Colocando em evidência a psicopatia e os dramas pessoais ligados por tragédias, chegou à Netflix uma minissérie cheia de caminhos para sua compreensão que nos leva até um jogo psicológico sombrio e inquietante. Escrita pelo nova-iorquino Gabe Rotter e tendo como showrunner Howard Gordon – da equipe do excelente Homeland -, O Monstro em Mim, ao longo dos seus intensos oito episódios, conta com atuações marcantes de Claire Danes e Matthew Rhys.
Aggie (Claire Danes)
é uma escritora de sucesso que, após a morte do único filho, vê sua vida
desmoronar. Sentindo-se culpada e não se desprendendo de procurar culpados para
a tragédia, destrói seu casamento e passa a viver reclusa. Um dia, muda-se para
sua vizinhança o polêmico e ambíguo empresário Nile (Matthew Rhys), acusado anos atrás de assassinar a própria esposa.
Ao se aproximar dele, começa a desconfiar de algumas ações e resolve escrever
um livro sobre ele, ao mesmo tempo que busca informações sobre se ele matou ou
não a ex-esposa.
Desde o início, em uma bela construção narrativa, percebemos
que a tragédia é uma variável importante e que ligaria pontos entre dois
personagens completamente distintos. Com uma ótima direção dividida entre Antonio Campos e Tyne Rafaeli - onde a câmera caminha pelos detalhes sugerindo de
forma indireta todo o complexo contexto ligado a incoerências e comportamentos
- vai sendo modelado um thriller inquietante, que provoca o público e fisga a
atenção.
Para quem gosta de tudo mastigado, esta é uma obra para se
ter paciência: nada é diretamente proposto, há um caminho profundo para se
chegar nas revelações. A série esquenta a partir do terceiro episódio, com os
dramas familiares já desenvolvidos – leia-se a culpa e o luto -, além de uma
trama política que faz todo sentido no alicerce do discurso que o roteiro
propõe. Com o inconsciente se manifestando – um prato cheio para fãs de Freud –
estabelece-se um tabuleiro de xadrez, com acertos e erros.
O roteiro se arrisca o tempo todo nas nuances de apresentar
o fator psicológico – um caminho cheio de espinhos que respinga na narrativa.
Esse acaba sendo um dos grandes méritos da obra: com seu bom desenvolvimento
dentro dessa psicologia dos personagens, onde valores, motivações e medos se
manifestam, moldando modos de agir, logo chegando aos desvios morais, sem
esquecer de apresentar as vulnerabilidades.
O Monstro em Mim foge
de qualquer ingenuidade ou dos desencontros que uma fluidez narrativa poderia
provocar. Seu objetivo é apresentar o ‘monstro dentro das pessoas’, como se
expressa externamente e no subconsciente. Ao se jogar nas complexidades - com
dois excelentes protagonistas ditando o ritmo das ações - avançamos nos graves
descompassos da personalidade humana, em uma incursão profunda no oculto da
mente, onde a moralidade hipócrita se manifesta.
