O que seria de nós sonhadores sem o cinema? A sétima arte tem poderes mais potentes do que qualquer superman, nos teletransporta para emoções, situações, onde conseguimos lapidar nossa maneira de enxergar o mundo através da ótica exposta de pessoas diferentes. Por isso, para qualquer um que ama cinema, conversar sobre curiosidades, gostos e situações engraçadas/inusitadas são sempre uma delícia, conhecer amigos cinéfilos através da grande rede (principalmente) faz o mundo ter mais sentido e a constatação de que não estamos sozinhos quando pensamos nesse grande amor que temos pelo cinema.
Nossa entrevistada de hoje é cinéfila, de São Paulo. Lala Alarcon tem 23 anos, mora em
São Paulo e é formada em moda pela Faculdade Santa Marcelina. Redatora e
produtora de conteúdo, ela compartilha análises e curiosidades sobre figurinos
de séries e filmes no perfil do Instagram @costumeincinema.
1) Na sua cidade,
qual sua sala de cinema preferida em relação a programação? Detalhe o porquê da
escolha.
O meu queridinho é o Petra
Belas Artes. Acho que eles fazem uma curadoria incrível e sempre colocam em
cartaz filmes muito relevantes, independente de serem pipoca ou mais alternativos.
Mas o que faz eles ganharem o meu coração são as programações especiais, principalmente
as maratonas da madrugada. Uma vez entrei na sala às 23h e só sai às 8h da
manhã do outro dia. Era a estreia de Midsommar
e depois passaram mais dois filmes de terror em homenagem à sexta-feira 13, foi
uma das experiências mais legais que já tive dentro de uma sala de cinema. Além
disso, eles fizeram um trabalho fantástico com o drive-in no ano passado quando
todos os cinemas fecharam por causa da pandemia. Na minha opinião, eles
deveriam continuar com essa ideia pra sempre!
2) Qual o primeiro
filme que você lembra de ter visto e pensado: cinema é um lugar diferente.
Acredite se quiser, mas foi assistindo o Gordo e o Magro. Meu pai amava e até
hoje ele guarda uma coleção enorme de dvds com toda a filmografia deles. O meu
preferido era A Herança Assombrada,
eu assistia em looping e ficava encantada com os cenários e personagens
caricatos. Por mais simples que fosse, eu achava tudo muito mágico.
3) Qual seu diretor
favorito e seu filme favorito dele?
Eu amo tudo o que o Wes
Anderson faz, em especial O
Fantástico Senhor Raposo, mas meu filme preferido da vida é Antes do Amanhecer, do Richard Linklater. Além disso, eu também
tenho gostado bastante dos filmes dirigidos pela Greta Gerwig, ela com certeza tá no meu radar de favoritos.
4) Qual seu filme
nacional favorito e porquê?
O Auto da Compadecida.
Eu lembro de assistir a minissérie na casa dos meus avós quando ainda era bem
pequena e cresci reassistindo o filme várias vezes. Hoje, tendo um olhar mais
crítico, sigo achando incrível. Não só pelo apego emocional, mas por conta de
todas as nuances e atuações fantásticas também. Inclusive já tive o prazer de
conhecer o Matheus Nachtergaele e
admiro muito o trabalho dele dentro e fora do filme.
5) O que é ser
cinéfilo para você?
Eu acredito que um cinéfilo é alguém tão importante quanto
um diretor de filme. É a mesma lógica de um leitor e um escritor. Por mais que
os artistas criem com um determinado objetivo, quem dá o real significado é
quem consome a arte. Tem muita gente que acredita que para ser um cinéfilo você
precisa assistir um filme clássico por dia e conhecer todos os diretores do sul
asiático, mas se você ama de verdade e respeita o cinema, para mim, você já é
considerado um. A gente precisa entender que nem todo mundo tem acesso ou facilidade
para compreender a complexidade de alguns tipos de filme, por isso o papel cinéfilo
é tão importante, cabe a ele questionar os porquês e criar um diálogo que abra caminhos
e gere discussões relevantes.
6) Você acredita que
a maior parte dos cinemas que você conhece possuem programação feita por
pessoas que entendem de cinema?
Eu acho que elas podem até entender, mas todo mundo que tá
por dentro desse mercado sabe que o grande problema são as distribuidoras. Não
adianta nada colocarem profissionais muito bem qualificados nesses tipos de cargo
se os filmes que entram nos cinemas brasileiros dependem de negociações
milionárias e de um monopólio que quase sempre privilegia quantidade à
qualidade.
7) Algum dia as salas
de cinema vão acabar?
Eu espero que não. É claro que é muito conveniente ter
vários serviços de streaming com catálogos infinitos na palma da nossa mão, mas
o cinema não se resume a isso. Ele é sobre ter experiências, criar
expectativas, fazer uma imersão no momento... E quando vemos filmes em casa
muitas vezes não conseguimos absorver o potencial máximo da obra.
8) Indique um filme
que você acha que muitos não viram, mas é ótimo.
Eu Não Estou Lá
do Todd Haynes. Ele convidou seis
atores, entre eles o Christian Bale,
o Heath Ledger e a Cate Blanchett, para interpretar o Bob Dylan em diferentes fases da sua carreira
musical. É um filme único e muito bem pensado.
9) Você acha que as
salas de cinema deveriam reabrir antes de termos uma vacina contra a covid-19?
