30/08/2017

Crítica do filme: 'Tempestade'

Temos o destino que merecemos. O nosso destino está de acordo com os nossos méritos. Vencedor de dois prêmios no aclamado Festival Internacional de Cinema de Veneza em 2015, Tempête, no original,  dirigido pelo francês Samuel Collardey, é uma daquelas pérolas sensíveis, raras, que explora a ausência até seu último suspiro. Dúvidas e escolhas são bastante explorados pelos personagens, repletos de indagações e sonhos, quase análogos à incerteza quando estamos passando por uma fase adolescente para a fase adulta. Um recorte maduro sobre a paternidade e a busca por melhores condições para uma família.

Na trama, conhecemos o pescador Dom (Dominique Leborne), um homem perto dos quarenta anos que trabalha em alto mar ficando pouco tempo por mês em terra. Ele recentemente se divorciou e conseguiu a guarda de seus dois filhos, Mailys (Mailys Leborne) e Matteo (Matteo Leborne) que escolheram ficar com ele por terem problemas com a mãe. Mesmo ausente, Dom sempre preenche a casa onde vive com os filhos de amor e carinho, mesmo com algumas irresponsabilidades. Quando a filha fica grávida aos dezesseis anos, Dom precisará encarar escolhas que mudarão para sempre os rumos dessa família.

A ausência é um tema importante, explorado com leveza, também acompanha toda a história, os caminhos da maturidade até a responsabilidade, grande dilema do protagonista. Há um certo descontrole quando se vê cheio de tempestades em sua vida, com a eminência da perda da guarda de seus filhos e a decisão de pensar em um trabalho remunerado que o deixe mais presente, em terra, perto deles. Movido pelo amor que tem pelos filhos, o protagonista embarca em uma transformação em sua vida pessoal e profissional, se apegando em seus sonhos para escrever um horizonte cheio de esperança e estabilidade.


Um pai ausente mas amoroso, irresponsável com detalhes da vida mas que ajuda quando está por perto. Dom, personagem marcante, é um retrato de parte da sociedade que na busca pro melhores condições para a família acaba abdicando de momentos importantes na formação dos filhos. Tempestade é um recorte que exala humanidade, duro, transformador quando estamos em um limite de nossas forças e de como todos os dias podemos aprender mais sobre nosso mundo.
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Crítica do filme: 'O Outro Lado da Esperança'

Vencedor do Urso de Prata de melhor direção no último Festival de Berlim, o cineasta finlandês Aki Kaurismäki (do excelente O Porto), volta as telonas explorando todo o alcance do tema dos refugiados em filme com um roteiro bastante interessante que conta duas trajetórias de vida que se encontram e mudam o destino de ambos. Minimalista e com alma de denúncia, o cineasta aclamado por crítica e público ao longo de sua carreira coloca as cartas na mesa para debates que consomem os noticiários mundiais todos os dias.

Na trama, bastante peculiar e intimista, conhecemos um senhor de idade quase avançada que troca de ramo profissional e resolve ser dono de um restaurante na Finlândia. Além dessa mudança profissional, o cinquentão Wikhström (Sakari Kuosmanen) abandona a esposa e parte rumo ao desconhecido. Ao mesmo tempo, e na mesma cidade, Khaled (Sherwan Haji), um jovem refugiado Sírio acaba tendo seu visto vetado ao chegar na capital finlandesa. Esses dois universos se encontram por acaso e Wikhström resolve ajudar Khaled em sua jornada.

O foco de toda a trama é a questão dos refugiados. Por meio de inserções detalhadas e por uma ótica simples, Kaurismäki (indicado ao Oscar pelo ótimo O Homem Sem Passado) consegue abrir questões importantes usando o cinema como ferramenta de denúncia. Com dois personagens cativantes, opostos ao extremo, um com ar de sonhador com mudança radical de vida aos cinquenta anos e um outro nômade, fugindo dos horrores dos absurdos que gente mal intencionada fez em sua terra, que se entendem pela bondade. O contraponto importante na diferença de idade encaixa as peças com perfeição nesse tabuleiro dramático e que é a verdadeira vida real para muitos habitantes desse nosso planeta.

O Outro Lado da Esperança estreia em breve no território nacional, uma distribuidora excelente está com os direitos dessa pequena obra-prima. É uma história de dor e esperança, sentimentos distantes mas nem tão extremos assim.


