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22/10/2024

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Crítica do filme: 'Centro Ilusão' [Festival do Rio 2024]


Quando o som traduz o sentimento. Direto e reto em seu discurso, o longa-metragem cearense Centro Ilusão ultrapassa as camadas superficiais com um nocaute nas levitações até o sonhar. Dando ênfase à cena cultural e musical nordestina, esse novo trabalho do excelente cineasta Pedro Diógenes também apresenta as diferenças do pensar no tempo, num choque de gerações, numa busca de um mesmo repouso para as interpretações dos momentos de devaneios.

Na trama conhecemos, Caio (Brunu Kunk) e Tuka (Fernando Catatau), dois músicos, de duas gerações diferentes, que estão em uma audição para uma vaga que pode mudar suas vidas. Na espera pelo resultado, durante um tempo rodam pelo centro de fortaleza entre os sonhos e as desilusões sobre o próximo passo na vida.

Há uma generosa poesia em cada momento de reflexão, aproximando as verdades com a realidade. Num choque proposto entre o tanque cheio para o sonhar e a pane seca acumulada por frustrações, somos testemunhas de um encontro urbano tendo a música como um satélite que personifica os conflitos emocionais de cada um dos personagens. Como um tradutor das camadas emotivas, através de um roteiro que não se desgruda de contextos para validar o presente, Diógenes joga para o centro do palco a angústia e muitas verdades de duas almas artísticas.

Amores perdidos, abandono de relações em busca da carreira musical, a luta diária pelo reconhecimento, confrontos com a família, as incertezas e as muitas interpretações de um atual momento. Esses são alguns dos muitos assuntos que ganham tons e ritmos através de números musicais marcantes, alguns brilhantes. Em quase declamações, sem esquecer de imagens que contemplam a cidade e seus movimentos, pegamos uma reta rumo ao valor da arte urbana, da poesia das ruas, além de todo o significado que as marcas do passado podem ter nas perspectivas de um futuro.

Vencedor do Prêmio de Melhor Longa da Mostra Competitiva Novos Rumos da 26a edição do Festival do Rio, Centro Ilusão deve estrear em breve no circuito exibidor. Um filme para você ficar de olho.

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15/10/2024

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Crítica do filme: 'Ainda não é Amanhã' [Festival do Rio 2024]


A ida até a instabilidade das incertezas que chega num novo mundo de possibilidades. Trazendo um recorte profundo de uma jovem estudante de direito que é surpreendida por uma gravidez indesejada, Ainda não é Amanhã passa suas reflexões através das rupturas dos sonhos e o atropelo das interpretações da moral. Escrito e dirigido por Milena Times, o projeto tem como um dos acertos um ótimo desenvolvimento do roteiro que impulsiona uma narrativa que vai direto ao ponto levando o público para inúmeras reflexões sem esquecer de apresentar por completo a desconstrução de sua protagonista.

Na trama, conhecemos Jana (Mayara Santos), uma esforçada jovem que é orgulho de sua avó e da mãe – com quem mora num conjunto habitacional da periferia de Recife - sendo uma das primeiras da família a conseguir ir pra faculdade. Mas a alegria de um presente cheio de sonhos se transforma em desespero quando descobre estar grávida do namorado. Pensando em encontrar alguma solução, em meio as incertezas de ter ou não a criança, a protagonista precisará enfrentar alguns dilemas com respostas que levará por toda a vida.

Da simplicidade e bons diálogos até as fortes camadas que nos levam até importantes reflexões sobre um dos temas mais polêmicos da sociedade. Contornando a circunstância intimista, com um forte conflito imposto por um dilema, a narrativa navega pelas dores e incertezas, como se abrisse um leque de possibilidades a partir das dúvidas sobre uma gravidez. Totalmente pelos olhos de sua protagonista – muito bem interpretada por Mayara Santos - enxergamos toda a dor e sofrimento de uma situação que pode muito bem ser o reflexo de muitas outras do lado de cá da tela.

Ganhador de um prêmio no Festival do Rio 2024 (Melhor Atriz, na Mostra Novos Rumos), o filme levanta o foco para a maternidade como escolha, um caminho que traça um paralelo na pergunta: Como encarar essa situação? Não é uma abordagem inovadora, vai de encontro ao centro do conflito – no caso, o aborto - deixando também fortalecido os contextos sociais, com a cidade em movimento ao redor da rotina, e as questões do desenvolvimento urbano através de críticas sociais.


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Crítica do filme: 'Continente' [Festival do Rio 2024]


Já na reta final do Festival do Rio de cinema, nos deparamos com um filme brasileiro pra lá de louco que a partir de uma distopia busca reflexões sociais imersas a um clima de tensão recheado de cenas chocantes e com sangue de sobra. Dirigido pelo porto-alegrense Davi Pretto, que 10 anos atrás estreou seu primeiro longa-metragem, Castanha, no Festival de Berlim, Continente peca por uma falta de clareza sobre o discurso, com uma premissa que busca nas entrelinhas os embates sobre classes sociais, entre outros pontos. Se mantém lúcido até as respostas sobre a pergunta: O que estaria acontecendo naquele lugar? A partir daí, é um show de desencontros.

Na trama, ambientada numa região do sul do país, conhecemos Amanda (Olivia Torres), que depois de muitos anos no exterior, volta para casa para se despedir do pai – perto da passagem – que é dono de uma enorme fazenda numa região isolada. Logo quando chega ao lugar, ao lado do namorado francês Martin (Corentin Fila), percebe que as coisas estão esquisitas e logo a tensão toma rumos inesperados quando descobrimos sobre as incertezas de um certo acordo que gera ações desesperadas entre os trabalhadores do local.

Filmado logo após a pandemia, financiado por cinco países e com um orçamento modesto, esse filme de horror brasileiro se joga sem muita direção nas rupturas do lógico com pitadas do sobrenatural. Com um clima onde gradativamente chegamos na tensão, o filme pode ser dividido em duas partes complementares onde na primeira se camufla o desespero e a extrema opressão, e na segunda transforma as consequências em ações desenfreadas, e bem vampirescas!

