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30/09/2023

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Crítica do filme: 'O Estranho'


Em sua segunda exibição em território nacional, que aconteceu no CINEBH2023, o longa metragem O Estranho é uma profunda viagem de encontros do presente com o passado às margens das idas e vindas de um famoso aeroporto que fica em um território indígena. Os que passam e os que permanecem envolvidos com esse lugar ditam o ritmo de uma narrativa que vai do passado, passando pelo presente por meio de memórias e experiências. Rodado em 2021, exibido no Festival de Berlim, o projeto dirigido por Flora Dias e Juruna Mallon é bastante interpretativo.


Na trama, somos envolvidos por curiosos recortes que de alguma forma estão relacionados a uma área onde funciona um aeroporto de alta frequência, um enorme espaço ligado por meio do tempo com os indígenas. Nesse lugar de constantes transformações ao longo dos anos, percorremos retratos tocantes de pessoas que buscam responder a uma mesma pergunta: Como enxergar o mesmo lugar de formas diferentes?


O tempo como referência se torna um importante elemento para a narrativa. O refletir sobre essa obra é algo que se faz durante as horas que se seguem, é muita coisa para captar nesse longa atemporal. Outra deixa sobre a questão: o tempo passa por você mas como é a sua interpretação diária do que passa por você? Nesse ponto entram os personagens que se misturam junto às referências dentro de uma bolha interpretativa que deve gerar boas conversas sobre as individualidades do entendimento.


As horas correm, tudo passa por você mas como é a sua interpretação diária do que passa por você? Refletir no agora, o significado das palavras, brigas por uma necessidade de estar ali, o projeto ruma para uma questão existencial onde o espectador, cada qual com suas experiências, vai ao encontro das angústias dos personagens no presente, no ‘eu’ hoje e os seus encontros com o tempo.


A resistência indígena vira um complemento, um subtema para a narrativa, um recurso em forma de crítica que faz pensarmos bastante sobre o capitalismo e suas formas de usufruir do que muitas vezes não tem direitos. Com o presente esbarrando em pitadas de uma extensa linha temporal, O Estranho caminha lá de trás para encontrarmos soluções para frente.



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28/09/2023

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Crítica do filme: 'Guapo’Y'


Como seguir com a vida após um forte trauma em tempos de ditadura? Diretamente do Paraguai, exibido no Cine Bh 2023, o documentário Guapo’Y, dirigido pela cineasta Sofía Paoli Thorne, nos mostra os fortes e emocionados relatos de uma mulher que sofreu diversos traumas num campo de concentração paraguaio durante o período de governo autoritário de um dos mais cruéis ditadores da América do Sul, Alfredo Stroessner. Um fato interessante do projeto é que a narrativa consegue criar interessantes paralelos, tendo a Terra como referência em uma aplicação de simbolismo de esperança e cura.


Exibido no prestigiado Festival de Málaga o projeto apresenta relatos que expõem o caótico Paraguai em tempos de Ditadura, a mais longa sul-americana, que começou em meados da década de 50 e foi até o fim da de 80. Esse momento marcante da história é amplamente contextualizado e segue navegando na narrativa inclusive sendo trazido até os dias atuais com fatos declarados de alguns governantes, absurdamente diga-se de passagem, elogiando o mais cruel ditador sul-americano (já citado acima).


Nesse filme de memórias ainda dolorosas, sabemos de companheiros muito torturados, presos em um lugar de ações limitadas, muitos lutando por esperança nas condições desumanas de tempos terríveis tendo a incerteza como antagonista aos lampejos de novos dias. 40 Anos depois do fim da ditadura, vemos os traumas que nunca vão se acabar para quem sofreu as dores daqueles tempos.


O paralelo com a Terra é a ponte cirúrgica que a narrativa consegue amarrar no seu refletir e faz muito sentido. Um símbolo de alguns povos indígenas é a árvore da cura, conhecida como Guapo’Y, e seu sentido dentro do que assistimos no documentário tem paralelo com esperança. Filmes como esse existem para nunca deixarmos cair no esquecimento esses tempos sombrios. É uma forte ferramenta com uma impactante descarga emocional que faz refletir do início ao fim.



