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15/06/2025

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Crítica do filme: 'Nem Toda História de Amor Acaba em Morte' [CINEPE 2025]


A rotina que mata. Trazendo um importante olhar para a surdez e acessibilidade gerando uma representatividade importante e ainda pouco vista nos produtos audiovisuais brasileiros, o longa-metragem paranaense Nem Toda História de Amor Acaba em Morte, entre beijos e feridas, num cair e levantar, busca um retrato sutil do cotidiano das relações.

Sol (Chiris Gomes) está em um casamento na iminência do fim. Quando resolve tomar essa decisão, acaba conhecendo Lola (Gabi Grigolom), uma jovem atriz surda. Quando as duas resolvem embarcar de forma definitiva nesse relacionamento, conflitos com o ex-marido de Sol se tornam presentes.  

Uma nova fase da vida e os sussurros dos que cismam em não entender, se tornam alguns dos contrapontos que se chocam numa narrativa com um abre alas com o freio de mão puxado mas que de alguma forma utiliza um trunfo interessante, um papo reto, uma mensagem objetiva, que deixa o filme leve, com momentos cômicos e com fácil identificação.

Nessa tragicômica jornada, que ganha força à medida que se afasta de seu início, acompanhamos uma protagonista em crise, descobrindo novas formas de amar e de enxergar as relações. O roteiro adota uma estrutura quase episódica, como pequenas esquetes que se costuram em busca de simplificar o que é, por natureza, complexo. Embora nem sempre alcance maior profundidade e por vezes se embarace em suas próprias propostas, a narrativa mantém um tom leve e agradável que convida o espectador a seguir até o fim.

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14/06/2025

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Crítica do filme: 'Depois do Fim' [CINEPE 2025]


Exibido no antepenúltimo dia das mostras competitivas do CINEPE 2025, o curta-metragem Depois do Fim apresenta um desabafo de emoções reprimidas, desencadeando um inesperado choque capaz de despertar conflitos há tempos adormecidos. Em um recorte profundo – mesmo com poucos minutinhos – sobre ‘O que não durou e as suas causas’, embarcamos rapidamente num universo muito visto nos filmes de Richard Linklater que aqui ganha sua própria originalidade nas mãos de uma habilidosa direção de Pedro Maciel.

Seis anos após o último adeus, Ana (Olivia Torres), uma musicista atualmente em uma relacionamento, dá de frente com o ex-namorado, Théo, oferecendo uma carona. Esse fato leva esses dois ex-pombinhos para preenchimentos de lacunas que ficaram perdidas pelo tempo. Será que há possibilidades para novos capítulos dessa história?

Uma carona, um reencontro, uma história de amor guardada numa caixinha de memórias. Em 19 minutos de duração, o curta-metragem nos convida a um encontro que, na verdade, é sobre desencontros. Entre confissões e desabafos, o filme faz do presente uma ponte para revisitar o passado e propõe uma reflexão madura sobre os labirintos emocionais dos relacionamentos.

Brincando com as incertezas, o roteiro preenche suas linhas com diálogos de múltiplas camadas e significados, encontrando uma cadência certeira e um ritmo envolvente. A narrativa, sempre centrada nos personagens, direciona o olhar do espectador para uma verdadeira explosão de emoções.

Criar um elo com o público não é fácil, há muitos méritos nisso. Esse é um filme que chega no seu desfecho com gostinho de quero mais. Quem sabe não vira um longa, né? Eu correria pra assistir!

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Crítica do filme: 'Itatira' [CINEPE 2025]


Assisti a um filme bastante curioso e instigante no CINEPE, que podemos definir como um verdadeiro “True Sobrenatural Brasileiro”. Com um prólogo impactante, repleto de figuras enigmáticas e imagens fragmentadas, o longa-metragem Itatira já abre evocando uma atmosfera de mistério e inquietação, ambientada numa pequena cidade do sertão cearense.

Fugindo do lugar-comum, a narrativa nos conduz por uma espécie de investigação sobre o inexplicável, enquanto expõe de forma crua e incisiva as feridas morais de uma comunidade que logo se vê engolida por um verdadeiro circo midiático. Dirigido por André Luís Garcia, roteirista de Cidades Fantasmas, vencedor do Festival É Tudo Verdade anos atrás, Itatira desafia o público a cada instante, a cada imagem, a cada som, com um cinema sensorial fascinante.

Em um pequeno município do interior do Ceará — que dá nome ao filme — um suposto espírito começa a se manifestar dentro de uma escola, fazendo os estudantes passarem mal de algumas formas. Com a recorrência dos episódios, o caso rapidamente desperta o interesse da mídia, que transforma a situação em um espetáculo sensacionalista, afetando de maneira profunda e desestabilizadora a rotina dos moradores da região.

Explorando de forma criativa diferentes camadas temporais e a cultura do sobrenatural dentro de uma atmosfera sensorial cuidadosamente construída – com o som de grilos, o tilintar metálico e o sopro do vento –, o projeto aposta numa narrativa que se demora a acontecer. Esse ritmo mais lento, porém, encontra amplitude e coerência na cadência de uma trilha sonora tensa que envolve todo o filme. É preciso entrega e paciência para embarcar nessa experiência.