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26/08/2017

Crítica do filme: 'Lady Macbeth'

Sentir raiva é vingar-se das falhas dos outros em si próprio. Debutando em longas metragens, o cineasta britânico William Oldroyd não poderia ter pisado mais forte com o pé direito no set de filmagens. Baseado no livro Lady Macbeth do Distrito de Mtzensk, de Nikolai Leskov, Lady Macbeth é um sombrio retrato onde impera a psicopatia da forte protagonista interpretada com louvor pela jovem atriz britânica Florence Pugh. Ao longo dos curtíssimos 89 minutos de projeção, somos testemunhas de atos violentos provocados por um lado sombrio, egoísta e ambicioso de uma das personagens mais fortes que iremos ver nas telas do cinema esse ano.

Vencedora do prêmio da associação de críticos (FIPRESCI) no Festival de San Sebastián ano passado, Lady Macbeth, ambientada no século XIX, conta a história de Katherine (Florence Pugh) que é vendida para um homem mais velho para ser sua esposa. Durante uma das inúmeras viagens de seu marido, a protagonista arranja um amante e deseja continuar com ele não importa o que aconteça. Quando o marido volta de viagem, uma série de acontecimentos despertará em Katherine sentimentos conturbados e ações sem remorso.

Cada sequência é impactante. As lentes do diretor são cirúrgicas para mostrar os detalhes e captar as emoções pelas expressões da jovem e debochada Lady Macbeth. De drama, o filme vira um suspense em segundos, explorando com eficácia o lado sombrio que Katherine guardava dentro de si, agora aflorado por um intenso amor e a vontade de se vingar da sua maneira de seu atual marido e família. Sentada em um grande sofá, parece pensar em todos os passos, sem se importar com a inconseqüência de seus atos. Katherine é um vulcão que quando entra em erupção não mede esforços para conseguir seus objetivos, um personagem feminino forte, bem a frente de seu tempo.


Apesar das ótimas críticas que teve ao longa da semana de seu lançamento semanas atrás, Lady MacBeth possui um circuito bastante reduzido no mercado exibidor brasileiro. É um esplendoroso trabalho de direção, com uma atuação marcante de sua protagonista. 
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Crítica do filme: 'Um Homem de Família'

Debutando em longas metragens como diretor, o produtor e roteirista (criador do sucesso recente na netflix, Ozark) Mark Williams traz para a telona um retrato de uma família que tem um pai distante por conta de sua vida workaholic. Nada muito incomum de tantos outros retratos de família que já vimos na tela grande. É difícil encontrar alguns diferenciais, as armadilhas dos clichês são acionadas a todo instante mesmo que em algumas sequência a trama emocione. Estrelado pelo ator escocês Gerard Butler, Um Homem de Família estreou no circuito exibidor meses atrás e deve fazer sucesso nas sessões da tarde de muitas emissoras.

Na trama, conhecemos Dane Jensen (Gerard Butler), um profissional do ramo de contratações que é intenso em suas 70 horas semanais de trabalho. Sempre chegando tarde em casa, passa pouco tempo com sua esposa Elise (Gretchen Mol) e seus três filhos. Tudo passa a mudar quando Dane e Elise recebem a terrível notícia que o filho mais velho do casal está com leucemia. O fato faz o protagonista mudar sua rotina e enxergar novas formas de viver sua vida e enxergar o tão importante é a sua presença na vida de todos que o amam.

O protagonista possui seu carisma, antes um trabalhador compulsivo passa por uma transformação pelo trauma que sofre. Isso influencia sua maneira de enxergar os absurdos que fazia em seu trabalho para conseguir êxito. O paralelo com uma subtrama, com o grande ator Alfred Molina atrás do telefone, vira os melhores momentos do filme. A transformação de Dean passa exatamente nas conclusões e arranjos finais que consegue para ajudar o personagem de Molina. O relacionamento de Dean com seu chefe Ed (Willem Dafoe) é fantasioso e exigente, Dean no início se espalha nele, quer sucesso, dinheiro, poder, estabilidade, custe o que custar.


