Mostrando postagens com marcador Cinema Brasileiro. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Cinema Brasileiro. Mostrar todas as postagens

02/08/2025

,

Crítica do filme: 'A Melhor Mãe do Mundo' [Bonito CineSur]


A Melhor Mãe do Mundo
novo longa-metragem de Anna Muylaert é arrebatador! Não há outra forma de começar esse texto! A desconstrução dos laços familiares surge como ponto de partida de uma trajetória que revela os impulsos necessários para, com os pés no chão e uma dose de criatividade, alcançar o início de um novo caminho. Uma verdadeira aula de narrativa, onde cada cantinho em cena ganha potência — seja pela atuação arrebatadora de Shirley Cruz, seja pela delicada gangorra entre dor e amor que atravessa a trama.

Gal (Shirley Cruz) é uma batalhadora. Trabalha como recicladora de lixo. Certo dia, num ato desesperado para fugir dos absurdos cometidos pelo marido (Seu Jorge), foge de casa junto com seus dois filhos. Durante esse período, fortalece seus laços maternos transformando esse momento numa grande aventura para essas duas crianças.

A ilusão palpável da aventura, quando vista por um olhar indefeso, escapa ao contraponto — ela se revela como complemento. Do pesadelo à esperança, o projeto assume um discurso plural, desdobrando camadas profundas e incessantes de reflexão. Aborda com sensibilidade temas como a maternidade, os relacionamentos abusivos e lança uma luz contundente sobre a violência contra a mulher. Somos capturados pela força desse roteiro, atentos a cada detalhe, enquanto ele escancara verdades que reconhecemos no nosso próprio cotidiano.

Cada detalhe em cena ganha intensidade — tudo salta aos olhos, grita, reverbera. A carga emocional toca fundo, entrelaçando compaixão e dor numa mistura capaz de nos desestabilizar. Os paralelos com a realidade surgem como um estalo: imediatos, incômodos, próximos demais. Quantas vezes vimos casos absurdos de violência contra a mulher estampando os noticiários ou vivenciados de perto? Este filme ultrapassa os limites da ficção, nos puxando de volta para reflexões urgentes deste lado da tela.

Selecionado para a Mostra Competitiva Sul-Americana do Bonito CineSur 2025, A Melhor Mãe do Mundo reafirma o talento de Anna Muylaert em um de seus trabalhos mais intensos e emocionantes. É daqueles filmes que tocam fundo, atravessam barreiras e permanecem com a gente. Uma obra necessária, que todos deveriam assistir.

Continue lendo... Crítica do filme: 'A Melhor Mãe do Mundo' [Bonito CineSur]

29/07/2025

,

Crítica do filme: 'Rua do Pescador, nº 6' [Bonito CineSur]


As dores de uma tragédia anunciada. Exibido no segundo dia de mostras competitivas do Bonito CineSur 2025, o novo trabalho da diretora e atriz Bárbara Paz, Rua do Pescador, nº 6 apresenta reflexões em meio a destruição e desilusão narrada por quem viveu os fatos de uma das maiores tragédias climáticas de nosso país. Com pausas reflexivas que buscam ganhar fôlego com uma raiz de conexões do discurso que se mostram amplas, o projeto parte de um olhar de uma comunidade ribeirinha gaúcha remetendo ao passado, sem saber sobre o futuro, mesmo do olhar presente.

Pouco tempo atrás, um fato de conhecimento público deixou o Brasil em choque. 478 das 497 cidades do estado do Rio Grande do Sul ficaram completamente inundadas culminando na maior tragédia climática da história da Região. Rua do Pescador, nº 6 se aprofunda na questão, apresenta novos olhares, a partir de uma Ilha de pescadores e seus moradores.

Esse é um longa-metragem que tem vários caminhos de análise. Dentre os elementos que se mostram em total evidência, o uso da versatilidade do P&B do início ao fim propõe uma imersão intensa por dentro das emoções. Com muitas cenas impactantes, dentro daquele chocar com intuito de gerar mais reflexões, nos levam para uma amplitude atemporal onde a fé e um ponto de interrogação sobre o futuro mostram suas facetas. Soma-se a isso algumas entrevistas que ajudam a contar a história.

A posição de observadora de um fato histórico, proposta feita com eficiência pela diretora, encaixa muito bem na condução desse documento histórico. Mesmo com desencontros narrativos, passando por leve redundância, o discurso é traduzido com imagens e movimentos de forma eficaz e que realmente prendem nossa atenção. Mas uma grande questão se apresenta quando reunimos todas as peças dessa crítica social: questionamentos de alguns porquês não encontram muitas camadas chegando apenas até uma crítica superficial.

O papel de todo documentário é registrar e ampliar debates sobre determinado assunto. No caso de Rua do Pescador, nº 6 soma-se o fato de dimensionar o tamanho dessa tragédia. É realmente muito chocante alguém de fora de toda região atingida perceber cada detalhe desse evento catastrófico. Narrador por quem viveu os fatos, o filme impacta, documenta a dor de forma visceral.

 

 

Continue lendo... Crítica do filme: 'Rua do Pescador, nº 6' [Bonito CineSur]

19/07/2025

, , ,

Crítica do filme: 'Marcos, o Errante' [Festival Cinemato]


Com simplicidade, faz-se um bom cinema. Selecionado para a Mostra Competitiva de Curtas-Metragens do Festival de Cinema e Vídeo – Cinemato –, Marcos, o Errante conduz sua narrativa com objetividade ao longo de seus 12 minutos, apresentando a autorreflexão como elemento central. Acompanhamos a trajetória de um homem à margem da sociedade, vivendo em condições de subsistência e buscando, em meio a um horizonte incerto, apenas sobreviver.

