29/01/2017
Crítica do filme: 'Jackie'
O recomeçar é doloroso. Faz-se necessário investigar novas
verdades, adequar novos valores e conceitos. Não cabe reconstruir duas vezes a
mesma vida numa só existência. Filme de estreia do excelente cineasta chileno Pablo
Larraín (O Clube, Neruda, Tony Manero,
No) em Hollywood, Jackie mostra a visão de da ex-primeira dama dos Estados
Unidos Jacqueline Kennedy sobre a tragédia que aconteceu com seu marido, o
ex-presidente John F. Kennedy. O roteiro, assinado por Noah Oppenheim (A Série Divergente: Convergente), é bem
detalhista sobre os fatos apresentados e mostra uma Jackie repleta de indecisões logo após o falecimento de seu amado
marido. No papel principal, Natalie Portman, em uma atuação irretocável e
sensível, indicada ao Oscar de Melhor Atriz esse ano.
Na trama, ambientada em novembro de 1963, acompanha a
ex-primeira dama dos Estados Unidos Jacqueline Kennedy (Natalie Portman) dias
após a tragédia que o país mais poderoso do mundo nunca esquecera, a morte do 35°
presidente dos Estados Unidos John F. Kennedy durante uma carreata presidencial
em Dallas, no Texas. Acompanhamos em detalhes toda a dor e o sofrimento de Jackie
e o desenrolar intenso logo após a morte de seu companheiro. Bobby Kennedy (Peter
Sarsgaard, em ótima atuação), irmão do ex-presidente, tem papel importante
nessa história com diálogos intensos com a ex-primeira dama.
Esses dias após o luto são narrados de maneira muito intensa,
e, assim vamos construindo um interessante quebra cabeça sobre os pensamentos e
personalidade de Jacqueline Kennedy. Seus intensos diálogos com um padre -confissões
de pensamentos constantes – sua relação carinhosa com uma das assessoras da
Casa Branca Nancy Tuckerman (interpretado pelo irreconhecível Greta Gerwig) que
vira seu porto seguro em exposição com a mídia mostrado com detalhes na
apresentação da Casa Branca para um programa de televisão, sua revolta na hora
de tomar fortes decisões para se despedir do marido já que Jackie queria um
enterro emblemático mas os Estados Unidos estava com receio de novos ataques.
Bobby Kennedy também muito afetado pela tragédia tenta sempre ser um porto
seguro para a cunhada e os sobrinhos se mantendo a frente das decisões
políticas já com o novo presidente Lyndon B Johnson e assessores em exercício.
O filme tem um ritmo deveras lento, ganha mais com a força
de seus personagens. Flashbacks curtos ganham contornos explicativos que rodam
uma entrevista que um jornalista, interpretado pelo ator Billy Crudup faz com
Jackie, já afastada da loucura de Washington, dias após a tragédia. Para quem
quer saber mais sobre a história pessoal que cercou um dos presidentes mais
famosos do planeta, Jackie é uma visão diferente sobre alguns fatos sempre
apresentados. Um filme corajoso e com belíssimas interpretações.
Crítica do filme: 'Aliados'
Não há progresso se este não surgir através das dúvidas. Depois
de diversos trabalhos impactantes na indústria cinematográfica mundial, como Forrest Gump, a trilogia De Volta para o Futuro, O Náufrago e tantos outros, o cineasta
norte americano Robert Zemeckis volta às telonas em 2017 para mostrar uma trama
repleta de referências a filmes antigos de espionagem onde o amor transborda e
as escolhas viram conseqüências angustiantes. Aliados, protagonizado pelos excelentes atores Brad Pitt e Marion
Cotillard é uma trama repleta de ação e suspense com revelações que se
transformam em grandes reviravoltas ao longo dos intensos 124 minutos de
projeção.