Analisando a história pelos limites do ser humano, ótimos debates podem ser construídos. A falta de ética de Dean no trabalho, suas falhas como pai, a luta interna entre o poder e a família. Mas como cinema, é muito parecido com outros tantos, clichês encaixados, direção apenas Ok, roteiro até certo ponto sonolento. Resumindo, um ótimo filme para ser selecionado para a sessão da tarde.
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Crítica do filme: 'Na Mira do Atirador'

Só os mortos conhecem o fim da guerra. Voltando aos conflitos oriundos da Guerra dos Estados contra o Iraque anos atrás, o cineasta nova iorquino Doug Liman (No Limite do Amanhã, Sr e Sra Smith) apresenta mais um recorte sobre esse conflito, dessa vez com um cenário e poucos personagens, metidos em uma espécie de batalha mental. Na Mira do Atirador , que estreia essa semana no circuito exibidor brasileiro, coloca em xeque todo o poder norte americano dentro de um campo de batalha, em uma posição de fraqueza, além de várias lacunas em aberto deixadas

Na trama, ambientada já no fim da Guerra do Iraque conhecemos os soldados norte americanos Matthews (John Cena) e Isaac (Aaron Taylor-Johnson), que durante uma inspeção a um lugar suspeito no meio do deserto acabam sendo encurralados por um conhecido sniper iraquiano que trava com eles um terrível e manipulador jogo psicológico, principalmente com Isaac, que se refugia atrás de uma grande parede quase destruída, e após Matthews ser atingido. Assim, ao longo dos intensos 88 minutos de projeção, somos testemunhas de um confronto entre o desespero e a paciência.

Sem muitas apresentações e sendo bastante objetivo, o filme (bastante parecido com o ótimo Mine que não estreou no Brasil) caminha para um drama psicológico e um jogo de gato e rato é instaurado. O preparo mental dos soldados é colocado em jogo a todo instante, mescla de desespero com esperança se embaraçam ao longo de toda essa intensa jornada pela sobrevivência. Aaron Taylor-Johnson se esforça para que seu personagem tenha força em cena, Isaac se desconstrói rapidamente, principalmente quando começa a revelar parte de seu passado em campos de batalha e traumáticos eventos causados por ações dele. Tido como vilão, o atirador iraniano só aparece para o público pela voz marcante e capaz de criar um grande quebra cabeça na mente de Isaac. Esse confronto entre a experiência e a juventude é bastante interessante.


Algumas questões são levantadas pelo lado de lá da parede. Talvez a mais reflexiva: ‘A Guerra já acabou, porque vocês não foram embora?’. Na guerra não existe lado, existe a sua verdade, o seu lado da batalha. O roteiro busca ir a fundo em como pensa um soldado norte americano e seu espírito de sobrevivência. Mesmo conseguindo ser bastante profundo em alguns momentos Na Mira do Atirador perde força no terço final mesmo com seu desfecho surpreendente. 
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Crítica do filme: 'O Efeito Aquático'

Em terra de coração apaixonado, a coragem vence o medo. Premiado na Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes do ano passado, essa pérola meio francesa, meio islandesa, O Efeito Aquático, no L'Effet Aquatique, é um daqueles filmes originais que vão nos conquistando a cada minuto com situações explorando o amor de maneira bem longe do convencional. Além de carismáticas interpretações, outro ponto alto do filme é o seu roteiro simples e muito eficiente, ganhador do César deste ano, 2017, de Melhor Roteiro Original. Infelizmente mas um daqueles filmes ótimos que não passou pelo circuito exibidor brasileiro.

Na trama, conhecemos o tímido Samir, um operador de guindaste que mora próximo de Paris e vive uma vida pacata. Certo dia, em uma local da cidade avista a professora de natação Agathe, uma mulher forte e cheia de energia que conquista o coração de Samir logo à primeira vista. Para viver esse amor platônico e intenso, Samir resolve se matricular nas aulas de natação de Agathe (mesmo já sabendo nadar) para assim ir conhecendo melhor a personalidade da amada.

Exibido no último Festival do Rio de Cinema, esse belíssimo trabalho contorna as veias do amor de maneira chamativa, fazendo analogias das emoções com o platônico, camuflado também nas hilárias situações que os pombinhos atravessam para chegar no despertar dos sentimentos. São duas personalidades bem diferentes e muito bem detalhadas pela lente dos cineastas Sólveig Anspach, Jean-Luc Gaget, diretores do filme. Samir é tímido, atrapalhado, se joga nessa paixão avassaladora de maneira espontânea, utiliza a mentira como ferramenta de proteção aos seus medos. Já Agathe é uma mulher guerreira, disciplinadora mas impulsiva, que se esconde em uma grande barreira, talvez, por ter muitas dificuldades de confiar e abrir seu coração.


