O que seria de nós sonhadores sem o cinema? A sétima arte tem poderes mais potentes do que qualquer superman, nos teletransporta para emoções, situações, onde conseguimos lapidar nossa maneira de enxergar o mundo através da ótica exposta de pessoas diferentes. Por isso, para qualquer um que ama cinema, conversar sobre curiosidades, gostos e situações engraçadas/inusitadas são sempre uma delícia, conhecer amigos cinéfilos através da grande rede (principalmente) faz o mundo ter mais sentido e a constatação de que não estamos sozinhos quando pensamos nesse grande amor que temos pelo cinema.
Nosso entrevistado de hoje é cinéfilo, de São Paulo. Paulo Rodrigues nasceu em 31 de março
de 1980 na cidade de Santos. Cresceu entre o Litoral Paulista e a Grande
Capital. Fez de seus trabalhos uma referência à linguagem, aos modos e costumes
da gente como a gente. Quem espera um Paulo de textos e linguagem ultrapassada,
esqueça! Ele é essencialmente contemporâneo e dialoga com intervenções onde o
verdadeiro sincretismo está ali. O sonho de ser cineasta concretizou-se em 2005
na Universidade Metodista de São Paulo. Valoriza as pequenas obras assim como
as grandes, os graves e os baixos, tipo o jeito elástico de escandir os versos,
com ironia, humor em roteiros e interpretações bem instigados e intimistas. Hoje
tem como responsabilidade o cargo de diretor criativo na página Cine.RG (@cine.rg no instagram), dedicada ao universo do cinema, séries,
livros e música. Um espaço aberto para o que há de melhor no entretenimento.
Desde então o cineasta segue sua trajetória de olho em tudo e deixando a vida
protagonizar os capítulos de sua história.
1) Na sua cidade,
qual sua sala de cinema preferida em relação a programação?
Detalhe o porquê da escolha. O Cinesala é um dos últimos cinemas de rua de São Paulo. Ele funciona
na Rua Fradique Coutinho há quase sessenta anos. Sua sala de projeção conta com
sofás e revela o chão de taco. Eles possuem um bar bem bacana para quem está
esperando o filme começar. Sua identidade visual faz referência aos antigos
letreiros de cinema e aos jornais dos anos 60 e 70. É um excelente espaço que
mantém viva a magia do cinema de rua. Um lugar pra lá de legal, com uma
curadoria de filmes impecáveis, e um bar muito charmoso (lá você pode assistir
ao filme bebendo um vinho). Para um amante do cinema como eu, a Cinesala
representa história. Cinema de rua desde 1962, e o mesmo destaca-se por sua
programação de boa qualidade, filmes tradicionais e também fora do convencional
- sou apaixonado!
2) Qual o primeiro
filme que você lembra de ter visto e pensado: cinema é um lugar diferente.
Lua de Cristal
(risos), um dos maiores clássicos de Xuxa,
chegou aos cinemas brasileiros há 30 anos. O longa de Tizuka Yamasaki trazia a eterna Rainha ao lado de Sérgio Mallandro e todas as crianças da
década de 1980 e 1990 se cansaram de assistir a esse filme. Nessa época eu nem
sabia do namoro com Pelé, fotos em revista masculina, filme com menor de idade,
nada disso. No máximo uma ou outra acusação de pacto com o demônio que volta e
meia aparecia na capa das revistas. É engraçado e triste acreditar que tem gente
que ainda acha isso.
De todos os filmes fofinhos que você já viu na sua vida, nada
pode ser mais romântico que ser atropelada por um entregador de pizzas que
corta caminho pelo meio da calçada. E pra ficar perfeito mesmo, só sendo o
Sérgio Mallandro! Que ainda vai pegar, como um verdadeiro cavalheiro, o tênis
que ela esqueceu no chão e depois dar uma cheiradinha apaixonado.
