18/06/2021

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Crítica do filme: 'Noites de Alface'


O reaprender a andar sozinho. Baseado no romance homônimo de Vanessa Barbara, Noites de Alface é um filme cíclico dentro de seus paralelos, que nos mostra uma eterna busca pelo silêncio, do aceitar a solidão. Busca suas reflexões na interpretação do espectador. Nos sentimos na plateia de um teatro onde o talento dos artistas se sobrepõe perante qualquer inflexão confusa do roteiro. O ritmo lento é para nos deixar envoltos no tão sonhado silêncio que busca o personagem viúvo, interpretado por Everaldo Pontes. Quando o espectador entende a percepção, acaba sendo surpreendido pela profundidade que esse personagem alcança. Dirigido por Zeca Ferreira, o longa-metragem que estreia esse mês nos cinemas tem também no elenco a sempre excelente Marieta Severo.


Na trama, conhecemos Otto (Everaldo Pontes), introspectivo, resmelengo, vive dentro de um casulo que também podemos chamar de solidão após o falecimento de sua esposa Ada (Marieta Severo). Antes, levava uma vida simples, vivendo a velhice como bons companheiros de toda uma vida. Depois, se torna quase paranoico, sem conseguir pregar os olhos, observa a rua, corre para as lembranças inclusive de um chá de alface que sua companheira preparava para suas insônias diárias. Assim, vamos acompanhando o cotidiano desse personagem que se vê envolvido em algumas pequenas surpresas sobre um ocorrido na cidadezinha onde mora.


Rabugento, ranzinza. O filme é todo em torno de Otto, suas questões são resolvidas muito mais pelas emoções do que qualquer razão como meio termo. As leituras corridas na cadeira de balanço, a forte presença das lembranças, vamos seguir seu caminho como se estivéssemos em duas estradas quase paralelas que nos mostra uma atualidade cheia de incertezas focada num primeiro momento no luto mais precisamente e uma outra que nos apresenta flashes de seu cotidiano antes da perda. Essa construção chega pelos sonhos lúcidos provocados pelas emoções já mencionadas e também por uma autodescoberta de dependência de quem já se foi.


Todo filmado no bairro de Paquetá, no Rio de Janeiro, o ponto negativo chega pela tentativa de suspense que é imposta por uma série de situações um pouco mal explicadas que jogam o pacato personagem em uma teia de disse me disse que acontece sem ele ao menos ter ida das movimentações. Mas nada que atrapalhe o bom exercício sobre a solidão.