O que seria de nós sonhadores sem o cinema? A sétima arte tem poderes mais potentes do que qualquer superman, nos teletransporta para emoções, situações, onde conseguimos lapidar nossa maneira de enxergar o mundo através da ótica exposta de pessoas diferentes. Por isso, para qualquer um que ama cinema, conversar sobre curiosidades, gostos e situações engraçadas/inusitadas são sempre uma delícia, conhecer amigos cinéfilos através da grande rede (principalmente) faz o mundo ter mais sentido e a constatação de que não estamos sozinhos quando pensamos nesse grande amor que temos pelo cinema.
Nossa entrevistada de hoje é cinéfila, de goiania e radicada em São Paulo. Tarsila Araújo é assistente de direção,
diretora e roteirista. Dirigiu Procuro-me
(2014), Tenho Saudade do que Não Vivi (2017), o clipe Muito Mais (2018) da
cantora Lara Aufranc e o filme-manifesto Minha Carne (2019) da música da Preta
Ferreira. Tem três projetos de longa-metragem documentário: Felicidade, Os
Ruminantes e Minha Carne. Foi mediadora e palestrante de uma mesa sobre Minas
no Audiovisual, no evento Crie como uma Garota no MIS em São Paulo, e em outra
mesa sobre O Feminino no Cinema Brasileiro pela Secretaria de Cultura de São
Bernardo do Campo. Ministra curso de Assistência de Direção na Escola Livre de
Cinema de Santo André. Há 14 anos trabalha como assistente de direção para
diretoras como Juliana Rojas, Eliane
Caffé, Carla Caffé, Eliane Coster, Lina Chamie, Amina Jorge, Alice Andrade
Drummond, Marco Dutra, Caetano Gotardo, Gustavo Vinagre, José Eduardo Belmonte,
Fernando Honesko, Eduardo Kishimoto, Aimar Labaki, André Klotzel, Rafael Gomes,
entre muitos outros.
1) Na sua cidade,
qual sua sala de cinema preferida em relação a programação? Detalhe o porquê da
escolha.
Cinesesc. Lá a
programação é sempre ótima, com filmes que passaram por importantes festivais
ao redor do mundo, sempre com preços acessíveis e o melhor, ela é a sala
oficial de diversos festivais como Mostra de Tiradentes em SP, Mostra
Internacional de Cinema de São Paulo, entre outros. Além disso, todo ano tem o
Festival Sesc Melhores Filmes, que são os filmes que estiveram em cartaz na
cidade, votado pelo público e também por um júri onde se selecionam os mais
votados. E sempre tem uma programação incrível. Este ano foi online e gratuito.
E não poderia citar esta sala sem dizer sobre sua tela enorme e a sua qualidade de som e imagem. Além do café
que fica atrás que dá pra assistir o filme tomando alguma coisa. Sei que alguns
cinéfilos acham heresia, mas eu adoro variar com essa possibilidade.
2) Qual o primeiro
filme que você lembra de ter visto e
pensado: cinema é um lugar diferente.
A História Sem Fim
(1984), dirigido por Wolfgang Petersen.
Eu era criança e nem sabia ler ainda. Lembro de lerem as legendas pra mim a
primeira vez que vi.
3) Qual seu diretor
favorito e seu filme favorito dele?
Por muitos anos foi Luis
Buñuel, O Anjo Exterminador (1962). E continuo amando. Quem nunca viu este
filme, veja. São muitos filmes dele que acho obra-prima. Mas de anos pra cá,
tenho gostado muito do cinema da Agnès
Varda e Eliane Caffé - não
porque já trabalhei com ela, mas ambas fazem (faziam, no caso da Agnès) um
cinema engajado, mas livre. E pensando, talvez o cinema do Buñuel fosse livre
também.
4) Qual seu filme
nacional favorito e porquê?
São Paulo S/A
(1965), dirigido por Luiz Sérgio Person.
Eu fiquei muito impressionada com esse filme a primeira vez que assisti, talvez
porque partilhava da sensação de desajuste que o personagem sente a partir de
certo momento em relação à sociedade, no caso do filme, em São Paulo, com o
crescimento da cidade e das indústrias, automatização e claro, uma crítica à
classe média, ao consumismo e ao casamento.
5) O que é ser
cinéfilo para você?
Pra mim, ver um filme é como estar em outros lugares. Viver
outras vidas, além da minha. Por 1h30 ou 2h sou transportada para a Europa na
década de 60 ou para o México no início dos anos 2000, sou uma atendente de uma
lanchonete ou uma atriz em crise numa peça de teatro. Visito lugares em que
nunca estive e somos capazes de estar na pele de outras pessoas. Sentir o que
outras pessoas sentem. Aprender coisas novas.