Selecionado para o Festival de Cinema de Sitges, na Espanha, um dos principais eventos cinematográficos de filmes de horror do mundo, Continente tem como ponto positivo a fotografia, que joga a atmosfera da tensão pro centro do olhar. Não há dúvidas que é bem filmado. Mas tem uma questão que envolve esse elemento. As sensações e a transmissões dos conflitos emocionais são notórios mas como a narrativa naufraga com a falta de lucidez sobre o discurso, que envolve as interpretações sobre as regras de uma imposição local, até mesmo um ritual denominado ‘a hora do certo’, acaba virando um achismo atrás do outro testando a paciência do espectador.

 

 

 

 

 

 

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11/10/2024

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Crítica do filme: 'Malu' [Festival do Rio 2024]


Explorando uma história sobre as dores da existência, do não saber lidar com as relações próximas, Malu foi um dos filmes selecionados para a competição de longas-metragens da Première Brasil no Festival do Rio 2024. Escrito e dirigido pelo cineasta Pedro Freire, que apresenta em sua estreia na direção memórias sobre a própria mãe, ao longo dos 103 minutos de projeção somos testemunhas de conflitos intensos, que vão de um extremo ao outro, do afeto até a indiferença, entre gerações de mães e filhas tendo como ponto de interseção a personagem título.

 Na trama, ambientada nos anos 1990, conhecemos Malu (Yara de Novaes), uma atriz desbocada com dias de sucesso no passado, que após se separar muda-se para uma casa em construção que comprou com o marido tempos atrás. Morando com a mãe conservadora (Juliana Carneiro da Cunha) e com a visita da filha (Carol Duarte) iniciando a fase adulta, uma série de conflitos se estabelecem e que logo rumam para a descoberta de uma cruel doença.

Tendo como único cenário uma casa em construção, que logo vira o reflexo de relações conturbadas que se estabelecem a partir da figura central, o filme busca no embate seu alicerce para preencher essa ciranda de atritos potencializado pelo tripê: conservadorismo, orgulho e imaturidade, representado pela mais forte característica de cada uma das personagens. A questão é que o discurso da revolução de um viver se perde com uma narrativa que apresenta os desafios do resolver os conflitos com as ações sendo mais fortes que os significados. Talvez seja mais marcante para quem já conhece essa história, ou conheceu Malu.

Ao longo de três meses de gravações – com o mesmo tempo anterior de ensaios – um fato que fica em evidência é a proximidade do diretor com a história. Fato que pode ser um trunfo ou mesmo um calcanhar de aquiles. Entre memórias emotivas, desabafos, e lapidado pelo orgulho como característica mais forte da personalidade explosiva de uma protagonista brilhantemente interpretada pelo furacão de emoções Yara de Novaes, o projeto se consolida como uma carta aberta do diretor para si mesmo sobre a mãe diagnosticada com uma doença neurodegenerativa.

Exibido em festivais que alcançaram cinco continentes, incluindo uma passagem pelo Festival de Sundance, Malu não deixa de ser um filme corajoso de Pedro Freire. Abrir as portas de uma história que o diretor conhece como poucos e deixar o público receber as mensagens íntimas que propõe deve ter sido uma jornada repleta de emoções. O ponto é se o público vai conseguir se conectar com tudo que queria ser transmitido. 



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09/10/2024

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Crítica do filme: 'Baby' [Festival do Rio 2024]


O juízo de valor no centro do tabuleiro para vencer a solidão. Depois de uma passagem positiva pelo Festival de Cannes esse ano, o longa-metragem brasileiro Baby desembarcou no Festival do Rio. Colocando para reflexões embates dolorosos entre duas almas que o destino une movidos ao centro do tabuleiro de emoções intensas, o filme dirigido por Marcelo Caetano aborda de forma visceral as segundas chances e, principalmente, passa a limpo as camadas do juízo de valor. Com uma narrativa hipnotizante, nua e crua sobre as facetas do sobreviver, esse é um daqueles filmes que demoram a sair de nossas memórias.

Na trama conhecemos o jovem Wellington (João Pedro Mariano), que ao sair de um reformatório vai em busca dos pais que não mantiveram contato enquanto ele estava em reclusão. Ao se ver perdido na maior cidade do país, certo dia seu destino se cruza com o de Ronaldo (Ricardo Teodoro), um homem que sobrevive se prostituindo e traficando. Aos poucos esse relacionamento se estabelece com muitas fases que vão desde amor intenso até caóticos desencontros.

Com uma belíssima construção de personagens que não saem de uma zona de conflitos, o roteiro minuciosamente transforma as esperanças de um inusitado encontro nas dores de desencontros. O caminho para isso é feito através de uma narrativa com um desenvolvimento que mantém o clímax constante, passando por construções simbólicas e representativas de opostos – mas nem tanto assim – que se atraem. Há também uma inversão entre a maturidade e a imaturidade, no meio de um sofrer pela solidão, em alguns momentos revertidos para a dubialidade entre as ações antagônicas de explorar e proteger.

Em camadas que vão se desenvolvendo através do profundo alcance na história dos personagens, principalmente na de Ronaldo – interpretado de forma magistral por Ricardo Teodoro, que levou o prêmio de Ator Revelação na Semana da Crítica em Cannes – vamos rumando a uma conclusão imprevisível, em meio aos agitos de uma badalada cidade repleta de diferentes visões e olhares, onde o juízo de valor, na linha das emoções e experiências de vida té ali, ganham o centro das atenções.

Baby estreia no circuito exibidor brasileiro no dia 9 de janeiro. Podemos afirmar com toda certeza que esse é um dos grandes filmes da seleção desse ano do Festival do Rio. 