Na trama, ambientada no começa da década de 40, conhecemos o
tenente coronel franco canadense Max Vatan (Brad Pitt), um espião em tempos de guerra
que recebe uma missão em Casablanca, no Marrocos. Durante essa missão, que
quase termina em tragédia para seu lado, conhece a bela e misteriosa agente
francesa Marianne Beausejour (Marion Cotillard). Após conseguirem sair vivos da
missão, ambos se apaixonam perdidamente e resolvem se casar e construir uma
família. O problema maior dos pombinhos é que tempos mais tarde, Max é alertado
por altas patentes do lado que luta que a esposa na verdade é uma espiã nazista
que rouba essa identidade tempos atrás. Sem saber em quem acreditar e duvidando
de tudo e todos, Max parte em uma missão pessoal que é descobrir a verdade
sobre sua esposa.
Indicado ao Oscar, apenas na categoria de Melhor Figurino, o
filme não deixa de ser uma pequena homenagem para o público que curte os filmes
de espionagem. O roteiro, assinado pelo britânico Steven Knight (dos ótimos Locke e Senhores do Crime), é bem detalhista, tem grandes cenas de ação, uma
espécie de clima noir no ar e muito suspense, estampado praticamente durante
toda a fita pelas ações e descobertas dos personagens. É o típico filme que
temos que esperar até a última cena para descobrir como montar as peças que
faltam no tabuleiro.
A parte do romantismo e da descoberta do amor, lembra muito
alguns filmes antigos na época dos lendários cineastas Michael Curtiz, Irving
Rapper e tantos outros. Sempre com traumas e amores quase impossíveis ou muitas
vezes sem aquele grande final feliz que todos esperam. O filme ganha contornos
eletrizantes nos arcos finais, onde vira uma grande busca pessoal do
protagonista para saber, na verdade, se tudo aquilo que viveu, sentiu com sua
esposa era real ou fazia parte de um grande plano manipulador por conta dos
objetivos da guerra, acima de tudo.
Aliados tem
muitos méritos, não é um filme inesquecível mas é um filme para ser visto. Robert
Zemeckis é um dos diretores mais acima da média em atividade, merece sempre a
conferida dos cinéfilos.
28/01/2017
Crítica do filme: 'O Ídolo'
A confiança em si mesmo é o primeiro segredo do sucesso. Depois
de brindar os cinéfilos com excelentes filmes como Omar (2013) e Paradise Now
(2005), o cineasta israelense Hany Abu-Assad volta às telonas dessa vez para
contar uma história baseada em fatos reais repleta de sofrimento e chances de
alcançar o tão sonhado sucesso. O Ídolo é
um filme repleto de críticas sociais, principalmente sobre a região onde se
passa Gaza na Palestina.
Na trama, conhecemos o jovem Mohammed Assaf que curte os
dias na cidade de Gaza, na Palestina, onde vive com sua família. Alegre e repleto
de amigos que sempre se envolveram com músicas, passa por um grande abismo
quando perde precocemente sua única irmã para uma doença terrível. Assim, ele
cresce e seus sonhos ficam mais distantes e a realidade que vive o vai sugando.
Até que um dia resolve voltar a buscar a música como inspiração e se candidata
ao Arab Idol (o American Idol Árabe) no ano de 2013 buscando seu tão sonhado
sucesso e reconhecimento.
Um dos grandes méritos de Hany Abu-Assad nesse filme, que
também assina o roteiro, é consegue preencher muito bem, em seus longos arcos,
todas as lacunas sobre a personalidade desse futuro grande cantor. Num primeiro
momento vemos o dia a dia do protagonista em sua primeira fase, a descoberta da
música e a importância que tem sua família e amigos em seu cotidiano. Já no
médio arco, vemos uma outra fase, aquela do sonho que lutando contra muitos
consegue a oportunidade de realizá-lo.
As críticas sociais, chegam em forma de obstáculos para o
protagonista. Quando resolve fugir de Gaza para poder participar da
eliminatória do programa (sem saber se poderia voltar para casa), a questão da
religião também ganha contornos, nesse caso só na superfície, no papel do amigo
que cresceu e virou assíduo quase atrapalhando a trajetória de sucesso do
cantor. A paisagem destruída pela guerra também ganham contornos interessantes
pelas lentes de Hany Abu-Assad, como na parte do Parkour entre os escombros que
com certeza despertou em Mohammed Assaf a variável que faltava para acreditar
em seu sonho e não desistir.