6) Você acredita que
a maior parte dos cinemas que você conhece
possuem programação feitas por pessoas que entendem de cinema?
Na verdade, muito da programação das salas de cinema tem a
ver com o mercado de cinema, e não com a qualidade dos filmes em si. Por isso
gosto tanto do Cinesesc. A Cinemateca Brasileira era outro lugar em que se
podia encontrar ótima programação, feita por pessoas que entendiam
absolutamente de cinema.
7) Algum dia as salas de cinema vão acabar?
Eu acredito que não. A experiência de assistir filmes em uma
sala escura, com bom som, imagem gigante, concentrados e coletivamente nunca
vai deixar de existir.
8) Indique um filme
que você acha que muitos não viram mas é ótimo.
Falei recentemente de Anche
Libero Va Bene (2006), dirigido pelo Kim
Rossi Stuart. Eu gosto bastante, assisti na Mostra Internacional de Cinema
de São Paulo.
Mas falando de cinema nacional, eu diria Sinfonia da Necrópole (2014) dirigido
pela Juliana Rojas. Tem humor, crítica
social e música. Está no Netflix
atualmente.
9) Você acha que as
salas de cinema deveriam reabrir antes de termos uma vacina contra a covid-19?
Bom, chegaram a reabrir, mas eu não fui nenhuma vez. Eu ouvi
um colega que estava indo com frequência e dizia que estava sempre vazio e se
sentia mais seguro que na padaria. Mas agora a pandemia está em um nível
catastrófico, não acho que deveria reabrir até estar mais seguro.
10) Como você enxerga
a qualidade do cinema brasileiro atualmente?
Eu acho que tem muitos filmes bons sendo feitos no Brasil. E
algumas séries também. Mas mesmo com alguns editais que descentralizam o eixo
Rio-SP, eu acho que os editais ainda estão concentrados em poucas mãos. E
quando se pega dentro da cidade de São Paulo, ainda não há muita diversidade.
Isto começou a mudar com algumas políticas da SPCine, mas ainda assim, acho
discreto para a mudança que se deveria ter.
11) Diga o artista
brasileiro que você não perde um filme.
Marcelo Gomes.
Mas foi difícil dizer apenas um nome.
12) Defina cinema com
uma frase:
Cinema pra mim é a chance de viver diferentes vidas. Seja
assistindo, seja fazendo cinema.
13) Conte uma história
inusitada que você presenciou numa sala de cinema:
Falando de novo do Sinfonia
da Necrópole, foi muito legal a sessão que teve no Festival de Paulínia, a
sessão estava cheia e era muito bom ver o público rindo muito do filme e
acompanhar as reações, de um roteiro que eu conhecia bem. Essa experiência
coletiva que o cinema traz é muito maravilhosa.
14) Defina 'Cinderela
Baiana' em poucas palavras...
Confesso que tive que pesquisar pra saber o que era. E
fiquei bem surpresa. Deu até uma leve vontade de assistir. E a nota do Imdb é
1.9. Acho que nunca tinha visto uma nota tão baixa.
15) Muitos diretores
de cinema não são cinéfilos. Você acha
que para dirigir um filme um cineasta precisa ser cinéfilo?
Eu responderia com: defina cinéfilo. Eu não acho que um(a)
diretor(a) precisa ser cinéfilo no sentido de conhecer toda a história do
cinema, de vários países, clássicos, cults, etc. Mas acho que um(a) diretor(a)
precisa conhecer um bocado de cinema, a linguagem e acho que quanto mais filmes
assistir, com certeza mais bagagem se pode ter. Mas não acho que há regras.
16) Qual o pior filme
que você viu na vida?
A Centopéia Humana.
Se eu tivesse um botão de desver, eu usaria. Sério, não assistam. Só é nojento,
em todos os sentidos.
17) Qual seu
documentário preferido?
Crônica de um Verão
(1960), Edgar Morin e Jean Rouch. E os filmes do Eduardo Coutinho, que pra mim é difícil
escolher um.
18) Você já bateu
palmas para um filme ao final de uma sessão?
Já. Mas em pré-estreias. Não lembro se bati palmas em uma
sessão comum, mas não duvido.
19) Qual o melhor
filme com Nicolas Cage que você viu?
Adaptação (2002),
Spike Jonze.
20) Qual site de cinema
você mais lê pela internet?
Olha, atualmente não tem um site específico. Eu vou lendo as
notícias e críticas conforme vão surgindo em redes sociais ou outros.
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