Seria esse um projeto sobre um grande achado? Um fenômeno do outro mundo? Padres chamados para um lugar que acontecem coisas que ninguém consegue explicar logo vira bafafá e munição para uma exposição violenta no lado moral a partir do circo midiático que logo tomou conta. Nesse ponto, seu ápice, o lugar é um personagem central que nos convida lentamente para um raio-x sociológico que explica muito de nossa sociedade.

 

 

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12/06/2025

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Crítica do filme: 'Senhoritas' [CINEPE 2025]


Seu mundo é você quem faz. Mostrando o retorno de uma amizade virando um estopim para descobertas na melhor idade, o longa-metragem Senhoritas caminha do embalo suave dos boleros à energia contagiante da salsa conduzindo o público por uma jornada sensível sobre o valor das conexões humanas. Selecionado para a Mostra Competitiva de Longas-Metragens do CINEPE 2025, esse projeto escrito e dirigido por Mykaela Plotkin é um mergulho afetuoso sobre as – muitas vezes dolorosas - reflexões sobre a vida, o recomeçar e os impulsos fascinantes de se lançar ao novo.

Lívia (Analu Prestes) é uma arquiteta aposentada que após conquistar a estabilidade, vive seus dias ao lado do marido, sem muitos grandes momentos. Sua maior alegria vem do vínculo afetuoso com a neta, que ilumina seus dias. Tudo isso muda quando sua amiga Luci (Tânia Alves) volta o Brasil e muda completamente a forma de pensar e agir da protagonista. Se revelando aos desejos antes contidos, Lívia desperta para uma jornada de descobertas e libertação. 

Com sua ótima premissa e dando espaço para um sensível olhar para a melhor idade, busca desenvolver os conflitos de maneira delicada e com um foco em uma fascinante protagonista, muito bem interpretada pelo furacão de emoções Analu Prestes. A narrativa corre o risco de não encontrar um grande clímax, aquele grande momento, mas consegue entregar sua bela mensagem do início ao fim.

Longe de ser algo inovador em relação a outros projetos audiovisuais, Senhoritas busca encontrar seu norte na maneira delicada que apresenta o descongelamento da monotonia. Logo chegamos numa ponte importante e fundamental que passa pelo reconectar das relações, nas três gerações de uma família, nos dilemas que se mostram constantes, nos impulsos e receios de confrontos.

Rodado há alguns anos, Senhoritas finalmente chega ao circuito de festivais, revelando o impacto sensível da direção de Mykaela Plotkin e da entrega do elenco. Nesta envolvente jornada, chama atenção a escolha narrativa de não revisitar o passado: o filme se ancora no presente e propõe um achado imaginativo que floresce na mente de quem se permite mergulhar no que se vê em tela.

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Crítica do filme: 'Sertão 2138' [CINEPE 2025]


A introspecção de uma solidão. É tão bom vermos filmes brasileiros de ficção científica ganhando os holofotes e chegando com fortes mensagens para refletirmos sobre o nosso agora. Esse é o caso de Sertão 2138, uma engenhosa – e ao mesmo tempo simples - distopia gravada no sertão de Pernambuco que passando pela inspiração, a importância da referência, da pesquisa, chega até um olhar atento para as questões climáticas e socioeconômicas.

Neste sci-fi ambientado no sertão e dirigido por Deuilton Júnior, o futuro, a tecnologia e o conhecimento formam o tripé de uma narrativa que, embora careça de ritmo, propõe um debate através do olhar melancólico de uma protagonista em crise, às vésperas de uma fuga de um planeta adoecido.

Em um futuro não tão distante, uma brilhante pesquisadora desenvolve uma estação espacial fora da Terra — uma alternativa para um novo mundo, repleto de possibilidades, diante de um planeta que se tornou quase inabitável por múltiplas razões. Quando ela está indo pra lá, surge uma missão que a coloca em novos debates sobre a existência.

Criado na Universidade Federal de Pernambuco, por estudantes atentos aos assuntos do cotidiano de um planeta com muitas questões que precisam serem debatidas, em 19 minutos vemos o local (o sertão) como um forte elemento representativo, cheio de saídas para nosso pensar. Os conceitos imaginativos oriundos da ficção científica viram uma espécie de cereja do bolo que ilustra e convida o público para conversar sobre as nossas necessidades para o agora.

Selecionado para a 2ª Edição do Festival de Cinema de Xerém, esse curta-metragem nos leva até o encontro entre o empírico e o inesperado. Cheio de interpretações e cantinhos de reflexões ao longo de seu desenvolvimento, faz parte da galeria de obras audiovisuais que aplicam criatividade ao mostrar verdades.