Com uma entrada bem discreta no circuito exibidor brasileiro
nessa última semana, por conta da quantidade dos filmes indicados ao Oscar que
já se encontram em circuito, O Ídolo
é um filme reflexivo que faz a gente nunca deixar de acreditar em nossos
sonhos, não importando os obstáculos.
Crítica do filme: 'Manchester à Beira-Mar'
Só nos curamos de um sofrimento depois de o haver suportado
até ao fim. Após alguns anos de hiato desde seu último filme, o cineasta nova
iorquino Kenneth Lonergan (Conta Comigo)
volta às telonas roteirizando e dirigindo um filme pra lá de triste que passa
um angustia arrepiante sempre na ótica melancólica de seu protagonista. Manchester à Beira-Mar indicado a seis
prêmios do Oscar, é uma história profunda repleta de buscas e dor, com
flashbacks impactantes que muito nos mostram nas mudanças da vida de um homem
que luta contra uma terrível tragédia em seu passado. Atuações marcantes são
vistas, Casey Affleck e Michelle Williams elevam a qualidade da fita e o
desconhecido Lucas Hedges cumpre com louvor seu importante papel na história.
Na trama, conhecemos Lee Chandler (Casey Affleck) um homem
solitário que vive em um minúsculo quarto na cidade de Boston e sobrevive sendo
uma espécie de faz tudo para alguns condomínios próximos a onde mora. Certo
dia, seu passado bate em sua porta com a terrível notícia de que seu único
irmão Joe (Kyle Chandler) acabara de falecera. Imediatamente, Lee precisa
voltar a cidade onde morou durante anos, muito por conta de único sobrinho
Patrick (Lucas Hedges), mas precisará enfrentar terríveis dores de seu passado.
Manchester à
Beira-Mar é um longa metragem cirúrgico na modelagem de seus dramas. Há
subtramas importantes que são exploradas aos poucos como a distante relação da
ex-cunhada do protagonista com o filho. Quando descobrimos o que aconteceu com
o protagonista, começamos a entender seu jeito caladão e distante que o
acompanha em toda a trama. Os flashbacks, nos arcos iniciais um pouco jogados
no roteiro, são parte importante do quebra cabeça que se monta, começamos a
entender melhor o porquê daquela personalidade, perguntas do tipo: ‘Será que
ele foi sempre assim?’ e ‘O que houve com esse personagem?’ são rapidamente
respondidas, fator que nos faz sofrer junto com o personagem.
O filme fala também sobre as inúmeras tentativas que temos
de recomeçar, mesmo quando quase tudo parece conspirar contra. A chance que Lee
tem em tentar criar o filho de seu irmão, sendo seu tutor, é algo importante
para ambos. Nesse desenrolar o roteiro segue frio e seco, e entre seus traumas
(visão do protagonista), principalmente o confronto que acontece com sua
ex-mulher Randi (Michelle Williams), após ser atualizado de como ela conseguiu
de alguma forma seguir em frente é uma das cenas mais bonitas dos últimos anos,
arrepia e emoção a flor da pele em cada segundo do emocionante diálogo.
Manchester à
Beira-Mar não é um filme para corações fracos. A dor e a conseqüência andam
lado a lado, assim como a emoção que sempre transborda no bom filme. Todo o
elenco se doa ao máximo para que vejamos um excelente trabalho na telona.
22/01/2017
Crítica do filme: 'Estrelas Além do Tempo'
A força sem inteligência é como o movimento sem direção. Baseado
no livro Hidden Figures, de Margot Lee Shetterly, Estrelas Além do Tempo fala sobre o preconceito na época da corrida
espacial, com o foco em três grandes mulheres negras que ajudaram a mudar o
rumo das descobertas norte americanas nesse período. Com ótimas atuações e uma
trilha sonora assinada pelo craque Pharrell Williams, o longa-metragem dirigido
pelo cineasta Theodore Melfi (Um Santo
Vizinho) é um daqueles belos filmes, nessa época corrida de muitos
lançamentos de prováveis indicados ao Oscar, que você não pode perder.