O filme gira em torno de Marcos, um morador de rua em uma grande cidade baiana, conduzindo o espectador por momentos e lugares marcantes de sua trajetória. Através de suas histórias, revelam-se fragmentos do passado, reflexões do presente e as incertezas que rondam seu futuro. A partir da figura desse nômade que escolhe viver à margem, constrói-se um panorama sociológico potente, capaz de despertar reflexões profundas.

Tendo o próprio personagem como narrador, o filme ganha força ao adotar esse olhar que, longe de estar perdido, enxerga com lucidez os detalhes sociais ao seu redor. Especialmente quando direciona sua atenção ao outro — mais do que a si mesmo —, somos levados a críticas e questionamentos sutis, que emergem mesmo nas entrelinhas. É impossível não refletir, por exemplo, sobre as políticas públicas e suas falhas na prática.

Com a câmera na mão e entregue ao acaso — talvez à espera do inesperado —, o cineasta Thiago Brandão escapa do lugar-comum e acerta ao transmitir com precisão o discurso que deseja. Parte em busca da realidade que se revela diante dele, alcançando muito com muito pouco.

Continue lendo... Crítica do filme: 'Marcos, o Errante' [Festival Cinemato]

18/07/2025

, , ,

Crítica do filme: 'Cabeça de Boi' [Festival Cinemato]


É sempre gratificante encontrar nos festivais obras criativas que apostam no inusitado para expandir nosso campo de reflexões. Selecionado para a Mostra Competitiva de Curtas-Metragens do Festival Cinemato, o curta Cabeça de Boi nos conduz por uma narrativa bem-humorada e debochada, inspirada em uma sequência de fatos curiosos que se desenrolam a partir de uma curiosa lenda sobre um terreno amaldiçoado em uma cidade remota do país.

Escrito e dirigido por Lucas Zacarias, o filme costura elementos da cultura e da arte por meio de uma fabulação conduzida pela voz de um forasteiro — cuja visão é marcada por constantes desencontros com a realidade. Com um discurso preciso, a narrativa articula três temas centrais que se conectam simbolicamente à figura da cabeça de boi, construindo um imaginário potente que dá forma a críticas sociais relevantes.

Dentro dos vestígios simbólicos que compõem a criativa construção narrativa, as contradições de uma cidade tendo o espiritismo como força, um lugar de descobertas paleontológicas e um espaço de referência ao gado, nos levam até surpreendentes constatações no híbrido entre documentário e ficção.

Essa jornada se mostra fascinante, elementos como a dança e até o inventivo uso de inteligência artificial na composição de um personagem narrador preenchem com força as mensagens. Críticas sobre o poder e a riqueza logo se mostram presentes dentro de um peculiar contraponto ligado as raízes culturais da tal cidade, logo alcançando reflexões variadas.

Tendo sua primeira exibição no circuito de festivais brasileiro no Festival de Cinema e Vídeo de Cuiabá – Cinemato – o filme também fora selecionado para o Festival de Gramado deste ano.

 

Continue lendo... Crítica do filme: 'Cabeça de Boi' [Festival Cinemato]
, ,

Crítica do filme: 'Arame Farpado' [Festival Cinemato]


Selecionado para o Festival de Cinema de Berlim e um dos curtas que mais vai ser exibido em festivais pelo Brasil, Arame Farpado, de Gustavo de Carvalho, nos conduz por uma narrativa repleta de interseções, mantendo um discurso afiado sobre questões sociais e relações humanas. Impressiona a harmonia de cada elemento em cena, especialmente a fotografia belíssima, que potencializa a força das entrelinhas e traduz, com impacto, tudo o que precisa ser captado.

Uma família leva uma vida simples no interior de São Paulo, batalhando diariamente pelo sustento. Tudo muda quando os dois filhos mais novos provocam um acidente em uma área isolada, obrigando a irmã mais velha a conduzir a vítima até a UPA (Unidade de Pronto Atendimento) mais próxima. Já à noite, ao chegar ao local, através de um silêncio ensurdecedor em muitos momentos, começam a revelar, pouco a pouco, os conflitos internos que marcam essa família.

A culpa — e o que fazer com esse sentimento dilacerante — parece ser o centro desse projeto marcante, que mergulha com sensibilidade em camadas profundas das relações familiares e da compaixão. A forma como a história é conduzida é precisa, com elementos que se harmonizam de maneira natural, permitindo que a narrativa flua com força. Pequenos gestos e escolhas sutis vão gradualmente tensionando a trama, sustentando um clímax contínuo que se estende, com intensidade, por quase todos os 21 minutos de projeção.

Com um retrato nu e cru dos desdobramentos do caso e das brechas para recomeçar, o projeto se destaca por sua abordagem direta, dura mas que encontra um abrigo na sensibilidade exposta. A partir de um acontecimento marcante que desencadeia consequências profundas, a narrativa encontra espaço para explorar os conflitos de uma família abalada pela chegada de um novo padrasto. À medida que verdades são reveladas e vividas, a trama ganha contornos de realidade, estabelecendo paralelos sociais que atingem em cheio o público.

