Reunindo um envolvente ping-pong entre o caráter e a moral – entre o certo pra si e o que é considerado aceitável pela sociedade –, o longa-metragem Ato Noturno adentra o desejo e o fetiche, para apresentar uma espécie de tragédia grega, marcada por quedas inevitáveis provocadas pelos deslizes humanos. Dito isso, o enredo convencional, de desenvolvimento linear e caminhos fáceis de acompanhar, com um conflito central bem definido, não alcança muitas camadas e vai diretamente ao encontro sensorial, conectando-se mais ao que é sentido do que ao que é elaborado.
Matias (Gabriel
Faryas) é um jovem ator que consegue uma oportunidade num grupo famoso da
cena teatral. Prestes a estrear a peça, acaba conhecendo um outro homem, Rafael
(Cirillo Luna), por meio de um
aplicativo de encontros. Com a intensidade amorosa ficando cada vez mais
constante, Matias descobre que Rafael é um político em ascensão que vai
concorrer ao cargo de prefeito. Dessa relação, que acompanhamos sob a perspectativa
de Matias, a ambição e os desejos vão chegando a superfície das ações.
Exibido no Festival de Berlim e selecionado para a mostra
competitiva de longas-metragens nacionais do Fest Aruanda 2025 o projeto
dirigido por Filipe Matzembacher e Marcio Reolon chama a atenção, em um
primeiro momento, pela concepção visual e estética, marcada por uma poderosa
fotografia num mix criativo de luzes e enquadramentos envolventes, comunicando
sensações e provocando reações diretas do público.
A trama é bem amarrada – para essa análise, consegui enxergar
uma divisão em dois atos – e, no primeiro, mal sentimos o tempo passar, graças
a um bom desenvolvimento narrativo. Porém, no segundo, surgem questões ligadas
à culpa e confronto com o moralismo constante, que não fogem do lugar-comum.
Entre os desafogos das angústias e o livre fluir de
pensamentos que invadem o protagonismo da própria vida, Ato Noturno apresenta as
dores dos riscos das escolhas, com o contestar em segundo plano e o sentir pulsando
vivo na tela.