Na trama, conhecemos três mulheres fortes e determinadas que
trabalham em um departamento específico de matemática dentro da toda poderosa
Nasa. A matemática brilhante e mãe de três filhas Katherine G. Johnson (Taraji
P. Henson, em mais uma bela atuação), a engenheira e dona de duas graduações na
área das exatas Mary Jackson (Janelle Monáe) e a primeira supervisora mulher e
negra da história da Nasa Dorothy Vaughan (Octavia Spencer, em mais um grande
trabalho no cinema). Cada uma na sua área de atuação mas todas dentro do mesmo
departamento, com um foco maior em Katherine,
vamos descobrindo ao longo dos 127 minutos de projeção todo o preconceito e
obstáculos que as jovens precisam enfrentar para poder ajudar seu país em uma
importante disputa com a Rússia no domínio das navegações espaciais.
O filme começa com um belo arco inicial, focando no
cotidiano profissional das três amigas e toda a luta para conquistarem seus reconhecimentos.
Tendo que viver com uma segregação racial absurda, onde até os banheiros e
refeitórios da Nasa eram divididos pela cor das pessoas, as três brilhantes em
suas carreiras profissionais precisam ser valentes e lutarem por seus merecidos
direitos a todo instante. O filme retrata bem essa época e faz uma grande reflexão
também com os dias atuais e a merecida valorização da mulher no mercado de
trabalho. A matemática é o alfabeto com
o qual Deus escreveu o universo, as leis dos senos e cossenos, além de diversas
fórmulas complexas, ajudam as três protagonistas a encontrem seu espaço em um planeta
que sofre até hoje com atitudes preconceituosas.
A física é a poesia da natureza. A matemática, o idioma. Já
no segundo arco, o filme ganha contornos matemáticos profundos, com introdução
de uma das personagens a famosa linguagem de programação Fortran (já que uma
das jovens precisa entender a programar um enorme computador da ainda pouco
conhecida, naquela época, IBM), tentativas de cálculos para levar um norte
americano a dar sete voltas completas pela órbita da Terra. Também, nesse
segundo arco, um embate jurídico para conseguir freqüentar uma faculdade que só
entravam brancos por uma das jovens que sonhava em ser engenheira contratada da
Nasa.
A história é muito bem contada, tem a força de sua leveza
com os arranjos cinematográficos que ficam encaixados matematicamente perfeitos
no grande carisma que as personagens possuem. Estrelas
Além do Tempo estreia na primeira quinta-feira de fevereiro nos cinemas
brasileiros e você não pode deixar de conferir esse belo filme.
21/01/2017
Crítica do filme: 'Até o Último Homem'
Sem medo não há coragem. Indicado ao SAG, Globo de Ouro,
Bafta e provavelmente ao próximo Oscar, o novo longa metragem do ator e diretor
Mel Gibson (que não dirigia um filme há dez anos, Apocalypto (2006)) é baseado em uma história real e conta a saga de
um jovem que segue firmemente em seus princípios e sua fé em um ambiente hostil
dentro de um dos campos de batalha mais sangrentos na história do mundo. Na pele do protagonista, o ex-Spider Man Andrew
Garfield cumpre muito bem seu papel, o roteiro que deixa um pouco a desejar
mesmo a direção sendo espetacular.
Na trama, ambientada na década de 40, conhecemos o carismático
Desmond Doss (Andrew Garfield), um jovem que fora criado no interior dos
Estados Unidos junto com seu irmão Hal, sua mãe e seu conturbado pai. Após apaixonar-se
por uma linda enfermeira chamada Dorothy Schutte (Teresa Palmer), Desmond
resolve se alistar no exército norte americano para lutar na segunda guerra
mundial por achar que é seu dever. Cheio de princípios e invocando leis que
poucas pessoas conheciam ele quer se manter no exército mas sem tocar em nenhuma
arma, fazendo parte do corpo de médicos para ajudar nas batalhas quando
preciso. Isso causa uma grande confusão com seus superiores, o Capitão Glover (Sam
Worthington) e Sargento Howell (Vince Vaughn) que fazem de tudo para ele
desistir. Só que a fé é gigante para esse jovem e mesmo indo a corte marcial
consegue os direitos de ir pro campo de batalha totalmente desarmado e assim
irá enfrentar os horrores da guerra tentando mostrar seu valor.
