça foi um enorme sucesso, com mais de 170 vezes sendo encenada, e com indicação ao Tony Awards (o Oscar do Teatro norte-americano). Nesse última montagem, outros grandes artistas fizeram parte do elenco: Anna Friel era Alice, Rupert Graves deu vida à Dan, Ciarán Hinds interpretou Larry e Natasha Richardson fez o papel de Anna.

Nos últimos 20 anos, poucos filmes conseguiram chegar tão forte em nossas emoções. 'Closer - Perto Demais' se torna ao seu término algo atemporal que fica em nossas memórias durante muito tempo. Um filme pra ver e rever. Pra quem se interessar, está disponível no catálogo da Star Plus.


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Crítica do filme: 'Morcego Negro'


Será só um o vilão dessa história? Exibido no Festival é Tudo Verdade do ano passado, o espetacular documentário Morcego Negro nos leva de volta para o final da década de 80 e início dos anos 90, um período de recomeço da democracia, onde um lobista de Alagoas se tornaria uma figura central no impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Mello. Com 10 anos de pesquisas sobre a vida de PC Farias, materiais de arquivos (alguns exclusivos), depoimentos de jornalistas, amigos, família, os cineastas Chaim Litewski e Cleisson Vidal resumem de forma intrigante o cenário político dentro da recém-restaurada democracia brasileira além de fatos sobre o misterioso assassinato do lobista.

1989, primeiras eleições com voto popular após mais de duas décadas. Em Alagoas, surge um forte nome para a presidência do Brasil, Fernando Collor de Mello. Com a ajuda da elite empresarial brasileira, preocupadas com a possibilidade do outro candidato (Lula) vencer as eleições apostam suas fichas em Collor. Ao lado dele, seu braço direito, o tesoureiro da campanha para presidência, PC Farias, um homem de negócios, até então desconhecido, que se tornou o cérebro de um amplo esquema de corrupção. Nesse resumo, estão inseridas informações que nos ajudam ao longo da cronologia dos fatos.

Amante da aviação, inclusive seu avião mais famoso, o Morcego Negro, dá nome ao documentário, Paulo César Farias tem importante recortes de sua vida contada ao longo de duas horas de projeção. Sua ascensão como homem poderoso ligado ao presidente, sua vida pessoal ao lado da esposa e filhas, seu relacionamento posterior, suas fugas espetaculares, o circo midiático que se tornou sua vida, negociações mal explicadas, se misturam com os andares do conturbado cenário político brasileiro. Uma cronologia impecável, com riqueza de detalhes, contextualizada, indo a fundo sobre muitas questões.

Sobre a mais misteriosa situação que envolve PC Farias, seu assassinato, o documentário apresenta os fatos, opiniões de legistas deixando para o espectador uma série de reflexões. Foi queima de arquivo? A mulher com quem estava o matou? O que aconteceu de fato naquele dia e lugar?

Baseado em partes no livro Morcegos Negros de Lucas Figueiredo, esse documentário investigativo mostra a chegada ao poder e a queda de um figura que marcou a história da política brasileira. Um filme importante para conhecer mais sobre nosso país. Dia 21 de março chega aos cinemas. Imperdível.

 

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02/03/2024

Crítica do filme: 'Monster'


O que fazer quando não está tudo bem? Dirigido pelo genial cineasta japonês Hirokazu Kore-eda e vencedor do melhor roteiro no Festival de Cannes, o longa-metragem Monster é profundo drama que junta alguns temas para refletir sobre a sociedade e o sistema escolar através de versões de um mesmo fato. Baseado em algumas próprias experiências do roteirista Yûji Sakamoto, o filme é um delicado retrato que vai se expandindo conforme vamos compreendemos melhor a história.

Na trama, conhecemos Saori (Sakura Andô), uma mãe, viúva, em busca das verdades sobre o recente comportamento do jovem filho Minato (Soya Kurokawa). Ela aciona a escola onde ele está matriculado e seu destino se cruza com o professor Hori (Eita Nagayama) acusado de agredir Minato. Esse é um dos pontos de vistas de uma história que abre seu leque com o olhar de Hori e também o de Minato.