Ao longo dos curtos 83 minutos de projeção, somos testemunhas de situações inusitadas e algumas bem engraçadas provocadas pelos ótimos personagens. Essa história deliciosa, é um dos grandes achados europeus dos últimos meses. O Efeito Aquático é, por simples definição, uma singela história de amor, com inteligentes pitadas cômicas, que mostra um homem apaixonado e ingênuo, indo atrás, com bastante coragem, do que ele pensa ser o amor de sua vida. Já vimos isso na vida real, não?
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19/08/2017

Crítica do filme: ' Onde Está Segunda?'

Dirigido pelo cineasta norueguês Tommy Wirkola (do terrível João e Maria: Caçadores de Bruxas) que dessa vez acerta a mão na direção, no futurístico, disponível apenas para a Netflix e repleto de cenas bem feitas, Onde Está Segunda? Protagonizado, em vários papéis, pela ótima atriz sueca Noomi Rapace (Prometheus, Os Homens que Não Amavam as Mulheres – Versão Sueca), o projeto demorou alguns anos para sair do papel. O ritmo frenético no último ato é peça fundamental de equilíbrio desse roteiro que é recheado de surpresas já que possui sete protagonistas que pensam e vivem o mundo que habitam de maneira completamente diferente.

Na trama, ambientada em um futuro não muito distante, o planeta vive uma imposição do Departamento de Alocação de Crianças, chefiado pela bióloga Nicolette Cayman (Glenn Close), onde todos os casais só podem ter apenas um filho pela justificativa de uma emergencial medida de controle populacional do Planeta Terra. Logo no início dessa medida, anos atrás, uma mulher tem sete filhas gêmeas e acaba falecendo no parto. Seu pai, Terrence (Willem Dafoe), avô das crianças, assume a guarda de todas as sete crianças e as esconde em um apartamento projetado e escondido para que elas nunca sejam separadas. Para esconder o segredo, dá o nome de todos os dias da semana para as meninas recém nascidas e ao longo da formação delas vai ensinando seus mandamentos para a sobrevivência. Um dos pontos principais ensinados, é que cada uma delas só pode sair para a rua no dia de semana do seu nome. Durante 30 anos, as sete irmãs assumem a identidade de uma pessoa só, se revezando no papel. Acontece que determinado dia, Segunda-feira (Monday) desaparece e as irmãs precisam descobrir o que houve, se expondo de uma forma que nunca fizeram.

O roteiro é bastante interessante mesmo com algumas pontas soltas que poderiam explicar mais sobre a curiosa história. Foca na formação familiar das irmãs e detalha os principais mandamentos do avô, esse último praticamente desaparece do filme do segundo ato em diante, voltando em eventuais flashbacks mas muito pouco para descobrirmos mais seus mistérios. Cada irmã possui uma personalidade diferente, o que eleva o trabalho da ótima Noomi Rapace que aparece em praticamente todas as sequências do filme. Tendo cerca de duas horas de projeção, o longa metragem (mais um achado da Netflix) é uma ficção científica com contornos dramáticos e ação empolgante. Falando em ação, as cenas que completam esse gênero dentro da trama são excelentes e empolgam.


Com filmagens realizadas na Romênia, e surgindo de repente na lista de catálogo da Netflix essa semana, Onde Está Segunda? é um entretenimento interessante, principalmente para quem curte filmes ambientados em contextos e universo ainda distante do que vivemos.
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17/08/2017

Crítica do filme: 'Os Meninos Que Enganavam Nazistas'

Nas grandes batalhas da vida, o primeiro passo para a vitória é o desejo de vencer. Dirigido pelo experiente cineasta canadense Christian Duguay, Os Meninos Que Enganavam Nazistas é mais um recorte da grande guerra. Mostra um lado do conflito que dizimou populações de vários países. Aos olhos de dois carismáticos irmãos somos testemunhas dos absurdos que os nazistas faziam, uma perseguição em massa contra os judeus em uma França dividida na década de 40. O roteiro é baseado em fatos reais e na obra Un Sac de Billes – também o nome original desse longa – escrito por Joseph Joffo, um dos protagonistas da história.

