08/11/2023

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Crítica do filme: 'A Sombra de Caravaggio'


Os detalhes que fazem a perfeição. Um dos destaques da seleção do Festival de Cinema Italiano 2023, excelente mostra de filmes gratuita com exibições em algumas salas e online, A Sombra de Caravaggio nos mostra alguns recortes da vida de Michelangelo Merisi, conhecido como Caravaggio, um influente pintor do final do século XVI e início do XVII que marcou a arte barroca em todo o mundo com uma extensa obra que buscava a associação do que era divino e do que era humano numa época onde a igreja católica mandava e desmandava na Itália. Dirigido pelo cineasta italiano Michele Placido, a narrativa se joga pelas imagens e movimentos de elementos emocionais conflitantes, característicos do protagonista.


Na trama, conhecemos parte da vida de Caravaggio (Riccardo Scamarcio), um famoso pintor que fez carreira na Itália e usava sua maestria arte como uma espécie de desabafo pelas associações que traçava em relação a tudo que via. Transformando em arte, a dor e angústia da humanidade, navegamos na fase final de vida do artista quando conseguiu abrigo após ser acusado de assassinato chegando à Nápoles em 1609, à espera de um perdão papal. Em paralelo a isso, acompanhamos a investigação da Igreja Católica, na figura do enigmático Ombra (Louis Garrel), para saber se o protagonista merece ou não o perdão.


O fascínio, o amor, o ódio. Elementos emocionais conflitantes guiavam a trajetória da genialidade de um artista complexo, intrigante, muitas vezes provocado, punido, senhor de grandes angústias numa reta em busca de validar seu espírito livre o que o levara para os lados interpretativos da inconsequência. Amados por alguns, odiados por tantos outros, Caravaggio era uma figura difícil de ser definida. Talvez por isso a narrativa se fixa nos diversos conflitos nessa fase de vida que o filme retrata, consumido pela angústia de não saber seu destino, andando entre Milão, Nápoles e Malta, criando arte a partir de expressões marcantes com referências em pessoas que encontrava nas noites em que não dormia.


Um dos inúmeros pontos positivos desse filme é o alcance de um poderoso recorte de uma época. Em paralelo a história do artista, enxergamos o olhar da Igreja Católica, até então definidora de destinos com seu poder de punição, sem saber o que fazer com um talento reconhecido por todos que apresentava suas obras ligadas ao divino de uma forma nunca antes vista. A personificação disso chega na figura sombria do personagem de Louis Garrel. Há também o olhar da alta sociedade sobre a situação do pintor, protegido em grande parte por famílias influentes, adoradores de seus trabalhos, ao longo de toda a Itália, como a influente Família Colonna aqui mencionada pela personagem de Isabelle Huppert, Costanza.


Com direito a intensos duelos de espadas, passagens históricas das origens de alguns obras lembradas até hoje e grandes imagens que representam o conjunto de angústias de um homem em eterno conflito, A Sombra de Caravaggio busca apresentar os fatos que compõem a reta final de vida do artista que marcou o movimento barroco.