Andrew Garfield encaixou bem no papel do protagonista e seus
coadjuvantes nos campos de batalha cumprem com louvor suas missões. Falta para
a construção completa do personagem, um pouco mais de profundidade nos laços
iniciais que possui com sua família, seu irmão Hal é completamente esquecido da
trama fator que é estranho já que Desmond quer entrar no exército também por
causa do irmão. A sua fé é bastante
explorada, com algumas cenas forçadas (é verdade) mas com muito simbolismo de
algo que representa o alicerce dos seus princípios.
Logo que começa o filme, nós sabemos que será um projeto hollywoodiano
em todos os sentidos. A busca constante pelos clichês, principalmente nos arcos
iniciais, logo na construção do personagem principal deixa o filme com cara de
enlatado norte americano. Do terceiro arco em diante, a produção parece que
consegue uma certa liberdade para focar nos pontos mais interessantes dessa
curiosa história. Mesmo com a construção inicial repleta de ‘momentos hollywood’,
o filme cresce estrondosamente do meio para frente. Mel Gibson em todo o momento
mantém suas ótica de forma exemplar, tenta mostrar ao público tanto emoções
quanto situações, detalhes, que são importantes para nosso entendimento e
envolvimento com a trama. É um belo trabalho de Mel na direção, mesmo o roteiro
ajudando em somente partes da história.
Até o Último Homem estreia
semana que vem no circuito brasileiro. Não é o melhor filme sobre guerra já
feito, longe disso, mas quem curte filmes do gênero pode gostar.
20/01/2017
Crítica do filme: 'A Garota do Trem'
O mistério do amor é maior que o mistério da morte. Baseado
no livro homônimo, de Paula Hawkins, best-seller do jornal The New York Times, A Garota do Trem é uma trama esquisita
onde nada é o que parece e o que parece também não é nada demais. Tudo é muito
confuso na história dirigida pelo ator e diretor Tate Taylor (Histórias Cruzadas). A protagonista não
possui a força e carisma necessários para prender nossa atenção nos sonolentos
100 minutos de projeção. Como filme, realmente não deu certo.
Na trama, conhecemos a desequilibrada Rachel (Emily Blunt)
que tenta seguir em frente em sua vida mesmo tendo um vício constante por álcool
e ter sida abandonada pelo ex-marido. Assim, escondendo da amiga que divide
apartamento que perdeu seu emprego, passa seus dias andando de um lado para o
outro de trem desenhando e criando em sua imaginação histórias para seus reais
personagens. Até que certo dia acaba se envolvendo como testemunha de um terrível
crime que aconteceu, por grande coincidência no bairro onde seu ex-marido mora
com a nova esposa e o filho recém nascido.
O grave problema dessa produção é a falta de lacunas
preenchidas para a composição de sua protagonista. Completamente fora do
controle (ritmo desnecessariamente acelerado) , com várias passagens vagas e
diálogos sem força na história, a personagem principal é mais confusa que o
atual meio campo do time do São Paulo. O
filme fica navegando nas águas do mistério mas na verdade é um grande drama
existencial mas sem possibilidades de nos conectarmos com seu enredo. Emily
Blunt até se esforça em tentar compor a personagem mas chega no meio do caminho
e parece mais perdida do que nós que assistimos o filme.
A Garota no Trem estreou
no Brasil no fim do ano passado, é o típico produto enlatado hollywoodiano
adaptado de um Best Seller que na hora de virar filme acaba se enchendo de
elementos com recheios de clichês. O livro deve ser bem melhor!
Crítica do filme: 'Toni Erdmann'
Sábio é o pai que conhece o seu próprio filho. Depois de um
hiato de sete anos na direção de um longa-metragem, a cineasta alemã Maren Ade
volta à telona em grande estilo com a hilária e doce dramédia Toni Erdmann. Contando a história de um
pai cheio de impulsos cômicos na busca constante pela atenção de sua sisuda filha,
o projeto, indicado a muitos prêmios internacionais e um dos favoritos para
ganhar o próximo Oscar de Melhor filme Estrangeiro é um daqueles filmes imensos
(2 horas e 40 de projeção) mas que não desejamos que acabe nunca, sempre à
espera da próxima gracinha que Toni Erdmann vai aprontar.