Rodado em Paraguaçu Paulista, no distrito de Sapezal, Arame Farpado se firma como um dos melhores curtas-metragens brasileiros exibidos até agora em 2025. Um filme que nos atravessa com emoção, sem deixar de lançar olhares precisos sobre questões importantes. Vale já anotar o nome de Gustavo de Carvalho — um cineasta promissor que merece nossa atenção para os próximos projetos.

Continue lendo... Crítica do filme: 'Arame Farpado' [Festival Cinemato]

16/07/2025

, ,

Crítica do filme: 'Concerto de Quintal' [Festival Cinemato]


Menos é mais. Traçando sua narrativa rumo a um interessante recorte sobre a cena musical na cidade de Porto Velho, em Rondônia, tendo os diversos sons como elementos marcantes, o longa-metragem Concerto de Quintal usa o impulso de uma certa nostalgia para debater a identidade cultural de uma região. De histórias dos Beatles da beira da estrada, passando pelo rapper da floresta, uma série de relatos costura um panorama diverso.

O pontapé desse pot-pourri sonoro se dá a partir das memórias de uma família, de um músico e do vínculo afetivo com o pai, preservado em antigas fitas cassete. A partir daí, o filme se abre como um leque, revelando uma mistura de ritmos que ajudam a compor a identidade musical da cidade. De quintal em quintal, o discurso vai ganhando camadas, preenchendo lacunas aqui e ali. No entanto, a falta de aprofundamento em alguns momentos gera uma certa desordem na harmonia narrativa, o que acaba impactando o ritmo do filme.

Nessa trajetória que oscila entre momentos imersivos e outros mais superficiais, o filme também provoca reflexões — e até constatações — sobre o cenário musical local, algo intimamente ligado ao recente processo de formação da cidade (Porto Velho completou 110 anos em 2025). Músicos e compositores transformam o abstrato do som em sentidos concretos, com suas histórias abrindo caminhos que atravessam o social, o ambiental e o político.

É uma pena que o projeto siga uma linha reta, sem grandes clímax. Comedido, não chega a explodir. Faltou aquele grande momento para marcar! Ainda assim, mesmo rompendo a bolha do inusitado de maneira quase ingênua — mas eficaz —, o filme lança ao mundo uma rica expressão da cultura local, ramificando-se entre o legado, as curiosidades e até os desabafos sobre políticas públicas que, simplesmente, não alcançam a cidade.

Selecionado para a Mostra de Longas-Metragens do Festival de Cinema e Vídeo de Cuiabá – Cinemato –, Concerto de Quintal , dirigido por Juraci Junior, constrói um vasto retrato de uma região marcada pelo clima tropical superúmido e por sons que ecoam de todas as formas. Aos poucos, esses elementos se entrelaçam, compondo um capítulo vibrante das curiosidades históricas e culturais do nosso país.


Continue lendo... Crítica do filme: 'Concerto de Quintal' [Festival Cinemato]
, , ,

Crítica do filme: 'Benção' [Festival Cinemato]


Histórias que envolvem o elo entre netos e avós — figuras maternas em dobro — sempre carregam uma força especial, ainda mais quando exploradas com sensibilidade no audiovisual. Esse é exatamente o caso do curta-metragem baiano Benção, selecionado para a Mostra de Curtas-metragens do Festival de Cinema e Vídeo de Cuiabá – Cinemato.

Dirigido por Mamirawá e Tainã Pacheco, este singelo e poderoso curta de 11 minutos nos conduz ao reencontro de um jovem com suas raízes. Após ter saído ainda cedo da comunidade onde foi criado, ele retorna já adulto, em uma espera silenciosa para rever sua maior referência de vida: a avó. Nesse retorno, mais do que reencontrar uma pessoa, ele se reconecta com sua identidade e ancestralidade — marcas profundas que o tempo jamais conseguiu apagar.

O sentimento puro em relação aos avós é apenas o primeiro passo de um filme que ultrapassa as fronteiras de sua primeira camada fazendo uma reconexão com a terra, com a família, com ancestrais. Inspirada em uma história real, a narrativa preenche seu minutos com a força de imagens que dizem no olhar, nas entrelinhas pulsantes de sentimentos que parecem em conflito mas na verdade estão voltando a se alinhar.

Sem espaço para um aprofundamento mais amplo da relação, o projeto segue por uma estrada em linha reta rumo à própria história e raízes, deixando lacunas intencionais sobre o antes e o depois. Essas ausências, longe de afastar, acabam aproximando ainda mais o público da jornada apresentada. Fica uma vontade danada de mergulhar mais fundo e conhecer tudo o que há por trás dessa história.

Continue lendo... Crítica do filme: 'Benção' [Festival Cinemato]
, , ,

Crítica do filme: 'Dandara' [Festival Cinemato 2025]


Com uma criativa apresentação dos créditos que já prende a atenção nos primeiros segundos, o filme goiano Dandara, selecionado para a Mostra Competitiva de Curtas-Metragens do Festival Cinemato 2025, mergulha em reflexões potentes sobre o bullying e o racismo. A produção entrega um retrato sensível e carregado de emoção, equilibrando o peso da realidade com a potência transformadora da imaginação na forma de enxergar o mundo.

Dandara é uma jovem negra, super alegre, que certo dia começa a sofrer bullying na escola onde estuda. Tentando entender os porquês dessa ação, passa por um processo de entendimento da situação onde num primeiro momento se questiona sobre várias questões, inclusive sua identidade. Quando a mãe dela fica sabendo, a volta da alegria vira uma questão de tempo, embalada inclusive por ancestrais.

