16/11/2020

Crítica do filme: 'Kajillionaire'


O que acontece quando você joga um baralho completo na mesa? Você tem a intenção de catar ou deixar tudo como está? Escrito e dirigido pela cineasta Miranda July, em seu terceiro longa-metragem na direção, Kajillionaire é, antes de mais nada, um grande desafio para o espectador. Pode funcionar para alguns, outros irão achar maçante. Contando a estranheza em forma de conflitos sociais, tendo como manequim nessa vitrine de experimento existencial uma família desajustada, o projeto desafio o espectador a encontrar sentido nas peculiaridades que deixam migalhas de tons reflexivos, onde, a cada vez que pensamos mais sobre, podemos encontrar caminhos e saídas para explicações existenciais bastante profundas. Esse não é um filme fácil é preciso um grande mergulho em uma piscina cheia de almas em busca de algum conforto sobre o futuro.


Na trama, conhecemos a família quase sem teto Robert (Richard Jenkins), Theresa (Debra Winger) e Old Dolio (Evan Rachel Wood) que vivem de pequenas falcatruas ensaiadas de maneira amadora em busca de sobrevivência. A jovem Old Dolio, aprendeu a fraudar antes mesmo de ler e escrever, é a cabeça dos planos e estratégias. Mas tudo muda com a chegada de Melanie (Gina Rodriguez), uma outra trambiqueira que se junta ao trio e a partir disso muitas mudanças podem ocorrer no caminho de todos os personagens. No fundo, o filme é uma vitrine para refletir sobre a solidão de almas completamente perdidas em um contexto pra lá de inusitado.


Não há muito na superfície, quase tudo está na grande profundidade que o roteiro consegue doar aos seus personagens. Na superfície apenas um relacionamento complicado de terríveis pais e uma filha com outros sonhos sem ser roubar que só despertam mais fortemente quando Melanie chega. O exercício proposto por July é o de tentarmos entender entrelinhas dentro de um contexto norte-americano atual. É um grande estudo sobre nômades do contraponto, ou quase isso, já que, provavelmente, estão em algum dado estatístico perto do não ter nada e ter algumas migalhas dentro de uma país conhecido como uma vasta terra de oportunidades mas que muita gente não consegue nem ao menos sobreviver ao caos do cotidiano e vivem da maneira que podem: invadindo casas, roubando encomendas dos correios, enrolando o dono do lugar onde moram. Há uma originalidade mas que não entrega muito sentido, serve o paralelo que consigamos traçar.