O que seria de nós sonhadores sem o cinema? A sétima arte tem poderes mais potentes do que qualquer superman, nos teletransporta para emoções, situações, onde conseguimos lapidar nossa maneira de enxergar o mundo através da ótica exposta de pessoas diferentes. Por isso, para qualquer um que ama cinema, conversar sobre curiosidades, gostos e situações engraçadas/inusitadas são sempre uma delícia, conhecer amigos cinéfilos através da grande rede (principalmente) faz o mundo ter mais sentido e a constatação de que não estamos sozinhos quando pensamos nesse grande amor que temos pelo cinema.
Nosso entrevistado de hoje é cinéfilo, de Porto Alegre (Rio
Grande do Sul). Conrado Heoli é
crítico e pesquisador de cinema, mestre em Arte, Cultura e Comunicação pela
Universidade do Minho, em Portugal. Foi curador da Sala de Cinema Ulysses
Geremia em Caxias do Sul (RS) e colaborador dos sites Cine Players e Papo de
Cinema, entre outras incursões – profissionais ou não – resultantes de sua
cinefilia. Atualmente compartilha sua paixão pelo cinema no projeto @sobrecine.
Natural de Cambé (PR), vive atualmente em Porto Alegre (RS).
1) Na sua cidade,
qual sua sala de cinema preferida em relação a programação? Detalhe o porquê da
escolha.
Temos a sorte de ter cinemas muito bons em Porto Alegre, com
excelente programação! Posso escolher dois? Cinemateca Capitólio, cinema histórico inaugurado nos anos 1920 que
passou muitos anos fechado e, depois de uma revitalização incrível, foi
reinaugurado em 2015. Também tenho que destacar a Cinemateca Paulo Amorim, localizada na Casa de Cultura Mário Quintana, que possui três salas e uma programação
fantástica. Ambos são refúgios cinéfilos pelos quais tenho grande carinho e
admiração.
2) Qual o primeiro
filme que você lembra de ter visto e pensado: cinema é um lugar diferente.
Sempre fui apaixonado pelo cinema, desde a infância, mas
lembro que na adolescência tive uma experiência transformadora. Trabalhava numa
videolocadora (saudades!) e o DVD de Sonhos,
do Akira Kurosawa, sempre me chamava
a atenção. Um dia tomei coragem para ver um filme tão diferente e fiquei
fascinado, mesmo não tendo toda a bagagem para compreender tudo o que o filme
propõe ao espectador. Ainda assim, fiquei encantado pelo filme, tanto que
comprei o DVD do meu chefe na época (não tinha muita saída, infelizmente!) e o
tenho até hoje.
3) Qual seu diretor
favorito e seu filme favorito dele?
Essa pergunta é cruel para qualquer cinéfilo, é muito
difícil apontar apenas um, mas vou com o mestre Alfred Hitchcock e sua obra-prima Um Corpo Que Cai.
4) Qual seu filme
nacional favorito e porquê?
Outra pergunta difícil! Sou fascinado pelo Cinema Novo e
pelas obras produzidas na Boca do Lixo, mas como favorito vou destacar um filme
que também vi bastante jovem e que até hoje me encanta: "Lavoura
Arcaica", do Luiz Fernando Carvalho.
5) O que é ser
cinéfilo para você?
É ter no cinema a principal referência para o que é arte,
todas as suas potências e possibilidades. É perceber as portas que se abrem,
para muitos mundos, a partir de cada filme. Como Fellini dizia, cinema é um
modo divino de contar a vida, e quem ama o cinema pode apreciar isso na
primeira fila.
6) Você acredita que
a maior parte dos cinemas que você conhece possuem programação feitas por
pessoas que entendem de cinema?
Não a maior parte, já que a maioria de cinemas hoje são
espaços comerciais e a programação é feita por quem entende do negócio, não
necessariamente de cinema. Ainda assim, tenho o privilégio de ter ótimas salas
próximas com grandes curadores que conhecem muito de cinema.
7) Algum dia as salas
de cinema vão acabar?
Acredito (e espero!) que não. Penso que elas vão se
transformar muito ainda, mas as salas de cinema sempre vão oferecer algo que
qualquer streaming jamais vai conseguir, que é a experiência coletiva de ver um
filme num espaço que é uma espécie de templo para qualquer cinéfilo.
8) Indique um filme
que você acha que muitos não viram mas é ótimo.