Com simplicidade e objetividade, a narrativa nos conduz por uma estrada de emoções intensas, onde aflição, medo, tristeza e insegurança ganham contornos comoventes na vivência da infância. Enxergamos o mundo pelos olhos de Dandara, uma criança negra que se depara com o preconceito justamente no espaço onde antes se sentia segura e feliz: a escola. Nesse momento, a figura da professora surge como um elo essencial, um abrigo sensível — mas é na reação da mãe que reside o entendimento mais profundo da situação. Entre idas e vindas emocionais, o filme se revela no aprendizado delicado, construído no tempo certo para tocar o público.

Trabalho de conclusão de curso da cineasta Raquel Rosa, Dandara é mais do que um exercício acadêmico — é um recorte sensível sobre como compreendemos e questionamos as relações humanas em sociedade. Com uma abordagem atual e elementos que dialogam diretamente com o presente, o filme preserva o olhar genuíno de uma criança diante de suas primeiras aflições. Em apenas 14 minutos, emociona e preenche a tela com delicadeza.


Continue lendo... Crítica do filme: 'Dandara' [Festival Cinemato 2025]
, , ,

Crítica do filme: 'Mãe' (2025) [Festival Cinemato 2025]


Exibido na Mostra Competitiva de Curtas-Metragens do Festival de Cinema e Vídeo de Cuiabá – o Cinemato –, o curta gaúcho Mãe aborda um tema potente e raramente retratado nas telas: a maternidade de uma mulher trans. Dirigido por João Monteiro – que também atua no filme – e roteirizado por ele ao lado de Julia Katharine e Homero Mendes, o projeto, com apenas 20 minutos de duração, rompe barreiras e amplia horizontes ao tocar em questões profundas como o racismo, a transfobia e os desafios sociais, tudo isso com sensibilidade e força narrativa.

Maria (Valéria Barcellos) é uma mulher trans que vive feliz ao lado do seu carinhoso marido Dário (João Monteiro). Certo dia, o jovem Zezinho é deixado pela mãe biológica na casa deles. O tempo passa e uma relação de afeto e amor é estabelecida pela família mas as barreiras sociais ainda se tornam um quebra-molas que gera insegurança.

Com profundidade e delicadeza, a narrativa prende a atenção desde os primeiros instantes, mergulhando em um recorte intimista e familiar sobre amor, reconhecimento e pertencimento. São poucos minutos, mas repletos de significado — deixam no ar o desejo por mais. O preconceito, embora presente em cenas marcantes, jamais se sobrepõe à força do afeto. O roteiro constrói, com sensibilidade, uma jornada de resistência e ternura, onde o amor não apenas sobrevive, mas triunfa.

A maternidade de uma mulher trans é o fio condutor que ilumina toda a narrativa, atravessando cada cena com a potência de uma personagem inesquecível, vivida com brilho e sensibilidade por Valéria Barcellos. Com representatividade pulsante, o filme confronta o preconceito de frente e reafirma, com firmeza e delicadeza, que o amor é capaz de transformar realidades.

Mãe deve circular por outros festivais, se você tiver a oportunidade de assistir, tenho certeza que não irá se arrepender.

 

Continue lendo... Crítica do filme: 'Mãe' (2025) [Festival Cinemato 2025]

15/07/2025

,

Crítica: 'Cazuza, Boas Novas'


Falar de um artista que ainda pulsa por meio de sua obra nunca é simples. O documentário Cazuza: Boas Novas, exibido com grande sucesso no Festival In-Edit Brasil, mergulha de forma sensível e intimista em um recorte marcante do fim dos anos 1980 — um período turbulento e intenso na vida pessoal e profissional do eterno Cazuza. A produção revela a explosão de emoções e criatividade de um dos nomes mais geniais da nossa música.

A obra percorre histórias curiosas contadas por amigos e familiares, entrelaçadas com reportagens de TV e canções que muitos de nós sabemos de cor e seguimos cantando até hoje. Clássicos como Faz Parte do Meu Show, Codinome Beija-Flor e tantos outros não ficam de fora. O mais interessante é como essas músicas surgem dentro de um contexto que dialoga com os arcos da narrativa, permitindo que o filme flua com leveza, mesmo ao abordar temas polêmicos que marcaram a trajetória de Cazuza.

Repleto de depoimentos de figuras marcantes da nossa música, como Gilberto Gil, Ney Matogrosso e Roberto Frejat, o documentário acerta ao construir uma narrativa organizada que mistura falas emocionantes, reportagens, imagens de arquivo e apresentações musicais — algumas possivelmente inéditas. Entre os destaques, está o espetáculo O Tempo Não Para, que arrastou multidões por todo o país. Em seus 90 minutos de projeção, o filme prende do início ao fim: é emoção atrás de emoção, e o tempo, ironicamente, parece mesmo não passar.

Dirigido por Nilo Romero e co-dirigido por Robert Moret — primeiro amigo e diretor musical do show final de Cazuza — o documentário tem como maior mérito a proximidade genuína que alcança com seu personagem central. A cada história contada, o público é conquistado por uma narrativa que flui de forma artesanal, conduzida por alguém que viveu intensamente os bastidores daquilo que vemos na tela. As longas conversas dos convidados, e também amigos de Cazuza, com o próprio Nilo, carregadas de emoção e memórias vívidas, transformam-se na cereja do bolo de um filme que tem tudo para se tornar atemporal — como toda grande obra que revela, com honestidade, as verdades de um artista único.


