23/04/2021

E aí, querido cinéfilo?! - Entrevista #389 - Geison Luz


O que seria de nós sonhadores sem o cinema? A sétima arte tem poderes mais potentes do que qualquer superman, nos teletransporta para emoções, situações, onde conseguimos lapidar nossa maneira de enxergar o mundo através da ótica exposta de pessoas diferentes. Por isso, para qualquer um que ama cinema, conversar sobre curiosidades, gostos e situações engraçadas/inusitadas são sempre uma delícia, conhecer amigos cinéfilos através da grande rede (principalmente) faz o mundo ter mais sentido e a constatação de que não estamos sozinhos quando pensamos nesse grande amor que temos pelo cinema.

 

Nosso entrevistado de hoje é cinéfilo, de São Paulo. Geison Luz tem 39 anos, é um cineasta apaixonado, diretor do Instituto Pensamentos Filmados e diretor de Vídeo na produtora Meu Estúdio.

 

1) Na sua cidade, qual sua sala de cinema preferida em relação a programação? Detalhe o porquê da escolha.

Eu passei a infância numa cidadezinha chamada Moreno, no interior de Pernambuco. E lá não tinham salas de cinema. Na verdade, até a televisão era uma coisa rara de se ter em casa. Tanto que a primeira vez que vi uma TV ligada eu pensei que fosse uma janela aberta. Mas, quando eu completei 10 anos de idade, abriu uma videolocadora no meu bairro, e foi por meio dela que eu comecei a ter contato com filmes. Eu passava o dia inteiro lá dentro lendo as sinopses dos filmes. E eu nem tinha como assisti-los em casa. 

 

2) Qual o primeiro filme que você  lembra de ter visto e pensado: cinema é um lugar diferente.

No final dos anos 80, Os Trapalhões fizeram um show numa cidade próxima da minha e a produção montou uma sala de cinema itinerante para que a população local pudesse assistir aos filmes deles. E foi lá, numa cadeirinha de plástico, que eu tive a minha primeira experiência cinematográfica. Eu fiquei encantado com o tamanho da tela projetada na lona improvisada e eu guardei pra sempre aquela sensação de ver e ouvir as pessoas sorrindo com o filme.   

 

3) Qual seu diretor favorito e seu filme favorito dele?

Eu amo a possibilidade que um filme tem de abordar a natureza humana, as sensações e sentimentos comuns a todos nós. E o Ingmar Bergman, cineasta sueco, é um mestre neste sentido. Eu amo o cinema dele, e destaco o filme 'Fanny and Alexander', de 1982, o filme é uma obra de arte.

 

4) Qual seu filme nacional favorito e porquê?

Durante a Pandemia, eu me dei a oportunidade de conhecer melhor o movimento do Cinema Novo Brasileiro que aconteceu nos anos 60. Eu sou apaixonado pela força cinematográfica daquele período. E pela vontade de documentar através da arte a realidade do nosso país. Então, eu vou destacar 2 filmes e 2 cineastas daquele movimento: ''Vidas Secas' (1963), de Nelson Pereira Dos Santos. E 'Terra em Transe' (1967), de Glauber Rocha. Clássicos!

 

5) O que é ser cinéfilo para você?

É um estudante apaixonado pelas artes audiovisuais.

 

6) Você acredita que a maior parte dos cinemas que você conhece possuem programação feitas por pessoas que entendem de cinema?

Essa é uma questão delicada. Porque, por mais que um programador queira apresentar um filme de qualidade artística na sala dele, o grande público brasileiro foi condicionado ao longo dos anos a consumir o cinema norte-americano. Então, por uma questão de sobrevivência financeira, os programadores são obrigados a atender esse gosto condicionado do público. E isso começou lá atrás, no período da 1ª Guerra Mundial, quando o cinema norte-americano dominou o mercado mundial, e a nossa produção cinematográfica, que já era fraca, sofreu uma queda violenta. Nesse período surgiram as primeiras revistas especializadas em cinema e elas começaram a difundir os mitos e estrelas de Hollywood. E, a partir dos anos 1930, diversos acordos comerciais estabeleceram que os filmes norte-americanos entrariam no Brasil isentos de taxas alfandegárias. E esses incentivos tornavam muito mais lucrativo para um programador exibir um filme 'enlatado' norte-americano do que um filme brasileiro ou mais artístico.