Na trama, conhecemos a família Joffo, judeus que vivem na França em uma época onde os nazistas ocuparam algumas regiões desse país, tornando a vida de esforçados trabalhadores em um inferno doloroso. Assim, Joseph (Dorian Le Clech) e Maurice (Batyste Fleurial) precisam fugir, seguindo um plano mirabolante feito por seu pai, o barbeiro Roman (Patrick Bruel) para uma região neutra e assim a família poder ser reunida novamente. Passando várias situações de risco e contando com a ajuda de surpreendentes personagens que aparecem na trajetória dos irmãos, os dois precisam unir forças e juntos enfrentar todos os inúmeros obstáculos que vão ter pela frente.

Um dos focos da trama é o valor da amizade entre os irmãos. Ambos enfrentam situações extremas na luta pela sobrevivência, em uma França repleta de soldados nazistas. Mostra-se também todo o sofrimento da família e as escolhas difíceis que precisam tomar para proteger a todos. A figura do pai é emblemática aos olhos dos irmãos, barbeiro e trabalhador, vê seu mundo desabar com as ameaças que recebe mas jamais perde a ternura e o carinho pelos seus filhos. Uma bela atuação do ótimo ator argelino Patrick Bruel.

O longa mostra o amadurecimento precoce dos jovens e uma vivência que levaram para o resto da vida. Como filme, Os Meninos Que Enganavam Nazistas, não acrescenta muito sobre fatos e relatos já vistos, lidos sobre os conflitos históricos da década de 40 na Europa. Há uma delicadeza na direção em algumas sequências, tenta mostrar todo um sofrimento de maneira até certo ponto superficial.


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14/08/2017

Crítica do filme: 'O Guardião Invisível'

As dúvidas do nosso passado passam a limpo o nosso futuro. Baseado na obra homônima da escritora Dolores Redondo, O Guardião Invisível, disponível no ótimo catálogo da Netflix, é um drama com envolventes momentos de suspense mesmo tendo um roteiro que falha em alguns arcos. Trabalha a psicologia dos personagens de maneira instigante e conta com atuações inspiradas, principalmente de sua protagonista, a inspetora Amaia Salazar, vivido pela ótima atriz espanhola Marta Etura (dos excelentes Cela 211 e Enquanto Você Dorme). A fotografia, grande destaque do filme, é impecável, domínio de luz, uma estrutura de planos dinâmica e muito eficiente.

Na trama, conhecemos a Inspetora Amaia Salazar (Marta Etura), uma mulher na casa dos 40 anos que descobre estar grávida de seu marido, o pintor norte americano James (Benn Northover). Amaia é designada a chefiar uma investigação sobre um possível serial killer que cometeu seu último assassinato em uma região que morou quando criança e onde vive sua misteriosa família. Chegando até o lugar onde foi criada, percebe que as coisas mudaram pouco desde sua saída, e, assim, além de participar de uma implacável busca pelo assassino, precisará combater fantasmas do seu passado cheio de tensão e que poucos conhecem.

Ao longo dos quase 130 minutos de filme percebemos a tentativa de apresentar todos os detalhes sobre os personagens que aparecem ao longo da trama. A protagonista é a mais misteriosa, esconde por um tempo sua gravidez do marido, tem uma relação bastante azeda e distante com uma de suas irmãs além de ter um conflito sem solução com sua problemática mãe. Aos poucos, algumas peças desse tabuleiro misterioso vão se mostrando e o público precisa estar atento, pois, é muita informação a cada sequência. A direção do espanhol Fernando González Molina (cineasta do aclamado na Espanha, Palmeiras na Neve) é detalhista, trabalha o plano de maneira inteligente dando um sentido a toda carga de mistérios. O roteiro falha em alguns arcos, deixa algumas lacunas em aberto no desfecho e foca em uma melancolia contínua de sua protagonista.

Amaia Salazar é uma personagem intrigante. Racional na maioria das decisões que toma, entra em parafuso quando o fator emocional se aproxima dela, trazendo situações vividas em um passado distante mas que estão guardadas em suas memórias. Por meio de telefonemas com um grande amigo do FBI que está nos Estados Unidos, recebe uns ‘starts’ para se concentrar e buscar as melhores soluções não só para o Serial killer que procura mas também para se livrar de memórias tristes que a travam. Há uma construção e desconstrução dessa personalidade ao longo da trama.


O cinema espanhol vem evoluindo bastante no gênero suspense. Ótimos filmes ao longo dos últimos anos foram lançados. É uma das escolas europeias de cinema mais ricas em mostrar os detalhes em paralelo ao psicológico de cada personagem. Amaia Salazar é mais uma na lista de grandes personagens da terra de Almodovar.
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