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Crítica do filme: 'O Ano em que o Frevo não foi pra Rua' [CINEPE 2025]


O frevo de uma nota só. Em meio à pandemia, que sufocou sonhos e silenciou a alegria, as emoções contidas nas ruas vazias ganham voz no documentário O Ano em que o Frevo não foi pra Rua, selecionado para a mostra competitiva nacional do CinePE 2025. Dirigido por Mariana Soares e Bruno Mazzoco, o filme apresenta um olhar sensível mas arrastado sobre o isolamento, a ausência e o reencontro de apaixonados pelo carnaval pernambucano, privados da celebração que dá ritmo às suas vidas.

Dando voz à representantes dos conhecidos mundialmente - O Galo da Madrugada, O Homem da Meia-Noite - de Recife à Olinda, vamos percorrendo as emoções conflitantes de dois anos sem carnaval. Mesmo perdendo fôlego em muitos momentos, a bonita e intensa relação dos pernambucanos com as festas populares é algo que é transmitido, contagia. Até a volta do final feliz: atenção e apreensão, emoções captadas através do sentimento vazio de um hiato com muitas questões.

O som melancólico do saxofone assume um papel central na atmosfera do filme, reforçando a tristeza onde a narrativa parece encontrar sua zona de conforto. Essa escolha sonora nos conduz por uma sequência de retornos emocionais — entre depoimentos de foliões, compositores e amantes das grandes festas culturais da região — ainda que, em alguns momentos, acabe recaindo em clara redundância. É como se estivéssemos ouvindo a mesma mensagem num eterno play de uma vitrola que busca gerar as reflexões num certo desconforto.

Não chega a ser um filme triste sobre carnaval (acho até que é impossível isso!). Há um esforço louvável para reflexões que já vimos – sobre outros temas – dentro do momento que a Covid-19 pegou a todos nós de surpresa. Mas a bolha de tristeza profunda que vai se criando é uma estrada sem retorno que não chega ao seu ápice mesmo quando tudo ganha cores.   

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07/06/2025

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Crítica do filme 'A Caverna' (2025) - [CINEPE 2025]


Conseguindo o efeito de uma poderosa bomba criativa que chega na raiz dos seus conflitos de forma acachapante, o filme A Caverna apresenta, de forma contundente, um recorte de uma relação intensa entre mãe e filha. A narrativa, com seus toques alegóricos certeiros, se liberta no denso terreno das emoções, formando uma experiência envolvente que facilmente fisga o olhar de quem enxerga algo próximo de alguma realidade.

Exibido na Mostra Competitiva de Curtas Nacionais da 2ª Edição do Festival de Cinema de Xerém, esse interessante projeto parte do princípio de que tudo em cena importa, utilizando muitas vezes de um incomodar para chamar a atenção do público. Associado a isso, logo o temporal que se cruza, busca nas infinidades do cinema uma porta de entrada para o ‘fora da caixa’.

Mãe e filha se veem em momentos distantes, com a segunda prestes a sair da casa onde sempre morou e descobrir o mundo que se apresenta através do seu olhar como artista. Nesse conflito, que também tem lampejos do forte amor desse laço eterno, ambas buscam soluções para a relação já fragmentada por cuidados em excesso. Num lugar figurativo, cheio de possibilidades de entendimento - uma caverna - se torna o espaço onde soluções podem ou não serem alcançadas.

Um dilema aliado ao discurso - o ficar ou abandonar – guiados por duas inspiradas artistas em cena (Patrícia Saravy e Natália Garcia), se mostra uma base importante para pensarmos sobre a sociedade e os obstáculos na interrelação. Associado a isso, trazendo um olhar para o real através de um assunto que não se mostra completamente, a Síndrome do Pânico, vamos percorrendo embates fervorosos.

Escrito e dirigido por Luísa Fiedler, esse curta-metragem dá margens para interpretações sem perder um ponto fixo onde seu desabrochar acontece.


 

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22/05/2025

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Crítica do filme: 'Um Outro Francisco'


Dois fotógrafos estrangeiros. Um evento religioso de um famoso santo italiano em terras cearenses. Com essas duas vertentes se unindo por um tour fascinante, objetivo e reflexivo sobre o universo da fotografia, o documentário Um Outro Francisco, dirigido por Margarita Hernández, amplia o olhar para os espelhos culturais através dos personagens que encontram.

Expandindo os horizontes do inesperado e abrindo caminhos para um trabalho fotográfico instigante, a dupla Dario De Dominicis e Giorgio Negro assume, simultaneamente, os papéis de protagonista e coadjuvante em um registro documental que transita pelo essencial e alcança novas formas de compreender as conexões culturais. Descobrindo que na cidade de Canindé (Ceará) acontece uma concorrida celebração dedicada a São Francisco, durante cinco anos resolvem produzir registros dos fiéis e moradores locais.

Com uma estrutura bem delineada — com início, meio e fim — a jornada, que se estende de 2013 a 2017, revela ao longo do tempo imagens e movimentos que caminham juntos rumo a um destino que se confunde com o próprio discurso: a troca de significados por trás dos registros. Os instantes, os sentimentos, os desabafos, as curiosidades, aqui se jogam num contexto sobre a fé, logo virando um laboratório de exposição sobre as emoções genuínas.