Continue lendo... Crítica: 'Cazuza, Boas Novas'

30/06/2025

, , ,

Crítica do filme: 'Paraíso' [CineOP 2025]


Numa gangorra que varia da sutileza ao escancarado, apresentando verdades que rolam soltas pelo Brasil, o documentário Paraíso é um recorte antropológico, sem respiro, com ritmo acelerado, que busca nos conflitos das relações, no ponto de interrogação aos comportamentos, trazer para debate fragmentos de reflexões sobre a sociedade. Exibido no último dia da Mostra Competitiva do CineOP 2025, esse é o novo trabalho da cineasta Ana Rieper.

Utilizando uma ampla variedade de materiais de arquivo, o filme apresenta situações que expõem a desigualdade social, a violência e colocam a indignação no centro da narrativa. No entanto, em meio a esse mar de contextos complexos, a construção opta por abordar apenas fragmentos desse oceano, deixando de estabelecer conexões mais sólidas. Em alguns momentos, a narrativa se assemelha a um carro desgovernado, carregado de informações que buscam sustentação, mas nem sempre encontram equilíbrio.

Com inúmeras críticas sociais contornando a narrativa, o discurso não chega a se dispersar, nem a ser redundante, mas segue acelerado, sem respiro. Nessa montagem, por vezes confusa, o uso do chocar é interessante e salta aos olhos. Nesse ponto, a indignação se impõe, provocando reflexões imediatas. Todos já sabemos que o paraíso não é aqui — e talvez nunca tenha sido —, mas a forma como o filme apresenta diferentes comportamentos, muitas vezes com um deboche inteligente, é uma escolha acertada que prende a atenção e amplia o impacto.

Não sei se era exatamente essa a intenção, mas o filme funciona como um verdadeiro laboratório social — construído a partir de experiências que, de certa forma, definem a essência da obra. Ao longo de seus 75 minutos, busca-se soluções por meio de reflexões e de um recorte antropológico que atravessa a narrativa. Ainda assim, mesmo levantando debates relevantes para a sociedade, o filme corre o risco de atingir apenas um dos lados da bolha de nosso país polarizado.


Continue lendo... Crítica do filme: 'Paraíso' [CineOP 2025]
, ,

Crítica do filme: 'Meu Pai e Eu' [CineOP 2025]


Após uma longa jornada que remexe, de forma dolorosa, com o passado — desde a concepção do filme até sua estreia brasileira na CineOP, integrando a Mostra Competitiva da 20ª edição — Meu Pai e Eu acompanha a trajetória de um homem que decide, com impressionante coragem, embarcar de peito aberto em busca do perdoar ou, ao menos, de uma melhor compreensão de um alguém próximo que se tornou indecifrável. Ao tentar decifrar esse mosaico emocional embaralhado pelo tempo, o filme nos conduz por intensos contrastes de sentimentos, que ressoam profundamente ao longo dos seus 73 minutos.

Muitos anos após a partida do pai — um acontecimento marcado por sentimentos confusos e dolorosos, que ainda hoje machuca —, um futuro pai decide buscar novos significados para a relação com o homem que tantas vezes o decepcionou. Guiado por relatos de pessoas próximas e por objetos encontrados em uma mala jamais aberta, ele mergulha em uma investigação íntima, ciente de que poucas lacunas serão, de fato, preenchidas.

Perdão só faz sentido para quem o sente. Esse sentimento repleto de espinhos é uma das portas de entrada para uma história que faz uso sensível e preciso de depoimentos de familiares, cartas — algumas de conteúdo muito forte — e fotos antigas, compondo um panorama em busca de qualquer significado que permita lançar um novo olhar sobre uma relação paternal.

O desejo de compreender a figura que tanto fere é o núcleo da estrutura narrativa desta obra capixaba, que explora o amor profundo e o desencontro, moldando-se aos poucos como um retrato corajoso diante das barreiras emocionais de uma relação marcada pela ausência e um surgimento - por conta de um fato marcante – de tentativa de reconexão.

Marcando a estreia de Thiago Moulin na direção de longas-metragens, e logo no arriscado lugar de personagem/diretor, essa obra não é difícil de se entender quando pensamos em roteiro e os caminhos utilizados para preencher cinematograficamente uma narrativa bastante pessoal com camadas profundas. A questão é o amplo alcance das cargas emocionais que caminham em linhas tênues entre a dor e o amor – algo que se sustenta do início ao fim. O impacto é sentido de forma imediata nos momentos em que o filme toca suas duas faces: o desespero explícito e a incapacidade de lidar com ele. É uma obra intensa e angustiante, daquelas que não saem da cabeça tão cedo.

 

 

 

Continue lendo... Crítica do filme: 'Meu Pai e Eu' [CineOP 2025]
, ,

Crítica do filme: 'Os Ruminantes' [CineOP 2025]


Partindo de fatos curiosos sobre um filme — considerado 'maldito' por muitos — que nunca saiu do papel, o documentário Os Ruminantes nos conduz por memórias de uma época marcada pela escassez de recursos e pela pressão política. A narrativa se constrói a partir da intimidade dos depoimentos e da presença de grandes trechos do cinema nacional, que ajudam a preencher as lacunas deixadas por um cineasta marcante na história do cinema brasileiro, falecido precocemente antes dos 40 anos. Dirigido por Tarsila Araújo e Marcelo Mello, o longa foi selecionado para a Mostra Competitiva da CineOP 2025.

