17/08/2020

E aí, querido cinéfilo?! - Entrevista #39 - Octavio Caruso

Nessa vida temos encontros e desencontros. A internet veio para bagunçar isso tudo e para quem é esperto conseguir se aproximar de ídolos ou apaixonados por cinema que nunca teria a chance de conhecer os pensamentos se a distância entre os dois pontos não existisse, como é agora no planeta internet. Dividir curiosidades sobre o gosto cinéfilo é um grande exercício que todos nós cinéfilos adoramos descobrir. Esse especial chega exatamente para apresentar universos diferentes do seu mas sempre com um grande amor ao cinema como o seu.

Nosso convidado de hoje é um grande cinéfilo carioca que tem como um de seus ídolos Elvis Presley. Dono de um texto sobre cinema cheio de argumentações e inteligentes colocações, Octavio Caruso é escritor, crítico de cinema, ator, roteirista e cineasta independente. Sempre com grandes comentários em suas postagens pelas redes sociais, é polêmico esse tijucano mas sempre em busca da defesa da sétima arte.

 

1) Na sua cidade, qual sua sala de cinema preferida em relação a programação? Detalhe o porquê da escolha.

Sem dúvida, o Cine Joia, a minha "casa" enquanto cineasta independente, local que acolheu meu sonho desde o início. Já virou tradição anual exibir meus curtas lá.

 

2) Qual o primeiro filme que você lembra de ter visto e pensado: cinema é um lugar diferente.

O filme que me despertou a paixão foi Ben-Hur (1959), visto em VHS na infância, mas não foi o primeiro que vi. Eu creio que o primeiro tenha sido Branca de Neve e os Sete Anões, na sala de cinema, com minha mãe. Todo o ritual me encantou, a sala escura, a tela gigantesca (aos olhos da criança), foi mágico.

 

3) Qual seu diretor favorito e seu filme favorito dele?

Woody Allen é o meu diretor favorito por sua produtividade invejável, ele sempre tem algo relevante a dizer. Gosto muito dele como escritor também, um gênio. O meu filme favorito dele é Hannah e suas Irmãs, seguido de perto por A Última Noite de Boris Grushenko.

 

4) Qual seu filme nacional favorito e porquê?

O Pagador de Promessas, de Anselmo Duarte. Eu gosto tanto, que meu primeiro texto como profissional da crítica, em 2008, foi sobre a inveja dos colegas cinemanovistas com a consagração de Anselmo em Cannes. É um roteiro focado, com simbologia, mas emocionalmente eficiente, uma obra que prova que o maior refinamento é a simplicidade.

 

5) O que é ser cinéfilo para você?

É apreciar a arte como algo atemporal, valorizar a memória cultural, entender que a REVISÃO é fundamental. Quem vê o filme apenas uma vez enxerga o cinema como um passatempo pueril, facilmente substituível por uma partida de gamão. O amor urge pelo reencontro. Enxergar a beleza única de cada gênero cinematográfico, sem preconceito, sem ser raso e imediatista. O cinéfilo entende o filme como oxigênio, algo existencialmente precioso. Fonte de estudo e prazer.

 

6) Você acredita que a maior parte dos cinemas que você conhece possuem programação feitas por pessoas que entendem de cinema?

É raro, o Cine Joia trabalha assim, curadoria é importante, mas na maior parte atendem somente o público mainstream, qualquer animal adestrado poderia fazer o mesmo trabalho.

 

7)  Algum dia as salas de cinema vão acabar?

Sem ritual, a arte perde relevância, creio que o cinema sempre irá se reinventar, sem perder o essencial.

 

8) Indique um filme que você acha que muitos não viram mas é ótimo.

Toda semana descubro pérolas obscuras, vou citar uma que vi recentemente, Tatuagem, com o Bruce Dern e a Maud Adams.

 

9) Como você enxerga a qualidade do cinema brasileiro atualmente?

Durante décadas, qualquer projeto que não atendesse a cartilha progressista não era sequer considerado, eu vivi isso na pele quando tentei produzir uma websérie anos atrás com o Carlos Miranda, o eterno "Vigilante Rodoviário". O esquema refletia nos temas abordados e na qualidade dos trabalhos, uma indústria encabrestada não evolui. Há guerreiros na seara independente, mas vai demorar muito tempo para que consigamos reverter décadas de aparelhamento estatal.

 

10) Diga o artista brasileiro que você não perde um filme.

Atualmente, difícil. Vejo todos, mas não me sinto emocionalmente atraído (no sentido da pergunta). A minha paixão é rever os grandes do passado, Humberto Mauro, José Mojica, os filmes da Cinédia, Vera Cruz, Atlântida. Troco qualquer produção nacional atual por uma comédia com o Mazzaropi.

 

11) Defina cinema com uma frase:

Cinema é vida.

 

12) Conte uma história inusitada que você presenciou numa sala de cinema:

Eu vivi algumas curiosas como crítico, em exibições para imprensa, como por exemplo, um colega veterano dormindo a sessão inteira de um filme do Cláudio Assis, mas dando nota máxima em seu texto (rs), tudo para agradar a "companheirada".

 

13) Defina 'Cinderela Baiana' em poucas palavras...

 

O resultado fraco do trabalho de uma equipe criativa que tentou, como todas, o seu melhor.

 

14) Você é um grande fã do Elvis Presley. Quais filmes você indicaria dele?

Sim, fui curador em uma mostra de filmes dele no Cine Joia, cantei seu repertório antes de cada sessão. Eu indico Balada Sangrenta, O Prisioneiro do Rock, Louco por Garotas, Viva Las Vegas, Estrela de Fogo e Viva um Pouquinho, Ame um Pouquinho.

 

15) Além de ser crítico de cinema você é ator, diretor, roteirista. O cinema é a sua vida? Você sempre recebeu o apoio de amigos e familiares para seguir nessa carreira do audiovisual?

Sim, eu produzi de forma independente 6 curtas até o momento, selecionados em festivais de Portugal (Figueira Film Art e FESTin). Eu respiro filmes e livros desde pequeno, o título do meu primeiro livro, lançado em 2013, é Devo Tudo ao Cinema, nem preciso dizer que o cinema é minha vida. Não recebi apoio, porque durante muito tempo neste país, trabalhar com arte (sem berço de ouro, sem grana) era equivalente à querer ser astronauta. Não há artistas na minha família, então não foi fácil para meus pais entenderem minha opção profissional. Hoje, mudou bastante, a internet possibilita uma democratização nesta área.