São muitos que merecem indicação, algo que buscamos sempre
fazer no @sobrecine! Vou reforçar a
recomendação de um que vi recentemente, O
Que Ficou Para Trás, de Remi Weekes.
Grande filme que se vale do terror para uma importante leitura sobre a questão
dos refugiados africanos na Europa. Grande filme!
9) Você acha que as
salas de cinema deveriam reabrir antes de termos uma vacina contra a covid-19?
Acredito na importância da reabertura gradual e com todos os
protocolos de segurança de espaços culturais, para a preservação desses
espaços. Da mesma forma, os espectadores devem ser cuidadosos e só visitar
esses espaços se estiverem aptos para tal, sem correr ou oferecer riscos para
outros. Infelizmente, muitas salas acabaram se fechando durante a pandemia, que
afetou principalmente as menores e independentes - que também são, geralmente,
aquelas voltadas ao cinema arte. Assim, com a vacinação aumentando, espero que
logo possamos superar este período tão difícil e todos voltarmos aos cinemas!
10) Como você enxerga
a qualidade do cinema brasileiro atualmente?
Com os melhores olhos. Nosso cinema é único e excepcional,
temos cada vez mais filmes e realizadores excelentes, admirados ao redor do
mundo. É uma pena que não tenhamos os incentivos merecidos, tanto da iniciativa
privada quanto e principalmente do nosso (des)governo, pois aí as
possibilidades e resultados seriam muito maiores.
11) Diga o artista brasileiro
que você não perde um filme.
Estou sempre de olho no cinema do Marco Dutra, da Juliana
Rojas, do Gabriel Mascaro e do Kleber Mendonça Filho!
12) Defina cinema com
uma frase:
O cinema é a vida narrada 24 vezes a cada segundo.
13) Conte uma história
inusitada que você presenciou numa sala de cinema.
Eu fui curador de uma sala de cinema durante cinco anos,
então tenho muitas delas... Acho que muitas aconteciam no projeto
"Pesadelo Coletivo", com sessões de cinema de terror durante a
madrugada. Numa delas, no meio de uma sessão, derrubamos acidentalmente algumas
cadeiras no fundo da sala, e o susto dos espectadores foi tão grande que
algumas pessoas saíram da sala para se recuperar (!).
14) Defina 'Cinderela
Baiana' em poucas palavras...
Nunca assisti!
15) Muitos diretores
de cinema não são cinéfilos. Você acha que para dirigir um filme um cineasta
precisa ser cinéfilo?
Acredito que não necessariamente, mas também penso que os
melhores cineastas são aqueles que, além da técnica e do poder de escrever
brilhantemente com suas câmeras, são cinéfilos e apaixonados pelo cinema.
16) Qual o pior filme
que você viu na vida?
Pergunta difícil... Acho que a gente acaba se esquecendo da
maioria dos filmes ruins, bloqueando de nossas memórias. Ainda assim, também
considero muito importante ver filmes ruins, pra aumentar nosso senso crítico!
Vou citar então dois filmes considerados ruins que adoro: Showgirls, do Paul Verhoeven,
e Plano 9 do Espaço Sideral, de Ed Wood.
17) Qual seu
documentário preferido?
Adoro o cinema do Eduardo Coutinho, então tenho que citar Cabra Marcado Para Morrer e Edifício Master. Também tem um doc que
mexeu muito comigo e que sempre indico, que é o Dear Zachary: A Letter to a Son About His Father.
18) Você já bateu
palmas para um filme ao final de uma sessão?
Com certeza! Geralmente acontece nos festivais e sessões com
os realizadores, mas é sempre muito interessante e curioso estar numa sessão
aleatória em que, com o final do filme, os espectadores se sentem compelidos a
aplaudir.
19) Qual o melhor
filme com Nicolas Cage que você viu?
Apesar de atualmente ser reconhecido mais pelos memes do que
por seus filmes, o Cage tem trabalhos incríveis, como Adaptação (meu favorito dele), Despedida
em Las Vegas e Coração Selvagem,
pra citar apenas alguns. Mas também adoro algumas besteiras que ele fez, como A Outra Face, Con Air e 60 Segundos.
20) Qual site de
cinema você mais lê pela internet?
Acompanho muito o IndieWire,
tanto o site quando os podcasts.
21) Qual streaming
disponível no Brasil você mais assiste filmes?
Meu preferido é o Mubi,
mas assisto muita coisa também pela Prime
Video e Netflix.