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Crítica do filme: 'O Silêncio das Ostras' [Festival do Rio 2024]


Um importante olhar para as atividades predatórias. Partindo para uma impactante crítica social através dos conflitos emocionais de uma jovem que acompanha as mudanças de tudo e todos ao seu redor, O Silêncio das Ostras, novo trabalho do cineasta Marcos Pimentel, fortalece o debate sobre as ações das mineradoras. Com uma belíssima fotografia assinada pelo craque Petrus Cariry, o projeto alimenta seu discurso através da tentativa de sobrevivência de uma representante de seres deslocados em meio à destruição.

Na trama, ambientada algumas décadas atrás, principalmente na época da copa do mundo de 1990, conhecemos Kaylane (Bárbara Colen, na fase adulta), uma jovem que mora com a família em uma comunidade de operários de uma mina, vivendo e crescendo a partir das ações da mineradora da região. Quando algumas partidas contornam sua trajetória, o tempo passa e ela se vê sozinha em meio ao caos que se tornou a região após o rompimento de uma barragem. Sem destino, vítima do êxodo da própria história, ela busca novos caminhos tendo como direção o resistir.

Mesmo com um ritmo demasiadamente lento, essa interessante filme encontra uma importante ponte entre um recorte familiar e as questões da mineração. A estrutura da família disfuncional é apresentada por camadas e conflitos girando em torno das ações da empresa que comanda o ir e vir da região. Isso influencia irmãos indo em busca de novos caminhos, uma mãe se deslocando rumo ao egoísmo do abandonar, o pai sofrendo as consequências de anos de um trabalho insalubre, sem assistência. Kaylane se coloca como os olhos do público em uma narrativa onde as imagens viram complementos, não só traçando paralelos com as emoções, mas também para todo um contexto que fortalece o discurso.

Outro ponto chave são os importantes recortes temporais – longe de gerarem redundância - reforçam a solidão pelas partidas, as histórias apagadas, focando nas consequências de pessoas excluídas do próprio berço. A partir disso, em meio a montanhas deixando de existir e a vida se modificando por ações predatórias que só ganham proporções mais críticas quando uma enorme tragédia acontece, chegamos a um desfecho com significados importantes e reflexões que ligam os pontos para a necessidade mais do que urgente para uma forte política ambiental.

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Crítica do filme: 'Kasa Branca' [Festival do Rio 2024]


Um delicado recorte sobre amores, afetos e família. Partindo de um drama familiar e abrindo um leque de camadas contextualizadas por dilemas da vida, o longa-metragem Kasa Branca, que teve sua estreia no Festival do Rio 2024, é um passeio sobre verdades da realidade. Escrito e dirigido por Luciano Vidigal, de forma simples, objetiva e sem esquecer do bom humor, somos apresentados a carismáticos amigos, seus dramas e cotidianos.

Na trama conhecemos o jovem e gente boa Dé (Big Jaum) que está passando por um momento delicado. Sua avó, a única parente de seu presente, está numa estrada sem volta com a doença de alzheimer e, precisando cuidar dela, as contas só acumulam. Morador de um bairro de Mesquita, Chatuba, no Rio de Janeiro, ele resolve enfrentar esse momento vivendo o máximo de experiências com ela, contando com a ajuda de seus dois melhores amigos Adrianim (Diego Francisco) e Martins (Ramon Francisco).

O alicerce é a relação do protagonista com a avó. Abandonado pelo pai na infância, Dé se vê em um ponto crítico, sem dinheiro para o básico, prestes a ficar sozinho no mundo, se tornando refém do apenas sobreviver. Todo dia vendo o trem passar - um óbvio paralelo com suas memórias e na busca por algo que não o faça desistir e seguir em frente - acompanhamos sua história com um ritmo dosado, chegando nos demonstrativos de medos e aflições, esses, contidos em cada ponto da narrativa que, trazendo um assunto duro envolvido muitas vezes pela falta de esperança, traça suas reflexões sociais.

Tocando em temas delicados, que são amenizados pelas pausas dramáticas a partir da contagiante amizade dos três amigos e suas questões, esse é um filme sobre verdades. Indicando certeiros paralelos com o mundo real, não é esquecido uma contextualização que vão desde descasos do sistema de saúde pública, mílicia, a corrupção policial, até a falta de um facilitador via políticas públicas na compra de remédios caríssimos.

Como um cronista do cotidiano carioca, trazendo a força da simplicidade na estrutura narrativa, exemplificados por gestos de ternuras imensuráveis, Luciano Vidigal mostra que mesmo na falta de esperança é possível respiros. E ao transformar isso tudo num grande mar de reflexões numa tela grande a mensagem chega com força a todos que estão dispostos a conhecer, aprender e dar sua contribuição.

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09/08/2024

Crítica do filme: 'Mais Pesado é o Céu'


O abraço nada distante dos sonhos e do pesadelo. A partir de uma jornada visceral com paralelos contemplativos do ser humano e suas dificuldades inseridas aqui num sertão nordestino que abre o leque de nossas observações, o novo longa-metragem do cineasta Petrus Cariry aponta suas janelas de reflexões através de realidades difíceis, abandonadas, em um Brasil onde o sonho e o pesadelo andam de mãos dadas. Mais Pesado é o Céu, e seu visual deslumbrante, filmado de forma impecável, nos mostra elos de correntes que vão desde a brutalidade da violência até a necessidade, dentro de um contexto às margens da sobrevivência. Esse não é um filme fácil, porém extremamente necessário!

Na trama, conhecemos Teresa (Ana Luiza Rios) e Antonio (Matheus Nachtergaele), dois personagens distantes, sozinhos no mundo, que acabam se conhecendo por acaso, ambos em busca de uma nova vida numa outra cidade. A partir desse encontro, e acolhendo uma criança abandonada, os personagens buscarão encontrar soluções para precariedade que flerta com suas rotinas, dependendo de quando a sorte voltará a sorrir. Mas o que será o suficiente para um é o mesmo que para o outro?