Lua de Cristal
está longe de ser o melhor filme da vida, e eu nem digo isso por apego sentimental
e sim pelo fato de ter sido o primeiro filme que eu vi no cinema, no qual pela primeira
vez um roteiro até fazia algum sentido.
3) Qual seu diretor
favorito e seu filme favorito dele?
Ang Lee se
reinventa a cada trabalho, é muito habilidoso e gosta de experimentar novas tecnologias.
Meus filmes preferidos se chamam: O
Banquete de Casamento e As Aventuras
de Pi, que lhe deu o segundo Oscar de direção, todo o cenário e os animais
eram digitais, coisa que pra época ainda era um pouco ousado.
4) Qual seu filme
nacional favorito e porquê?
O filme Central do
Brasil! Essa obra de Walter Salles
é um marco do cinema brasileiro. Eu classifico e aclamo a obra cinematográfica
como um retrato fiel da situação social do país. Além de entretenimento de
excelente qualidade, oferece subsídios para analisarmos diversos campos de
atuação na sociedade brasileira, inclusive o campo social e econômico. Sabe
aquelas histórias de crianças que além de buscar um pai que nunca conheceram, sonham
com um país onde a paz, o amor e a compaixão sejam possíveis. Isso sim é retratar
o cinema de forma honrosa!
5) O que é ser
cinéfilo para você?
Eu me lembro do primeiro filme que vi no cinema. Lua de Cristal, lá em Santos, eu tinha entre
9 e 10 anos de idade. Muitas das sensações que temos quando somos crianças mudam,
enfraquecem ou simplesmente desaparecem quando crescemos, mas a mistura de batimentos
acelerados, coração preenchido e frio na barriga que senti nesse dia nunca mudou
e se repete até hoje. Um bom filme continua a fazer o meu coração disparar.
Ainda desperta todos os meus sentidos e me faz sentir completo. Entrar numa
sala de cinema sempre vai ser como pisar em um mundo de possibilidades onde, no
melhor dos cenários, viajarei por universos paralelos e realidades distantes e,
no pior deles, terei uma experiência diferente.
6) Você acredita que
a maior parte dos cinemas que você conhece possuem programação feitas por
pessoas que entendem de cinema?
Minha resposta será bem sucinta (risos) Não! Nosso circuito
de cinema é extremamente comercial! Não que os outros países não sejam. Porém,
nossa memória afetiva é apagada facilmente pelas novidades e os números de
bilheteria! Hoje em dia acredito que para ser um curador de cinema, não basta
somente entender de cinema, mas sim entender de números. Triste realidade.
7) Algum dia as salas
de cinema vão acabar?
O cinema não vai acabar, porém não será mais o mesmo. Quando
essa turbulência passar as pessoas irão rever seus hábitos e passarão a exigir mais
comodidade pelo fato de não saírem de casa. Até para grandes lançamentos. É
triste isso, pois com essas medidas de redução o circuito cinematográfico
perderá sua popularidade e não conseguirá levar cultura, entretenimento e
informação a todos.
8) Indique um filme
que você acha que muitos não viram, mas é ótimo.
Alabama Monroe. Com
apenas dois minutos de projeção, ao ver a pequena filha daquele casal recebendo
uma injeção como parte de seu tratamento contra a leucemia, eu já sabia que o
filme iria doer. E doeu. Aliás, este trabalho do diretor belga Felix van Groeningen é uma daquelas obras
que jamais sairá da minha cabeça.
9) Você acha que as
salas de cinema deveriam reabrir antes de termos uma vacina contra a covid-19?
Acho que mais do que estar pronto ou não para voltar aos cinemas,
a pergunta mais válida seria: Está valendo a pena ir aos cinemas? Minha
resposta seria: não, afinal protocolo de segurança não é vacina!
10) Como você enxerga
a qualidade do cinema brasileiro atualmente?