Os diferentes olhares e os diálogos em torno do que esperar – num jogo corajoso entre fotógrafos e fotografados - através do que foi registrado, preenche a narrativa com um dinamismo que transmite luz para as linhas que se aproximam (muito mais do que se distanciam) entre a arte e as ferramentas para se chegar num recorte profundo sobre identidade.

Um Outro Francisco chegou recentemente ao circuito exibidor de algumas cidades. É um filme simples, mas potente em suas reflexões. Com menos de 80 minutos, consegue expandir seus questionamentos para além da fotografia, utilizando o audiovisual como um recurso essencial para capturar e transmitir suas verdades.


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16/05/2025

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Crítica do filme: 'Hora do Recreio'


Estabelecendo paralelos entre o poder da educação contra a violência, o fascinante documentário Hora do Recreio constrói uma narrativa que transita entre o documental e o ficcional, sempre alinhada ao discurso proposto. A partir de depoimentos de estudantes de escolas públicas do Rio de Janeiro, a obra traça de forma impactante reflexões profundas sobre a sociedade brasileira.

Menção Especial do Júri Jovem da Mostra Generation 14 plus na última edição do Festival de Berlim e selecionado para os programas especiais da 30ª edição do Festival É Tudo Verdade, esse novo trabalho da ótima documentarista Lúcia Murat escancara ao mundo verdades. Por meio de relatos reais, temas como a violência contra a mulher, o racismo e a gravidez na adolescência tornam-se pontos de encontro para debates ricos e significativos, conduzidos sob o olhar e fala de uma juventude que conquista cada vez mais voz.

O teatro, a dança, também ganham espaço no projeto, ampliando o campo de argumentações. Um dos grandes momentos do projeto é a performance de uma peça baseada no livro Clara dos Anjos, escrita no final da década de 1940 pelo jornalista e escritor brasileiro Lima Barreto. A obra retrata o abuso sofrido por uma jovem negra do subúrbio, tornando-se ponto de partida para reflexões e paralelos com a realidade vivida por moradores das comunidades na atualidade.

Ao longo da projeção, somos testemunhas de uma imersão contínua a retratos dolorosos - e por vezes conflitantes - através de inúmeras formas artísticas, o que valida a cultura como ferramenta importante pra qualquer sociedade. Guiado por importantes mensagens, dividido em atos complementares, as perspectivas futuras se jogam pelas entrelinhas, com o senso crítico cada vez mais afiado de uma juventude atenta e revidando.

Essa realidade de nosso país contada pelo olhar dos jovens que vivem nessas realidades é uma fórmula que traz o choque para encararmos as reflexões que se formam necessárias. Hora do Recreio deve chegar ao circuito exibidor brasileiro ainda em 2025, uma obra cinematográfica que escancara ao mundo verdades que precisam ser debatidas.  


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06/05/2025

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Crítica do filme: 'Criaturas da Mente'


A partir de uma inquietação e também curiosidade de um consolidado cineasta brasileiro, o fascinante documentário Criaturas da Mente vai de encontro as possibilidades de preenchimentos de lacunas onde um universo fascinante logo se abre. Imerso num curioso paradoxo onde um cineasta não consegue mais sonhar, Marcelo Gomes encontra o neurocientista Sidarta Ribeiro e juntos abrem diálogos para profundos paralelos entre o cinema e os sonhos.

Sob esses dois pontos de vistas, inclusive com Gomes – diretor pernambucano de Cinema, Aspirinas e Urubus, Paloma e outros ótimos filmes - se colocando como um importante personagem, vamos entendendo estudos presentes e a espiritualidade de muitos anos que de alguma forma compõem o sonho como objeto científico. Nesse momento engrandece os desenrolares a chegada de Sidarta Ribeiro, professor, escritor e um dos fundadores do Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, referência mundial na área dos sonhos.

Filme de abertura da 57ª edição do Festival de Brasília, Criaturas da Mente instiga o público para uma jornada onde o acreditar e o descobrir andam lado a lado através de experiências bastante pessoais conseguindo amplo contexto. O alerta dos pesadelos na vida cotidiana, a representação do que seriam as ‘criaturas da mente’, as janelas de percepções, tudo isso vira pauta para uma investigação detalhada que são lapidadas por depoimentos interessantes e imagens que contemplam o refletir.

Um dos mais visíveis méritos dessa obra é que o discurso nunca se desprender dos 80 minutos de projeção. Contornando as dúvidas do diretor-narrador e as experiências que se joga, abre-se portas para os saberes ancestrais de povos originários, um diálogo enriquecedor com um psicanalista Junguiano e as descobertas de culturas afrodescendentes. Além dessa busca incessante por respostas, caminhamos também por parte da obra de Marcelo Gomes, que 30 anos atrás fez sua estreia no universo cinematográfico assumindo a direção e roteiro do curta-metragem Maracatu, Maracatus.