Na trama, acompanhamos a árdua saga de Winfried Conradi (Peter
Simonischek), um dedicado pai que muito se entristece com o distanciamento na
relação com sua única filha Ines (Sandra Hüller), essa última, uma jovem em
ascensão na empresa onde trabalha o que a transforma em uma Workholic sem
limites. O problema é que Ines trabalha demais e pouco tempo de sua agenda é
dedicada à sua família. Quando o o cachorrinho de Winfried morre, ele decide
encarar o desafio de ter mais atenção de sua filha e para isso, entre outras
coisas, viaja para vê-la quando ela está a trabalho e desenvolve um personagem,
um Alter ego de nome Toni Erdmann.
Não é preciso nem dizer as inúmeras e hilárias que esses dois vão se meter ao
longo desse complexo processo de melhoramento na relação pai e filha.
Escolhido o Melhor Filme Estrangeiro de 2016 pelos críticos
de Nova York, um dos sinais de sua provável indicação ao próximo Oscar, Toni Erdmann navega pelo humor para
mostrar o cotidiano de um relacionamento conturbado entre pai e filha. De
personalidades completamente diferentes, os dois embarcam em uma jornada basicamente
de auto descoberta. Aos poucos, após uma quantidade absurda de insistência, Ines
vai conseguindo se reconectar com seu pai, o que provoca uma cena de desfecho
para lá de emblemática. Mesmo tendo quase três horas de duração o que dificulta
sua entrada no circuito de cinema brasileiros, talvez um dos pontos para
nenhuma distribuidora ter ainda comprado os direitos no filme no Brasil, o
filme é uma delícia de assistir e essas horas passam voando.
O foco no primeiro
arco é a personalidade forte de Ines em paralelo as trapalhadas e atos
incompreendidos de Winfried. Tudo começa a fazer mais sentido, praticamente a
virada na trama, quando chega o Sr. Toni
Erdmann, com sua peruca para lá de chamativa e dentes falsos para lá de
explícitos. Esse Alter Ego transforma demais a visão de Ines sobre a
personalidade cativante de seu pai. Assim, o longa-metragem cresce demais em
emoção, o inusitado começa a ter sentido e fica num tom cômico na medida
conforme as antes constrangedoras agora com sentido situações. Toni Erdmann, rouba a cena, transforma
o mais difícil dos conflitos paternos em uma aula de amor e afeto.
O filme, que não tem previsão de estrear no Brasil, ainda é
forte concorrente a alguns prêmios esse ano. Merece todos os prêmios, da
direção ao roteiro e atuações, a produção joga por música, mexe com nossas emoções
e transforma esse filme de quase três horas em algo obrigatório para todos que
amam o bom cinema. Bravo!
Crítica do filme: 'O Roubo da Taça'
O mal do malandro é achar que todo mundo é otário. Escrito e
dirigido pelo cineasta Caito Ortiz, O
Roubo da Taça é uma comédia franca, com ótimos diálogos e personagens que
produzem uma comédia de fato realmente engraçada. Na contra mão de outros
filmes do gênero, falando em cinema nacional, O Roubo da Taça está muito acima, um longa metragem muito divertido
e bem feito. O projeto ganhou alguns prêmios, inclusive no prestigiado Festival
de Gramado no ano passado.
Na trama, ambientada no começo da década de 80 no Rio de
Janeiro, conhecemos Peralta (Paulo Tiefenthaler em grande atuação) um
trambiqueiro, flamenguista e corretor de seguros que passa os dias se atolando
em dívidas de jogo e dando pouco atenção a sua charmosa esposa Dolores (Taís
Araújo). Certo dia, após receber um singelo ultimato do dono da casa de jogos
onde passa a maioria de suas noites perdendo dinheiro, tem a inusitada ideia de
invadir a sede da CBF com a ajuda do enrolado amigo Borracha (Danilo Grangheia)
e roubar a Taça Jules Rimet, que está em posso dos brasileiros após o
tricampeonato mundial, após vencer a Copa do Mundo de Futebol do México, em
1970. Obviamente muitas coisas dão erradas após o roubo e a polícia começa a
desconfiar da dupla de malandros.
