26/11/2020

E aí, querido cinéfilo?! - Entrevista #192 - André Santa Rosa


O que seria de nós sonhadores sem o cinema? A sétima arte tem poderes mais potentes do que qualquer superman, nos teletransporta para emoções, situações, onde conseguimos lapidar nossa maneira de enxergar o mundo através da ótica exposta de pessoas diferentes. Por isso, para qualquer um que ama cinema, conversar sobre curiosidades, gostos e situações engraçadas/inusitadas são sempre uma delícia, conhecer amigos cinéfilos através da grande rede (principalmente) faz o mundo ter mais sentido e a constatação de que não estamos sozinhos quando pensamos nesse grande amor que temos pelo cinema.

 

Nosso entrevistado de hoje é cinéfilo, de Recife. André Santa Rosa é jornalista, crítico e poeta, escreve sobre cinema para Diário de Pernambuco além de ser editor e crítico do site Notas Críticas. Tem formação em crítica pela Escola Livre de Imagens, colabora com projetos de produção cultural e outros projetos de jornalismo como as revistas Propágulo e Gruvi. Alguns trabalhos como escritor já foram publicados em revistas e sites de poesia e sua primeira publicação tem data para 2021. Em 2019 foi membro do Júri Curtas Brasil, do Canal Brasil, que elegeu o melhor curta do Janela Internacional de Cinema do Recife. Em 2020 foi finalista do Prêmio Cristina Tavares de Jornalismo.

 

1) Na sua cidade, qual sua sala de cinema preferida em relação a programação? Detalhe o porquê da escolha.

As salas do Cinema da Fundação. São duas salas (uma no Derby e outra no Poço da Panela) que tem uma programação em equilíbrio com o que saiu dos festivais europeus, tipo Berlim e Cannes, junto dos lançamentos de cinema brasileiros independentes. Também, aos finais de semana apresentam sessões especiais de clássicos aos sábados e domingos. Os clássicos geralmente são selecionados com um gancho objetivo com a realidade, com algum fato que acabou de rolar na semana.

 

2) Qual o primeiro filme que você lembra de ter visto e pensado: cinema é um lugar diferente.

Acho que comecei a ter essa sensação quando fui sozinho ao cinema pra entender qual era parada. Isso ainda na pré-adolescência, com uns 13 anos. Nessa época eu queria ver tudo, todos os clássicos e saber o que tinha de melhor. Lembro que fui sozinho ver uma exibição de Janela Indiscreta, quando ainda morava em Maceió. Foi meio que um clique: “poxa, existe muita coisa a se pensar sobre esse filme e sobre cinema”.

 

3) Qual seu diretor favorito e seu filme favorito dele?

Fico entre Éric Rohmer e Edward Yang. Mas filme favorito fico como YiYi, do Edward Yang.

 

4) Qual seu filme nacional favorito e porquê?

Copacabana, Mon amour. Acho que existe um tipo de sujeira e delírio daquela época que o cinema brasileiro perdeu. Ainda é um cinema que está muito interessado em entender o país, num sentido sócio-cultural, mas de alguma maneira se tornou mais careta, com exceções claro. Existem também várias coisas que não cabem mais em Copacabana, Mon amour, porém, Sganzerla conseguiu criar um troço que é o caos e a vertigem que o nosso cinema deveria ser. Acho que por ter tão pouco pra fazer aquilo, ele se permitia ser qualquer coisa. Inclusive, tem trilha de Gilberto Gil.

 

5) O que é ser cinéfilo para você?

Acho é um olhar específico para o cinema. Para além de amar cinema e querer estar em um ambiente de pessoas que compartilham disso, é sobre fazer parte de uma tradição moderna de encontrar desdobramentos e afetos com cinema, que excedem o ato de simplesmente ver filmes. Na verdade é bem mais complicado, inclusive existe um livro inteiro de Antoine Baecque, chamado Cinefilia, pra entender como foi que isso surgiu.

 

6) Você acredita que a maior parte dos cinemas que você conhece possuem programação feitas por pessoas que entendem de cinema?

Em Recife, quatro salas (pelo menos) tem uma programação e curadoria “mais ligada”. Mas é a minoria, já que um cinema de shopping tem 10 salas passando as mesmas coisas.