 

7) Algum dia as salas de cinema vão acabar?

As salas de cinema não vão acabar, mas eu acredito que, em breve, elas irão se adaptar para dar ao público uma sensação de entretenimento mais parecida com a encontrada num parque de diversões. As pessoas não irão ao cinema necessariamente para assistir ao filme, mas sim para viver uma experiência divertida com os amigos com telas tridimensionais, poltronas que se movem, jatos d'água que esquiçam durante a projeção, ... essas coisas. 

 

8) Indique um filme que você acha que muitos não viram mas é ótimo.

Eu tô pelo Brasil rs, e indico o filme 'Eles Não Usam Black-Tie', de Leon Hirszman. Esse filme é muito atual. Conta com interpretações maravilhosas da Fernanda Montenegro e Gianfrancesco Guarnieri. E ganhou o Grande Prêmio Especial do Júri, o Leão de Ouro, no Festival de Veneza em 1981.

 

9) Você acha que as salas de cinema deveriam reabrir antes de termos uma vacina contra a covid-19?

Infelizmente, não. A Covid-19 ainda é uma doença misteriosa, e a nossa paixão por cinema não poder ser maior do que a saúde e vida das pessoas. Mas eu acredito que até o final do ano as coisas comecem a melhorar. Mas até lá, o Governo precisa ter boa vontade e começar a realmente criar programas de incentivo para a área.  

 

10) Como você enxerga a qualidade do cinema brasileiro atualmente?

A nossa qualidade técnica é muito boa, o digital abriu muitas possibilidades para o audiovisual brasileiro. Mas sinto que ainda pecamos na questão do conteúdo. Alguns dos nossos roteiros ainda são muito fracos. E as abordagens superficiais. E eu acredito que isso tem a ver com a formação dos profissionais e a falta de oportunidades. Nós temos roteiristas maravilhosos, mas muitos deles não conseguem chegar até os produtores. 

 

11) Diga o artista brasileiro que você não perde um filme.

Karim Aïnouz. Eu amo a direção sensível dele. E 'O Céu de Suely' é um filme lindo.

 

12) Defina cinema com uma frase:

“Eu acredito que o audiovisual tem o poder de sensibilizar e transformar as pessoas. Foi assim que aconteceu comigo. ”

 

13) Conte uma história inusitada que você presenciou numa sala de cinema:

Em 2001, eu trabalhava numa pequena rede de videolocadoras na zona leste de SP e a nossa equipe foi convidada para assistir a pré estreia do suspense 'Os Outros', estrelado pela Nicole Kidman (atriz que eu amo!). A nossa equipe entreteve tanto com sustos e gritos o público presente na sala que fomos convidados pela distribuidora do filme no Brasil pra participar de TODAS pré estreias dele em SP.

 

14) Defina 'Cinderela Baiana' em poucas palavras...

Um surto rs. O filme é muito ruim. 

 

15) Muitos diretores de cinema não são cinéfilos. Você acha que para dirigir um filme um cineasta precisa ser cinéfilo?

Eu acredito que sim. A gente não precisa acumular informações (até porque pessoas assim as vezes são chatas rs), mas é fundamental conhecer a fundo a nossa arte.

 

16) Qual o pior filme que você viu na vida?

Eu fico com 'Cinderela Baiana' rs.

 

17) Qual seu documentário preferido?

'Honeyland' (2019), dos cineastas Tamara Kotevska, Ljubomir Stefanov. Um documentário poético sobre uma apicultora solitária e a relação dela com a natureza.

 

18) Você já bateu palmas para um filme ao final de uma sessão?  

Sim. 'A Montanha Sagrada' (1973), do cineasta Alejandro Jodorowsky.

 

19) Qual o melhor filme com Nicolas Cage que você viu?

'A Outra Face' (1997), do John Woo. O filme é uma viagem. Pra mim, um dos melhores do gênero ação.   

 

20) Qual site de cinema você mais lê pela internet?

thefilmstage.com

 

21) Qual streaming disponível no Brasil você mais assiste filmes?

Netflix.