24/08/2020

E aí, querido cinéfilo?! - Entrevista #55 - Santiago Dellape

O que seria de nós sonhadores sem o cinema? A sétima arte tem poderes mais potentes do que qualquer superman, nos teletransporta para emoções, situações, onde conseguimos lapidar nossa maneira de enxergar o mundo através da ótica exposta de pessoas diferentes. Por isso, para qualquer um que ama cinema, conversar sobre curiosidades, gostos e situações engraçadas/inusitadas são sempre uma delícia, conhecer amigos cinéfilos através da grande rede (principalmente) faz o mundo ter mais sentido e a constatação de que não estamos sozinhos quando pensamos nesse grande amor que temos pelo cinema.

Nosso convidado de hoje é cineasta e cinéfilo! Santiago Dellape realizou um longa-metragem, dois telefilmes e seis curtas que ganharam mais de 40 prêmios. É formado em Audiovisual e Jornalismo pela UnB, com estudos em Teatro, Cinema e TV pela UCLA (EUA). A Repartição do Tempo, seu 1º longa, foi premiado no 37º Fantasporto, em Portugal, e distribuído nos cinemas pela O2 Play. Dirigiu o telefilme de Natal Meio Expediente, coproduzido pela Globo Filmes e exibido em 77 países pela Globo Internacional.

Obs: Conheci pessoalmente esse grande cinéfilo num antigo cinema em jacarepaguá onde ele seria exibido o ótimo A Repartição do Tempo, seu primeiro longa-metragem. Espero que nos encontremos amis vezes querido cinéfilo!

1) Na sua cidade, qual sua sala de cinema preferida em relação a programação? Detalhe o porquê da escolha.

Atualmente é o Cine Drive-In de Brasília, que até pouco tempo atrás era o último da América Latina. Agora com a pandemia estão surgindo outros em várias cidades, mas eu fico com a tradição do nosso, que existe desde 1973 e que foi cenário do filme O Último Cine Drive-In, do Iberê Carvalho. Num passado que agora parece remoto eu escolheria a programação do Cine Brasília, sempre de muito bom gosto e com filmes de fora do circuito, além de ser palco do Festival de Brasília – que esse ano, dizem, deve migrar pro Drive-In.

 

2) Qual o primeiro filme que você lembra de ter visto e pensado: cinema é um lugar diferente.

O primeiro filme que lembro de ter assistido no cinema foi Batman, de Tim Burton, devia ter uns seis anos de idade. Foi num cinema de rua que hoje não existe mais, o Cine Karim, que ficava numa área arborizada da superquadra onde morávamos. O filme me causou um tremendo impacto e lembro de ter ficado muito tempo impressionado com o assassinato do casal Wayne. No Natal daquele ano eu ganhei um saco de risadas do Coringa.

 

3) Qual seu diretor favorito e seu filme favorito dele?

Stanley Kubrick - O Iluminado

 

4) Qual seu filme nacional favorito e porquê?

Cidade de Deus – não só pelo virtuosismo técnico e pelo abalo sísmico que provocou na época, mas porque eu havia acabado de começar a fazer cinema quando o filme foi lançado, então CDD me influenciou e continua influenciando significativamente até hoje.

 

5) O que é ser cinéfilo para você?

 

Pegando a dica de um amigo, gosto de pensar no cinéfilo mais como alguém que ama os filmes do que necessariamente alguém que assiste um filme atrás do outro. De outra forma eu não poderia me considerar cinéfilo (rs). Acho que não assisto a tantos filmes quanto gostaria ou deveria enquanto diretor, mas amo o ritual – principalmente o de reassistir aos prediletos.

 

6) Você acredita que a maior parte dos cinemas que você conhece possuem programação feitas por pessoas que entendem de cinema?

Nunca me detive na questão, mas gostaria de acreditar que sim. É complicada essa definição “entender de cinema”, traz a noção de que o cinema precisa ser decifrado, quando prefiro crer que está acessível a todos. Por outro lado se for no sentido de “estudar”, acho que sim: o ideal é que a programação seja feita por pessoas que estejam constantemente estudando, ou seja, ampliando seus horizontes e assistindo aos mais diversos filmes, das mais diversas cinematografias.

 

7)  Algum dia as salas de cinema vão acabar?

Duvido muito. Talvez as salas precisem se readaptar aos novos tempos, mas não acho que a humanidade vá renunciar ao rito coletivo de se assistir a filmes numa tela grande, dentro de uma sala escura. É um hábito já por demais entranhando em nós e minha aposta é de que ele ainda vai nos acompanhar por milênios, assim como o teatro.

 

8) Indique um filme que você acha que muitos não viram mas é ótimo.

Crimes Temporais (Los Cronocrímenes), de Nacho Vigalondo.

 

9) Você acha que as salas de cinema deveriam reabrir antes de termos uma vacina contra a covid-19?

Nas cidades que cumpriram o isolamento e já observam achatamento da curva de infectados, e desde que sob um protocolo rígido de distanciamento e desinfecção, eu acho possível – no entanto eu mesmo não me arrisco nem recomendo!

 

10) Como você enxerga a qualidade do cinema brasileiro atualmente?

Altíssima qualidade. Desde o mais nutritivo enlatado à mais sofisticada art house, temos cinema para todos os gostos. Penso que o mundo enxerga essa qualidade também, e a presença constante e numerosa do Brasil nas últimas edições do Festival de Berlim e de premiações internacionais como um todo é prova disso.

 

11) Diga o artista brasileiro que você não perde um filme.

Camilo Cavalcante, diretor.

 

12) Defina cinema com uma frase:

Amor sem palavras, cinema mudo: não falo nada, você sabe tudo.

 

13) Conte uma história inusitada que você presenciou numa sala de cinema:

Eu e alguns amigos que fundamos a Lumiô Filmes em Brasília uma vez fomos convidados a nos retirar do Cine Brasília porque estávamos com um garrafão de vinho Mioranza à tiracolo. Errados eles não estavam em nos expulsar.

 

14) Defina 'Cinderela Baiana' em poucas palavras...

É a coda perfeita para o Brasil da década de 90.

 

15) Muitos diretores de cinema não são cinéfilos. Você acha que para dirigir um filme um cineasta precisa ser cinéfilo?

Seria bastante recomendável, mas indispensável não é. Pode-se trabalhar como diretor contratado, sem qualquer envolvimento afetivo com o projeto, mas tenho para mim que esse comprometimento sempre se reflete no produto final.

 

16) Qual o pior filme que você viu na vida?

Faces da Morte, Traços da Morte e similares. Independente das mortes serem reais ou encenadas olhando hoje em dia a ideia me parece abjeta, gostaria de poder “desver”.

--