O projeto parte da trajetória de Luiz Sergio Person, mas se expande para retratar todo um cenário audiovisual da época. Com olhar voltado para o final da década de 1960, o documentário se destaca pela sólida pesquisa e cuidadosa montagem. A partir de um roteiro que tinha potencial para se tornar mais uma obra marcante do nosso cinema, a narrativa nos conduz por contextos políticos e culturais do período, revelando curiosidades pouco conhecidas — como a intervenção do regime militar que impediu o sucesso de um dos filmes de Person nos Estados Unidos.

O roteiro em questão é uma adaptação do romance A Hora dos Ruminantes, de José J. Veiga — uma obra que explora a imprevisibilidade da vida por meio das transformações provocadas pela ruptura do cotidiano, após a chegada de misteriosos personagens à fictícia cidade de Manarairema. Os paralelos com a sempre conturbada política brasileira e com temas relevantes da sociedade saltam aos olhos — elementos que despertaram o interesse do cineasta Luiz Sergio Person e de seu grande amigo, o também cineasta Jean-Claude Bernardet.

A construção do documentário parte de perguntas ainda sem respostas sobre os motivos que impediram a realização do filme, e se desenvolve a partir dos depoimentos de Marina Person (filha de Luiz Sergio Person) e Jean-Claude Bernardet. Um de seus grandes méritos está em revelar as dificuldades de se produzir uma obra audiovisual em um contexto histórico adverso, ao mesmo tempo em que reforça a importância de manter viva a memória documentada — funcionando como uma espécie de continuidade da obra de um cineasta que, mesmo décadas após sua morte, segue como referência no cinema brasileiro.

Os Ruminantes mantém os pés no chão, mas não deixa de dialogar com o universo do realismo fantástico presente na obra original — um clássico da literatura brasileira. Por meio do inusitado, o filme abre espaço para aprendizados e provoca reflexões profundas. A história, agora novamente documentada, convida o espectador a olhar com atenção. Basta querer enxergar.



Continue lendo... Crítica do filme: 'Os Ruminantes' [CineOP 2025]

15/06/2025

, ,

Crítica do filme: 'Nem Toda História de Amor Acaba em Morte' [CINEPE 2025]


A rotina que mata. Trazendo um importante olhar para a surdez e acessibilidade gerando uma representatividade importante e ainda pouco vista nos produtos audiovisuais brasileiros, o longa-metragem paranaense Nem Toda História de Amor Acaba em Morte, entre beijos e feridas, num cair e levantar, busca um retrato sutil do cotidiano das relações.

Sol (Chiris Gomes) está em um casamento na iminência do fim. Quando resolve tomar essa decisão, acaba conhecendo Lola (Gabi Grigolom), uma jovem atriz surda. Quando as duas resolvem embarcar de forma definitiva nesse relacionamento, conflitos com o ex-marido de Sol se tornam presentes.  

Uma nova fase da vida e os sussurros dos que cismam em não entender, se tornam alguns dos contrapontos que se chocam numa narrativa com um abre alas com o freio de mão puxado mas que de alguma forma utiliza um trunfo interessante, um papo reto, uma mensagem objetiva, que deixa o filme leve, com momentos cômicos e com fácil identificação.

Nessa tragicômica jornada, que ganha força à medida que se afasta de seu início, acompanhamos uma protagonista em crise, descobrindo novas formas de amar e de enxergar as relações. O roteiro adota uma estrutura quase episódica, como pequenas esquetes que se costuram em busca de simplificar o que é, por natureza, complexo. Embora nem sempre alcance maior profundidade e por vezes se embarace em suas próprias propostas, a narrativa mantém um tom leve e agradável que convida o espectador a seguir até o fim.

Continue lendo... Crítica do filme: 'Nem Toda História de Amor Acaba em Morte' [CINEPE 2025]

14/06/2025

,

Crítica do filme: 'Depois do Fim' [CINEPE 2025]


Exibido no antepenúltimo dia das mostras competitivas do CINEPE 2025, o curta-metragem Depois do Fim apresenta um desabafo de emoções reprimidas, desencadeando um inesperado choque capaz de despertar conflitos há tempos adormecidos. Em um recorte profundo – mesmo com poucos minutinhos – sobre ‘O que não durou e as suas causas’, embarcamos rapidamente num universo muito visto nos filmes de Richard Linklater que aqui ganha sua própria originalidade nas mãos de uma habilidosa direção de Pedro Maciel.

Seis anos após o último adeus, Ana (Olivia Torres), uma musicista atualmente em uma relacionamento, dá de frente com o ex-namorado, Théo, oferecendo uma carona. Esse fato leva esses dois ex-pombinhos para preenchimentos de lacunas que ficaram perdidas pelo tempo. Será que há possibilidades para novos capítulos dessa história?

Uma carona, um reencontro, uma história de amor guardada numa caixinha de memórias. Em 19 minutos de duração, o curta-metragem nos convida a um encontro que, na verdade, é sobre desencontros. Entre confissões e desabafos, o filme faz do presente uma ponte para revisitar o passado e propõe uma reflexão madura sobre os labirintos emocionais dos relacionamentos.

Brincando com as incertezas, o roteiro preenche suas linhas com diálogos de múltiplas camadas e significados, encontrando uma cadência certeira e um ritmo envolvente. A narrativa, sempre centrada nos personagens, direciona o olhar do espectador para uma verdadeira explosão de emoções.

Criar um elo com o público não é fácil, há muitos méritos nisso. Esse é um filme que chega no seu desfecho com gostinho de quero mais. Quem sabe não vira um longa, né? Eu correria pra assistir!

