O que seria de nós sonhadores sem o cinema? A sétima arte tem poderes mais potentes do que qualquer superman, nos teletransporta para emoções, situações, onde conseguimos lapidar nossa maneira de enxergar o mundo através da ótica exposta de pessoas diferentes. Por isso, para qualquer um que ama cinema, conversar sobre curiosidades, gostos e situações engraçadas/inusitadas são sempre uma delícia, conhecer amigos cinéfilos através da grande rede (principalmente) faz o mundo ter mais sentido e a constatação de que não estamos sozinhos quando pensamos nesse grande amor que temos pelo cinema.
Nosso entrevistado de hoje é cinéfilo, sociólogo e produtor
cultural. Fernando Nogueira trabalha
com pesquisa e programação cultural desde os anos 1990. Hoje, pesquisa sobre
antigos cinemas do interior paulista para um novo projeto.
1) Na sua cidade,
qual sua sala de cinema preferida em relação a programação? Detalhe o porquê da
escolha.
O Cine São Carlos.
Cinema de shopping, particularmente, eu não frequento, não gosto. E o cinema do
Sesc, com excelente programação, porém, não é uma sala de cinema propriamente.
A razão do Cine São Carlos tem a ver com a memória do cinema na cidade, do cinema
que frequentei nos anos setenta, oitenta e noventa. Eram duas salas – o Studio
1 e 2, na região central da cidade. E permanecem com duas salas. E cinema de
rua, coisa rara hoje em dia! Frequento, ou frequentava (antes da pandemia), a
depender da programação dos filmes. Portanto, é um cinema que remete ao
passado, apesar, que não sou um adepto da nostalgia pura e simples. Penso que a
memória deva ter um sentido, caso contrário, ela é apenas saudosismo,
nostalgia, reminiscência. Não é a minha praia. A memória deve ajudar a
articular, pensar e produzir novos conhecimentos. E a sala de cinema é um
objeto valioso para a produção cultural. Como trabalho na área da cultura,
então, o cinema, é para mim, não somente cinefilia, mas, ofício, trabalho
intelectual, projetos, enfim... Agora mesmo, estou retomando uma pesquisa sobre
o cinema em São Carlos, e os movimentos artísticos em primeiro plano. Aliás, o
tema dos “velhos cinemas” não sai da minha cabeça há alguns anos. Como
percorri, praticamente, as várias regiões do estado de SP por conta de
trabalhos desenvolvidos (projetos culturais), em cada cidade “descobria” um
velho cinema por lá... E o pesquisador é um cara vidrado na pesquisa, no
objeto, no recorte... Ainda não sei o
destino final das pesquisas. Algum projeto sairá do mergulho que estou fazendo.
Algum ou alguns. Então, posso afirmar que não me considero um cinéfilo
propriamente, mas, um pesquisador. O que não quer dizer que não acompanho o
mundo do cinema. Adoro filmes! Na quarentena estou revendo filmes, e conhecendo
outros. O cinema é para você conhecer outros mundos. Mas não gosto de tudo. E nem tudo é cinema!
Do cinema americano, o faroeste é maravilhoso, mas, fico mesmo com a produção
dos anos 70 e 80: Scorsese, Coppola
puxando a fila. Do cinema europeu, fui conhecê-lo na Sessão Maldita, em S.
Carlos e na Sessão Zoom em Araraquara, durante os anos de Ciências Sociais na
Unesp. E sem contar com os anos do VHS, DVDs. Assisti tudo (ou quase!). E como objeto de estudo e vivência, o cinema
brasileiro! Maravilhoso! Do cinema político ao Mazzaropi. O que ver no cinema brasileiro? Tudo! Se você não
conhece o teu cinema, a tua arte, a tua política, em que mundo você vive? Eu
sempre provoco por aí em minhas intervenções, em meus projetos, em minhas
oficinas. E como estamos no campo da memória cinematográfica, impossível não
falar da Cinemateca Brasileira. Do desmonte de nossa guardadora de memórias do
cinema nacional. Tá tudo lá. A imagem do Brasil está na Cinemateca. E como ela
está? Hoje sendo desmontada, e como política cultural desvalorizada pelo
governo Bolsonaro. Uma lástima! Viva a Cinemateca
Brasileira!
2) Qual o primeiro
filme que você lembra de ter visto e pensado: cinema é um lugar diferente.
Provavelmente todos os filmes assistidos durante a infância.
Os desenhos animados, talvez. É o primeiro impacto mesmo. O contato com a tela.