O roteiro é bem simples e as atuações que engrossam o caldo
desse tempero tipicamente carioca. A malandragem, exercida com louvor pelos
personagens, é tratada de maneira charmosa com caricaturas óbvias mas muito
eficazes tanto em relação às ações como nas reações. O filme poderia ser
tranquilamente um seriado de sucesso, onde semanalmente acompanharíamos o
desenrolar dessa cômica trama. É um filme que todos vão dar risadas, a inclusão
do malandro em sua personificação argentina é hilária e dá mais charme a boa
história.
O Roubo da Taça encontra-se
atualmente no vasto catálogo do Netflix e merece que todos dêem uma conferida.
Em meio a gigantescos lançamentos de comédia sem graça no cenário nacional,
esse é um filme do gênero que agrada, possui muitas e inúmeras qualidades.
Crítica do filme: 'Moonlight: Sob a Luz do Luar'
As mais belas descobertas ocorrem quando as mesmas coisas
são vistas com um novo olhar. Filme sensação do último Festival Internacional
de Cinema de Toronto no ano passado, esse baita filme Moonlight: Sob a Luz do Luar é uma pérola que precisa ser
descoberta por todos que amam cinema. Dirigido pelo cineasta norte americano Barry
Jenkins, com roteiro baseado na peça In Moonlight Black Boys Look Blue, de
Tarell McCraney, o filme fala sobre a vida de um garoto de origem humilde que
precisa enfrentar os absurdos feitos pela mãe e acreditar nas suas escolhas num
mundo tão insensível em que vivemos.
A trama, vencedora do Globo de Ouro 2017 na categoria Melhor
Filme de Drama, conta a história de Chiron que passa por três fases em sua
vida, na infância onde descobre uma amizade com o traficante Juan (Mahershala
Ali), na adolescência onde descobre sua sexualidade no encontro com o amigo Kevin,
e na fase adulta onde tenta se redescobrir após passar dias preso e tendo que
mudar de cidade. Nos três momentos de vida do protagonista, interpretado pelos ótimos
atores Alex R. Hibbert (infância), Ashton Sanders (adolescência) e Trevante
Rhodes (fase adulta), sua mãe Paula (Naomie Harris, que absolutamente dá um
show em cena) o cerca e o coloca em situações desagradáveis muito por conta de
seus vícios incansáveis. Ao longo do tempo vamos acompanhando o personagem
principal, seus dramas e suas certezas em um mundo cheio de obstáculos em busca
da felicidade.
O filme é uma grande crítica social. O preconceito e a
violência andam lado a lado, paradigmas impostos por um planeta repleto de caos
vivendo todo dia com medos aflorando e com cada vez menos luz no final desse
túnel. O protagonista vive grandes conflitos dentro de si e acaba sendo exposto
por conta de toda a dificuldade que possui com sua mãe, que deveria ser seu
primeiro ombro amigo. Na infância, descobre Juan, o traficante que vendia
drogas para sua mãe, um conflito de direções com uma cena emblemática à beira
de uma mesa de jantar. Em sua adolescência, onde o roteiro segue firme em sua
tentativa de fazer um grande raio-x não só do protagonista mas da sociedade ao
seu redor, a descoberta da sexualidade chega com grande surpresa e uma situação
que tenta entender aos poucos. Em sua fase adulta, esperamos as conclusões do
caminho que Chiron escolheu, quem sabe o amor possa ajudar a encontrá-lo.
O roteiro é espetacular. A direção também. O elenco é
maravilhoso. É muito elogio mas com toda verdade do mundo. Tudo é bem detalhado
e há uma forma de poesia na maneira como Chiron enxerga o amor. Repleto de
amargura dentro de si, o que acaba mexendo com suas emoções (como vemos na cena
da cadeira sendo quebrada), as boas ações que viu com os próprios olhos acabam influenciando
de alguma forma suas escolhas. Sim, esse também um filme de escolhas e mesmo
com o final aberto, quando sobem os créditos imaginamos que enfim, anos depois
de uma infância perturbada, sim, nosso protagonista encontra seu caminho.
Moonlight: Sob a Luz
do Luar estreia dia 23 de fevereiro. Um filme imperdível, um dos melhores
do ano. Bravo!