Um dos méritos do roteiro é atravessar muitos olhares para uma mesma obra. Pelas estradas da vida, através de nômades atrás de sonhos distantes, o longa-metragem abre suas reflexões em um leque angustiante onde o final feliz se torna cada vez mais longe em um túnel de angústia e desespero. Assim, percorrendo o presente dos protagonistas, e com uma narrativa afiada onde as imagens dizem muito pelas entrelinhas, chegamos em escolhas complexas, num olhar frio mas também acolhedor sobre a maternidade, nas várias formas de agonia, no machismo sempre presente, no lidar com as esferas de um desespero que insiste em não dar descanso.

A construção de um relacionamento familiar, um núcleo que aqui chega de uma forma ao acaso, acaba sendo um dos pilares para o desenrolar das ações e consequências que se mostram nítidas e viscerais principalmente quando pensamos sobre a necessidade de recursos para ao menos sobreviver. Nos desabafos, em ótimos diálogos, os protagonistas ganham contornos de contrapontos mesmo inseridos na mesma realidade. Assim, as saudades de outrora se misturam com um presente perdido onde as desilusões se tornam um zumbido diário incessante abrindo também camadas emocionais pelas maneiras de enxergar realidades com soluções intricadas.

Exibido em muitos festivais no Brasil e pelo mundo, Mais Pesado é o Céu diz muitas verdades através da infinidade criativa que uma obra audiovisual proporciona, um filme com assuntos universais que aqui ganham moldes de realidades nuas e cruas não se desprendendo de crises que despejam desencantos em vários cantos.

 

 

 

 

 

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23/07/2024

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Crítica do filme: 'Luiz Melodia – No Coração do Brasil' [Bonito CineSur]


Um observador do próprio cotidiano sem deixar de ampliar os olhares para o coletivo. Escolhido como filme de encerramento do 'Festival É Tudo Verdade' 2024 e selecionado para o Bonito CineSur do mesmo ano, Luiz Melodia - No Coração do Brasil nos leva para um tour objetivo sobre a carreira gloriosa, com altos e baixos, de um dos maiores artistas que o Brasil já viu. Chegando até o sucesso e o inusitado de ir ao seu desencontro, ao longo de 85 minutos de projeção, pelas ruas da alegria e com o violão debaixo do braço, acompanhamos um meteoro de carisma e genialidade que saiu do morro e conquistou plateias de todo o país.

Com o auxílio do próprio protagonista contando sua história através de imagens e vídeos, o documentário passa pelo toque de sonhar sozinho que levou o grande melodia a uma direção de sucesso atrás de sucesso. Sem fronteiras quanto ao gosto musical, seus embates com o próprio mercado fonográfico, a primeira canetada de sucesso, as parcerias musicais, são algumas das passagens desse belo trabalho assinado por Alessandra Dorgan que venceu o prêmio de Melhor Filme na 16ª edição do In-Edit Brasil – Festival Internacional do Documentário Musical.

Passando rapidamente também pelos seus primeiros passos na música, sua relação carinhosa e muito próxima com o lugar onde foi criado, o Morro Do Estácio, a chegada ao mundo da fama, num primeiro momento logo reconhecido como talentoso compositor, depois seu desabrochar como um intérprete de apresentações únicas, vemos ao longo de 85 minutos a caminhada até seu brilhantismo que conquistou a atenção de Gal Costa e outras lendas da Música Brasileira.

Com o rico auxílio de imagens de outrora, numa fabulosa montagem, passeando no estácio, um lugar que sempre lhe quis, ou num momento pelos palcos da vida, Luiz Melodia - No Coração do Brasil costura o encontro entre as observações do cotidiano e as emoções, na visão do próprio centro das atenções, chegando até um recorte interessante sobre sua carreira, o homem e o artista de forma empolgante. Melodia pode ter ido por aí mas jamais saiu daqui...dos nossos corações.

 

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Crítica do filme: 'Rotas Monçoeiras – História de um Rio e seu Povo' [Bonito CineSur]


Selecionado para a Mostra Competitiva de Filmes Sul-Mato-Grossenses da segunda edição do Bonito CineSur, dirigido pela dupla Cid Nogueira e Silas Ismael, o longa-metragem documental Rotas Monçoeiras – História de um Rio e seu Povo antes de qualquer coisa é um rico aulão de história e geografia, com belíssimas imagens e uma competente pesquisa. Dito esse mérito, precisamos apontar que parece estarmos assistindo a uma edição de programas educativos. Com uma óbvia forma definida como episódica, mas exibido como filme, o projeto busca apresentar a rica história de uma região através das expedições fluviais, mais precisamente no Rio Coxim que banha o estado do Mato Grosso do Sul.

Há uma estrutura narrativa que segue através do tempo a partir de recortes históricos explicados passando de forma objetiva pelos processos de expedições do século XVII até as consequências socioambientais da atualidade. Pode ser dividido em quatro partes: a história de uma região, os ribeirinhos, os pescadores e os garimpeiros. Os fios intercessores chegam por estudiosos e pesquisadores que, com grande conhecimento do tema, exploram seus olhares como se fossem professores em uma espécie de vídeo aula, que de forma didática, ajudam a construir caminhos para reflexões.

A questão é: como alocar tanta informação numa obra cinematográfica? Com um ritmo acelerado para contar uma história de séculos em 70 minutos (uma tarefa realmente bem difícil!), é preciso de muita atenção e concentração do espectador. Mesmo assim, corre-se o risco de necessitar do complemento de leituras futuras, ou outras obras audiovisuais, para preencher lacunas. Um ponto que poderia ser muito útil mas naufraga é o uso de legendas explicativas que em alguns momentos entram e saem rapidamente, evidenciando um mal uso do elemento.

Algumas críticas sociais, em relação à situações e ações que foram ganhando multiplicidade com o tempo e, em certos pontos, provocando um efeito dominó que impactaram toda a região mostrada, ganham espaço já quase no desfecho mas sem muita profundidade. A cultura ribeirinha, aos olhos de relatos pessoais de alguns personagens que tem um amplo conhecimento daquele espaço, buscando o resgate dessa história, se junta aos pontos positivos da obra.