Continue lendo... Crítica do filme: 'Depois do Fim' [CINEPE 2025]
,

Crítica do filme: 'Itatira' [CINEPE 2025]


Assisti a um filme bastante curioso e instigante no CINEPE, que podemos definir como um verdadeiro “True Sobrenatural Brasileiro”. Com um prólogo impactante, repleto de figuras enigmáticas e imagens fragmentadas, o longa-metragem Itatira já abre evocando uma atmosfera de mistério e inquietação, ambientada numa pequena cidade do sertão cearense.

Fugindo do lugar-comum, a narrativa nos conduz por uma espécie de investigação sobre o inexplicável, enquanto expõe de forma crua e incisiva as feridas morais de uma comunidade que logo se vê engolida por um verdadeiro circo midiático. Dirigido por André Luís Garcia, roteirista de Cidades Fantasmas, vencedor do Festival É Tudo Verdade anos atrás, Itatira desafia o público a cada instante, a cada imagem, a cada som, com um cinema sensorial fascinante.

Em um pequeno município do interior do Ceará — que dá nome ao filme — um suposto espírito começa a se manifestar dentro de uma escola, fazendo os estudantes passarem mal de algumas formas. Com a recorrência dos episódios, o caso rapidamente desperta o interesse da mídia, que transforma a situação em um espetáculo sensacionalista, afetando de maneira profunda e desestabilizadora a rotina dos moradores da região.

Explorando de forma criativa diferentes camadas temporais e a cultura do sobrenatural dentro de uma atmosfera sensorial cuidadosamente construída – com o som de grilos, o tilintar metálico e o sopro do vento –, o projeto aposta numa narrativa que se demora a acontecer. Esse ritmo mais lento, porém, encontra amplitude e coerência na cadência de uma trilha sonora tensa que envolve todo o filme. É preciso entrega e paciência para embarcar nessa experiência.

Seria esse um projeto sobre um grande achado? Um fenômeno do outro mundo? Padres chamados para um lugar que acontecem coisas que ninguém consegue explicar logo vira bafafá e munição para uma exposição violenta no lado moral a partir do circo midiático que logo tomou conta. Nesse ponto, seu ápice, o lugar é um personagem central que nos convida lentamente para um raio-x sociológico que explica muito de nossa sociedade.

 

 

Continue lendo... Crítica do filme: 'Itatira' [CINEPE 2025]

12/06/2025

,

Crítica do filme: 'Senhoritas' [CINEPE 2025]


Seu mundo é você quem faz. Mostrando o retorno de uma amizade virando um estopim para descobertas na melhor idade, o longa-metragem Senhoritas caminha do embalo suave dos boleros à energia contagiante da salsa conduzindo o público por uma jornada sensível sobre o valor das conexões humanas. Selecionado para a Mostra Competitiva de Longas-Metragens do CINEPE 2025, esse projeto escrito e dirigido por Mykaela Plotkin é um mergulho afetuoso sobre as – muitas vezes dolorosas - reflexões sobre a vida, o recomeçar e os impulsos fascinantes de se lançar ao novo.

Lívia (Analu Prestes) é uma arquiteta aposentada que após conquistar a estabilidade, vive seus dias ao lado do marido, sem muitos grandes momentos. Sua maior alegria vem do vínculo afetuoso com a neta, que ilumina seus dias. Tudo isso muda quando sua amiga Luci (Tânia Alves) volta o Brasil e muda completamente a forma de pensar e agir da protagonista. Se revelando aos desejos antes contidos, Lívia desperta para uma jornada de descobertas e libertação. 

Com sua ótima premissa e dando espaço para um sensível olhar para a melhor idade, busca desenvolver os conflitos de maneira delicada e com um foco em uma fascinante protagonista, muito bem interpretada pelo furacão de emoções Analu Prestes. A narrativa corre o risco de não encontrar um grande clímax, aquele grande momento, mas consegue entregar sua bela mensagem do início ao fim.

Longe de ser algo inovador em relação a outros projetos audiovisuais, Senhoritas busca encontrar seu norte na maneira delicada que apresenta o descongelamento da monotonia. Logo chegamos numa ponte importante e fundamental que passa pelo reconectar das relações, nas três gerações de uma família, nos dilemas que se mostram constantes, nos impulsos e receios de confrontos.

Rodado há alguns anos, Senhoritas finalmente chega ao circuito de festivais, revelando o impacto sensível da direção de Mykaela Plotkin e da entrega do elenco. Nesta envolvente jornada, chama atenção a escolha narrativa de não revisitar o passado: o filme se ancora no presente e propõe um achado imaginativo que floresce na mente de quem se permite mergulhar no que se vê em tela.

Continue lendo... Crítica do filme: 'Senhoritas' [CINEPE 2025]
, , ,

Crítica do filme: 'Sertão 2138' [CINEPE 2025]


A introspecção de uma solidão. É tão bom vermos filmes brasileiros de ficção científica ganhando os holofotes e chegando com fortes mensagens para refletirmos sobre o nosso agora. Esse é o caso de Sertão 2138, uma engenhosa – e ao mesmo tempo simples - distopia gravada no sertão de Pernambuco que passando pela inspiração, a importância da referência, da pesquisa, chega até um olhar atento para as questões climáticas e socioeconômicas.

