O que seria de nós sonhadores sem o cinema? A sétima arte tem poderes mais potentes do que qualquer superman, nos teletransporta para emoções, situações, onde conseguimos lapidar nossa maneira de enxergar o mundo através da ótica exposta de pessoas diferentes. Por isso, para qualquer um que ama cinema, conversar sobre curiosidades, gostos e situações engraçadas/inusitadas são sempre uma delícia, conhecer amigos cinéfilos através da grande rede (principalmente) faz o mundo ter mais sentido e a constatação de que não estamos sozinhos quando pensamos nesse grande amor que temos pelo cinema.
Nossa entrevistada de hoje é cinéfila, de Blumenau (Santa
Catarina). Jéssica Frazão tem 31
anos é doutoranda em cinema pela ECA-USP, onde desenvolve pesquisa sobre o
teórico alemão Siegfried Kracauer.
Seu interesse pelo cinema começou em 2013, e desde então vem trabalhando com
produção de curtas-metragens, crítica cinematográfica, debates, oficinas, palestras,
e formações em cinema e audiovisual, em universidades e instituições culturais.
É integrante do Coletivo de Mulheres
Críticas de Cinema (Elviras) e colunista cinematográfica no jornal da sua
cidade, O Município Blumenau. É
também idealizadora do projeto Das Kino
(@daskinobrasil), página no Instagram voltada para divulgação cultural,
formação de público e críticas de cinema.
1)Na sua cidade, qual sua sala de cinema
preferida em relação a programação? Detalhe o porquê da escolha.
Na cidade que eu moro, Blumenau, infelizmente só temos cinemas
comerciais em shoppings. O que é uma pena, visto que historicamente, Blumenau
foi uma das primeiras cidades do país a promover exibições cinematográficas.
Havia vários cinemas de rua e cine-clubes por aqui, que há tempos foram
fechados. Hoje, as alternativas são o Cine Sesc, em parceria com a
universidade, e o CineArte,
vinculado à Secretaria de Cultura, ambos com ótima programação, ainda que
funcionem em salas pequenas e tenham horários pouco chamativos para muitas
pessoas.
2) Qual o primeiro filme que você lembra de
ter visto e pensado: cinema é um lugar diferente.
Titanic! Eu tenho uma lembrança muito nítida de ter ido assistir Titanic no
cinema várias vezes com a minha família, eu tinha 8 anos. Lembro das filas
gigantescas para as sessões, das pessoas se emocionando. O filme gerou em mim
sensações muito fortes. Naquele momento, eu descobri o que o cinema é capaz.
3) Qual seu diretor favorito e seu filme
favorito dele?
Werner Herzog. Fitzcarraldo.
4) Qual seu filme nacional favorito e porquê?
O Pagador de Promessas. Esse filme fala tanto de Brasil, fala de hipocrisia
e intolerância religiosa de uma maneira tão realista, e ali tudo funciona muito
bem, atuação, roteiro, montagem, direção. Outro que poderia citar é Iracema -
uma transa amazônica, esse também me marcou muito.
5) O que é ser cinéfilo para você?
Percebo que o termo "cinéfilo" é utilizado hoje em dia de
forma muito aleatória. Muita gente acha que para ser cinéfilo, basta gostar de
assistir filmes, e se fosse simples assim, a maioria das pessoas seriam
cinéfilas. A Netflix tá aí para
provar como as pessoas gostam de assistir filmes. A meu ver, a cinefilia é
muito mais que isso. A pessoa cinéfila tem uma forte e sensível conexão com o
cinema. Ela não se contenta apenas em ver os filmes, ela precisa rever, reviver
um diálogo, ler críticas, entrevistas, artigos, conhecer o contexto, revisitar
um momento, descobrir conexões, ampliar o olhar, buscar por referências para
além do mainstream, o(a) cinéfilo(a) é uma pessoa ativa, sempre se coloca
diante do filme na sua experiência fílmica. Ou seja, você simplesmente quer assistir
e conhecer bons filmes porque você ama o cinema. O cinema é o seu mundo e sobre
o mundo.