Em complemento, as pesquisas culturais e o paralelo ao movimento monçoeiro, além das belíssimas imagens da região do Pantanal, um lugar onde convergem vários rios, podem se tornar um prato cheio para geógrafos, historiadores, Botânicos, orquidófilos. Rotas Monçoeiras – História de um Rio e seu Povo se encaixaria melhor como uma obra seriada, dentro da sua estrutura vestido de documentário pode ter um discurso com méritos mas confuso.

 

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22/07/2024

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Crítica do filme: 'Ainda Somos os Mesmos' [Bonito CineSur]

Crédito Foto: Edson Filho

Marcas de um passado que nunca esqueceremos. Trazendo para reflexões situações vividas por alguns brasileiros que estavam no Chile durante o início da ditadura de Pinochet nos anos 70, o novo trabalho do cineasta gaúcho Paulo Nascimento, Ainda Somos os Mesmos, apresenta dilemas, embates geopolíticos fervorosos, chegando até uma luta pela sobrevivência, com lapsos de solidariedade, apontando dedos para hipocrisias. Baseado em fatos reais, adotando uma narrativa de forma linear usando flashbacks como apoio, o projeto parte de uma relação conflituosa entre pai e filho para se chegar até os horrores de uma das ditaduras mais sangrentas da América do Sul.

Na trama, com seus 91 minutos de projeção, ambientada no início da década de 1970 em meio ao caótico domínio de ditaduras em vários lugares, conhecemos Gabriel (Lucas Zaffari), um estudante de medicina, que após precisar fugir do Brasil por conta dos militares brasileiros, chega até o Chile ainda no governo de Salvador Allende, onde acreditava estar seguro. Mas pouco tempo depois, um golpe de estado liderado pelo chefe das forças armadas chilenas, o general Augusto Pinochet, acontece, levando Gabriel a buscar refúgio na Embaixada da Argentina. Em paralelo a isso, seu pai, Fernando (Edson Celulari), um empresário influente da indústria calçadista, com forte ligação com os militares brasileiros, busca soluções para resgatar o filho.

Para toda essa engrenagem audiovisual funcionar, do discurso até o que vemos em cena, através de todo o contexto dolorido vivido pelos angustiados personagens, há um foco na tensão constante que se sustenta e não estaciona no trivial da relação de pai e filho. Assim, amplia-se o contexto, parte desse ponto para se chegar em outros epicentros dramáticos. Uma questão de toda essa costura, é uma trilha sonora que se torna em certos momentos maçante, quebrando horizontes mais amplos, limitando o olhar do espectador para a construção narrativa.

A insanidade e o desespero é um fator bem explorado, muito por conta da personagem de Carol Castro, Clara, uma brilhante economista afetada de forma drástica pelos abalos emocionais que parecem nunca terem fim. Essa figura, que ganha destaque mesmo com pouco tempo em cena, dentro de uma Mise en Scène que segue o discurso, personifica as emoções conflituosas que o lugar onde estão apresenta. Com as regras zeradas, uma nova dinâmica do poder entre eles mesmos circula o ambiente caótico que virou a embaixada da argentina. A clareza dessas questões deixam mais fáceis as reflexões que se seguem.

Rodado no Chile (na Cordilheira dos Andes e em Santiago) e no Brasil (Porto Alegre e Novo Hamburgo), premiado como Melhor Filme Independente no Montreal Independent Film Festival 2023, e ainda selecionado para o Bonito CineSur 2024, Ainda Somos os Mesmos é mais um filme importante para a galeria de projetos que abordam os tempos sombrios de ditadura. Sempre vamos lembrar e nunca esqueceremos.

 

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12/07/2024

Crítica do filme: 'A Filha do Pescador'


O desenrolar de conflitos familiares tendo o mar como testemunha. Escrito e dirigido pelo cineasta colombiano Edgar De Luque Jácome, em seu primeiro trabalho como diretor de longas-metragens, A Filha do Pescador de forma bem objetiva, contorna a aceitação e o perdão dentro de um contexto familiar, numa relação conturbada entre pai e filha tendo uma paisagem deslumbrante como testemunha. O preconceito, o assédio, o machismo também são elementos que estão inseridos nas linhas do competente roteiro.

Na trama, conhecemos Samuel (Roamir Pineda) um experiente pescador que mora em uma ilha e vive seus dias dedicado 100% ao seu trabalho. Amargurado com o passar do tempo, sem se livrar das desilusões, aprendeu a viver com a solidão. Certo dia, seu filho que não via faz mais de uma década, volta pra casa, agora como uma mulher trans chamada Priscila (Nathalia Rincón), que fugiu da cidade onde morava por conta de uma situação. Quando Samuel se machuca após uma ida ao mar e precisa de alguém para cuidá-lo, esse pode ser o momento que precisam para se entenderem.

Há um paralelo importante do choque familiar com o mar e a força da natureza. Ambientado num lugar isolado mas com suas belezas, percebemos as dores de um passado já distante que ganham novos sentidos com um reencontro, mesmo que em meio a tempestades que logo podem virar dias bonitos. Mas até quando o perdão pode superar as inconsequências? A desconstrução de Samuel é a base para uma narrativa que ruma para a aceitação ao mesmo tempo que encontra a amargura envolvida por uma solidão. O vai e vem do mar e o olhar para a natureza são como uma mensagem indireta, uma parábola, para os desequilíbrios das relações.

Nessa co-produção Brasil, República Dominicana, Colômbia e Porto Rico, em menos de 80 minutos de projeção, com o passar dos conflitos que se seguem vamos vendo uma tentativa de reconexão surgindo, mais uma chance numa relação que insistiu em se perder com o tempo. O preconceito enraizado num machismo interminável nos leva até a dor de uma personagem sofrida, frequentemente assediada, que busca um oásis pro seu sofrimento exatamente num lugar onde as pedras chegam na frente de qualquer conforto.   