Neste sci-fi ambientado no sertão e dirigido por Deuilton Júnior, o futuro, a tecnologia e o conhecimento formam o tripé de uma narrativa que, embora careça de ritmo, propõe um debate através do olhar melancólico de uma protagonista em crise, às vésperas de uma fuga de um planeta adoecido.

Em um futuro não tão distante, uma brilhante pesquisadora desenvolve uma estação espacial fora da Terra — uma alternativa para um novo mundo, repleto de possibilidades, diante de um planeta que se tornou quase inabitável por múltiplas razões. Quando ela está indo pra lá, surge uma missão que a coloca em novos debates sobre a existência.

Criado na Universidade Federal de Pernambuco, por estudantes atentos aos assuntos do cotidiano de um planeta com muitas questões que precisam serem debatidas, em 19 minutos vemos o local (o sertão) como um forte elemento representativo, cheio de saídas para nosso pensar. Os conceitos imaginativos oriundos da ficção científica viram uma espécie de cereja do bolo que ilustra e convida o público para conversar sobre as nossas necessidades para o agora.

Selecionado para a 2ª Edição do Festival de Cinema de Xerém, esse curta-metragem nos leva até o encontro entre o empírico e o inesperado. Cheio de interpretações e cantinhos de reflexões ao longo de seu desenvolvimento, faz parte da galeria de obras audiovisuais que aplicam criatividade ao mostrar verdades.

Continue lendo... Crítica do filme: 'Sertão 2138' [CINEPE 2025]
,

Crítica do filme: 'O Ano em que o Frevo não foi pra Rua' [CINEPE 2025]


O frevo de uma nota só. Em meio à pandemia, que sufocou sonhos e silenciou a alegria, as emoções contidas nas ruas vazias ganham voz no documentário O Ano em que o Frevo não foi pra Rua, selecionado para a mostra competitiva nacional do CinePE 2025. Dirigido por Mariana Soares e Bruno Mazzoco, o filme apresenta um olhar sensível mas arrastado sobre o isolamento, a ausência e o reencontro de apaixonados pelo carnaval pernambucano, privados da celebração que dá ritmo às suas vidas.

Dando voz à representantes dos conhecidos mundialmente - O Galo da Madrugada, O Homem da Meia-Noite - de Recife à Olinda, vamos percorrendo as emoções conflitantes de dois anos sem carnaval. Mesmo perdendo fôlego em muitos momentos, a bonita e intensa relação dos pernambucanos com as festas populares é algo que é transmitido, contagia. Até a volta do final feliz: atenção e apreensão, emoções captadas através do sentimento vazio de um hiato com muitas questões.

O som melancólico do saxofone assume um papel central na atmosfera do filme, reforçando a tristeza onde a narrativa parece encontrar sua zona de conforto. Essa escolha sonora nos conduz por uma sequência de retornos emocionais — entre depoimentos de foliões, compositores e amantes das grandes festas culturais da região — ainda que, em alguns momentos, acabe recaindo em clara redundância. É como se estivéssemos ouvindo a mesma mensagem num eterno play de uma vitrola que busca gerar as reflexões num certo desconforto.

Não chega a ser um filme triste sobre carnaval (acho até que é impossível isso!). Há um esforço louvável para reflexões que já vimos – sobre outros temas – dentro do momento que a Covid-19 pegou a todos nós de surpresa. Mas a bolha de tristeza profunda que vai se criando é uma estrada sem retorno que não chega ao seu ápice mesmo quando tudo ganha cores.   

Continue lendo... Crítica do filme: 'O Ano em que o Frevo não foi pra Rua' [CINEPE 2025]

07/06/2025

, , ,

Crítica do filme 'A Caverna' (2025) - [CINEPE 2025]


Conseguindo o efeito de uma poderosa bomba criativa que chega na raiz dos seus conflitos de forma acachapante, o filme A Caverna apresenta, de forma contundente, um recorte de uma relação intensa entre mãe e filha. A narrativa, com seus toques alegóricos certeiros, se liberta no denso terreno das emoções, formando uma experiência envolvente que facilmente fisga o olhar de quem enxerga algo próximo de alguma realidade.

Exibido na Mostra Competitiva de Curtas Nacionais da 2ª Edição do Festival de Cinema de Xerém, esse interessante projeto parte do princípio de que tudo em cena importa, utilizando muitas vezes de um incomodar para chamar a atenção do público. Associado a isso, logo o temporal que se cruza, busca nas infinidades do cinema uma porta de entrada para o ‘fora da caixa’.

Mãe e filha se veem em momentos distantes, com a segunda prestes a sair da casa onde sempre morou e descobrir o mundo que se apresenta através do seu olhar como artista. Nesse conflito, que também tem lampejos do forte amor desse laço eterno, ambas buscam soluções para a relação já fragmentada por cuidados em excesso. Num lugar figurativo, cheio de possibilidades de entendimento - uma caverna - se torna o espaço onde soluções podem ou não serem alcançadas.

Um dilema aliado ao discurso - o ficar ou abandonar – guiados por duas inspiradas artistas em cena (Patrícia Saravy e Natália Garcia), se mostra uma base importante para pensarmos sobre a sociedade e os obstáculos na interrelação. Associado a isso, trazendo um olhar para o real através de um assunto que não se mostra completamente, a Síndrome do Pânico, vamos percorrendo embates fervorosos.

Escrito e dirigido por Luísa Fiedler, esse curta-metragem dá margens para interpretações sem perder um ponto fixo onde seu desabrochar acontece.


 

Continue lendo... Crítica do filme 'A Caverna' (2025) - [CINEPE 2025]