Deus não pode estar em todos os lugares e por isso fez as
mães. Dissecando uma intensa e comovente relação entre mãe e filha, o novo
trabalho do genial diretor espanhol Pedro Almodóvar é uma abertura de portas
secretas nas intensidades da amargura que pode nascer de traumas terríveis que
mudam pra sempre trajetórias de vida. Com uma baita fotografia, ótimas atuações
e a delicadeza minimalista de sempre na direção, Almodóvar brinda mais uma vez
os cinéfilos com uma obra original e repleta de momentos emocionantes.
Na trama, conhecemos Julieta (vivida por Adriana Ugarte na
fase jovem e por Emma Suárez na fase mais velha), uma mulher na fase final de
sua vida que está prestes a se mudar da Espanha para Portugal com seu namorado,
o escritor Lorenzo (Darío Grandinetti). Alguns dias antes da partida, porém,
encontra casualmente em uma esquina uma jovem que foi amiga de sua filha na
infância. Esse acontecimento muda radicalmente (e depois percebemos, novamente)
a vida da protagonista que se tranca em casa e começa a escrever uma carta para
sua filha. Assim, ao longo de fabulosos 99 minutos de projeção, vamos
conhecendo o passado de Julieta e um grande segredo que guarda dentro de seu
coração de mãe.
Após três anos de hiato entre seu último filme e esse novo
trabalho, Almodóvar mostra mais uma vez que por mais que tenhamos a experiência,
sempre podemos renovar nosso olhar sobre a técnica de contar uma história numa
tela de cinema. Usando e abusando das cores, principalmente da intensidade do
vermelho, o ganhador do Oscar (com o fabuloso Fale com Ela) é minucioso em causar o impacto para falar sobre os
sentimentos. O desenvolvimento da personagem, tanto na fase mais velha, quanto
na fase mais jovem, é sublime. Não conseguimos desgrudar os olhos da tela,
queremos a todo instante descobrir as peças que faltam desse quebra cabeça. Há
um suspense, misturado com drama e com raríssimos momentos de sorrisos.
Baseado em três contos da escritora Alice Munro (Chance,
Silence e Soon), Julieta pode ser
considerado como um dos melhores trabalhos de Almodóvar no cinema, um drama
contundente de arrematar corações. Indicado recentemente para representar a
Espanha no próximo Oscar (na categoria Melhor Filme Estrangeiro), o filme teve
uma boa jornada aqui no Brasil, onde estreou faz poucos meses. Se ainda não
viu, não perca! Bravo!