A Filha do Pescador dispara suas considerações a partir da melancolia de personagens no sentido de um sentimento que não se desprende da perda. A construção narrativa eficiente e com respiros para entendermos os conflitos dos protagonistas fortalecem o discurso, dentro de um contexto de aflições nos levando até um mar de reflexões.   


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03/07/2024

Crítica do filme: 'Greice'


Um curioso quebra-cabeça emocional. Buscando ampliar suas reflexões através de contextos que envolvem um passado sem deixar de tocar em pontos que ligam a atualidade entre dois países, o longa-metragem Greice é um projeto que deixa suas marcas através de uma narrativa divertida e segura que nos leva até uma carismática protagonista, amiga das circunstâncias. Escrito e dirigido por Leonardo Mouramateus, o roteiro abre caminhos para camadas dramáticas que se ligam à uma personalidade, através das ações da ótima protagonista.

Na trama, conhecemos Greice (Amandyra), uma brasileira na casa dos 20 anos, que tempos atrás embarcou para Portugal. Dividindo sua rotina trabalhando em um quiosque, sendo da produção de uma artista e avançando no curso de esculturas no curso de Belas Artes da Universidade de Lisboa, certo dia conhece um jovem português. Durante uma festa, Greice vê seu nome envolvido em uma situação que acontece, fato esse que coloca sua permanência no país em risco e ela resolve voltar para o Brasil, mais precisamente para sua cidade natal, para achar soluções. Em um hotel em Fortaleza, fugindo de uma possível descoberta da família, reencontra amigos, conhece novos e assim analisa o que fazer com sua vida.

Greice pode ser dividido em dois momentos. Numa primeira fase em Portugal, conhecemos um pouco da rotina de sua personagem principal, imigrante irregular, adepta do ‘deixa a vida me levar’ que sempre arranja um jeitinho de moldar tudo e todos para suas necessidades. Quando uma variável incontrolável aparece em seu caminho, chegamos na segunda fase, já no Brasil, onde a força do roteiro mostra seu valor através de autodescobertas. Esse arranjo se mostra eficiente em uma narrativa cativante que usa muito bem o espaço e o tempo a seu favor. A direção também é segura, com um foco nos paralelos para reflexões sem deixar de apresentar os detalhes de cada ponto que se soma na imprevisibilidade da trama.

Com um direcionamento total pelos olhos de Greice, somos levados para uma imersão rumo as incertezas da bolha de mentirinhas compulsivas instauradas no seu fantástico mundo. Isso torna imprevisível qualquer situação, uma carta na manga que a narrativa explora muito bem. Subtramas e seus leques de assuntos importantes para debates vão se somando mas tendo apenas um ponto intercessor. Ao se aproximar das próprias verdades, aquelas que ela insiste em se esconder, a protagonista flerta com a necessidade de desconstrução e aí vem um outro ponto positivo, a inconsequência, mostrada através de fatos onde há a necessidade de se passar pelo choque da realidade.

Exibido no Festival Internacional de Cinema de Roterdã e vencedor dos Prêmios de Melhor longa-metragem e Melhor Atuação (Amandyra) no Festival Olhar de Cinema nesse ano, Greice é um trabalho consistente, interessante, honesto, que aproxima-se da realidade com ótimas atuações e personagens. Não duvide que esse filme vai figurar em listas dos melhores filmes brasileiros lançados em 2024.


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11/06/2024

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Crítica do filme: 'Geografia Afetiva'


Poético, tocante, através de memórias recriadas por lembranças. Falaremos agora do ótimo documentário Geografia Afetiva. Exibido no último dia de exibições do CINEPE 2024, o longa-metragem paulista encontra sentido nas descrições dos sentimentos, nos encontros e desencontros de uma família com conexões entre Brasil, Canadá e El Salvador. Contando parte da sua própria história, a cineasta Mari Moraga leva ao público de forma cativante e honesta os desabafos dos tempos de guerra, o sofrimento da distância, a satisfação dos reencontros. Marcas que acompanham toda uma vida.

O primeiro recorte, logo na abertura, é a base do discurso, algo que a narrativa preenche com poesia, imagens e movimentos que fazem total sentido, uma busca por respostas após a dor de uma perda. Aos poucos, passando por dilemas, dramas e escolhas, algumas lacunas são preenchidas, algo que a realizadora divide com o espectador de forma honesta e delicada, abrindo a porta da sua família para que todos possam refletir sobre muitas questões. Em certo momento entendemos que nem todas as respostas seriam ditas mas o que viesse já era o suficiente.

Junta-se à narrativa um olhar curioso que mostra o elo da geografia com as descobertas, algo feito de forma elegante, sucinta, também trazendo um interessante paralelo com a natureza. A aparente superficialidade em alguns temas na verdade se mostra um convite à pesquisa, o início de um refletir, um exercício que o espectador pode se aprofundar futuramente. Através de uma espécie de road movie, onde cada ponto no mapa afetivo é detalhado através de relatos objetivos dos entrevistados, entendemos contextos mais amplos, políticos, sociais, econômicos, de décadas atrás e os reflexos hoje.

A planta da emoção chega como um registro. Vou explicar: uma folha de cartolina com detalhes de lugares onde familiares fixaram raízes no início de trajetória. Uma mapa que mostra uma história. Nesse ponto, marcas de um passado difícil que logo flertam com o adeus se tornam o combustível de um dia caminharem de volta. Logo, estamos de frente para o passado e o presente, um choque que traz suas questões, um momento esperado por décadas no coração de cada integrante dessa família.

Geografia Afetiva encontra a beleza no reencontro, na necessidade de um registro definitivo de uma história familiar que começa num lugar e avança para outros. Um ciclo que nada mais é do que a jornada de uma vida, com altos e baixos, mas com a vontade de voltar mais uma vez e relembrar.

