Trazendo um pouquinho do Brasil por meio das peculiaridades que circulam entre as ironias e o bom humor de um dos mais conhecidos compositores das história da música brasileira, o longa-metragem Ary, dirigido por André Weller, acerta em cheio ao construir uma narrativa com camadas simbólicas, emocionais e também sociais. Misturando documentário com pitadas de ficção, somos convidados a participar como observadores de um deslumbrante tour pela capacidade inventiva de um artista idolatrado, que abraçou em suas criações a cultura brasileira.
Filme de abertura da 20ª edição do Fest Aruanda 2025, o
projeto acerta ao contar essa história de forma cronológica e, em uma boa
sacada, traz a voz marcante de Lima Duarte
como narrador em primeira pessoa. Dentro dessa estrutura narrativa fluida - ora
divertida, ora empolgante -, de Minas para o Rio (e depois conquistando o
exterior), vamos conhecendo os momentos-chave de sua trajetória, nos quais a
vida pessoal se mistura com a profissional.
Com imagens raras de arquivo – inclusive de um inesquecível
Rio de Janeiro antigo -, conversando com a narração a todo instante e tendo
como pano de fundo algumas de suas inesquecíveis canções na voz de Dorival Caymmi, Nora Ney, Jamelão, Quarteto
em Cy e outros artistas do passado, o filme busca criar um ‘aryverso’ de
possibilidades em uma única obra – e consegue com maestria.
Diferente dos sambas-canção que compunha com cadência e elegância
no ritmo, sua vida foi, em partes, uma grande aventura agitada, com vários
fatos peculiares. Seu amor pelo Flamengo – que, por coincidência, foi mais uma
vez campeão brasileiro exatamente no horário da sessão do filme na abertura do
Fest Aruanda – não fica de fora, assim como seus inacreditáveis tempos como narrador
de futebol e os detalhes do período em que virou pianista profissional,
trabalhando em um cinema no Rio de Janeiro, na época dos filmes mudos, quando a
trilha sonora terceirizada ao vivo levava qualquer produção cinematográfica ao
seu ápice.
Invadindo também as particularidades do processo criativo,
chama a atenção o seu ‘libertando o samba das tragédias’, presente em sua
música mais conhecida – Aquarela do
Brasil – fruto de uma fixação por um país que amava. Criou a canção - música
e letra - em apenas 10 minutos, em meio à chuva de um lugar que adotou como
casa e onde não se sabe conversar baixinho.
Ary Barroso conquistou
não só o seu país, mas também os gringos - principalmente os americanos. Foi,
inclusive, o primeiro brasileiro a ser indicado ao Oscar, na categoria Melhor
Canção Original, além de alcançar mais de um milhão de execuções nas rádios
americanas. Ao longo de 70 minutos – que passam rapidinho e com gosto de quero
mais –, Ary se consolida como um forte registro de um artista: uma experiência
envolvente, repleta de observações sociais, que mostra facetas do ‘Brasil
Brasileiro’ por meio de uma narrativa envolvente repleta de delicadeza e graça.