Desbravando e compartilhando o mundo das sensações e interpretações, Criaturas da Mente - coprodução com Globo Filmes e GloboNews e em associação com a Carnaval Filmes - é um dos ótimos documentários que estrearão esse ano no circuito exibidor brasileiro. Não tenham dúvidas de que é um chamado para se pensar sobre o inconsciente! As reflexões chegam por todos os lados.


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19/04/2025

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Crítica do filme: 'Noel Rosa, um Espírito Circulante'


Quem nasce lá na Vila, nem sequer vacila! Exibido na Mostra Retratos da última edição do Festival do Rio, o documentário Noel Rosa, um Espírito Circulante busca decifrar curiosidades e histórias desse importante personagem da nossa cultura. Através da sua conhecida vida boêmia, da importância e relevância de muitas das suas mais de 200 canções até hoje e da forte ligação que tinha com um famoso bairro da zona norte do Rio de Janeiro, o trabalho da diretora e roteirista Joana Nin nos leva para um encontro animado entre o antes e o depois.

Fixando-se em um espaço querido por sambistas de todo o país - apresentando para muitos não cariocas o bairro de Vila Isabel – desfilando imagens por suas principais ruas e pontos de encontro, o projeto busca em algumas etapas reconstruir a vivência de outrora, a relação com o samba, e a força do legado que o famoso músico deixou para as futuras gerações. Para isso também conta com lindas interpretações de suas canções através do talento de nomes como: Edu Krieger, Dori Caymmi, Moacyr Luz e Mart'nália.

Um dos grandes acertos do projeto é transformar o bairro que nasceu Noel em um personagem, isso dá muito sentido a toda uma costura narrativa que apresenta seu olhar sem precisar se aprofundar, navegando a favor das memórias e das interpretações de quem seria esse célebre boêmio vindo de uma família de classe média, que estudou no prestigiado Colégio São Bento e frequentou a Faculdade de Medicina, na visão daquela época e no olhar do agora.

Conseguindo trilhar numa narrativa pulsante que ainda não foge do seu discurso em nenhum instante, guiada por animadas entrevistas de sambistas de vários períodos, além de canções marcantes do eterno cria de Vila Isabel, ao longo 71 minutos viajamos confortavelmente pela trajetória de um dos mais impactantes compositores da música brasileira - que faleceu de tuberculose aos 26 anos no final da década de 1930.

Noel Rosa, um Espírito Circulante estreia nos cinemas no dia 24 de abril. É um oportunidade de você conhecer melhor esse meteoro criativo que nos deixou muito cedo mas que nunca cairá no esquecimento.


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07/04/2025

Crítica do filme: 'Mário de Andrade, o Turista Aprendiz'


O encontro de desabafos, sensações e conclusões. Com um discurso criando seu oásis nas angústias dos relatos de uma viagem pela região amazônica de um dos maiores poetas da nossa literatura, Mário de Andrade, o Turista Aprendiz pode ser interpretado como uma peça filmada - bem definida por atos – caminhando com paradas no experimental, na ficção, no documental. Essa experiência dirigida e roteirizada por Murilo Salles faz valer o encontro das sensações, das emoções, com personagens ganhando força no imaginário.

O caminho traçado por essa obra vai de encontro a uma necessidade de preenchimento de lacunas das verdades do Brasil pouco visto, utilizando como trunfo a experimentação – e todo o alcance e possiblidades - da linguagem cinematográfica na narrativa. Seu ritmo lento parece criar as reflexões no pós instante, algo que ganha complementos ao longo dos 92 minutos de projeção. Imagens da época, fotografias, encenações, uma narração que não se desgruda, se tornam elementos que saltam na aleatoriedade dos movimentos.

Qualquer obra que nos leva na borda do decifrar uma personalidade através de um ofício que liga os tantos pontos de um país já tem seu mérito próprio quando pensamos em registro. Esse longa-metragem, que teve um circuito modesto no tão disputado circuito exibidor brasileiro, se arrisca também em buscar em alguns momentos traçar os paralelos da época com os tempos atuais, como nas imagens de um ambulatório lotado durante a Covid-19 embutido numa passagem por uma região sofrendo com a malária, uma luta naqueles tempos.

Dando ênfase no seu traço mais marcante, o filme busca suas inspirações no Livro O Turista Aprendiz e fatos documentais, apresentando sua versão para o olhar do ávido observador, criador de crônicas que englobam a cultura, a política, a sociedade. Esse cantinho de personalidade que deixa rastros da complexidade de sua inquietude se junta a um se jogar na busca, no entender e interpretar tudo que vê com os próprios olhos durante uma viagem que mudaria sua visão de mundo.

Não há a necessidade de ser um grande conhecedor da história do cronista paulista - e um dos fundadores do modernismo - para chegar as tão variadas reflexões. O roteiro localiza o momento deixando nas entrelinhas uma breve biografia de Mario de Andrade, um homem de mente pulsante que viajou por alguns cantos de nosso extenso território em busca de uma identidade cultural para nosso país.