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Crítica do filme: 'El Reino de Dios'


As interpretações para a fé. No segundo dia de programação do Cine BH 2023 um carismático longa-metragem deu o ar da graça nos levando, de maneira comovente, para um refletir sobre a perda e os obstáculos duros da vida real aos olhos de uma criança sonhadora que está prestes a realizar a primeira comunhão. Escrito e dirigido pela cineasta Claudia Sainte-Luce, esse projeto mexicano foi exibido em mais de 10 festivais internacionais, inclusive no prestigiado Festival de Berlim no ano passado.


Na trama, conhecemos Neimar (Diego Armando Lara Lagunes), um jovem menino carinhoso, curioso, que vive em uma cidadezinha no interior do México. Criado mais pela avó do que pela mãe, ele está prestes a completar a primeira comunhão. Só que nas horas que se seguem após esse momento importante para ele e sua família alguns eventos insistem em aparecer levando Neimar a ganhar lições para toda uma vida.


Muito ligado a avó, e com aparentes desentendimentos com a mãe, o protagonista é o carisma em pessoa. Se enxerga em um momento de muitas descobertas sem se esconder na imaturidade da idade. Logo cedo é apresentado e a ter que interpretar a fé, fruto de uma tradição familiar, que enxerga a igreja católica como um pilar, algo indiscutível para seus parentes que passaram por processos parecidos. Quando a representação do que seria o compromisso com Cristo é colocado em xeque com as séries de situações que logo se apresentam em sua frente, o jovem Neimar começa a trilhar o caminho da maturidade.


Esse longa-metragem mexicano de apenas 73 minutos parte do cotidiano limitado a sonhos e simplicidade para levantamentos de questões mais amplas que vão da fé ao luto. Aos poucos, ganham força os entendimentos sobre vida e a morte na visão de uma criança, dentro de uma narrativa que de maneira comovente e em muitos pontos bastante leve consegue conquistar o espectador.  



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27/09/2023

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Crítica do filme: 'Zé'


O abdicar por acreditar. Mostrando mais um recorte dos horrores de um tempo que marcou uma das páginas mais tristes da história brasileira, o longa-metragem mineiro , filme de abertura do CINEBH 2023, se perde na redundância do seu principal objetivo como discurso. Demasiadamente longo, com seus 124 minutos de projeção, o arquétipo da narrativa toma um rumo maçante. Mas há pontos positivos: amplia o leque de análise para um momento marcante do nosso país, se torna ferramenta cultural de aprendizado se tornando uma obra que constará como consulta para futuras gerações entenderem esse conturbado momento. O roteiro assinado por Anna Flavia Dias e Rafael Conde, a direção é do último, um dos homenageados do CINEBH 2023.


Na trama, ambientada nos tempos sombrios da ditadura, conhecemos Zé (Caio Horowicz), um rapaz vindo de uma família de classe média, influente dentro do Movimento Estudantil, que se junta a amigos com o mesmo pensar revolucionário fazendo parte assim de um grupo de resistência contra a Ditadura. Quando o cerco aperta para ele e outros membros do grupo, Zé resolve viver na clandestinidade, nesse tempo desenvolve uma família ao lado da companheira Bete (Eduarda Fernandes) e precisa viver longe de tudo e todos, praticamente ficando sem contato com os pais. Com a vida rumando para o imprevisível, uma traição de alguém próximo ao grupo será o início de mais uma tragédia na vida dele.


Repetitivo, como se já soubéssemos o que viria a acontecer na sequência, perde a oportunidade de ser uma obra mais penetrante no nosso pensar dentro de uma enorme safra de ótimos filmes sobre o tema. A insistência em reforçar o discurso se torna desnecessária e quebra o ritmo da narrativa pois a montagem é confusa. A contextualização não se apresenta quando se pede, deixando a linha temporal uma gangorra de suposições. Talvez um bom complemento para tudo que assistimos seja ler o livro que fora inspirado. O filme é baseado na obra escrita pelo poeta cearense Samarone Lima, Zé José Carlos Novais da Mata Machado, uma Reportagem.


Como importância para a vasta filmografia brasileira, se coloca como mais uma ferramenta de consulta para futuras gerações que vão pesquisar sobre os horrores vividos nas décadas de 60, 70 e 80.  E isso é algo muito importante! Mesmo com questões na narrativa, esse é um longa-metragem que se coloca na lista dos filmes urgentes para conscientizar para que tempos como aqueles vividos por Zé nunca voltem para nosso cotidiano.


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