O olhar para a tela. É o diferencial. Até hoje acho surpreendente.
3) Qual seu diretor
favorito e seu filme favorito dele?
Todos e todas do cinema brasileiro. Sério! Eles é que formam
o meu repertório. Tento acompanhar tudo o que estão produzindo, o tempo todo.
Nem sempre é fácil, mas corro atrás mesmo. E tem muita gente do cinema
internacional também. E como tem! Pergunta difícil, não dá para responder
assim, na lata. O Coppola é um
cineasta especial. Do bom e velho cinema...
4) Qual seu filme
nacional favorito e porquê?
Todos!
5) O que é ser
cinéfilo para você?
Eu acho que o cinéfilo é uma pessoa dedicada ao cinema.
Talvez até de forma radical, um apaixonado pela arte do cinema. Deve ser
assim...
6) Você acredita que
a maior parte dos cinemas que você conhece possuem programação feitas por
pessoas que entendem de cinema?
Sim.
7) Algum dia as salas
de cinema vão acabar?
Não, não... Talvez uma mudança, uma outra arquitetura.
8) Indique um filme
que você acha que muitos não viram mas é ótimo.
O Duplo, um
curta-metragem com a atriz Sabrina Greve.
É ótimo! Assistam! ps. Está no Porta
Curtas: http://portacurtas.org.br/filme/?name=o_duplo
9) Você acha que as
salas de cinema deveriam reabrir antes de termos uma vacina contra a covid-19?
Arriscado!
10) Como você enxerga
a qualidade do cinema brasileiro atualmente?
O cinema brasileiro é de excelência desde sempre. Premiado
nos maiores e melhores festivais de cinema do mundo. É preciso conhecê-lo e
reconhecê-lo.
11) Diga o artista
brasileiro que você não perde um filme.
José Dumont e Marcélia Cartaxo são maravilhosos!!! O De Niro é nitroglicerina pura! E tem a
atriz francesa que eu acho a mais bela, Juliette
Binoche. Acabei extrapolando a ideia inicial, falei de dois estrangeiros
também. O cinema é assim...
12) Defina cinema com
uma frase:
Eletricidade pura!
13) Conte uma
história inusitada que você presenciou numa sala de cinema:
Não estou conseguindo lembrar agora... Faz tanto tempo que
não entro em uma sala de cinema...
14) Defina 'Cinderela
Baiana' em poucas palavras...
E agora?
15) Muitos diretores
de cinema não são cinéfilos. Você acha que para dirigir um filme um cineasta
precisa ser cinéfilo?
Não é necessário ser cinéfilo para gostar de cinema, estudar
cinema e produzir cinema. Eu mesmo, como disse na primeira pergunta não me
considero um cinéfilo, mas alguém que vivencia o cinema no trabalho e na
cultura. Um cineasta precisa entender o cinema. O processo como um todo. E
claro, ser criativo, ter uma boa história para contar etc. O que eu acho,
reitero, é que para você trabalhar com cinema é necessário você conhecer o teu
território, o cinema brasileiro, o conjunto de filmes, o acervo, o contexto.
Não é uma questão de reserva de mercado, mas, de conhecimento. Das temáticas,
do processo de produção, da política cinematográfica, das novas mídias etc.
16) Qual o pior filme
que você viu na vida?
Não sei dizer... Tantos, talvez. Tem muito filme ruim em todas as épocas,
cinematografias... O bom é selecionar. O cinema voltado ao entretenimento, puro
e simples, eu acho ruim, muitas vezes um tanto ingênuo, infantilizado, enfim.
17) Qual seu
documentário preferido?
O cinema que dialoga com a política é a minha área de
interesse, então, difícil escolher um, mas Viramundo,
filme de Geraldo Sarno (1965), Cabra Marcado para Morrer, do Coutinho (1964/84), Jango, do Silvio Tendler (1984) e Liberdade
de Imprensa, do João Batista de
Andrade (1967) são filmes importantíssimos para a minha leitura sobre
cinema e sociedade. Existem outros, claro. Escolhi 4, era para ser apenas 1.
18) Você já bateu
palmas para um filme ao final de uma sessão?
Não me lembro, acho que não.
19) Qual o melhor
filme com Nicolas Cage que você viu?
Gosto de dois: Coração
Selvagem (David Lynch, 1990) e Despedida em Las Vegas (Mike Figgis, 1996).
20) Qual site de
cinema você mais lê pela internet?
Acompanho pouco, preciso acompanhar mais.