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20/03/2025

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Crítica do filme: 'Eu e o Boi, o Boi e Eu' [7a Edição do Lanterna Mágica]


Trazendo para o centro dos holofotes um evento marcante em vários municípios de Minas Gerais, inclusive a cidade de Pedro Leopoldo - sua festa conhecida do Boi da Manta - o criativo filme Eu e o Boi, o Boi e Eu nos apresenta o contraste entre a admiração e o receio através de um jovem personagem e seus primeiros passos rumo à percepção cultural de seu estado. Dirigido e escrito por Jane Carmen Oliveira, essa animação foi selecionada para a Mostra Competitiva Nacional da 7ª edição do Lanterna Mágica – Festival de Animação Internacional e Nacional que ocorre todo ano em Goiânia.

Em cinco interessantes minutos acompanhamos um pequeno recorte na vida de uma criança que paralisa seus olhos para as histórias que escuta da mãe sobre um tal boi da manta que é uma figura representativa de uma festa popular conhecida em sua cidade, Pedro Leopoldo. Com o passar do tempo a criança embarca em jornada de onde vai do extremo de um medo incessante até um fascínio pelas descobertas.

Compondo sua narrativa com a base na relação inicial de uma jovem com as descobertas culturais e folclóricas, tendo todas as infinidades criativas que o universo do cinema e animação possibilitam, o projeto consegue seguir uma forte linha dentro de seu discurso transformando em camadas que giram em torno das emoções e tensões uma festa-ritual sempre realizada em períodos pré-carnaval.

As mensagens se tornam objetivas, com o foco nas primeiras impressões, dentro de um arranjo contextual que transforma uma festa com seus simbolismos destacados através de um possível choque de imagens. Da imaginação da personagem, importante pilar por aqui, nasce uma pequena pérola que ganha vida na tela batendo na tecla do descobrir o Brasil e seus detalhes através da força cultural.


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Crítica do filme: 'Anacleto, o Balão' [7a Edição do Lanterna Mágica]


Baseado em livro de 48 páginas escrito por Carol Sakura e com ilustrações de Walkir Fernandes - que também é inspirado em um recorte familiar curioso da primeira – o divertido suspense infantil Anacleto, o Balão tem sua espinha dorsal no modo criativo de mostrar as percepções dos sentimentos aos olhos de uma criança. Esse foi um dos projetos selecionados para a mostra competitiva nacional da 7ª edição do Lanterna Mágica – Festival Internacional e Nacional de Animação.

Nesse curta-metragem do Paraná, acompanhamos a saga de um jovenzinho que um dia se vê de frente com um balão vermelho. Esse artefato de papel fino e com formatos variados passa a fazer parte da família, interagindo no café da manhã e até acompanhando jogos de futebol com toda a família. Após um tempo, algumas situações inusitadas começam a fazer parte das percepções do jovem e os sustos se tornam algo constante.

Do medo até a imaginação, em 12 minutinhos conseguimos absorver reflexões variadas sobre o universo ampliado a partir do livro. O balão, elemento fundamental dessa animação, encontra no seu vermelho o sentido de alerta e outros simbolismos ligados à sensações. As situações variadas vividas pelo núcleo familiar – acopladas em uma narrativa dinâmica e bem estruturada - ganham interpretações através do olhar infantil conseguindo uma ótima fórmula entre o suspense e o humor.

Produzido pelo estúdio Dogzilla e com direção da dupla que escreveu o livro, Carol Sakura e Walkir Fernandes, Anacleto, o Balão não se prende a ser um filme apenas para o público infantil, é um filme para toda família. Chamou muito a atenção em um set com ótimas obras no primeiro dia das mostras competitivas do Festival Goiano dedicado à animações, o Lanterna Mágica.  

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05/02/2025

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Crítica do filme: 'Milton Bituca Nascimento' [Mostra de Cinema de Tiradentes 2025]


Indo de encontro ao impossível, o decifrar, explorando todas as facetas, de um ícone da música brasileira o documentário Milton Bituca Nascimento teve sua primeira exibição na 28ª Mostra de Cinema de Tiradentes. Batendo forte na tecla de que os começos é que são eternos, com a fragilidade e a fortaleza se encontrando numa trajetória, o músico nascido na tijuca - mas que logo virou mineiro de coração – tem aqui os olhares dos outros para contar sua própria história.

Diferente de outras obras documentais, onde a lógica era tentar que o próprio centro das atenções contasse sua história, o documentário dirigido por Flavia Moraes aposta em menos canções com Milton à frente, investigando respostas de lacunas nunca preenchidas através de quem o admira, que logo se torna um desvendar cheio de caminhos de um dos mais enigmáticos artistas que nosso país já conheceu.

O tempo, a imortalidade, ganham atmosfera poética e até filosófica que inclui uma narração constante feita pela grande Fernanda Montenegro. O processo criativo através de depoimentos de outros expoentes da arte ganha força na tela explorando todas as facetas de um exímio conector de talentos, conhecido pelas melodias diatônicas. A contagem regressiva dos palcos parece ditar o tom das quase duas horas de projeção sempre com um discurso que atravessa a complexidade em busca de respostas sobre o que é e o que representa.