Rodado na cidade de Suwa, na província de Nagano, Monster tem um roteiro envolvente, aberto a surpresas, além de um olhar delicado para uma forte relação estabelecida em segredo que acaba virando o estopim para outras subtramas. O luto, a perda, a culpa, a mentira se somam ao desespero, vidas arruinadas, suposições, bullying dentro de um olhar da imaturidade sobre os abusos e a falta de esperança que se tornam pedras gigantes no caminho.

Os adultos parecem limitados no seu olhar para a questão que se desenrola. A escola e sua proteção ao ocorrido, lida da pior forma possível com a situação, aqui personificado na figura de uma diretora com um trauma recente e uma escolha pela mentira. A mãe, presa em um luto persistente não alcança o olhar para o turbilhão de emoções que passa o filho. O professor exigente e carinhoso, que recentemente se jogou a um amor, se vê perdido nas suas limitações como membro da escola.

A narrativa traz a emoção para a tela, através de imagens e movimentos que exemplificam o abstrato dos conflitos, o olhar que diz mais que mil palavras. A partir de alguns pontos de vistas, vamos entendendo melhor as verdades dessa história que comove e faz refletir.


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27/02/2024

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Crítica do filme: 'American Fiction'


Indicado para cinco Oscar em 2024, inclusive na categoria Melhor Filme, American Fiction usa sua brilhante e hilária narrativa para ir na contramão dos hipócritas de plantão, que recheiam olhares com estereótipos. Baseado na obra Erasure do escritor e professor da USC (Universidade do Sul da California) Percival Everett, o filme apresenta recortes na vida de um escritor em crise, entediado, completamente sem paciência com as hipocrisias na sua frente que tem uma ideia que o coloca no epicentro de tudo que pensa. Excelente estreia na direção do cineasta norte-americano Cord Jefferson.

Na trama, conhecemos Monk (Jeffrey Wright), um escritor e professor num presente repleto de conflitos não deixando barato os absurdos culturais que percebe ao seu redor. Após ser afastado pela universidade que leciona, vai passar um tempo na casa de praia da família se aproximando dos irmãos e da mãe em fase inicial de Alzheimer. Um dia, resolve escrever um livro de forma aleatória, longe das complexidades de suas outras obras e acaba vendo o sucesso chegar de forma curiosa e mostrando muitas verdades da sociedade.

As pessoas não se resumem aos erros. Um dos méritos do roteiro é chegar numa ampla reflexão sobre seu protagonista através do relacionamento com a família. A narrativa é empolgante, até uma cena espetacular de personificação da escrita nós vemos. Perdido nos pensamentos que se juntam a absurda conclusão de uma ideia inusitada, nas perdas recentes, a volta do convívio com os mais próximos familiares, um espaço para um novo amor, o protagonista duela com seus conflitos sem nunca deixar de expressar sua opinião. Tudo isso é colocado de forma brilhante na tela.

Personagens surgindo aos montes só validam o pensar de Monk, aqui uma analogia com a sociedade e seus valores se torna uma reflexão importante. O mercado literário também ganha holofotes, o lucro com o entretenimento raso, preconceituoso em muitos momentos, se mostra evidente através da armadilha feita pelo personagem principal dessa história maravilhosa que ficará nas nossas lembranças por muito tempo.

As entrelinhas da moral da história chega através dessa narrativa dinâmica, envolvente, que nos faz rir, emocionar e pensar sobre muitas verdades que estão por aí pra quem quiser ver.


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Crítica do filme: 'Acertando o Passo'


A busca pelo sorriso no rosto até a hora de partir. Trazendo um olhar delicado e divertido para a melhor idade, associado também ao campo da redescobertas da vida, o longa-metragem britânico Acertando o Passo, lançado em 2017, é uma explosão dançante de sentimentos aos olhos de uma protagonista em crise existencial. Dirigido pelo cineasta britânico Richard Loncraine, o alegre projeto mostra a dança como uma ponte para descobertas nas novas maneiras de enxergar a vida.

