A dialética em torno da logicidade. Chegou nas plataformas digitais nos últimos dias um longa-metragem com humor fúnebre apoiado no lado da razão e objetivos dentro da frieza de seu protagonista. Há um tom macambúzia que move-se pelas linhas do roteiro de O Diário de um Maquinista, filme sérvio de 88 minutos dirigido por Milos Radovic. Um outro olhar para essa produção, chega quando imaginamos o contorno de uma linha de medo (ora evidente, ora não), da razão sobre a inconsequência, até mesmo de um egoísmo clássico das pessoas que só tem um modo de pensar sobre as coisas. Apoia-se na solidão para explicar como podem ser curiosos as aprendizagens da vida. Interessante trabalho.
Na trama, conhecemos Ilija (Lazar Ristovski) um homem já beirando a melhor idade, vindo de uma
família de maquinistas (seu pai, seu avô...), profissão que segue desde que se conhece
por gente. Sempre ao lado de seu cachorrinho Rocco, pilota Locomotivas pelas
estradas da Sérvia. Certo dia, após já ter um enorme histórico de atropelamento
no currículo, acaba salvando a vida de Sima (Petar Korac), um jovem deixado na porta de um orfanato, dentro de
uma caixa de bananas, ainda recém-nascido. O tempo passa e logo viram pai e
filho. Mais velho, o segundo insiste em ser maquinista que nem o primeiro, mas
esse não quer isso para o filho por conta de um medo pouco exposto do jovem
sofrer e se desgastar em uma profissão que pode trazer algum trauma, exatamente
como aconteceu com ele e toda sua família. Assim, ambos embarcam em uma jornada
de teimosia rumo a um objetivo incerto.
Não dá pra entender se a intenção do roteiro era para terem
duas visões sobre a vida, acredito até que sim. Porém, tudo é centrado em Ilija
e mesmo assim, a partir do seu peculiar modo de pensar a vida vemos a
trajetória de ambos se desenvolvendo ao longo do tempo, principalmente as
inconsequências que viram dolorosas decisões com consequências, nos contrapontos
de emoções sobre a questões fatais dentro do currículo do maquinista. Quando
partimos do princípio que o jovem, buscando o mesmo caminho do pai, vai ser
afetado em algum momento pelo reflexo da vida dele, é simples a dedução que
haverá uma transformação na espera iminente de alguma provável tragédia que ele
terá que superar. Nesse último ponto concluímos o objetivo do filme: o encontro
da alma amargurada com a juventude sem referências.
A solidão e a velhice chegando ganham contornos na história,
que não possui clímax definido mas prende a atenção pela quase poética maneira
que o protagonista se modifica aos nossos olhos. Principalmente, quando há uma
auto reflexão do mesmo, quando ele começa a ver o amor de sua vida, que morreu
faz 25 anos, mostrando que em todas as fases da vida o exercício da felicidade
é não parar de aprender.