O projeto é bem corajoso, poderia ter seguido muitos caminhos mas resolve arriscar-se jogando-se num desmistificar pensamentos e conclusões do que é um artista completo que são preenchidos por entrevistas, imagens da turnê de despedida, tendo a trajetória de Bituca como referência. Milton Bituca Nascimento joga luz e passa pela história do Brasil além de questões sociais que vemos em constante debate até os dias hoje. Durante a turnê de despedida, um dos epicentros que compõe a narrativa, a emoção é vista em cada olhar, em cada sentimento. 


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Crítica do filme: 'Os Sapos'


Trazendo um recorte maduro sobre dependências, relações e o machismo, além do engolir sapos no sentido de situações desagradáveis, o longa-metragem brasileiro Os Sapos, adaptação da peça homônima escrita pela carioca Renata Mizrahi mescla a tragédia do comportamento humano e da moral, com a comédia. Com um roteiro inteligente, cirúrgico, e uma ótima direção brilham em cena Thalita Carauta e o restante do elenco.

Ao longo de um dia vamos conhecendo um pouco da chegada de Paula (Thalita Carauta) a uma casa isolada no interior que pertence ao amigo de infância Marcelo (Pierre Santos). Chegando nesse lugar, se depara com as histórias de dois casais, além de sentir na pele o assédio e o machismo descarado conforme o tempo passa.

Em apenas um cenário, um lugar distante de conexão com a natureza, uma enriquecedora série de situações são provocadas a partir da visão da protagonista em relação a tudo que presencia dos casais que aparecem. Paralelos com a realidade podem ser sentidos para muitas pessoas que acompanharem esse filme. O machismo, o depender, os lapsos do sentir a liberdade se amontoam em uma mostra da sociedade.   

Pelas entrelinhas - ou de forma descarada - o projeto apresenta contextos que soltam reflexões para todos os lados. O clima bucólico e intimista logo se torna uma bomba relógio passando pelos relacionamentos tóxicos que também encosta nas dependências no campo emocional. É impressionante o que se consegue trazer para debate com apenas 77 minutos de projeção.


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31/01/2025

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Crítica do filme: 'A Vida Secreta de meus Três Homens' [Mostra de Cinema de Tiradentes 2025]


O lembrar, o esquecer, o entender. Em uma interessante abordagem que reúne o concreto de reflexões com a transmissão de lições de moral através das histórias de três personagens que de alguma forma ajudam a criar retratos de um país cheio de perguntas sobre seus caminhos e destinos, A Vida Secreta de meus Três Homens é um filme que explora a originalidade em sua essência.

Selecionado para a Mostra Olhos Livres, da 28ª edição da Mostra de Tiradentes, o longa-metragem com cerca de 70 minutos, repleto de achados visuais, joga na tela perguntas sobre o lembrar e o esquecer além das conexões entre o passado e o presente. Com roteiro e direção de Letícia Simões, a obra passa muito pela história da sua própria família com contextos e a consciência invadindo o trânsito entre mundos, os contrapontos até um fabular a partir da violência.  

Construindo revelações através de um jogo de cena, conhecemos versões de fatos de três fantasmas que envolvem a violência, a sexualidade, a política. O próprio processo criativo do filme ganha forma como se as cortinas caíssem e nos mostrassem cada canto de uma busca por verdades. O rumo até descobertas de verdades não ditas cria um novo universo que vai de uma desconstrução da admiração e o medo passando pela discussão da realidade.

Simples e criativo, esse é um filme corajoso que se arrisca numa transmissão de lição de moral. O roteiro audacioso, fora da caixa, costurado com uma narrativa que dribla o convencional, explora o infinito da linguagem e o sons. Tudo que vemos em tela faz muito sentido, se complementam, fazendo as reflexões pularem a todo instante.

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29/01/2025

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Crítica do filme: 'Tijolo por Tijolo' [Mostra de Cinema de Tiradentes 2025]


Selecionado para a Mostra de Cinema de Tiradentes depois de passear - deixando ótimas impressões - em outros festivais de nosso país, o documentário Tijolo por Tijolo caminha pela era das redes sociais e, em consequência, as oportunidades pelo mundo dos influencers sem esquecer de paralelos com os sonhos e a realidade difícil. Nesses versos de imagens e movimentos urbanos com recortes de um cotidiano familiar chegamos de forma animada nas maneiras de como lidar com as dificuldades.

Dirigido por Victória Álvares e Quentin Delaroche, esse filme de 103 minutos nos leva até a história de uma carismática família, moradores do Ibura, na periferia do Recife, com a realidade atravessando o sonhar ainda numa época de pandemia. A reconstrução de uma casa se torna o primeiro passo para abertura de camadas profundas onde descobertas chegam ao mesmo tempo de recortes intimistas de um cotidiano guiados pela figura materna que se lança como influenciadora digital.

