29/06/2021

E aí, querido cinéfilo?! - Entrevista #458 - Lala Alarcon


O que seria de nós sonhadores sem o cinema? A sétima arte tem poderes mais potentes do que qualquer superman, nos teletransporta para emoções, situações, onde conseguimos lapidar nossa maneira de enxergar o mundo através da ótica exposta de pessoas diferentes. Por isso, para qualquer um que ama cinema, conversar sobre curiosidades, gostos e situações engraçadas/inusitadas são sempre uma delícia, conhecer amigos cinéfilos através da grande rede (principalmente) faz o mundo ter mais sentido e a constatação de que não estamos sozinhos quando pensamos nesse grande amor que temos pelo cinema.

 

Nossa entrevistada de hoje é cinéfila, de São Paulo. Lala Alarcon tem 23 anos, mora em São Paulo e é formada em moda pela Faculdade Santa Marcelina. Redatora e produtora de conteúdo, ela compartilha análises e curiosidades sobre figurinos de séries e filmes no perfil do Instagram @costumeincinema.

 

1) Na sua cidade, qual sua sala de cinema preferida em relação a programação? Detalhe o porquê da escolha.

O meu queridinho é o Petra Belas Artes. Acho que eles fazem uma curadoria incrível e sempre colocam em cartaz filmes muito relevantes, independente de serem pipoca ou mais alternativos. Mas o que faz eles ganharem o meu coração são as programações especiais, principalmente as maratonas da madrugada. Uma vez entrei na sala às 23h e só sai às 8h da manhã do outro dia. Era a estreia de Midsommar e depois passaram mais dois filmes de terror em homenagem à sexta-feira 13, foi uma das experiências mais legais que já tive dentro de uma sala de cinema. Além disso, eles fizeram um trabalho fantástico com o drive-in no ano passado quando todos os cinemas fecharam por causa da pandemia. Na minha opinião, eles deveriam continuar com essa ideia pra sempre!

 

2) Qual o primeiro filme que você lembra de ter visto e pensado: cinema é um lugar diferente.

Acredite se quiser, mas foi assistindo o Gordo e o Magro. Meu pai amava e até hoje ele guarda uma coleção enorme de dvds com toda a filmografia deles. O meu preferido era A Herança Assombrada, eu assistia em looping e ficava encantada com os cenários e personagens caricatos. Por mais simples que fosse, eu achava tudo muito mágico.

 

3) Qual seu diretor favorito e seu filme favorito dele?

Eu amo tudo o que o Wes Anderson faz, em especial O Fantástico Senhor Raposo, mas meu filme preferido da vida é Antes do Amanhecer, do Richard Linklater. Além disso, eu também tenho gostado bastante dos filmes dirigidos pela Greta Gerwig, ela com certeza tá no meu radar de favoritos.

 

4) Qual seu filme nacional favorito e porquê?

O Auto da Compadecida. Eu lembro de assistir a minissérie na casa dos meus avós quando ainda era bem pequena e cresci reassistindo o filme várias vezes. Hoje, tendo um olhar mais crítico, sigo achando incrível. Não só pelo apego emocional, mas por conta de todas as nuances e atuações fantásticas também. Inclusive já tive o prazer de conhecer o Matheus Nachtergaele e admiro muito o trabalho dele dentro e fora do filme.

 

5) O que é ser cinéfilo para você?

Eu acredito que um cinéfilo é alguém tão importante quanto um diretor de filme. É a mesma lógica de um leitor e um escritor. Por mais que os artistas criem com um determinado objetivo, quem dá o real significado é quem consome a arte. Tem muita gente que acredita que para ser um cinéfilo você precisa assistir um filme clássico por dia e conhecer todos os diretores do sul asiático, mas se você ama de verdade e respeita o cinema, para mim, você já é considerado um. A gente precisa entender que nem todo mundo tem acesso ou facilidade para compreender a complexidade de alguns tipos de filme, por isso o papel cinéfilo é tão importante, cabe a ele questionar os porquês e criar um diálogo que abra caminhos e gere discussões relevantes.

 

6) Você acredita que a maior parte dos cinemas que você conhece possuem programação feita por pessoas que entendem de cinema?

Eu acho que elas podem até entender, mas todo mundo que tá por dentro desse mercado sabe que o grande problema são as distribuidoras. Não adianta nada colocarem profissionais muito bem qualificados nesses tipos de cargo se os filmes que entram nos cinemas brasileiros dependem de negociações milionárias e de um monopólio que quase sempre privilegia quantidade à qualidade.

 

7) Algum dia as salas de cinema vão acabar?

Eu espero que não. É claro que é muito conveniente ter vários serviços de streaming com catálogos infinitos na palma da nossa mão, mas o cinema não se resume a isso. Ele é sobre ter experiências, criar expectativas, fazer uma imersão no momento... E quando vemos filmes em casa muitas vezes não conseguimos absorver o potencial máximo da obra.

 

8) Indique um filme que você acha que muitos não viram, mas é ótimo.

Eu Não Estou Lá do Todd Haynes. Ele convidou seis atores, entre eles o Christian Bale, o Heath Ledger e a Cate Blanchett, para interpretar o Bob Dylan em diferentes fases da sua carreira musical. É um filme único e muito bem pensado.

 

9) Você acha que as salas de cinema deveriam reabrir antes de termos uma vacina contra a covid-19?