Na trama, acompanhamos Sandra (Imelda Staunton), uma respeitada mulher da alta sociedade britânica que parece ter a vida perfeita. Só que uma questão logo a abala: três décadas e meia casada descobre a traição do marido, um ex-chefe de polícia, com uma amiga próxima. Sem saber direito o que fazer da vida, resolve ir morar com a animada irmã Bif (Celia Imrie), com quem não falava fazia tempos, em uma outra parte da cidade.

E como é bom ver artistas maravilhosos, veteranos, protagonizando um filme! As subtramas impulsionam o simpático roteiro, com ótimos coadjuvantes, como Bif e Charlie (Timothy Spall) que circulam o desconstruir da protagonista. Nesses momentos, as memórias ganham o sentido de nostalgia algo que aproxima a personagem do mundo real onde o vai e vem da vida deixam margens para surpresas.

As eternas lições do se reinventar. Altos padrões, alta sociedade, furando a bolha em que vivia e indo descobrir o mundo, a protagonista passa por descobertas em recordações do passado quando ia atrás dos sonhos, quando nada era fácil, onde o arriscar era uma opção. Mesmo caminhando rumo a previsibilidade, a narrativa enche a tela de alegria, num filme que fala sobre família e os laços que muitas vezes se encontram em estados de encontros e desencontros.

 

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Crítica do filme: 'Fim da Sentença'


A decepção é um labirinto. Escondido no catálogo da HBO Max, esse poderoso drama que parte do recorte de um pai e sua conflituosa com o filho dilacera as mágoas do passado entre idas e vindas da liberdade até a oportunidade. Fim da Sentença, dirigido por Elfar Adalsteins, em seu primeiro longa-metragem, é um interessante road movie que caminha na melancolia para se achar um norte, uma direção, mas de forma próxima à realidade, humana, numa relação angustiante presa em um passado que não existe mais. John Hawkes e Logan Lerman estão sublimes nos seus respectivos papéis.

Na trama, conhecemos Frank (John Hawkes), um vendedor aposentado que passa seus dias de forma pacata ao lado da esposa Anna (Andrea Irvine) no estado do Alabama. Quando ela falece, vítima de câncer, Frank, precisa realizar o último desejo da esposa: uma viagem para a Irlanda junto do filho. A questão é que Sean (Logan Lerman), que acabara de sair da prisão, não se dá bem com o pai. Embarcando nessa viagem, muitas surpresas pelo caminho esperam pai e filho.

O controle sobre as coisas se torna um parâmetro importante que define as personalidades de pai e filho. O primeiro um homem rígido, que viveu para seu amor toda uma vida e se lamenta pelo abismo na relação com o único filho. O segundo, um imaturo jovem que travou momentos conflituosos com o pai ao longo da vida jogando nele toda a culpa pelo seu presente momento. Ao longo dessa viagem, a oportunidade de verem lados nunca vistos de um e de outro, de alguma forma, transforma essa relação. A narrativa costura muito bem esse olhar num campo de interseção, nas peças que vão unindo os protagonistas.

Descobertas surpreendentes de um grande amor, as verdades por trás das raivas que logo se mostram traumas de um passado repleto de lacunas nunca respondidas, momentos com variáveis incontroláveis, o olhar para a família e sua relação com o caos, tem de tudo nesse roteiro que antes de mais nada se joga para cima do lado humano, dos erros e acertos que estão previstos em todos os caminhos.  



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26/02/2024

Crítica do filme: 'Blackberry'


Um recorte do início de uma era. Num tempo onde a busca pela informação em um único dispositivo traçaria as novas tendências tecnológicas de um frequente dinamismo no campo da comunicação, existiu uma empresa que saiu na frente e marcou seu nome na história. Blackberry, terceiro longa-metragem da carreira do ator e diretor canadense Matt Johnson, mostra em alguns recortes momentos chaves de uma meteórica ascensão e a brusca queda de uma das primeiras gigantes da comunicação via smartphone. Com uma narrativa empolgante, repleto de humor na linha do sarcástico, o filme vai a fundo num mar de emoções em conflitos que passam seus protagonistas.

