O caos do mundo lá fora. Abordando de forma madura e inteligente o universo das emoções, Goyo, recém lançado na Netflix, é um caminhar de personagens pelo aprender para entender. Escrito e dirigido pelo cineasta argentino Marcos Carnevale, imerso numa narrativa que contempla a arte e suas relações com as sensações, acompanhamos algumas fases do maior dos sentimentos sob dois pontos de vistas. Esse projeto busca abrir espaços de reflexões também para as formas como lidar com a rejeição através de dilemas que percorrem os caminhos dos ótimos personagens.
Na trama conhecemos Goyo (Nicolás Furtado), um homem inteligente que já tem um doutorado e
trabalha como guia num museu de artes em Buenos Aires. Condicionado com
Síndrome de Asperger, um estado do espectro autista, vive com sua irmã pianista
Saula (Soledad Villamil), uma mulher
superprotetora, em um belíssimo apartamento. Ele também é muito próximo de seu
outro meio irmão Matute (Pablo Rago),
um empreendedor de sucesso, dono de restaurante. Com a chegada de Eva (Nancy Dupláa), a nova segurança do
Museu, uma mulher mais velha, com um relacionamento destrutivo com o marido
frustrado, Goyo encontrará depois de muito tempo o amor mas também tudo que
esse sentimento provoca.
Pés no chão, explorando dilemas, fugindo de qualquer
melancolia rasa, explorando os altos e baixos pelo olhar de um protagonista com
Síndrome de Asperger e uma outra personagem num momento de total instabilidade
familiar, essa obra busca construir caminhos para conexões que surgem sem
deixar de abrir um leque de considerações maduras. A narrativa opta por
personificar o abstrato dos sentimentos em imagens e paralelos, um transporte
das aflições, da dor, até mesmo do sentimento de prazer, um caminho cheio de
interpretações onde o contexto se torna importante.
O olhar para a maternidade ganha alguns focos mesmo que
pelas entrelinhas. A estrutura familiar que cerca o protagonista, com os meio
irmãos presentes durante toda sua vida fazendo o papel de um pai falecido num
acidente e uma madrasta que nunca aprendeu a atender, escolhendo o caminho mais
distante na relação com o filho. Aliás, essa última, Magda (interpretada pela
fabulosa Cecilia Roth), e sua
história com o Goyo acaba sendo a representante em cena que mais se aproxima da
mesa de reflexões que o discurso propõe. De forma menos profunda, Eva e as questões
que envolvem seus filhos e o marido descontrolado também estão inseridos nesse
contexto.
O lidar com a rejeição, outro ponto importante por aqui,
chega aos personagens de várias formas, é uma questão que está muito presente
nas linhas do roteiro. Mas mesmo escancarado ou escondido em todas suas formas
de expressá-lo, o amor, essa variável incontrolável, que nos leva do céu ao
inferno, acaba sendo o combustível, algo que alimenta as ações, dos 106 minutos
de projeção. Goyo, é uma daquelas
obras cirúrgicas que apresenta verdades sobre o caos do mundo lá fora mas sem
deixar de tocar nossos corações.