O cinema brasileiro cresceu no mercado mundial e concorre
lado a lado com produções estrangeiras. Atualmente, o Brasil produz inúmeros filmes
por ano que estão no mesmo nível dos internacionais. Apesar de às vezes parecer
que temos um orçamento baixo, é preciso levar em conta que fora do país a
produção é bem mais cara. Por isso, hoje pode-se dizer que nossos filmes têm um
nível de qualidade tão bom quanto o internacional. Carlota Joaquina, a princesa do Brasil da diretora Carla Camurati é considerada a primeira
grande produção da fase de retomada do cinema brasileiro. O longa-metragem
levou 1,2 milhões de espectadores para as salas de exibição, isso foi um marco
para a história cinematográfica nacional. Já Central do Brasil, feito em parceria com a França e dirigido por Walter Salles, foi o grande sucesso dos
primeiros anos dessa retomada. O longa-metragem ganhou o Urso de Ouro de Melhor
Filme, o Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro e foi candidato ao Oscar de
Melhor Filme de Língua Estrangeira. Não acredito em premiações, mas é claro
que, quando um filme nacional é indicado a prêmios internacionais, o mesmo
ganha uma perspectiva que não teria por outros meios. A visibilidade alcançada
por Central do Brasil foi um dos grandes responsáveis pelo aumento no número de
produções e de investimentos no cinema nacional.
11) Diga o artista
brasileiro que você não perde um filme.
Quando se fala em carreira internacional, sem dúvida alguma,
a atriz Sônia Braga é referência e
sinônimo de sucesso pra mim. Ela coleciona atuações importantes em produções
cinematográficas, por exemplo: Aquarius e Bacurau. A mesma desde os anos 80 conquista
grandes indicações e espaço.
12) Defina cinema com
uma frase:
O amor pelo Cinema nasce quando você atravessa a porta de
saída da sala, e mesmo assim continua acreditando em tudo aquilo.
- Paulo Rodrigues.
13) Conte uma
história inusitada que você presenciou numa sala de cinema.
Não existiram muitas histórias inusitadas que eu me lembre!
Mas no lançamento do documentário Bixa
Travesty, ter a presença do corpo político de Linn da Quebrada, cantora transexual
negra, pra mim foi muito forte e importante presenciar, sentir sua luta pela desconstrução
de estereótipos.
14) Defina “Cinderela
Baiana” em poucas palavras...
Uma obra mal compreendida que entrou para o hall do porque
que existe.
15) Muitos diretores
de cinema não são cinéfilos. Você acha que para dirigir um filme um cineasta
precisa ser cinéfilo?
Sim! Só que essa regra infelizmente não se aplica em nosso
país!
16) Qual o pior filme
que você viu na vida?
Sem dúvidas o filme O Fantasma do Louvre, do diretor Jean
Paul Salomé de 2001. Já assisti vários filmes horríveis, mas nenhum se compara
com esse.
17) Qual seu
documentário preferido?
Saving the Amazon,
para explicar a importância da vasta região, foi criado este documentário por Sophie McNeil. A obra pode ser
assistida na Amazon Prime Video.
18) Você já bateu
palmas para um filme ao final de uma sessão?
Já! E nem me importei com o que iam achar (risos). Foi no
cinema do shopping Frei Caneca, no ano de 2002, assistindo ao filme As Horas. Eu amo muito esse filme e
tinha que me expressar de alguma forma.
19) Qual o melhor
filme com Nicolas Cage que você viu?
O filme Adaptação,
do espetacular diretor Spike Jonze.
É genial e inesperado como tudo se apresenta ali. Sua originalidade é
impressionante!
20) Qual site de
cinema você mais lê pela internet?
Acompanho várias na verdade! Gosta muito de conhecer e dar
oportunidade a novas páginas e novos olhares. Hoje eu citaria 3 canais de
cinema: Casa do Cinema Brasileiro (@casadocinemabrasileiro no Instagram),
Guia do Cinéfilo (Não é média! Sua página
é maravilhosa! Parabéns! - @guiadocinefilo
no Instagram), Filmes 77 (@filmes77 no Instagram).