 

 

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08/06/2024

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Crítica do filme: 'Memórias de um Esclerosado'


Um retrato honesto, corajoso e emocionante. Filme de abertura da mostra competitiva de longas-metragens do CINEPE 2024, o documentário gaúcho Memórias de um Esclerosado nos leva para uma intensa viagem de um homem em busca de registrar suas memórias após ser diagnosticado com esclerose múltipla. Em uma belíssima construção narrativa, colocando na tela um poderoso pulsar de alguns pontos marcantes de toda uma trajetória até uma notícia avassaladora, encontramos uma estrada que percorre o real sentido dos sonhos que aqui ganham força em imagens e movimentos.

Na trama, conhecemos o cartunista Rafael Côrreas, que 14 anos atrás, recebeu o diagnóstico de esclerose múltipla. Com o avanço da doença, resolve ir atrás de um registro sobre momentos importantes de sua vida, até mesmo personificações importantes do abstrato mundo das emoções, que traçam paralelos com o mix de sentimentos que entra em ebulição de forma dilacerante em uma enorme inquietante e produtiva conversa com o espectador.

Passando pelo karma de um acontecimento quando criança, em um antes e depois imersivo, a narrativa busca fugir do lugar comum e tratar o epicentro do discurso de mãos dadas com os medos que chegam. Esse exercício de linguagem interessante, se soma a uma metalinguagem cirúrgica, algo que traz o refletir para perto a todo instante. O desfecho inesquecível, dentro do campo da infinidade de possibilidades criativas que a sétima arte abraça, vira poesia nas mãos competentes da cineasta Thaís Fernandes.  

Estima-se que no Brasil mais de 40.000 pessoas foram diagnosticada por essa doença neurológica. É papel do cinema ser um caminho para mostrar essa realidade que sempre nos trazem reflexões sobre tudo que envolve um tema tão delicado, com ligação aos importantes debates sobre acessibilidade.


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27/05/2024

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Crítica do filme: 'Dorival Caymmi – Um Homem de Afetos'


O que é que o baiano tem? Chegou aos cinemas um documentário super interessante que contorna a poesia de um dos maiores nomes da Música Popular Brasileira. Dorival Caymmi – Um Homem de Afetos nos apresenta um grande contador de histórias, um artista que aprendeu a gostar de si, pelos outros. Escrito, dirigido e produzido por Daniela Broitman, com um rico material, muito bem aproveitado, ao longo de 90 minutos passeamos por meio de memórias do seu passado e as inspirações que moldaram sua vida e suas canções.

Na casa de amigos, já pelos oitenta anos e com depoimentos de Caetano Veloso, Gilberto Gil e de seus filhos, o projeto apresenta imagens que conversam com as suas letras. Uma história contada por ele mesmo e por muitos que o cercavam. O mar e o cotidiano, a Bahia, a fase romântica pelo Rio de Janeiro, histórias sobre a composição de uma das mais conhecidas músicas na voz de Carmen Miranda, sua ligação com o candomblé. Repleta de contextos que encostam na história de artistas de uma outra época, esse documentário reproduz décadas de amor pela arte.

Os tempos no Rio de Janeiro, as histórias por Copacabana, ganham boa parte do filme com momentos engraçados, além de prováveis inspirações por paixões relâmpagos que se tornaram eternas em algumas de suas letras, algumas bem famosas. O reconhecimento como artista, o lado mulherengo, nada é colocado de lado em papos francos, abertos, onde tudo se torna uma grande celebração.

Em sua imaginária jangada que saiu pro mar, aqui no caso, da Bahia para o mundo, Dorival Caymmi marcou seu nome na história da nossa cultura, um nome que merece sempre ser relembrado e descoberto pelas futuras gerações.



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28/04/2024

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Crítica do filme: 'Verissimo'


O Luis Fernando do Verissimo. Partindo 15 dias antes do aniversário de 80 anos de uma das lendas da literatura brasileira, o documentário Verissimo, busca um recorte do dia a dia de um dos maiores cronistas do cotidiano. Com um acertado tom intimista, a narrativa, de alguma forma, simplifica a personificação de um homem pacato que adora criar laços com as palavras através de seu próprio universo. Dirigido por Angelo Defanti, o projeto foi um dos destaques do Festival É Tudo Verdade desse ano.

Ao longo de uma hora e meia de projeção, da simplicidade ao brilhantismo, caminhamos pelas reflexões não expostas, nos momentos de relaxamento, na rotina, algo que cobre e desvenda um pouco de uma personalidade que vê os holofotes como uma consequência de seu brilhante trabalho que segue constante mesmo aos 80.

O estático que não quer dizer parado. Ouvindo músicas do musical Hamilton, leituras de jornais, brincando com os netos, batendo seu pensar criativo nas teclas do seu computador, acompanhamos um introvertido Luis Fernando, não adepto do celular, que já jogou ao mundo os mais variados assuntos e insiste em nunca parar. Ao mesmo tempo, um pouco do seu processo criativo, um contemplar único com ideias reunidas pelo humor peculiar acaba ganhando formas.

A sacada de apresentar um novo olhar em meio a tanto que já foi falado e filmado sobre o escritor é o maior mérito. O emblema do seu clube de futebol do coração, o Internacional de Porto Alegre, fixo na altura da distante na fileira de uma coleção de Fernando Sabino, sua relação carinhosa com seus parentes, as inúmeras idas à eventos, seus momentos de pausa e pensativo, sua dedicação memorável ao ofício que lhe deu projeção internacional. Em sua residência na cidade de Porto Alegre, acompanhamos o Luis Fernando do próprio veríssimo.


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27/04/2024

Crítica do filme: 'Aumenta que é Rock'n'Roll'


Rock and roll e cinema, tudo isso junto e misturado? Vamos falar agora sobre Aumenta que é Rock'n'Roll. Chegou aos cinemas nesse final e abril de 2024 um longa-metragem brasileiro que usa a nostalgia à seu favor para contar uma história que envolve sonhos, amores, política e muito rock and roll. Baseado no livro autobiográfico "A Onda Maldita", de Luiz Antonio Mello, Aumenta que é Rock'n'Roll navega pelas ambições e desejos de uma juventude fervilhando por liberdade e desejos em meio ao processo de restauração da democracia.

