A longa caminhada de uma amizade por meio de memórias. Baseado em uma premiada peça teatral criada no ano de 2004 pelo ator e diretor Gero Camilo, Aldeotas se propõe a um exercício constante e bastante criativo de complemento com o imaginário apresentando em curtos recortes momentos chaves na vida de dois amigos que se reencontram no funeral de um deles. Dirigido e protagonizado pelo próprio Gero Camilo, ao lado de Marat Descartes, intérpretes da montagem original da peça teatral, Aldeotas busca nas memórias um alicerce para sua poesia sobre amizade.
Na trama, que teve sua estreia mundial na Mostra de São
Paulo, vamos acompanhando algumas fases na vida dos amigos Levi (Gero Camilo) e Elias (Marat Descartes) que se reencontram por
meio de memórias após o primeiro, depois de um longo hiato sem se falarem
pessoalmente, volta para o funeral do segundo. Eles moraram na infância e adolescência
na cidade de Coti das Fuças, no interior do Brasil, um lugar conservador em uma
época de pouca liberdade para os sonhadores. As descobertas, os amores, as
dores, as alegrias, as decepções, os sonhos, a opressão, os abusos, a busca
pela liberdade, a vontade contagiante de conhecer o mundo são apresentados ao
público através das lembranças.
O abstrato universo da saudade se mostra presente em cada cena
mesmo que a troca de experiência seja a chave para se conectar com essa
impactante narrativa. Se despedir de um amigo, dar cabo de uma saudade, joga Levi
em uma estrada de retorno para a cidade onde momentos de todos os tipos
reaparecem. A adolescência cheia de variáveis, escolhas que acabam sendo
rupturas, os traumas por não ser aceito, a busca por explicações sobre o
inexplicável. As visões de compartilhamentos de experiências em uma cidade
conservadora são compostas por uma linha definida da linguagem exercendo forte
preponderância dentro de uma função poética, aguçando assim o imaginário do
espectador.
O uso de poucos elementos como base de algum tipo de
expressão poética transformam a caminhada desse filme em uma interação para o
espectador como se estivesse em um teatro, onde a imaginação nos leva ao
refletir por meio de uma estrada de pensamentos sobre amizade e momentos chaves
na vida de duas almas que de alguma forma se completam através das experiências
que tiveram na infância e na adolescência. Emocionante em momentos pontuais, o filme
gera reflexões sobre os tempos da imaturidade e a necessidade de se tornar uma
fortaleza madura para se proteger dos avanços de conflitos que não se consegue
enfrentar.
Aldeotas e suas
diversas interpretações mexem com nosso refletir nos levando a pensar sobre
memórias e saudade, até mesmo de tempos lá atrás, mostrando que a distância, o
silêncio, podem ser uma enorme ferramenta de entendimento sobre as linhas de
qualquer história.