Um dos grandes méritos desse projeto é o fato de não deixar de ser interessante nem um minuto. Busca o dinamismo através das camadas que se abrem como pontos de vistas sobre o trabalho, a reconstrução de um lar, a relação familiar. Numa pequena mostra dentro da seleção de Tiradentes, onde há um forte debate sobre temas e formas, Tijolo por Tijolo apresenta sua simplicidade e a riqueza das possibilidades de câmeras em várias mãos.

Muito bem montado, com filmagens que duraram dois anos, consegue fluir numa narrativa onde questões sociais se ampliam para ótimos debates. O empreender, a maternidade, se tornam pontos chaves sempre ligados ao amor, a luta, a solidariedade e ao afeto. Esse é um daqueles documentários que marcam. Tijolo por Tijolo é, sem dúvidas, um dos melhores documentários brasileiros do ano passado.

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Crítica do filme: 'Nem Deus é tão Justo Quanto seus Jeans' [Mostra de Cinema de Tiradentes 2025]


Selecionado para a aguarda Mostra Aurora da 28ª Mostra de Cinema de Tiradentes, o projeto paulista Nem Deus é tão Justo Quanto seus Jeans explora o vazio existencial que a depressão provoca através de um amargurado e perdido personagem que vaga pelo cotidiano preso nos pensamentos movidos por amores num passado que se foi e num presente cheio de interrogações. A direção é assinada por Sergio Silva.

A vida de Marcos anda uma amargura só: afastado do trabalho e em casa para curar suas dores, se perde em seus pensamentos através do que estrutura como as verdades que se seguirão em sua trajetória. Entendendo quase nada sobre sua nova relação com o namorado Gabriel – também preso no luto pelo ex que faleceu - se joga com força nas consultas com uma psiquiatra e acaba encontrando caminhos quando um inusitado gatilho aparece: a chegada de baby, um cãozinho deixado por um tempo sob seus cuidados pela irmã.

A narrativa busca explorar a linguagem e suas infinidades possíveis de forma organizada tendo uma estrutura base alcançada com o protagonista sendo o epicentro entre a razão e a emoção. Os desabafos se tornam estradas para chegarmos aos desejos e pensamentos, o que nada mais é que uma manifestação do inconsciente. O olhar do outro ganha importantes manifestações – aqui no sentido de revelação – tendo até mesmo o sobrenatural como elemento.

As peças se movimentam de forma lenta ao longo de 73 minutos, com os diálogos virando o alicerce do entendimento. Caminhar pela melancolia constante pode atrair ou não os olhares permanentes do público, principalmente quando a obra escapa do discurso indo para experimentações.

Com apenas seis diárias e pegando equipamento emprestado Nem Deus é tão Justo Quanto seus Jeans é um dos projetos mais interessantes que se encaixaram na proposta da nova Mostra Aurora, agora para o primeiro filme de realizadores e realizadoras.

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28/01/2025

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Crítica do filme: 'Para Lota' [Mostra de Cinema de Tiradentes 2025]


Mostrando através da escuridão - que esconde as belezas de um emblemático point carioca - interpretações de desabafos em cartas trocadas sobre questões que envolveram a criação de um parque num aterro do Flamengo, o documentário Para Lota, é um filme, praticamente nascido de uma imagem, que transforma o tempo numa importante variável. Esse jogo de temporalidades, desbravando a linguagem, se junta num imaginar dos desejos e luta de uma contraditória e sonhadora da elite carioca.

Exibido no segundo dia da 28a Mostra de Cinema de Tiradentes, esse projeto dirigido por Bruno Safadi e Ricardo Pretti, mesmo trazendo importantes reflexões sobre uma época de mudanças em nosso país - que sempre devem entrar nas reflexões - poderá ser um grande teste de paciência. Viajando com sua câmera através do travelling, de ponta a ponta de um ponto turístico muito conhecido, apresenta passagens que não se ampliam em contextos, pecando na superficialidade da transmissão de mensagens, indo de encontro a um retrato de um país em tumultuado período na política.

A proposta segue linhas de encontro a partir de uma época pandêmica onde uma filmagem de 8km pela noite carioca entregou uma ideia ao diretor: contar em um objetivo recorte questões sobre a criação do Parque do Flamengo através de cartas escritas pela criadora do lugar, a arquiteta-paisagista e urbanista da elite brasileira Lota de Macedo Soares. As atrizes Leandra Leal e Mariana Ximenes dão vozes as cartas. O desafio a partir desse ponto é: como transformar isso em cinema?

Para Lota encontra em sua narrativa imagens de uma escuridão sem pessoas em plano, somente a paisagem, que poderia ser um interessante complemento contemplativo para o conteúdo histórico das cartas escritas por Lota. Porém, mesmo sem redundância e passando por uma época turbulenta no Brasil, sem deixar de se arriscar nas possibilidades autorais da linguagem, encontra seu sentido apenas para quem alcança a paciência.

  

 

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