Na trama, ambientada no início dos anos 80, conhecemos Luiz Antonio (Johnny Massaro), um jovem jornalista que desde os tempos de colégio, ao lado do amigo Samuca (George Sauma), sonha em trilhar carreira pelas ondas do rádio. Luiz consegue a grande oportunidade da vida ao ser colocado de frente de um novo projeto e assim criar a Fluminense Fm, mais conhecida como ‘A Maldita’, que logo se torna uma das estações mais ouvidas, lançando grandes nomes do rock nacional. Em meio ao caos de tentar manter seu sonho, com desafios atrás de desafios, ele começa a se aproximar de uma das locutoras do lugar, Alice.

Um tempo que não volta mais. Através dos sonhos de um protagonista obstinado, contornamos um contexto borbulhante de um país, uma ligação entre a cultura e as formas de expressão. A rádio é um dos meios de comunicação que mais vem ficando para trás após a chegada da internet, por isso histórias assim, de idealizações de sucesso de outros tempos são importantes para mantermos a preservação da memória ativa. E não pensem que só quem viveu esses tempos mostrados vai se interessar por esse filme, o leque é bem aberto.

Sob o foco de um protagonista, muito bem interpretado por Johnny Massaro, chegamos aos dilemas que vão desde a estrutura de uma oportunidade até sonolentos pontos românticos. Aliás, esse último ponto é encaixado de forma um pouco forçada dentro de uma narrativa que se apoiam no carisma de ótimos personagens. Ao longo de quase duas horas de projeção, mesmo com algumas derrapadas, indo de encontro à clichês, a narrativa busca ser pulsante, embalada por uma trilha sonora com canções conhecidas, se construindo a partir de uma realização pessoal buscando assim alcançar reflexões mais amplas que ligam a política ao espírito de uma geração marcada pela redemocratização. 

Aumenta que é Rock'n'Roll cumpre seu objetivo, com a sacada de ter a nostalgia como base do entretenimento, revive o espírito sonhador que está em todos nós. Não deixem de conferir, em cartaz nos cinemas! Viva o cinema brasileiro!

 

 

 

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16/04/2024

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Crítica do filme: 'Hoje é o Primeiro Dia do resto da sua vida'


Um filme sobre pais e filhos sempre traz reflexões e emoções para todos nós que acreditamos em dias melhores para toda uma nova geração. Selecionado para o Festival ‘É Tudo Verdade’ 2024, o documentário paulista Hoje é o Primeiro Dia do resto da sua vida nos leva ao encontro com uma família que está crescendo, com uma adoção aguardada e as iminentes mudanças em torno de suas vidas. Filmado na própria casa de um casal com o lado profissional ligado ao audiovisual, momentos se tornam eternos nesse registro pulsante que coloca a maternidade e paternidade lado a lado.

Mostrando a parte final do processo de adoção de Gael, de apenas 4 meses pelos seus novos pais, os cineastas Bel Bechara e Sandro Serpa, em meio aos tempos complexos de pandemia, de forma leve, verdadeira e emocionante conhecemos as conflitantes emoções que se jogam no caminho, além de descobertas que valerão para toda uma vida. As inseguranças de pais de primeira viagem, as reviravoltas no cotidiano do casal, as novas maneiras de enxergar o mundo, o medo do futuro, se juntam ao abstrato das emoções aqui se ligando a uma ternura que emociona.

Recortes de momentos que outros pais de primeira viagem já tiveram, aproximam essa história com a de tantas outras. É muito fácil se emocionar quando a verdade está presente em cada cena, em cada preocupação. Um mundo que era de dois, agora é de três e o alicerce desse projeto é exatamente mostrar essas mudanças cotidianas que vão desde a arrumação da casa até as primeiras experiências com tudo que uma nova vida precisa. O caos político de uma eleição próxima a vir (o projeto foi filmado em 2021) abre incertezas, medos, caso não haja mudanças.

Hoje é o Primeiro Dia do resto da sua vida é um singelo recorte de uma nova família, uma nova estrutura que é voltada ao amor. Tomara que esse filme chegue até o circuito exibidor. Merece.

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Crítica do filme: 'Luiz Melodia – No Coração do Brasil'


Um observador do próprio cotidiano sem deixar de ampliar os olhares para o coletivo. Escolhido como filme de encerramento do 'Festival É Tudo Verdade' 2024, Luiz Melodia - No Coração do Brasil nos leva para um tour objetivo sobre a carreira gloriosa, com altos e baixos, de um dos maiores artistas que o Brasil já viu. Chegando até o sucesso e o inusitado de ir ao seu desencontro, ao longo de 85 minutos de projeção, pelas ruas da alegria e com o violão debaixo do braço, acompanhamos um meteoro de carisma e genialidade que saiu do morro e conquistou plateias de todo o país.

Com o auxílio do próprio protagonista contando sua história através de imagens e vídeos, o documentário passa pelo toque de sonhar sozinho que levou o grande melodia a uma direção de sucesso atrás de sucesso. Sem fronteiras quanto ao gosto musical, seus embates com o próprio mercado fonográfico, a primeira canetada de sucesso, as parcerias musicais, são algumas das passagens desse belo trabalho assinado por Alessandra Dorgan.

Passando rapidamente por seus primeiros passos na música, sua relação carinhosa e muito próxima com o lugar onde foi criado, o Morro Do Estácio, a chegada ao mundo da fama, num primeiro momento logo reconhecido como talentoso compositor, depois seu desabrochar como um intérprete de apresentações únicas, vemos ao longo de 85 minutos a caminhada até seu brilhantismo que conquistou a atenção de Gal Costa e outras lendas da Música Brasileira.

Com o rico auxílio de imagens de outrora, passeando no estácio, um lugar que sempre lhe quis, ou num momento pelos palcos da vida, Luiz Melodia - No Coração do Brasil costura, num recorte interessante sobre sua carreira, o homem e o artista de forma empolgante. Melodia pode ter ido por aí mas jamais saiu daqui...dos nossos corações.

 

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