A raiva é um estado transitório da consciência? Uma das gratas surpresas no universo das séries que chegaram aos streamings em 2023, sem dúvidas, é o projeto criado pelo sul-coreano Lee Sung Jin, Treta. Com uma trama sólida e com camadas e mais camadas que giram em torno da história principal, o seriado reflete sobre por duas pessoas ligadas por uma inusitada situação que se veem presos numa crise existencial onde o limite para ações e consequências extrapolam qualquer normalidade. O projeto tem uma curiosidade bem legal, alguns dos chamativos títulos de episódios são citações de mentes famosas, como uma do escritor tcheco Franz Kafka e outra da poeta norte-americana Sylvia Plath.
Na trama, conhecemos Danny (Steven Yeun), um empreiteiro, com problemas, que vem de uma
decepção com um empreendimento familiar passando por um presente confuso,
desiludido, com pensamentos ruins. Também conhecemos uma empresária chamada Amy
(Ali Wong), dona de uma marca que
foi ficando poderosa ao longo do tempo, ligado à plantas. Parece ter uma vida
perfeita, de sucesso no campo pessoal e profissional, mas nem tudo é o que
aparenta ser, vive seus dias em um enorme stress. Certo dia, o destino desses
dois personagens se cruzam de maneira peculiar, após uma briga de trânsito, o
que desencadeia uma série de situações surpreendentes.
Um acúmulo dentro de si e uma explosão de uma só vez é o
estopim dessa história, assim vamos acompanhando os pontos de vistas do dois
protagonistas. Viciada no seu telefone, Amy vive resolvendo problemas em grande
parte do seu dia, seja no campo profissional com uma enorme oportunidade de
venda do negócio, ou mesmo no campo pessoal, com o acomodado marido que se
dedica à sua arte que não traz dinheiro para dentro de casa, além de ter que
lidar com a sogra jararaca. Já Danny, mora com o irmão mais novo em um pequeno
apartamento e parece nunca acertar o seu rumo, vendo o tempo passar, amigos
próximos progredindo na vida, não conseguindo sair de uma situação de
dependência com a óbvia má companhia de um primo que acabara de sair da prisão.
Essas duas almas viram o estopim um do outro trazendo nas bagagens um cansaço
do mundo que gira ao redor deles.
De maneira inusitada somos testemunhas do encontro de certos
propósitos na vida, já que quando nenhum lugar parece um lar, você começa a
olhar a si mesmo. As ações e consequências tem um papel importante nesse
criativo roteiro onde os protagonistas são colocados em sinuca por eles mesmo
mas sem deixar de levar outros para dentro do caos que criaram. Buscando
encontrar respostas na fé, na psicologia, até mesmo na terapia, os personagens
se veem perdidos constantemente como se um curativo fosse colocado em todas suas
dores mas logo percebem que nunca encontram soluções para resolver o problema.
Com uma trilha sonora empolgante e a real possibilidade de
ter uma continuação, seguindo formatos de antologia ou não, Treta não perde o ritmo um instante se
tornando uma fonte de reflexões sobre o vazio existencial.