Selecionado para a mostra Première Brasil de Documentários do Festival do Rio 2025, o impactante projeto Cheiro de Diesel é um profundo e inquietante recorte sociológico da cidade conhecida como ‘maravilhosa’. Buscando em seus intensos 80 minutos de projeção ampliar o debate sobre as intervenções militares nas favelas cariocas - mais precisamente quando o exército brasileiro ocupou o complexo da Maré durante a Copa do Mundo de 2014 -, chegamos num retrato comovente e avassalador pela visão da própria comunidade, de seus trabalhadores e moradores da região.
Muito bem montado, o longa-metragem costura com precisão
seus pontos a partir de um discurso irrepreensível, onde caminhamos pela luta
da jornalista, comunicadora comunitária e ativista social Gizele Martins em sua
busca para dar voz ao que de fato aconteceu em uma região tomada por perigos de
todos os lados – uma realidade que afetou em cheio o direito de ir e vir de
140.000 moradores.
A contextualização é bem feita e se insere naturalmente na
narrativa, através das histórias que são contadas. Quando eventos de grande
projeção passaram a ter o Rio de Janeiro como sede, o governo resolveu enviar o
exército para um complexo de favelas - fato que gerou situações alarmantes, pouco
divulgadas nas mídias tradicionais. A herança disso? As sequelas na vida de inúmeras
pessoas que sofreram na pele os horrores dessa chamada ‘paz armada’.
Indo à raiz dos problemas que se acumulam – que servem como
um importante registro através do cinema –, chegamos aos medos constantes e às
facetas de uma suposta proteção que, na verdade, revelou-se uma despreparada
empreitada assinada pelo alto escalão da república. Com o jornalismo também em pauta, o
documentário exemplifica a tragédia e as marcas da violência por meio dos
depoimentos de algumas vítimas, mas sem deixar de criar a ponte com o agora.
Cheiro de Diesel é
um soco no estômago, um projeto valente que joga seus holofotes para as
verdades muitas vezes não ditas – caladas pelos anos - e que precisam de uma
vez por todas reflexões de todos nós.
