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30/06/2025

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Crítica do filme: 'Paraíso' [CineOP 2025]


Numa gangorra que varia da sutileza ao escancarado, apresentando verdades que rolam soltas pelo Brasil, o documentário Paraíso é um recorte antropológico, sem respiro, com ritmo acelerado, que busca nos conflitos das relações, no ponto de interrogação aos comportamentos, trazer para debate fragmentos de reflexões sobre a sociedade. Exibido no último dia da Mostra Competitiva do CineOP 2025, esse é o novo trabalho da cineasta Ana Rieper.

Utilizando uma ampla variedade de materiais de arquivo, o filme apresenta situações que expõem a desigualdade social, a violência e colocam a indignação no centro da narrativa. No entanto, em meio a esse mar de contextos complexos, a construção opta por abordar apenas fragmentos desse oceano, deixando de estabelecer conexões mais sólidas. Em alguns momentos, a narrativa se assemelha a um carro desgovernado, carregado de informações que buscam sustentação, mas nem sempre encontram equilíbrio.

Com inúmeras críticas sociais contornando a narrativa, o discurso não chega a se dispersar, nem a ser redundante, mas segue acelerado, sem respiro. Nessa montagem, por vezes confusa, o uso do chocar é interessante e salta aos olhos. Nesse ponto, a indignação se impõe, provocando reflexões imediatas. Todos já sabemos que o paraíso não é aqui — e talvez nunca tenha sido —, mas a forma como o filme apresenta diferentes comportamentos, muitas vezes com um deboche inteligente, é uma escolha acertada que prende a atenção e amplia o impacto.

Não sei se era exatamente essa a intenção, mas o filme funciona como um verdadeiro laboratório social — construído a partir de experiências que, de certa forma, definem a essência da obra. Ao longo de seus 75 minutos, busca-se soluções por meio de reflexões e de um recorte antropológico que atravessa a narrativa. Ainda assim, mesmo levantando debates relevantes para a sociedade, o filme corre o risco de atingir apenas um dos lados da bolha de nosso país polarizado.


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Crítica do filme: 'Meu Pai e Eu' [CineOP 2025]


Após uma longa jornada que remexe, de forma dolorosa, com o passado — desde a concepção do filme até sua estreia brasileira na CineOP, integrando a Mostra Competitiva da 20ª edição — Meu Pai e Eu acompanha a trajetória de um homem que decide, com impressionante coragem, embarcar de peito aberto em busca do perdoar ou, ao menos, de uma melhor compreensão de um alguém próximo que se tornou indecifrável. Ao tentar decifrar esse mosaico emocional embaralhado pelo tempo, o filme nos conduz por intensos contrastes de sentimentos, que ressoam profundamente ao longo dos seus 73 minutos.

Muitos anos após a partida do pai — um acontecimento marcado por sentimentos confusos e dolorosos, que ainda hoje machuca —, um futuro pai decide buscar novos significados para a relação com o homem que tantas vezes o decepcionou. Guiado por relatos de pessoas próximas e por objetos encontrados em uma mala jamais aberta, ele mergulha em uma investigação íntima, ciente de que poucas lacunas serão, de fato, preenchidas.

Perdão só faz sentido para quem o sente. Esse sentimento repleto de espinhos é uma das portas de entrada para uma história que faz uso sensível e preciso de depoimentos de familiares, cartas — algumas de conteúdo muito forte — e fotos antigas, compondo um panorama em busca de qualquer significado que permita lançar um novo olhar sobre uma relação paternal.

O desejo de compreender a figura que tanto fere é o núcleo da estrutura narrativa desta obra capixaba, que explora o amor profundo e o desencontro, moldando-se aos poucos como um retrato corajoso diante das barreiras emocionais de uma relação marcada pela ausência e um surgimento - por conta de um fato marcante – de tentativa de reconexão.

Marcando a estreia de Thiago Moulin na direção de longas-metragens, e logo no arriscado lugar de personagem/diretor, essa obra não é difícil de se entender quando pensamos em roteiro e os caminhos utilizados para preencher cinematograficamente uma narrativa bastante pessoal com camadas profundas. A questão é o amplo alcance das cargas emocionais que caminham em linhas tênues entre a dor e o amor – algo que se sustenta do início ao fim. O impacto é sentido de forma imediata nos momentos em que o filme toca suas duas faces: o desespero explícito e a incapacidade de lidar com ele. É uma obra intensa e angustiante, daquelas que não saem da cabeça tão cedo.

 

 

 

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Crítica do filme: 'Os Ruminantes' [CineOP 2025]


Partindo de fatos curiosos sobre um filme — considerado 'maldito' por muitos — que nunca saiu do papel, o documentário Os Ruminantes nos conduz por memórias de uma época marcada pela escassez de recursos e pela pressão política. A narrativa se constrói a partir da intimidade dos depoimentos e da presença de grandes trechos do cinema nacional, que ajudam a preencher as lacunas deixadas por um cineasta marcante na história do cinema brasileiro, falecido precocemente antes dos 40 anos. Dirigido por Tarsila Araújo e Marcelo Mello, o longa foi selecionado para a Mostra Competitiva da CineOP 2025.

O projeto parte da trajetória de Luiz Sergio Person, mas se expande para retratar todo um cenário audiovisual da época. Com olhar voltado para o final da década de 1960, o documentário se destaca pela sólida pesquisa e cuidadosa montagem. A partir de um roteiro que tinha potencial para se tornar mais uma obra marcante do nosso cinema, a narrativa nos conduz por contextos políticos e culturais do período, revelando curiosidades pouco conhecidas — como a intervenção do regime militar que impediu o sucesso de um dos filmes de Person nos Estados Unidos.

O roteiro em questão é uma adaptação do romance A Hora dos Ruminantes, de José J. Veiga — uma obra que explora a imprevisibilidade da vida por meio das transformações provocadas pela ruptura do cotidiano, após a chegada de misteriosos personagens à fictícia cidade de Manarairema. Os paralelos com a sempre conturbada política brasileira e com temas relevantes da sociedade saltam aos olhos — elementos que despertaram o interesse do cineasta Luiz Sergio Person e de seu grande amigo, o também cineasta Jean-Claude Bernardet.

A construção do documentário parte de perguntas ainda sem respostas sobre os motivos que impediram a realização do filme, e se desenvolve a partir dos depoimentos de Marina Person (filha de Luiz Sergio Person) e Jean-Claude Bernardet. Um de seus grandes méritos está em revelar as dificuldades de se produzir uma obra audiovisual em um contexto histórico adverso, ao mesmo tempo em que reforça a importância de manter viva a memória documentada — funcionando como uma espécie de continuidade da obra de um cineasta que, mesmo décadas após sua morte, segue como referência no cinema brasileiro.

Os Ruminantes mantém os pés no chão, mas não deixa de dialogar com o universo do realismo fantástico presente na obra original — um clássico da literatura brasileira. Por meio do inusitado, o filme abre espaço para aprendizados e provoca reflexões profundas. A história, agora novamente documentada, convida o espectador a olhar com atenção. Basta querer enxergar.



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