 

7) Algum dia as salas de cinema vão acabar?

Espero que não, mas acho que futuramente vai existir um filtro maior. Acho que ainda tem muita gente fã de blockbuster que não abre mão das salas. Esse grupo fica por um tempo e aí os cinemas de rede vão ter que repensar seu funcionamento. Já circuito de filme independente a mesma coisa, não abre mão dos festivais presenciais e nem de frequentar o cinema cotidianamente. Acho que os cinemas fora do circuito comercial não serão tão afetado por streaming e etc. Talvez fique só quem já frequenta de verdade e as pessoas mais casuais passem a ficar mais em casa.

 

8) Indique um filme que você acha que muitos não viram mas é ótimo.

Como só passou em festival, vou indicar Sertânia (2020), de Geraldo Sarno.

 

9) Você acha que as salas de cinema deveriam reabrir antes de termos uma vacina contra a covid-19?

Parte de mim fica meio indignada, que por conta de pressão política, as igrejas já estejam abertas e alguns cinemas não. Faço essa comparação porque são estruturas que têm o formato muito semelhante, não à toa aqui em Recife muitos cinemas de rua viraram igrejas evangélicas quando fecharam. Então é aquela coisa, os aparelhos culturais são os com menos financiamento e os últimos a abrir.

Mas, por outro lado, acho que não existe promessa de medida de segurança certa. Você vai ao cinema e aceita que a consequência pode ser ficar doente.

 

10) Como você enxerga a qualidade do cinema brasileiro atualmente?

Existe uma produção muito variada e muito rica. Mas acho que o melhor não tá no eixo Rio-São Paulo. Tem um pessoal fazendo muita coisa legal no Ceará, Minas Gerais e um pessoal mais independente aqui em Pernambuco. Quando se tem um cinema que vive de edital muita coisa fica em jogo, como os nomes que sempre aprovam e o mesmo pessoal que é mais bem quisto sempre com muita vantagem nesses processos. Isso acaba gerando muito policiamento entre os próprios realizadores.

Contudo, a gente tá em boa fase, os investimentos dos governos de Lula e Dilma deram resultados muito bons. Até porque essa própria descentralidade de anualmente termos filmes de Minas, Pernambuco e Ceará só é possível por conta desses investimentos. E torna a produção nacional muito mais interessante e profícua.

 

11) Diga o artista brasileiro que você não perde um filme.

Fico curioso pra saber qual a próxima de Affonso Uchoa.

 

12) Defina cinema com uma frase:

Cinema é a experiência contemporânea mais próxima da realidade e da mágica.

 

13) Conte uma história inusitada que você presenciou numa sala de cinema:

Não é exatamente inusitada, mas o último filme que vi antes do começo da pandemia foi Fim de Festa, de Hilton Lacerda, na pré-estreia dele no Cinema São Luiz. Era um sábado pós-carnaval, quando todo mundo fica doente, então o barulho das pessoas tossindo eram muito constantes e constrangedores. Acabou que duas semanas depois não tinha mais uma sala aberta em Recife e eu fico imaginando que ali já estávamos na pandemia, mas sem ter noção disso.

 

14) Defina 'Cinderela Baiana' em poucas palavras…

O final é socialista.

 

15) Muitos diretores de cinema não são cinéfilos. Você acha que para dirigir um filme um cineasta precisa ser cinéfilo?

Acho que ajuda muito, para qualquer coisa na vida, você saber o que foi feito antes. Mas não precisa ser cinéfilo.

 

16) Qual o pior filme que você viu na vida?

Vou dizer o pior desse ano: Mulan.

 

17) Qual seu documentário preferido?

Edifício Master, do Eduardo Coutinho.

 

18) Você já bateu palmas para um filme ao final de uma sessão?  

Não ahahahaha.

 

19) Qual o melhor filme com Nicolas Cage que você viu?

Gosto de um que ele tá bem caricato, que se chama Color Out of Space (2019).

 

20) Qual site de cinema você mais lê pela internet?

É bem variado. Eu leio bastante as críticas dos jornais locais, que conhece os críticos e também escrevo pra um. Também leio a Cinética, Plano Aberto, Zagaia em Revista e um pessoal mais atuante no instagram como Plano Cinema, Cineset e vocês da Guia do Ciné