Na trama, conhecemos Mike (Jay Baruchel) e Doug (Matt Johnson), dois amigos, nerds, que ditam o ritmo em uma micro empresa de tecnologia buscando algum dia alçar voos mais altos no setor de comunicação. Em certo momento, o destino da dupla se cruza com Jim (Glenn Howerton), um experiente homem de negócios que enxerga em um projeto dos amigos um grande potencial. Assim, entre decisões movidas pela emoção, amizades estremecidas e lidando de forma atabalhoada com a iminência da concorrência, no fim dos anos 90, nasceu o primeiro famoso smartphone da história, o Blackberry.

O contexto é importante para uma melhor compreensão do que acontece por aqui. O boom tecnológico ligado a comunicação estava prestes a acontecer, o Blackberry foi criado em um cenário onde a demanda pelo máximo de informações em um dispositivo móvel estava carente. Mike e Jim conseguiram se posicionar nesse mercado feroz, fazendo o que cada um era bom: o primeiro nas genialidades ligadas a inovação e segurança da informação, já o segundo sua capacidade impositiva de lidar com acordos e negócios.

Os arcos dos personagens são complementares, há uma desconstrução muito bem feita, o que transforma o filme em um explosivo retrato sobre dilemas, algo que se segue até a conclusão de conhecimento público quando não souberam lidar com a concorrência das gigantes Google e Apple.

Para contar essa história, uma referência foi importante. Baseado na obra Losing the Signal: The Untold Story Behind the Extraordinary Rise and Spectacular Fall of BlackBerry escrita pelos jornalistas Jacquie McNish e Sean Silcoff, o filme navega pelas emoções de personagens em eternos conflitos buscando assim um poderoso recorte dos motivos que trouxeram o sucesso e o fracasso. A narrativa brilha com seu dinamismo, com muitas informações que estão associadas a outras pelas entrelinhas.

 

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Crítica do filme: 'O Abismo'


O somatório de dramas movidos por uma catástrofe. Chegou recentemente no catálogo da Netflix um filme que tinha tudo para ser um show de mesmices, clichês amontoados, tendo como epicentro uma tragédia anunciada. Só que no longa-metragem sueco O Abismo um fator muito bem encaixado na sua trama acaba deixando tudo mais profundo prendendo a atenção do espectador nos 103 minutos de projeção. Dirigido pelo cineasta Richard Holm, o projeto consegue com muita eficiência na sua intensa narrativa alinhar conflitos familiares a uma tragédia.

Na trama, acompanhamos a história de Frigga (Tuva Novotny), uma mulher de atitude, mãe de dois, chefe de segurança de uma mina subterrânea Kiirunavaara, situada na cidade de Kiruna. Quando rachaduras enormes vão aparecendo pela cidade, Frigga embarca em uma jornada de sobrevivência tendo que lidar com o sumiço do filho Simon (Edvin Ryding), a recente chegada do novo namorado Dabir (Kardo Razzazi), o relacionamento conturbado com o ex Tage (Peter Franzén) e os embates com a filha Mika (Felicia Truedsson).

Uma cidade condenada onde fica uma mina de ferro, que praticamente é uma bomba relógio, onde o chão racha a cada metro explorado, é o ponto central de uma história que não se desprende da alcunha de ‘filme catástrofe’ mas trazendo elementos que ajudam a narrativa a encontrar caminhos. O liquidificador de falhas geológicas e os emaranhados das emoções familiares ditam o ritmo de um filme que tem drama, ação, suspense, dilemas, conseguindo altos picos de tensão.

A contextualização é muito bem feita. Cães fugindo, insetos se locomovendo, canos estourando, vamos entendendo os dramas dos moradores através da iminência de uma evacuação às pressas. As subtramas ajudam nesse ponto. Esse olhar para o todo nos faz entender melhor os dramas dos protagonistas além das escolhas difíceis que se seguem. Não há espaço para inconsequências, a sobrevivência toma conta da razão existencial numa narrativa pés no chão mas sem deixar de causar os incômodos que objetiva.



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