Estou respondendo essa entrevista em junho de 2021 e graças
a Deus a população já está sendo vacinada. No momento em que estamos vivemos eu
acredito que não tem problema se tudo for feito com muito cuidado, mas se você
me perguntasse isso há um ano, quando ainda não tínhamos muitas expectativas,
eu provavelmente diria que não. É um alívio saber que esse capítulo conturbado
da nossa história já está quase no fim.
10) Como você enxerga
a qualidade do cinema brasileiro atualmente?
Acho que temos vários artistas excelentes e obras que deixam
muitas produções de Hollywood no chinelo. Vira e mexe diretores grandes como David
Lynch e Martin Scorsese elogiam algum filme nacional, mas infelizmente a maior
parte dos brasileiros que têm acesso a esse tipo de informação ainda não
aprendeu a dar o devido valor. Já vi muitos conhecidos que tem acesso à
informação preferirem ir ao cinema para assistir a mais um filme de ação
meia-boca do Liam Neeson do que darem uma chance para uma produção nordestina
como Boi Neon. É muito triste ver filmes inovadores e com um potencial gigantesco
sucumbirem ao preconceito e ignorância da população do seu próprio país.
11) Diga o artista
brasileiro que você não perde um filme.
Com certeza o Selton
Mello. Acho ele um dos artistas mais versáteis da nossa geração e não falo
só pelo o trabalho dele como ator. Adoro a dublagem dele em A Nova Onda do Imperador e considero
seu papel em Estômago um dos mais intensos que já vi em um filme.
12) Defina cinema com
uma frase:
Tem uma frase da Julie
Delpy em Antes da Meia-Noite que
ela diz que sempre tem a sensação de estar dentro de uma memória ou um sonho. E
eu para mim, quando assisto algum filme, me sinto exatamente assim: como se
tivesse vivido aquilo, seja no passado ou em outra dimensão.
13) Conte uma
história inusitada que você presenciou numa sala de cinema.
Vale uma coincidência fofa? Em 2012 eu era apaixonada por um
menino e fomos com um grupo de amigos assistir O Espetacular Homem-Aranha. Sentei do lado dele e fiquei o filme todo
insistindo pra que ele me beijasse, mas o que recebi foi um fora tão bonito que
resolvi esquecer ele pra sempre. Bom, não preciso nem comentar que o meu plano
não deu certo, né? Continuei apaixonada, mas ao invés de ganhar seu coração no
romance, eu mudei a estratégia e foquei em construir uma boa amizade. Um ano
depois, quem estava apaixonado era ele e desde então, há 8 anos, assistimos
todos os lançamentos de Homem-Aranha juntos.
14) Defina 'Cinderela
Baiana' em poucas palavras...
Um filme que não poderia pertencer a nenhum outro lugar do
mundo, se não o Brasil.
15) Muitos diretores
de cinema não são cinéfilos. Você acha que para dirigir um filme um cineasta
precisa ser cinéfilo?
Na teoria acho estranho, mas na prática sei que as coisas
são diferentes. Por ser um trabalho artístico, que envolve inspiração e carrega
uma carga muito forte da essência do diretor, essa ideia me parece meio
contraditória, mas pode acontecer. Conheço muitas pessoas que são excelentes em
suas profissões, mas que não são necessariamente apaixonadas pelo universo em
que estão inseridas.
16) Qual o pior filme
que você viu na vida?
Tenho uma lista com vários, mas um que me deixou ofendida de
tão ruim foi Mary Shelley. Lembro
que fui toda empolgada assistir porque se tratava de uma produção da Haifaa al-Mansour, a primeira mulher
saudita a se tornar cineasta, e até hoje me pego pensando em como conseguiram
transformaram uma história feminista tão interessante em um filme tão
superficial e fraco. Tem tanta coisa errada com esse filme que nem sei por onde
começar.
17) Qual seu
documentário preferido?
Confesso que sou viciada em documentários e é muito difícil
escolher só um, principalmente se forem sobre moda, que é a minha área de
atuação. Um dos meus preferidos é Bill Cunningham
New York, que fala sobre o precursor da fotografia de streetstyle, e outro
que me marcou muito é Dior e Eu
(2014). Ele está longe de ser perfeito, mas lembro que assisti quando estava na
época de decidir qual faculdade cursar e com certeza esse filme foi um grande
influenciador na minha carreira.
18) Você já bateu
palmas para um filme ao final de uma sessão?
Algumas vezes, mas pra mim só faz sentido se for em festivais,
pré-estreias muito hypadas ou em sessões com o diretor.
19) Qual o melhor
filme com Nicolas Cage que você viu?
Eu tenho certeza de que essa pergunta é uma pegadinha, inclusive
ela me fez lembrar de um episódio da quinta temporada Community em que eles discutem se o Nicolas Cage é um bom ou um mal ator. Eu gostei bastante de Adaptação, mas confesso que só assisti porque
é dirigido pelo Spike Jonze.
20) Qual site de
cinema você mais lê pela internet?
Eu acesso o IndieWire
quase todos os dias, mas ultimamente tenho consumido mais conteúdos rápidos
pelo Instagram ou ouvido podcasts para dar conta de fazer várias tarefas ao
mesmo tempo. O da A24 é o meu
preferido do momento!
21) Qual streaming
disponível no Brasil você mais assiste filmes?
Depende muito do mood do que to afim de assistir. É meio difícil
fugir do trio Netflix - Amazon - HBO,
mas pelo menos uma vez por semana faço questão de entrar no Mubi e conferir as novidades do
catálogo. Tem muita coisa incrível escondida lá.