Estou respondendo essa entrevista em junho de 2021 e graças a Deus a população já está sendo vacinada. No momento em que estamos vivemos eu acredito que não tem problema se tudo for feito com muito cuidado, mas se você me perguntasse isso há um ano, quando ainda não tínhamos muitas expectativas, eu provavelmente diria que não. É um alívio saber que esse capítulo conturbado da nossa história já está quase no fim.

10) Como você enxerga a qualidade do cinema brasileiro atualmente?

Acho que temos vários artistas excelentes e obras que deixam muitas produções de Hollywood no chinelo. Vira e mexe diretores grandes como David Lynch e Martin Scorsese elogiam algum filme nacional, mas infelizmente a maior parte dos brasileiros que têm acesso a esse tipo de informação ainda não aprendeu a dar o devido valor. Já vi muitos conhecidos que tem acesso à informação preferirem ir ao cinema para assistir a mais um filme de ação meia-boca do Liam Neeson do que darem uma chance para uma produção nordestina como Boi Neon. É muito triste ver filmes inovadores e com um potencial gigantesco sucumbirem ao preconceito e ignorância da população do seu próprio país.

 

11) Diga o artista brasileiro que você não perde um filme.

Com certeza o Selton Mello. Acho ele um dos artistas mais versáteis da nossa geração e não falo só pelo o trabalho dele como ator. Adoro a dublagem dele em A Nova Onda do Imperador e considero seu papel em Estômago um dos mais intensos que já vi em um filme.

 

12) Defina cinema com uma frase:

Tem uma frase da Julie Delpy em Antes da Meia-Noite que ela diz que sempre tem a sensação de estar dentro de uma memória ou um sonho. E eu para mim, quando assisto algum filme, me sinto exatamente assim: como se tivesse vivido aquilo, seja no passado ou em outra dimensão.

 

13) Conte uma história inusitada que você presenciou numa sala de cinema.

Vale uma coincidência fofa? Em 2012 eu era apaixonada por um menino e fomos com um grupo de amigos assistir O Espetacular Homem-Aranha. Sentei do lado dele e fiquei o filme todo insistindo pra que ele me beijasse, mas o que recebi foi um fora tão bonito que resolvi esquecer ele pra sempre. Bom, não preciso nem comentar que o meu plano não deu certo, né? Continuei apaixonada, mas ao invés de ganhar seu coração no romance, eu mudei a estratégia e foquei em construir uma boa amizade. Um ano depois, quem estava apaixonado era ele e desde então, há 8 anos, assistimos todos os lançamentos de Homem-Aranha juntos.

 

14) Defina 'Cinderela Baiana' em poucas palavras...

Um filme que não poderia pertencer a nenhum outro lugar do mundo, se não o Brasil.

 

15) Muitos diretores de cinema não são cinéfilos. Você acha que para dirigir um filme um cineasta precisa ser cinéfilo?

Na teoria acho estranho, mas na prática sei que as coisas são diferentes. Por ser um trabalho artístico, que envolve inspiração e carrega uma carga muito forte da essência do diretor, essa ideia me parece meio contraditória, mas pode acontecer. Conheço muitas pessoas que são excelentes em suas profissões, mas que não são necessariamente apaixonadas pelo universo em que estão inseridas.

 

16) Qual o pior filme que você viu na vida?

Tenho uma lista com vários, mas um que me deixou ofendida de tão ruim foi Mary Shelley. Lembro que fui toda empolgada assistir porque se tratava de uma produção da Haifaa al-Mansour, a primeira mulher saudita a se tornar cineasta, e até hoje me pego pensando em como conseguiram transformaram uma história feminista tão interessante em um filme tão superficial e fraco. Tem tanta coisa errada com esse filme que nem sei por onde começar.

 

17) Qual seu documentário preferido?

Confesso que sou viciada em documentários e é muito difícil escolher só um, principalmente se forem sobre moda, que é a minha área de atuação. Um dos meus preferidos é Bill Cunningham New York, que fala sobre o precursor da fotografia de streetstyle, e outro que me marcou muito é Dior e Eu (2014). Ele está longe de ser perfeito, mas lembro que assisti quando estava na época de decidir qual faculdade cursar e com certeza esse filme foi um grande influenciador na minha carreira.

 

18) Você já bateu palmas para um filme ao final de uma sessão?

Algumas vezes, mas pra mim só faz sentido se for em festivais, pré-estreias muito hypadas ou em sessões com o diretor.

 

19) Qual o melhor filme com Nicolas Cage que você viu?

Eu tenho certeza de que essa pergunta é uma pegadinha, inclusive ela me fez lembrar de um episódio da quinta temporada Community em que eles discutem se o Nicolas Cage é um bom ou um mal ator. Eu gostei bastante de Adaptação, mas confesso que só assisti porque é dirigido pelo Spike Jonze.

 

20) Qual site de cinema você mais lê pela internet?

Eu acesso o IndieWire quase todos os dias, mas ultimamente tenho consumido mais conteúdos rápidos pelo Instagram ou ouvido podcasts para dar conta de fazer várias tarefas ao mesmo tempo. O da A24 é o meu preferido do momento!

 

21) Qual streaming disponível no Brasil você mais assiste filmes?

Depende muito do mood do que to afim de assistir. É meio difícil fugir do trio Netflix - Amazon - HBO, mas pelo menos uma vez por semana faço questão de entrar no Mubi e conferir as novidades do catálogo. Tem muita coisa incrível escondida lá.