6) Você acredita que a maior parte dos cinemas
que você conhece possuem programação feitas por pessoas que entendem de cinema?
Não saberia te afirmar se a programação é pensada por quem entende ou
não de cinema. O que me parece claro é que, no geral, o lucro vem em primeiro
lugar para os donos dos cinemas comerciais, pouco importando a qualidade e
diversidade do que é exibido.
7) Algum dia as salas de cinema vão acabar?
Não vão. As crises no cinema não é uma novidade. O streaming e a
pandemia são só mais uma questão que as salas de cinema estão tendo que lidar.
Quando tivemos o advento do som sincronizado, no final da década de 1920, houve
crise. “O som aniquila a grande beleza do silêncio”, dizia Charles Chaplin, bastante relutante à novidade. Quando surgiu a TV
aberta, houve crise. Então as salas seguiram firmes e as salas vão continuar,
mas estarão sempre se reinventando, se adaptando. Pra quem tiver interesse,
escrevi sobre isso na coluna que tenho no jornal:https://omunicipioblumenau.com.br/das-kino-filmes-lancados-diretamente-em-streaming-pandemia-decretou-o-fim-cinema/
.
8) Indique um filme que você acha que muitos
não viram mas é ótimo.
Indico não só um filme mas a trilogia inteira do diretor da Ceilândia Adirley Queirós: A cidade é uma só? (2011), Branco sai, preto fica (2014) e Era uma vez
Brasília (2017).
9) Você acha que as salas de cinema deveriam
reabrir antes de termos uma vacina contra a covid-19?
Não deveriam. Ainda que eu entenda como é complicada essa questão,
porque envolve o salário de várias pessoas, um local fechado, sem janelas, com ar-condicionado
de forma alguma é um local seguro. Caberia ao governo cuidar dos trabalhadores,
para que consigam ficar em casa enquanto não houver vacina para todos.
10) Como você enxerga a qualidade do cinema
brasileiro atualmente?
Infelizmente, muita gente acha, ainda hoje, que cinema brasileiro se
resume a sexo, violência e comédias de mau gosto. Um desamor que tem inclusive
explicações históricas. Quem pensa isso, não conhece cinema brasileiro. O
cinema brasileiro é amplamente reconhecido e admirado, e os brasileiros
deveriam parar com o vira-latismo.
11) Diga o artista brasileiro que você não
perde um filme.
Não perco de muitos, como Affonso
Uchoa, Lúcia Murat, Anna muylaert, Adirley Queirós, Kleber Mendonça Filho,
Juliana Rojas, Karim Aïnouz.
12) Defina cinema com uma frase:
Alimento para a alma.
13) Conte uma história inusitada que você
presenciou numa sala de cinema.
Eu fui assistir A Vida Invisível,
do Karim Aïnouz, e a energia do shopping ACABOU no meio do filme. Não
entendi bem o motivo, sei que os shoppings costumam ter geradores, mas eu fui
felizarda de ver isso acontecer comigo. Ficamos todos da sala papeando sobre o
que tínhamos assistido até ali, até a energia voltar. Eu não ia embora sem
terminar de ver o filme hahaha.
14) Defina 'Cinderela Baiana' em poucas
palavras...
Ainda não vi.
15) Muitos diretores de cinema não são
cinéfilos. Você acha que para dirigir um filme um cineasta precisa ser
cinéfilo?
Não acho que precise, mas praticar a cinefilia pode ajudar a compreender
o próprio cinema que se quer fazer, é maravilhoso aprender com bons filmes.
16) Qual o pior filme que você viu na vida?
Vários com o Adam Sandler.
17) Qual seu documentário preferido?
Edifício Master, do Eduardo Coutinho.
18) Você já bateu palmas para um filme ao
final de uma sessão?
Já fiz isso algumas
vezes. A última vez foi para Bacurau.
19) Qual o melhor filme com Nicolas Cage que
você viu?
Adaptação.
20) Qual site de cinema você mais lê pela
internet?
Geralmente acompanho a Zagaia em
Revista, a Cinética e o Feito por Elas, mas o próprio Letterboxd é um ótimo site para ler
críticas que utilizo.